terça-feira, 18 de julho de 2017

Meu pedaço de chão

Prover moradia digna é ainda um dos principais desafios da agenda pública nacional. Há milhões de brasileiros sem ter onde viver e outros tantos que vivem num pedaço que não podem chamar de seu. Esta situação está prestes a mudar.

Na semana passada, o presidente Michel Temer sancionou texto de medida provisória que cria o Programa Nacional de Regularização Fundiária. A iniciativa nasceu no Ministério das Cidades sob o comando do tucano Bruno Araújo. Seu objetivo é titular os chamados núcleos urbanos informais, conferindo a famílias a propriedade de imóveis que estão, muitas vezes há décadas, na ilegalidade aos olhos do Estado.

De acordo com o ministério, entre 40% e 70% da população urbana do país vive em imóveis informais ou com algum tipo de irregularidade fundiária. São dezenas de milhões de pessoas, em geral carentes. Muitas delas se esparramam pelas 6,3 mil favelas localizadas nos maiores municípios brasileiros.

Pela medida, elas receberão gratuitamente dos cartórios as escrituras de onde moram. Brasileiros que vivem em áreas rurais também serão beneficiados. Com a titularidade, abre-se um enorme rol de possibilidades de melhoria de vida para essas pessoas.

A regularização permite que serviços públicos como água e esgoto passem a ser oferecidos. Com a escritura na mão, as famílias também poderão ter acesso a crédito – como se sabe, uma das alavancas mais poderosas para o melhor bem-estar.

Até efeitos prosaicos serão observados. A regularização converte locais de moradia em endereços e seus moradores passam a ter um CEP. Isso significa que milhões de brasileiros que não tinham sequer a possibilidade de receber uma correspondência ou encomenda por meio dos Correios agora passarão a ter.

A titularidade também conferirá ao Estado a possibilidade de cobrar tributos e usar a arrecadação para a promoção efetiva de políticas públicas como mobilidade urbana e urbanização nas áreas afetadas.

A partir do momento que passarem a contar com uma “garantia real”, será possível aos novos proprietários, ainda, financiar a faculdade do filho, reformar o imóvel, investir na produção rural ou em um negócio urbano. O imóvel passa a poder ser transferido com segurança aos descendentes.

Trata-se de uma revolução silenciosa, porém de efeitos potentes. A regularização poderá ficar conhecida no futuro como uma política social fundamental para a mudança de vida e a promoção de cidadania para milhões das famílias mais carentes do país.

sábado, 15 de julho de 2017

Virar a página

O governo obteve vitória importante ontem na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. Parecer que autorizava abertura de ação penal contra o presidente Michel Temer por crime de corrupção foi rejeitado pelos deputados. É preciso avançar com esse processo para que o país vire a página que o paralisa há dois meses.

A votação terminou com placar de 40 votos pela rejeição contra 25 favoráveis. Retirar um presidente da República do cargo é algo muito sério. Se todo mandatário estiver sujeito a ser defenestrado da cadeira por causa de acusações incomprovadas, ainda que graves, não haverá estabilidade política no país.

O relatório de Sergio Zveiter incorria nos mesmos pecados da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República. Realçava acusações e suspeitas, mas igualmente não apresentava provas suficientes para demonstrar tanto que a mala de dinheiro carregada por Rodrigo Rocha Loures tinha o presidente como destinatário, quanto ter havido interferência dele em órgãos como o Cade para azeitar pleitos da JBS.

A crônica do dia trata as iniciativas do presidente para virar o placar na CCJ como estratégia espúria. O debate deveria ser mais sóbrio. Trocar integrante de comissão, escalar parlamentar aliado para votar e liberar verba que consta do Orçamento é prática corrente desde que o presidencialismo existe no Brasil.

Mesmo com todas as manobras, o resultado de ontem é demonstração da habilidade de Temer para lidar com adversidades no Parlamento. Nisso ele se destaca. Há uma semana, desde que foi escolhido o relator, a perspectiva era de aprovação do pedido da PGR. O governo usou as armas à mão para ganhar no voto – o que, no entanto, deveria poupar, pelo menos, a máquina estatal.

Mas a vitória de ontem não encerra a batalha do governo. Em 2 de agosto, o plenário da Câmara se manifestará sobre o pedido do Ministério Público. Será ainda mais difícil para a oposição ao governo sobressair-se: são necessários 342 votos, ou seja, dois a cada três, para que a investigação seja autorizada e Temer afastado da presidência.

