quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Decolagem com turbulências

O governo do PT oficializou ontem a primeira privatização de um aeroporto no país. São Gonçalo do Amarante, no Rio Grande do Norte, representa um marco na superação da postura retrógrada que o partido de Dilma Rousseff adotou ao longo de anos. Mas os brasileiros ainda conviverão por algum tempo com aeroportos caóticos e inadequados.

O programa de concessão de aeroportos foi anunciado em abril pelo então ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci. Na época, divulgou-se que as primeiras concessões ocorreriam em julho passado. Pura ilusão, como se vê agora. São Gonçalo do Amarante só saiu do papel porque seu processo já se arrastava há anos.

“[O aeroporto] Começou a ser implantado em 1995, teve a edificação iniciada em 1997, mas até agora só tem pista de pouso. As vias de acesso são de barro, os prédios se limitam a alojamento do canteiro de obras, e as comunicações são precárias”, relata O Globo. O aeroporto potiguar receberá investimentos de R$ 650 milhões, dos quais 80% virão do BNDES.

Sabe-se agora que as demais concessões só decolarão mesmo no ano que vem. Os leilões dos aeroportos de Brasília, Guarulhos e Campinas, antes previstos para 22 de dezembro, só acontecerão entre fevereiro e março, informou a Folha de S.Paulo no domingo.

Se já não era crível que as melhorias chegariam a tempo da Copa de 2014, agora menos ainda. “A demora tornará a obra mais cara, pois será necessário pôr mais pessoas para trabalhar e pagar mais horas extras”, diz uma analista ouvida pelo jornal. Estima-se investimento de R$ 13,2 bilhões nos três terminais ao longo do período de concessão, que pode variar de 20 a 30 anos.

A concessão de outros terminais fundamentais para o transporte aéreo brasileiro – como Confins, na região metropolitana de Belo Horizonte, e Galeão, no Rio – segue indefinida. Também nestes casos, os leilões não têm data para acontecer.

Uma das principais dúvidas quanto ao sucesso do modelo de concessões que o governo Dilma resolveu adotar repousa na participação da Infraero nos consórcios. As regras fixadas reservam fatia de 49% do capital para a empresa, que acumula um histórico de ineficiências e mantém-se como um retrato da malversação de dinheiro público.

Relatório recente da Anac mostrou que, dos 66 aeroportos administrados pela Infraero, apenas sete foram lucrativos em 2010. Não surpreende que a perspectiva de caos aéreo no fim deste ano ainda seja uma atemorizante ameaça à espera dos usuários.

Entre Natal e Ano Novo, é esperado trânsito de 16 milhões de passageiros pelos aeroportos do país. O número representa aumento de 10% sobre 2010. “Os aeroportos não estão preparados para encarar o movimento recorde esperado no período”, avaliou o Correio Braziliense em sua edição de domingo.

A situação dos nossos aeroportos reforça a constatação da incapacidade do governo federal de levar a cabo os investimentos necessários para melhorar a infraestrutura no país. Estudo do economista Mansueto Almeida, do Ipea, mostra que são os investimentos e não o custeio que está pagando o pato do ajuste fiscal da gestão Dilma.

“De janeiro a outubro, houve queda forte do investimento nos ministérios das Cidades, do Turismo e da Integração Nacional, além de um recuo pequeno no dos Transportes. (...) O conjunto dessas seis pastas investiu R$ 25,3 bilhões, quase 9% a menos que em igual período de 2010. Os gastos de custeio aumentaram 27%, para R$ 42,310 bilhões”, informou o Valor Econômico ontem.

A resistência petista às privatizações já causou muitos males. Espera-se que a presidente Dilma Rousseff não retarde ainda mais a solução que se aguarda para os aeroportos do país. Que São Gonçalo do Amarante seja o início de um caminho sem volta ao tempo de ineficiência e desrespeito aos direitos dos usuários de transporte aéreo no Brasil.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Ministros e obras fantasmas

Ministérios deveriam existir para bem servir a população que paga os impostos que os sustentam. Na forma petista de governar, porém, as 38 pastas existentes e seus ocupantes-mor se prestam a tudo menos produzir bem-estar para o público. Para ficar apenas em dois exemplos, o que justifica a manutenção de gente como Carlos Lupi e Mário Negromonte na equipe ministerial?