É bem provável que, como parte da guerra que vem travando contra o mundo político, até lá a PGR apresente nova denúncia contra Temer. Como a ordem ali é não dar sossego ao presidente, é possível que no início de agosto o país esteja com um olho no plenário e outro já mirando de novo a CCJ em novo processo como o que se encerrou ontem.

O problema é que, enquanto continuar assim, vai perdendo o Brasil real. Há nas pessoas, nas empresas e até em entidades representativas clara sensação de exaustão diante desse caudal sem fim de escândalos. O país quer voltar a andar para frente e o quanto antes esta página puder ser virada, melhor.

sexta-feira, 14 de julho de 2017

Lula na cadeia

A condenação de Luiz Inácio Lula da Silva por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro abre nova perspectiva histórica para o país. Aproxima-se o momento de sepultar um período perverso que, para sustentar um projeto de poder, comprometeu o presente e rifou o futuro de milhões de brasileiros. Chegou agora de extirpar o lulismo.

Lula foi sentenciado ontem a 9 anos e seis meses de prisão pelo juiz Sergio Moro - o Ministério Público quer pena maior. Parte dos crimes foram praticados ainda no exercício da presidência da República. Ele também ficará impedido de ocupar cargo ou função pública pelo dobro desse tempo, ou seja, 19 anos. Ainda não será preso, para o que será preciso aguardar confirmação em segunda instância pelo TRF da 4ª região.

O tríplex do Guarujá que condenou Lula é quase anedótico perto do manancial de traficâncias que ele e o PT promoveram no Brasil por mais de uma década. Afinal, o que são R$ 2,2 milhões num esquema em que um barusco, a moeda inaugurada por um funcionário de terceiro escalão da petroleira, era cotado em quase 40 vezes mais em termos de propina?

O apartamento é apenas um dos mimos que o grupo OAS destinou a Lula para compensar as benesses que recebeu da Petrobras. Cabe recordar, ainda, que os contratos que geraram as vantagens indevidas amealhadas pelo ex-presidente referem-se a apenas uma obra e que acabou custando dez vezes mais, ultrapassa R$ 40 bilhões e até hoje não foi concluída, a refinaria Abreu e Lima.

A roubalheira petista ultrapassa o âmbito privado. Dinheiro da corrupção resultante da corrosão do aparelho estatal brasileiro financiou por anos a fio o esquema político-eleitoral do PT. Com as revelações ainda não apreciadas da Odebrecht e da JBS, é cristalino que todas as vitórias petistas desde 2006 foram embaladas em dinheiro sujo.

Pode-se alegar, como não se cansarão de fazer os lulistas, que a sentença de Moro careça de provas materiais rotundas de crime. Mas, convenhamos, estamos tratando com uma organização criminosa que se especializou em fraudar o interesse público e em sequestrar o dinheiro dos brasileiros. Numa situação assim, não haverá nunca batom na gola do colarinho branco.

O que é fora de questão, pelo menos para quem tem um pingo de discernimento, é que Lula foi diretamente beneficiado por um esquema corrupto firmado entre o aparato de Estado e empresas privadas que qualquer um reconhece. O ex-presidente ainda é réu em mais quatro processos abertos na Justiça Federal e investigado em um quinto inquérito por falcatruas relacionadas ao sítio de Atibaia.

O petista tornou-se o primeiro ex-presidente da República a ser condenado à cadeia. Mas o ineditismo não se aplica ao PT: Lula é o terceiro ex-comandante da legenda a ter que acertar contas com a Justiça. Fará companhia a José Dirceu e José Genoíno. Como se percebe, trata-se de esquema longevo, que passou pelo mensalão, desaguou no petrolão, mas antecede a ascensão do partido ao comando do governo federal.

A jararaca e seu serpentário não se fazem de rogados e anunciaram que planejam transformar a sentença de Moro em mote de uma campanha política permanente - embora os atos convocados para ontem tenham sido fracasso retumbante. Arreganham os dentes para constranger adversários e coagir a população em geral. Atacam e intimidam para não serem atacados. Posam como as vítimas, ou perseguidos políticos, nos termos empregados pela defesa de Lula ontem, de sempre.

A condenação de Lula por Moro é apenas o primeiro capítulo do ajuste de contas da sociedade brasileira com o demiurgo do maior esquema criminoso instalado no seio do poder no país, e cuja administração resultou na maior crise econômica a nos assolar. O próximo passo é a condenação dele em segunda instância, com a decretação de sua prisão e de sua inelegibilidade.

Como o líder dos petistas não deverá sossegar com isso, usando todos os recursos jurídicos à disposição, ainda assim provavelmente seu nome estará na urna eletrônica daqui a 15 meses. Aí, sim, será o momento de escrever o tomo final dessa história nefasta e derrotar Luiz Inácio Lula da Silva no voto, sepultando para todo sempre uma época que prometeu ser venturosa, mas serviu mesmo foi para afundar o país. Ainda temos muito trabalho pela frente, mas a virada já começou.

quinta-feira, 13 de julho de 2017

A pixotada das senadoras

O Congresso Nacional é o lugar do embate entre ideias, visões de mundo e posições político-partidárias divergentes. Lócus da representação popular, que se manifesta pelo sufrágio livre e soberano, é onde o processo democrático se desenrola. No voto, as disputas se resolvem e a vida segue. Não, contudo, para aqueles que hoje estão na oposição.

O Senado Federal foi palco ontem de um dos espetáculos – os termos não são aleatórios – mais deprimentes deste deprimente momento da vida política nacional. Senadoras de partidos de oposição, gente que até um ano atrás estava no comando do país, apelaram para o grito contra aquilo que não conseguiram conquistar legitimamente no voto.

Lideradas, se é que se pode dizer assim, por Gleisi Hoffmann, a presidente nacional do PT, as senadoras tomaram à força posições de comando da Casa e chegaram a transformar uma mesa de trabalho em balcão de cantina. Durante cerca de sete horas paralisaram trabalhos e votações no plenário, deixado no escuro. Agiram como se estivessem numa assembleia estudantil, dessas que a esquerda brasileira controla e domina desde sempre.

O fito manifesto era exigir alterações na reforma trabalhista. A intenção real era implodir o projeto de lei que atualiza, corrige e moderniza uma legislação nascida há sete décadas pelas mãos de um ditador. O gesto protagonizado ontem pelas senadoras do PT e seus satélites coaduna-se com a inspiração que esteve no nascedouro da CLT.

A dimensão da insignificância política delas – e dos partidos que elas representam – ficou expressa no resultado da votação. A reforma foi aprovada por 50 votos a 26. Ou seja, para cada parlamentar contrário, dois foram favoráveis. Provavelmente, o placar espelha o sentimento da população, que quer ver saídas para o desemprego – ao contrário das senadoras.

O gesto de Gleisi, Fátima Bezerra, Regina Souza, Vanessa Grazziotin, Lídice da Mata e Katia Abreu – que se vangloriaram do ato e agora responderão a representação por quebra de decoro – é uma afronta às instituições do Estado democrático de direito. É um desrespeito não apenas com os pares do Senado, mas, sobretudo, com o povo que cada um dos 81 integrantes daquela Casa ali representa.

Disputa se resolve, e se ganha, no voto, respeitadas todas as possibilidades regimentais à disposição da minoria. Enquanto o PT mandou no país, sempre foi assim e isso jamais foi posto em dúvida. Quem não reconhece esses preceitos e ditames simplesmente não merece participar da vida democrática nacional.

Não há, porém, surpresa no que aconteceu ontem em Brasília. Desde que o petismo ascendeu ao poder, uma de suas tônicas foi sempre tentar calar e constranger vozes dissonantes. A novidade agora é que, mesmo sendo minoria, quer se impor à vontade da maioria. Lugar de pixotada não é no Congresso. O Congresso é lugar de democratas e não de dublês de ditadoras ou de eternas secundaristas.

quarta-feira, 12 de julho de 2017

Aprovar para empregar

O Senado faz hoje a votação final da reforma trabalhista. Não se trata de tema de mero interesse do governo e de seus aliados, mas sim item fundamental da necessária reconstrução do país. Quem ganhará com a aprovação não será Michel Temer, mas sim os milhões de brasileiros que clamam por emprego.

O cerne da reforma é migrar de um modelo estatutário, conduzido sob a tutela estatal, para um arcabouço que conceda mais liberdade para a mão de obra se entender e negociar com o capital, também com menos intervenção sindical. Direitos considerados fundamentais, contudo, ficam preservados. Que mal há nisso?

Claro que haverá os que gritarão, como já vêm fazendo nos últimos meses, que a nova legislação “enterra a CLT”, “rasga a carteira de trabalho”, “acaba com direitos históricos dos trabalhadores”. Falso, falso, falso. A reforma promove o encontro do mundo do trabalho com a realidade.

A CLT é uma idosa que completou 74 anos de idade. Não precisa ir muito longe para concluir que esteja anacrônica, que não contemple as muitas mudanças – em alguns casos, verdadeiras revoluções – que aconteceram nestas últimas décadas em termos de relações e condições de trabalho.