Há um mês sob denúncias pesadas de corrupção e irregularidades, o ministro do Trabalho transformou-se num ectoplasma vagando pela Esplanada. Sua pasta está envolta em suspeita de favorecimentos, desvios de verbas públicas e irregularidades – muitas delas geradas pela disputa de facções sindicais pelo polpudo imposto sindical.

Mas Lupi não é apenas um fantasma retórico. Soube-se pela edição da Folha de S.Paulo de sábado que também foi, por seis anos, funcionário com carteira assinada da Câmara dos Deputados sem nunca dar expediente. E era muito bem remunerado: nesse período, ele embolsou R$ 864 mil, em valores de hoje.

O agora ministro esteve lotado na Liderança do PDT na Câmara. Lá, entre 2000 e 2006, recebia, como assessor técnico, o maior salário pago pela instituição: R$ 12 mil. Mas desenvolvia apenas atividades partidárias. Numa parte do tempo, 2004 a 2006, Lupi também acumulou a função de funcionário fantasma com a presidência do PDT.

“Os funcionários do partido em Brasília, que pediram para não ser identificados, confirmaram que Lupi não aparecia no gabinete da Câmara e se dedicava exclusivamente a tarefas partidárias”, informou o jornal.

Se o que estivesse em jogo fosse a lisura e o compromisso com a coisa pública, Dilma Rousseff já teria razões de sobra para tirar Lupi da sua equipe. Mas ela prefere alimentar uma guerrinha miúda com a imprensa – a quem acusa de estar tentando emparedar seu governo, que já perdeu cinco ministros por envolvimento em corrupção – a limpar a área.

A presidente também tem motivos de sobra para defenestrar outro integrante do seu time. Mário Negromonte faz tudo no Ministério das Cidades, principalmente mágicas em documentos oficiais. Só não faz o que se espera de sua pasta, ou seja, melhorar as condições de saneamento, mobilidade urbana, habitação etc do país.

Na semana passada, O Estado de S.Paulo mostrou que uma fraude num documento elevou em R$ 700 milhões os custos de uma obra de mobilidade urbana em Cuiabá. Trocou-se um corredor de ônibus orçado em R$ 489 milhões por um veículo leve sobre trilhos de R$ 1,2 bilhão. A mudança foi feita contrariando pareceres e a boa norma técnica.

O que aconteceu na obra mato-grossense é apenas uma amostra do que está ocorrendo em geral com os empreendimentos associados à realização da Copa de 2014. Estádios e intervenções urbanas em outras cinco capitais já ficaram pelo menos R$ 2 bilhões mais caras, mostra hoje o Estadão.

Além de Cuiabá, houve aumento de preço nas obras de mobilidade urbana em outras cinco cidades: Belo Horizonte, Manaus, Porto Alegre, Recife e Rio de Janeiro. Os aumentos variam de 20% a 164%. Elas têm lá também seu componente fantasmagórico: orça-se o que viu e paga-se (muito mais) pelo que não se vê.

O tamanho do descalabro com o dinheiro público aplicado com vias à Copa pode ser aferido em reportagem que o Valor Econômico publica hoje: “Arenas da Copa vão demorar até 198 anos para pagar custo”.

As arenas esportivas que estão sendo construídas para a Copa do Mundo nas 12 cidades-sede demorarão de 11 a 198 anos para se pagar, levando em conta o nível atual de rentabilidade dos estádios nos locais onde estão sendo erguidas. Também custarão mais que as estruturas construídas para as últimas duas edições da Copa, na Alemanha e na África do Sul.

“As 12 arenas, somadas, estão orçadas em R$ 6,71 bilhões. O gasto é 32% maior do que foi dispendido pela África do Sul na última edição do torneio, e 46% maior do que o gasto pela Alemanha em 2006. O montante, no entanto, pode aumentar. Estimativas do próprio governo apontam que os gastos devem chegar a R$ 7 bilhões”, informa o jornal.