A reforma tem novidades que espantam pela singeleza – e por nos darem conta de quão atrasado o arcabouço em vigor no país encontra-se. Permitirá, por exemplo, dividir férias (hoje não previsto na CLT), o trabalho remoto (como o home office) e o trabalho intermitente (também não resguardado atualmente na lei).

Ou seja, passa a abrigar inúmeras situações que o mundo real já adotou, mas não estão consolidadas em legislação e, assim, deixam milhões de trabalhadores na chuva. Como bônus, há, ainda, o fim da famigerada contribuição sindical, que drena por ano R$ 3,5 bilhões do suor do trabalhador para cofres de sindicatos, centrais e confederações.

É bom que fique explícito que os direitos que a lei trabalhista em vigor concede abarcam apenas parcela ínfima dos trabalhadores. Dos 167 milhões de brasileiros em idade de trabalhar, apenas 33 milhões são trabalhadores com carteira assinada, segundo o IBGE. A eles se juntam os 11 milhões de empregados no setor público. E só.

O Brasil tem hoje 14,1 milhões de desempregados. Infelizmente, as perspectivas de redução desse número ainda estão distantes, e são tímidas. Embora o mercado de trabalho tenha voltado a gerar vagas líquidas de emprego, o resultado se dá mais por redução das demissões do que pela aceleração das admissões. Ou seja, vai levar tempo para o estoque cair.

Não sejamos simplistas o ponto de dizer que a reforma será a panaceia da chaga do desemprego no Brasil. Não será, até porque ainda há muito, muito mais a ser consertado. Mas é certo que ela atualiza e melhora as condições de trabalho e produção no país, aproximando-as do resto do mundo. Para muitos, já é uma perspectiva e tanto.

terça-feira, 11 de julho de 2017

Quanto pior, pior

A batalha em torno da manutenção do peemedebista Michel Temer na presidência da República transformou-se no lance inaugural da eleição de 2018. Em campanha permanente, o velho PT de sempre ressuscitou seu quanto pior, melhor como lema de guerra.

Todas as táticas à mão estão sendo usadas para aprofundar o desgaste do governo e prolongar o martírio de Temer. A ordem é arrastar a crise até onde for possível, puxar a corda, parar o país, boicotar as reformas. Como sempre, os petistas, alegremente servidos por seus satélites no Congresso, estão se lixando para o Brasil.

Hoje a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara conhecerá o relatório do deputado Sérgio Zveiter sobre a denúncia apresentada há duas semanas pela Procuradoria-Geral da República contra Temer. Uma vez aprovado, são necessários 34 votos, o parecer segue para o plenário, onde precisa de 342 votos para ser confirmado.

Ao país importa que esse processo seja o mais célere possível. Afinal, quem ganha com a novela em capítulos diários na TV em torno da desconstrução do atual presidente? O PT, claro - e, possivelmente, também alguns interessados inconfessáveis.

A atual oposição, que até o ano passado era protagonista da ruína promovida pelo petismo, prefere que cada dia tenha sua agonia. Faz de tudo para estender os trâmites, protelar algum desfecho (qualquer que seja) e evitar que o folhetim de padrão mexicano ganhe rapidamente seu the end a fim de que voltemos a cuidar do que interessa: a reconstrução do país.

É, pois, imperativo que as instituições funcionem e os ritos previstos na Constituição sejam regiamente obedecidos para que o país encontre uma saída, qualquer que seja ela. O pior dos mundos é ficarmos reproduzindo e propagando indefinidamente esta crise, que drena a energia necessária para a recuperação. É claro que isso agrada sobremaneira ao petismo.

Espera-se que a CCJ dê andamento adequado à discussão da denúncia nos próximos dias. Já soa excessivo dar tempo a todos os 132 integrantes da comissão, entre titulares e suplentes, além de líderes partidários e mais 40 deputados não membros para se manifestarem. Serão, se cumpridos os 15 minutos prometidos a cada um, quase 50 horas de discussão.

O que é realmente relevante é dar resposta definitiva ao impasse que paralisa o país desde o último dia 17 de maio. A decisão acerca de quem deve ficar no comando da nação deve ser tomada o mais rapidamente possível. Quanto mais demorar, piores ficarão as condições do Brasil. E melhor será para quem sempre ganha com o caos: o PT

sábado, 8 de julho de 2017

Golpe de misericórdia

A inflação desceu em junho ao seu menor nível para o mês desde que a economia brasileira recuperou a estabilidade com o Plano Real. Depois de mais de uma década, também voltou a mergulhar em terreno negativo. A ocorrência de deflação suscita novos desafios, acende alertas e exige posturas distintas da política econômica.