Irregularidades, como aquelas em que Carlos Lupi está metido, ou excrescências como as que estão sendo descobertas no ministério de Mário Negromonte deveriam ser ceifadas de imediato. Mas combater o mal não parece ser prioridade para o governo Dilma, que prefere esperar uma “reforma ministerial” que, pelo jeito, só servirá para manter tudo como está.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Mercado de trabalho em ponto morto

Está encerrada a temporada de criação de postos de trabalho no país neste ano. Os levantamentos mais recentes indicam que a geração de novas vagas arrefeceu, e até antes da hora. A situação está longe de ser tão crítica quanto nos países convulsionados da Europa, mas deve inspirar atenção e cuidados.

Em outubro, a geração de empregos formais despencou no país, de acordo com o Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) do Ministério do Trabalho. Foram criados apenas 126 mil postos com carteira assinada, o que equivale a quase 40% menos do que no mesmo período do ano passado. Foi o pior resultado para o mês desde o fatídico ano de 2008 e tão ruim quanto no recessivo 2003.

Ontem saiu uma nova fornada de dados. O IBGE informou que a taxa de desemprego nas seis principais regiões metropolitanas do país foi a menor para meses de outubro desde o início da série histórica, em 2002. Isto é ótimo, mas uma análise mais cuidadosa dos resultados revela aspectos desagradáveis, a começar pela queda da renda média real do trabalhador.

Houve recuo de 0,3% sobre outubro de 2010 – a primeira nesta base de comparação desde janeiro do ano passado – e estabilidade em relação a setembro, quando o indicador recuara 1,8% sobre o mês anterior. Segundo as análises correntes, o comportamento dos rendimentos reforça a constatação de que o mercado de trabalho já sente na pele os efeitos da desaceleração da atividade econômica.

A perda de fôlego é generalizada, mas é mais marcante na indústria: nesta altura da temporada, o setor costumeiramente estaria em plena época de contratações. Neste ano, porém, não foi assim e as máquinas começaram a ser desaceleradas antes do previsto. Pelos números do IBGE, houve redução de 23 mil vagas industriais em outubro – mais abrangente, o Caged mostrara saldo positivo de apenas 5,2 mil no mês.

Em comércio e serviços, que respondem às condições gerais da economia com defasagem maior que a indústria, o mercado de trabalho também já começa a dar sinais de enfraquecimento. Tudo somado, evaporou a previsão do governo de gerar 3 milhões de novos empregos neste ano. O Ministério do Trabalho já se dá por satisfeito se atingir 2,4 milhões – o saldo atual está em 2,241 milhões, mas o último bimestre costuma não ajudar.

“Desde agosto, pelo menos, há um mergulho muito rápido, para o zero, do ritmo de aumento da ocupação, da renda média do trabalho e da massa salarial. O tombo ficou mais evidente em outubro”, comenta Vinicius Torres Freire hoje na Folha de S.Paulo.

Análises mais minuciosas revelam fragilidades várias no nosso mercado de trabalho. Vão desde a predominância da geração de empregos com baixíssimos salários à rotatividade recorde, passando pela precária situação que aflige os mais jovens, que convivem com taxas espanholas de desocupação.

Na prática, o país só tem gerado vagas cujos salários pagos não ultrapassam dois salários mínimos, como mostrou o Valor Econômico na sua edição de anteontem. Acima desta faixa, o que tem ocorrido é o fechamento de postos de trabalho. “As empresas estão demitindo pessoas que ocupam cargos com salários maiores e pagando menos na hora de contratar”, avalia o jornal.

Estabilidade no emprego é outro artigo raro no mercado de trabalho brasileiro. Segundo dados oficiais, divulgados pela Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, a rotatividade de mão de obra é mais alta no Brasil do que em qualquer outro lugar do mundo: 41% da força de trabalho muda de emprego a cada ano, índice que ultrapassa 50% nas faixas salariais mais baixas.