No mês passado, o IPCA ficou em -0,23%, conforme divulgou o IBGE nesta manhã. Para junho, é o menor índice de toda a série histórica, ou seja, em 23 anos. O país não registrava deflação desde junho de 2006. No ano, a inflação caiu a praticamente um quarto do que foi entre janeiro e junho de 2016. Por todos os ângulos, a queda é assombrosa.

O país passa a conviver com situação oposta à que enfrentou, por meses seguidos, até dezembro do ano passado. Até então, o problema era o estouro do limite superior da meta, tônica dos governos perdulários e lenientes do PT. Agora a questão é outra: impedir que a inflação caia abaixo do piso.

No acumulado em 12 meses, o IPCA baixou para 3%, o exato limite inferior da banda de variação adotada pelo regime de metas nacional. Os índices gerais, que medem a inflação também no atacado, também estão em queda persistente e em deflação já por três a quatro meses seguidos.

Certamente é mais confortável, e sadio, ter como desafio uma inflação baixa demais. Pelo menos há a garantia de que os salários dos trabalhadores não estão apanhando dos preços. No entanto, como o próprio sistema de metas sugere, quedas acima do desejado também são problemáticas.

A inflação brasileira declinou com força desde a primeira metade do ano passado porque passou a encontrar pela frente uma política econômica para a qual a alta de preços é uma doença a se combater e não uma aliada conveniente para o crescimento econômico, como os governos anteriores acreditavam.

Entretanto, é inegável que outro fator relevante para o recuo dos preços é a recessão. E este é o aspecto mais preocupante do movimento atual da inflação brasileira. Ela cai, em parte, porque há menos demanda, por causa do desemprego e também em razão da desconfiança que assombra os consumidores.

Juntados estes fatores, resta evidente que a ação de política monetária do Banco Central precisa mudar. Não há razão para segurar o ritmo de queda da taxa básica de juros. Embora a Selic já tenha caído quatro pontos desde outubro e encontre-se hoje no seu menor patamar em quase quatro anos, há condições sustentáveis de acelerar os cortes já na reunião do próximo dia 26.

É claro que persiste a incógnita em relação ao lado fiscal dessa moeda. Segurar o rombo orçamentário tem se mostrado tarefa dificílima, ante o peso da má herança legada pela irresponsabilidade petista. Há pela frente o duplo desafio de, do lado fiscal, garrotear os gastos e, do lado monetário, afrouxar o laço, sob pena de aborto precoce da incipiente saída do país da recessão, algo que a crise política só faz piorar.

sexta-feira, 7 de julho de 2017

O triste fim da Venezuela

A Venezuela está muito perto de transpor o limiar que ainda separa o frágil caráter democrático do seu regime de uma pura e simples ditadura. O “socialismo do século 21” revelou-se um fracasso rotundo, e hoje só recebe aplausos das viúvas do muro de Berlim, muitas das quais abrigadas na esquerda brasileira.

Não há um dia em que as principais cidades da Venezuela não sejam sacudidas por protestos cuja marca mais evidente é a truculência e a intolerância dos partidários do chavismo. Nos últimos três meses, 91 pessoas foram mortas em conflitos e mais de 1,4 mil foram feridas. A situação é de guerra.

O regime de Nicolás Maduro, que sempre instigou a violência de seus sequazes, passou a executá-la com requintes de crueldade, como quando, na semana passada, um estudante foi executado pela polícia chavista em frente a câmeras de TV.

Ontem, em mais um passo nessa insana escalada, militantes e milicianos armados simpáticos ao governo invadiram o Congresso, uma das poucas instituições ora não subjugadas ao chavismo, e espancaram parlamentares. A Venezuela, hoje, só é uma democracia na forma. No conteúdo, é um regime de exceção, e da pior espécie.

O golpe de misericórdia pode vir no fim do mês, quando está prevista a eleição de uma Assembleia Constituinte. Tudo nas suas regras é manipulado e antidemocrático. Um exemplo: no conclave, “representantes” de estudantes terão 24 assentos, enquanto empresários terão apenas cinco. Na realidade, funcionará como uma espécie de ditadura do proletariado.

O chavismo levou a Venezuela à situação de pária do mundo. Faltam todos os tipos de bens e serviços para a população, em especial alimentos e artigos de primeira necessidade, de papel higiênico a medicamentos. A predação populista destruiu as empresas públicas e jogou 82% da população na pobreza – muitos dos quais hoje buscam em desespero alguma oportunidade no Brasil.