Também é muito alto o percentual de jovens que buscam seu primeiro emprego e não encontram. Na faixa etária de 15 a 17 anos, a taxa de desocupação média está em 22,9%, ou seja, praticamente um de cada quatro brasileiros com esta idade não encontra trabalho. Na comparação com outubro do ano passado, o desemprego entre os mais jovens cresceu em todas as capitais pesquisadas, exceto em Salvador e no Rio. Recife e Belo Horizonte exibem as piores marcas: 24,4% de desocupação entre os que têm entre 15 e 17 anos.

Já se sabe que a economia brasileira não cresceu nada no terceiro trimestre – algo que o IBGE deve oficializar no início do próximo mês. Com os ventos frios que sopram da Europa e dos EUA, a situação tende a ficar um pouco pior daqui para a frente. Para o Brasil, o mais importante na temporada bicuda que se prenuncia é lutar para preservar os empregos. O bolso é sempre onde as crises mais doem.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

O mapa da violência

O “Anuário Brasileiro de Segurança Pública”, divulgado ontem, revela um triste mapa da violência no país. O crime tem migrado com cada vez mais intensidade para os estados do Nordeste e os jovens continuam a ser suas vítimas preferenciais. As ações do governo federal no combate à criminalidade seguem demoradas, insuficientes e imprecisas.

Segundo o levantamento, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública com base em dados repassados pelos estados ao Ministério da Justiça, 40.974 pessoas foram assassinadas no país no ano passado. São 2,1% menos do que em 2009.

É possível que a situação brasileira seja um pouco pior do que a apresentada pelo “Anuário”. Alguns estados subnotificaram as ocorrências – a ponto de a Folha de S.Paulo afirmar que os dados são “precários”. O mais provável é que a média nacional de homicídios tenha se estabilizado de um ano para outro.

O que é fora de dúvida é que, nas atuais condições, o Brasil continua a aparecer na lista dos países com as piores taxas de homicídios no mundo. Aqui registra-se uma média de 21,9 assassinatos por grupo de 100 mil habitantes, o que nos coloca entre os seis primeiros do ranking mundial da violência.

Para a ONU, taxas acima de 10 homicídios por grupo de 100 mil habitantes configuram um quadro de violência epidêmica. Não só a média nacional está acima deste patamar, como em 24 unidades da federação também.

Entre 2009 e 2010, o número de mortes subiu em 13 estados brasileiros. Dos dez com as mais altas taxas de homicídio hoje, seis estão no Nordeste: Alagoas (68,2 por 100 mil habitantes), Paraíba (38,2), Pernambuco (36,4), Sergipe (33,8), Bahia (31,7) e Ceará (31,2).

O crime tem migrado com cada vez mais intensidade para a região nordestina no rastro do aumento do tráfico de drogas, notadamente o crack, mais barato e acessível. Nesta triste dinâmica, os jovens surgem sempre como as principais vítimas.

O combate ao crime tem sido ineficaz no país. Gasta-se mal os recursos públicos empregados em segurança. Foram 1,36% do PIB em 2009, mais do que, por exemplo, Alemanha e Espanha, que investiram, respectivamente, 1,2% e 1,3% dos seus PIB, mas, em contrapartida, exibem taxas de 0,8 e 0,7 homicídios por grupo de 100 mil habitantes, como destacou O Globo.

A tônica do governo federal tem sido anunciar planos mirabolantes de enfrentamento ao crime que nunca saem do papel. Ontem, foi a vez de mais um, destinado a reduzir o déficit prisional no país, estimado em 212 mil vagas. Fala-se agora em investir R$ 1,1 bilhão para criar 42,5 mil vagas até 2013 por meio da construção de novas unidades e da ampliação das atuais prisões.

O aumento do encarceramento é apontado como uma das mais eficientes ações para combater a criminalidade. Mas trata-se de política timidamente posta em prática pela gestão petista, que resiste a esta profilaxia.

Um programa lançado pelo governo Lula com os mesmos propósitos agora anunciados pelo Ministério da Justiça não saiu do lugar. Metade das vagas em presídios que se pretende abrir até o fim de 2013 já deveria ter sido criada no ano passado, em parceria com os estados. Mais: a gestão passada previu 146 construções entre 2004 e 2010, mas apenas 27 foram finalizadas e 68 delas sequer começaram até agora.

“A execução do programa alcançou apenas 5% da meta de 2010, beneficiando apenas 1.245 de uma previsão de atendimento de 24.750 detentos. As 13 reformas em estabelecimentos estaduais também prometidas no governo Lula não saíram do papel, da mesma forma que nenhuma das 3.800 vagas para o aprisionamento especializado de jovens foi criada”, revela O Globo, com base numa auditoria da Controladoria Geral da União.

Outra deficiência no combate ao crime está na vigilância dos nossos 16,8 mil quilômetros de fronteiras secas, obrigação precípua do governo federal. Ontem, O Estado de S.Paulo mostrou que o plano estratégico para as áreas de fronteira, lançado em junho, ainda não passou das palavras à realidade. Quase nada dos R$ 200 milhões iniciais foi gasto.

“O plano prevê a instalação de 14 Veículos Aéreos Não Tripuláveis (Vant) até 2014 e ampliação de 21 para 49 no número de postos de fronteira. Quase nada foi desembolsado e nenhum posto novo começou a ser construído. Com três meses de atraso, só um Vant entrou em operação neste mês”, sintetiza o jornal. Para completar, a vigilância da Amazônia só contará com 10% dos recursos inicialmente prometidos.

A violência vem despontando como uma das principais preocupações dos brasileiros nos últimos anos. Há um evidente clamor para que o aparato estatal aja o quanto antes para evitar a piora do quadro. Até agora, apenas iniciativas isoladas, como a bem sucedida estratégia do governo de São Paulo, foram tomadas.

Do governo federal, quase nada se viu. Já não dá mais para ficar simplesmente anunciando planos recheados de boas intenções e medidas inexistentes. A (in)segurança pública justifica uma ação firme e decidida do poder central. Já passa da hora de não ficar mais apenas em promessas vãs.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

PAC do pó de arroz

O governo teve que usar muito pó de arroz para maquiar o balanço do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) divulgado ontem. Nem com todo o esforço, porém, deu para disfarçar o ritmo cadente de execução das obras neste ano, os atrasos expressivos em empreendimentos importantes e o impacto que a corrupção teve no andamento dos trabalhos.

Segundo o balanço divulgado pelo governo, 11,3% das obras e ações previstas para a segunda fase do PAC foram concluídas. À primeira vista, parece até razoável. Mas, quando se conhecem os detalhes de como o resultado oficial foi obtido, fica claro que o desempenho real está muito aquém do desejável: apenas 3% das obras foram finalizadas até 30 de setembro.

O governo diz ter executado R$ 80,2 bilhões do chamado PAC 2. Mas, disso, R$ 55,2 bilhões referem-se a financiamentos habitacionais para pessoas físicas. Ou seja, praticamente 70% do total que a gestão petista diz ter “investido” nada mais é do que empréstimos dados a mutuários que, ao longo de anos, terão de pagar o que agora receberam. Pior: parte do valor destina-se à compra de imóveis usados, com impacto nulo na expansão da economia.

Continuemos. Outros R$ 41,4 bilhões foram aplicados pelas estatais, principalmente Petrobras, e R$ 25,6 bilhões pelo setor privado. O governo propriamente dito só comparece com uma parcela ínfima dos valores informados: do Orçamento Geral da União saíram, segundo o Ministério do Planejamento, R$ 13,2 bilhões, ou 16% do total.

Quando se desce a detalhes, a cara do PAC fica ainda mais feia. Só 1% das obras de transporte foram concluídas, ressalta O Globo. Isso equivale a R$ 1,6 bilhão aplicados em rodovias, portos e aeroportos neste ano. Para um país que, segundo o Ipea, precisa de R$ 183 bilhões apenas para recuperar suas estradas existentes e construir novos trechos, estamos bem...