O país também tem hoje a maior inflação mundial e Caracas tornou-se o local mais violento do planeta. Em três anos, o PIB nacional caiu 27%. Foi esse o resultado que quase duas décadas do socialismo promovido pelo chavismo, tão louvado por petistas brasileiros, produziu.

A Venezuela não merece mais ser tratada como democracia. Os órgãos multilaterais deveriam lhe fechar as portas em definitivo, a começar pelo Mercosul, de onde o país está suspenso desde dezembro de 2016. Hoje não bastam mais apenas palavras diplomáticas.

A maior preocupação das chancelarias – com a brasileira à frente, pela posição de liderança que o país deve protagonizar na região – deve ser proteger a população local e evitar que ela pague ainda mais caro pelas insanidades do chavismo. O alvo deve ser o regime ditatorial, não o povo da Venezuela.

quinta-feira, 6 de julho de 2017

À procura da máquina perfeita

É a velha história do copo meio cheio, meio vazio. Mais provável é que esteja pela metade mesmo. Vez ou outra, o desalento geral da economia é temperado por algum resultado positivo, como os que a indústria brasileira voltou a registrar em maio. São, por ora, suspiros à espera de uma real recuperação.

Em dois meses, a alta da produção industrial nacional chega a quase 2%, informou ontem o IBGE. Em maio, todos os segmentos tiveram desempenho positivo – foi o melhor para o período desde 2011 – com destaque para a retomada da fabricação de máquinas e equipamentos, em especial as agrícolas.

No acumulado em 12 meses, o resultado do setor ainda está no campo negativo (-2,4%), mas já é bem menos ruim do que os quase 10% de queda que exibia um ano atrás. Sobre maio de 2016, o avanço foi de 4% e, no ano, a alta é de 0,5%.

São bons registros e merecem ser comemorados. Mas a indústria ainda terá que comer muita poeira para chegar a algum lugar – para junho, os primeiros prognósticos são novamente negativos, impactados pela crise política. Há, contudo, bem mais ferrugem, pelo menos oito anos, a recuperar.

A produção física da indústria brasileira encontra-se hoje no mesmo nível em que estava em fevereiro de 2009, época em que, é bom recordar, a economia do mundo inteiro estava zonza após a crise das hipotecas nos EUA. As fábricas nacionais produzem atualmente 18% menos do que na sua máxima histórica, quatro anos atrás.

O setor industrial brasileiro precisa dar muitos passos adiante para tornar-se novamente pujante e impulsionar o conjunto da economia. Nos últimos anos, foi entrave, nunca alavanca. Mais desafiador ainda é ter alguma relevância no mercado global – hoje, salvo raras exceções como a indústria aeronáutica, não tem nenhuma.

O exemplo a seguir está aqui mesmo, na agropecuária. O campo brasileiro hoje produz como fábrica, e das boas. Alia eficiência, produtividade e sustentabilidade, com um olho posto no boi, outro no mundo. O agronegócio nacional é, sim, global. Qual a composição desse fertilizante?

O campo renasceu depois que passou a contar com políticas de créditos previsíveis e de longo prazo. Teve a parceria de institutos públicos de pesquisa e inovação. Mas, sobretudo, deixou o livre mercado fazer sua parte. Hoje dificilmente produtor rural chora por esta ou aquela taxa de câmbio. Pede apenas que o governo não lhe atrapalhe.

A carne da indústria made in Brazil ainda precisa passar por esta maturação. As políticas públicas pelas quais o setor se bateu nos últimos anos quase sempre clamavam por mais proteção, mais intervenção e apoio estatal. A pauta encontrou eco na visão de mundo dos governos petistas. Não sem surpresa, todas as políticas industriais postas em marcha por Lula e Dilma fracassaram rotundamente.

Com a economia ainda em modo errático, resta adotar a cautela como método de avaliação. Sem um caminho realmente novo, a indústria brasileira continuará oscilando, em maior ou menor intensidade. O que deu errado, a gente já conhece. Agora é tentar seguir o que pode vir a dar certo.

quarta-feira, 5 de julho de 2017

A aritmética é soberana

O grupo político que até o ano passado governou o país acreditava que, com boa vontade e bastante malandragem, era possível dobrar as regras da aritmética. Mas, como a matemática não dá espaço para a irresponsabilidade, o que ficou de herança foram contas públicas em petição de miséria. Será difícil, muito difícil, trazê-las de volta à normalidade.