Uma das razões para que o andamento das obras de transportes fosse ainda pior do que a média geral atende pelo nome de corrupção. O próprio ministro dos Transportes admitiu ontem que as mudanças que teve que fazer na pasta em razão dos escândalos que resultaram na saída de Alfredo Nascimento afetaram o desempenho.

O volume investido no setor caiu 20% em comparação com 2010. Das 42 licitações do Dnit que estavam em andamento na época da troca de comando na pasta dos Transportes, 14 foram revogadas e 27 suspensas. Ou seja, estava tudo carcomido pelos cupins da corrupção da gestão petista.

De maneira geral, o governo classifica 14% dos projetos do PAC como tendo andamento “fora do adequado” e outros 4% como “preocupantes”. Mas a classificação está longe de ser precisa: de acordo com a conveniência, os cronogramas vão sendo acochambrados para diluir atrasos. Mesmo sem cumprir prazos, alguns empreendimentos receberam a indicação de andamento “adequado” – que caiu de 76% para 72% desde o balanço anterior, realizado em julho, segundo o Valor Econômico.

Tome-se, como exemplo eloquente das maquiagens, o que está acontecendo na refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco: anunciada em 2005, pelo cronograma inicial ela ficaria pronta no ano passado, a um custo de US$ 2 bilhões. Com obras iniciadas em 2007, será concluída, se for, apenas em 2016, a um custo superior a US$ 14 bilhões.

“O novo balanço do PAC 2 traz duas datas para a refinaria, uma de operação, em 30 de junho de 2013, e outra de conclusão, de 30 de junho de 2016. Nos relatórios anteriores, havia apenas uma única data, de conclusão, que já teve os anos de 2010, 2011, 2012 e 2013”, registra o Jornal do Commercio, de Recife.

Os números edulcorados do PAC não conseguem disfarçar a situação desfavorável que emerge da realidade das obras. Em Minas Gerais, por exemplo, apenas um grande empreendimento foi concluído: a duplicação de um trecho de 83 km da BR-262. Mesmo assim, as obras começaram na primeira fase do PAC e já deveriam ter terminado há tempo, registra o Estado de Minas.

Nem o próprio governo concorda com a suposta importância do PAC para a vitalidade da economia brasileira. Ontem, enquanto a ministra do Planejamento tecia loas ao programa, o secretário-executivo da Fazenda, Nelson Barbosa, afirmava, segundo a Folha de S.Paulo: “A manutenção do investimento do PAC no mesmo nível do ano passado significa que o PAC neste ano não contribuiu para acelerar o crescimento”.

Já é certo que, também em termos de proporção do PIB, o  desempenho será declinante neste ano, caindo de 3,1% para 2,7%. É de se perguntar: para que tem servido, então, o PAC, senão como peça de marketing? O governo poderia ao menos nos poupar da pantomima que protagoniza a cada seis meses a título de “balanço” do programa.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Lorotas do PAC

O governo promete divulgar hoje mais um balanço sobre o andamento das obras e ações do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Terá que torturar muito os números para extrair deles um resultado menos desfavorável do programa. Quase cinco anos depois de lançado, o PAC continua sendo um amontoado de boas intenções. Nada além disso.

Engana-se quem é levado a imaginar que o governo Dilma Rousseff investe a plenos pulmões, como apregoa o marketing oficial. Os dispêndios realizados neste ano não estão conseguindo sequer repetir os do ano passado e, mesmo assim, a maior parte dos desembolsos refere-se aos chamados “restos a pagar”, ou seja, são contas herdadas da gestão anterior que ora estão sendo quitadas.

Segundo O Estado de S.Paulo, dos R$ 21,7 bilhões inscritos como ações do PAC pagas neste ano, R$ 16,1 bilhões, ou praticamente 75% do total, se referem a restos a pagar. Dos R$ 40,4 bilhões previstos no Orçamento do PAC para 2011, somente R$ 5,6 bilhões foram efetivamente aplicados em obras. “Em resumo, até agora, o atual governo só conseguiu executar 13,9% do que foi programado para 2011”, comentou o jornal em editorial, no domingo.