A cada mês, a contabilidade oficial salienta os contornos do desafio. Em maio, o rombo no orçamento do governo subiu a R$ 167 bilhões no acumulado em 12 meses. Embora uma alteração no fluxo de pagamentos de precatórios tenha afetado o resultado, o quadro geral ainda é de extremo desconforto. Não vai mudar tão cedo.

A proporção da dívida bruta brasileira sobre o PIB bateu recorde, e nada indica que irá parar aí. O indicador atingiu 72,5% em maio e deve ultrapassar 80% já no ano que vem, de acordo com previsões colhidas pelo Valor Econômico. Se isso se confirmar, a dívida do país terá dado salto de quase 30 pontos num intervalo de cinco anos e superará com folga o padrão de economias emergentes.

O país convive com uma realidade em que a economia cresce pouco – as perspectivas declinaram ainda mais após a eclosão da atual crise política – e as receitas fiscais não reagem, mas as despesas seguem firmes e fortes. Como era de se esperar, gastos com aposentadorias e pensões continuam puxando o rombo para cima, com alta real de 7% no ano.

Em vista disso, o governo cogita cobrar mais tributos dos contribuintes para tentar tapar os buracos e cumprir as cada vez mais distantes metas fiscais que fixou na lei orçamentária – um déficit de R$ 139 bilhões. Trata-se de um Estado que precisa, mas tem dificuldade, desinchar.

As reformas estruturais que tramitam no Congresso têm condão de iniciar a necessária lipoaspiração. Não se deve, pois, abrir mão delas. Tampouco a política deve enveredar por caminhos fáceis que, pavimentados por concessões e farta distribuição de benesses, conduzem ao inferno.

De positivo, o laissez-faire que dominava o governo petista deu lugar a tentativas sérias de domar o monstrengo. A aprovação, no fim do ano passado, da regra constitucional que proíbe o aumento dos gastos públicos acima da inflação injeta algum controle sobre o orçamento, ainda que a tarefa não se revele simples nem de fácil execução.

Se nada for feito, cada vez mais, os gastos considerados obrigatórios sufocarão os chamados discricionários, em que se situam os investimentos públicos necessários para recuperar a competitividade do país. Um país assim não consegue avançar. Daí porque é tão necessário reformar, concentrar a ação do Estado naquilo que a população mais precisa e, sobretudo, agir com responsabilidade. A aritmética não brinca em serviço.

terça-feira, 4 de julho de 2017

Menos é mais

O Conselho Monetário Nacional (CMN) deu na semana passada passo importante na direção de tornar a economia brasileira menos desalinhada do resto do mundo. O compromisso com inflação mais baixa repõe a melhor ciência econômica no centro das políticas de governo. A estabilização é uma conquista que a sociedade brasileira demorou tempo demais para alcançar e não pode ser posta em risco, como ocorreu na gestão petista.

A política monetária do país será orientada para alcançar IPCA de 4,25% em 2019 e de 4% no ano seguinte. O Brasil aproxima-se, assim, dos padrões vigentes nas economias emergentes, cuja meta de inflação média é de 4%. O próximo passo será perseguir o patamar de 3% das economias vizinhas do continente.

Além da redução das metas, o horizonte estabelecido para a política monetária passa a ser de três anos à frente, e não apenas dois. A partir de agora, apenas uma vez a cada quatro anos a meta definida limitar-se-á ao mandato presidencial corrente.

Tal mudança dará mais previsibilidade e confiança ao sistema e também ajudará no processo de baixa da taxa básica de juros ora em marcha. Por fim, o intervalo de tolerância, que já havia sido estreitado neste ano, foi agora mantido em 1,5 ponto percentual.

Nos últimos 14 anos, a meta esteve congelada em 4,5%. Não raro, a rigidez combinou com fracasso: apenas em duas ocasiões o objetivo do sistema foi plenamente alcançado. A tônica sempre foi namorar o limite superior de tolerância, que nos governos de Lula e Dilma acabou convertendo-se na meta na prática, fruto de uma política, defendida pelo PT, segundo a qual uma inflaçãozinha a mais não dói. Doeu.

O processo de derrocada da inflação brasileira vem de longa data. Começou com o sucesso do Plano Real, implantado pelo governo Itamar Franco, tendo Fernando Henrique Cardoso à frente de uma brilhante equipe de economistas, em 1994. Sábado completaram-se 23 anos que a nova moeda entrou em circulação.

Neste momento, os índices de preços vivem período de forte retração. O IPCA encontra-se hoje em um terço de onde estava no início de 2016. O IGP-M (que não é usado para balizar a meta) acumula baixa de 0,78% nos últimos 12 meses, algo inédito desde janeiro de 2010. A previsão é de que a inflação oficial feche o ano próxima de 3,5%, no que seria a menor taxa desde 2006.

Reduzir a meta de inflação implica também perseguir aumentos menores para os gastos públicos, já que a política do teto instituída a partir deste ano restringe a variação das despesas do governo à variação do índice oficial de preços. Os resultados fiscais divulgados a cada mês sugerem a dificuldade quase hercúlea da tarefa.

A fixação de metas mais baixas para 2019 e 2020 também serve para sinalizar que o compromisso com o controle da inflação deve transcender governos e independe de quem detém o comando da nação. Manter preços comportados significa valorizar a moeda e promover maior bem-estar para a população. Disso, os brasileiros não devem abrir mão, aconteça o que acontecer.

sábado, 1 de julho de 2017

A justiça foi feita

A decisão tomada nesta manhã pelo ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, representa um alento para a democracia brasileira e o respeito veemente ao Estado de direito no país. A restauração do mandato do senador Aécio Neves tem implicações que alcançam muito além do caso específico e interessa a todos os que prezam a legalidade, a garantia dos direitos individuais, a separação, independência e harmonia entre os poderes e, sobretudo, o primado da Constituição.

Em resposta a agravo interposto pela defesa do parlamentar, Marco Aurélio decidiu restabelecer o mandado do qual Aécio estava afastado há um mês e 12 dias por decisão liminar tomada pelo ministro Edson Fachin. Na mesma decisão, ele também negou pedido de prisão do senador feito pela Procuradoria-Geral da República (PGR).

A decisão do ministro é uma aula de direito.

Marco Aurélio salienta que o afastamento determinado em 18 de maio último colide com o que prevê a Constituição. O artigo 53 confere imunidade aos parlamentares por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. Seu artigo 2° estabelece que um congressista só pode ser preso pela prática de crime inafiançável e em flagrante, mesmo assim somente após autorização de seus pares – os demais parágrafos normatizam esta possibilidade. A suspensão de mandato sequer é prevista em lei como medida cautelar alternativa.

O afastamento de Aécio do mandato não condiz, portanto, com nenhuma das hipóteses previstas pelo texto constitucional. Nas palavras de Marco Aurélio, “os delitos, supostamente praticados, não se enquadram entre os inafiançáveis. (...) Logo, não fosse suficiente a inexistência de flagrante – o senador não foi surpreendido cometendo crime – não se teria como prendê-lo”.

Neste sentido, afirma o ministro na decisão, a suspensão do mandato imposta ao senador eleito por Minas Gerais seria “verdadeira cassação temporária branca”. Não precisa dizer muito mais que isso.

Desde o início, a defesa de Aécio vem tentando demonstrar que a acusação que lhe é feita é injusta. O contato que manteve com Joesley Batista – criminoso confesso que negociou com a PGR uma delação que lhe premiou com anistia total dos mais de 200 delitos que cometeu e assumiu – prestou-se à obtenção de um empréstimo, não envolveu contrapartidas em benesses públicas e tampouco recebimento de propina.

A decisão de hoje também afasta a acusação de tentativa de obstrução de Justiça, configurada numa suposta interferência de Aécio em nomeações no Ministério da Justiça e na Polícia Federal ou na suposta intenção de aprovar projeto de lei sobre caixa dois. O ministro do STF salienta, em linha com o que sempre sustentou a defesa do senador, que suas manifestações neste contexto nada mais são do que opiniões, palavras e votos inerentes à atividade parlamentar e protegidos pela imunidade constitucional.

A decisão do ministro do STF tem implicações que transcendem o caso específico do senador Aécio Neves. Ela significa que o veio sobre o qual repousa a nossa Justiça não pode ser o arbítrio, o abuso ou o mero exercício de vontades, ainda que sob o resguardo de instituições do Estado brasileiro. Acima de tudo estará, sempre, a Constituição.

Restituído ao mandato que lhe foi conferido por mais de 7,5 milhões de mineiros, o senador tucano, presidente licenciado do PSDB, terá melhores condições de provar-se inocente e de demonstrar que não deixou de honrar a confiança expressa pelos eleitores que, de maneira reiterada, o elegeram quatro vezes deputado federal, duas vezes governador de Minas, uma vez senador e ainda lhe destinaram 51 milhões de votos para presidente da República em 2014.

Não há palavras melhores para encerrar do que as do próprio ministro Marco Aurélio Mello na decisão proferida hoje: “Há de prevalecer a autocontenção judicial, virtude essencial sobretudo em tempos estranhos. É hora de serenidade, de temperança, de observância do racional, evitando-se atos extremos.”