Para piorar, o Orçamento deste ano tem R$ 17,9 bilhões, ou 44% do total, parados na estaca zero. Isso significa que não cumpriram sequer a primeira etapa do gasto público, que é o empenho. São recursos que poderiam estar fazendo a diferença em termos de melhoria da qualidade de vida da população, mas estão esterilizados no caixa do Tesouro.

A observação isolada da execução de alguns programas dá melhor dimensão da paralisia. Para ficar no exemplo mais significativo, o “Minha Casa, Minha Vida” executou até agora apenas 0,05% do valor orçado para o ano. Ou seja, para começar a construir as 2 milhões de moradias prometidas na campanha eleitoral, a presidente Dilma só investiu R$ 6,5 milhões neste ano, que não dão nem para 100 casinhas...

Na realidade, os gastos com o PAC estão encolhendo em 2011, mostrou a Folha de S.Paulo na semana passada. Os desembolsos com obras do programa entre janeiro e outubro foram 14% menores do que no mesmo período do ano passado. “Este é o primeiro ano em que os gastos diminuem desde o lançamento do programa, em 2007.”

“Projetos de grande visibilidade considerados prioritários pelo governo, como a ferrovia Norte-Sul, a transposição do rio São Francisco e a urbanização de favelas no Rio tiveram menos dinheiro”, segundo o jornal.

Num balanço mais amplo, feito em fins de outubro, O Estado de S.Paulo também mostrara que apenas um terço das obras do PAC previstas para o período 2007-2010 foram concluídas até agora e 20% da lista de mais de R$ 600 bilhões de empreendimentos listados ainda não saiu do papel.

“Algumas obras ainda nem conseguiram superar a fase de contratação de projeto básico ou de processo licitatório. Há ainda aquelas que já foram iniciadas, mas estão paralisadas por algum tipo de entrave, como contrato suspenso, questão ambiental e dificuldade de desapropriação de áreas”, informou o Estadão.

Vale lembrar que, no início do mês, o Tribunal de Contas da União recomendou a paralisação de 18 obras do PAC envoltas em suspeitas de irregularidades, entre elas a refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, e a ferrovia Norte-Sul, em Tocantins. Ambas são reincidentes. Dentre os empreendimentos do PAC, foram avaliadas 161 obras. A maior parte delas tinha irregularidades consideradas graves, segundo a Folha de S.Paulo.

Para driblar esta feia fotografia, os resultados do PAC a serem divulgados hoje devem conter as mandracarias de sempre. O governo costuma manipular as planilhas de acompanhamento das obras: quando algo não vai bem, acaba sendo excluído da lista, escondido debaixo do tapete. Para confundir ainda mais, foram criados dois PAC, mas na prática o que se denomina PAC 2 inclui boa parte do PAC 1 não encerrada na gestão Lula.

A triste realidade é que o Brasil ocupa a rabeira dos rankings mundiais que medem o investimento público. Em 2009, por exemplo, segundo estudo do economista José Roberto Afonso, o país ficou em 123º lugar na lista, superando apenas Croácia, República Dominicana, Uzbequistão, Líbano e Ucrânia.

Não há perspectiva de que tal cenário mude com o PAC. Até agora, o programa lançado com estardalhaço por Lula, e que serviu de esteio para a eleição de Dilma Rousseff, não mostrou a que veio, exceto ter funcionado como eficiente peça de marketing e propaganda do PT para enganar brasileiros incautos.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Ilusões e a dura realidade do pré-sal

Há 14 dias vaza, ininterruptamente, óleo de um poço perfurado no Campo do Frade, na faixa oceânica do litoral fluminense. O acidente ambiental, causado pela petrolífera americana Chevron, e seus desdobramentos posteriores mostram quão despreparado o país está para enfrentar os desafios que advirão com a exploração do pré-sal.

Passadas duas semanas, nenhuma autoridade brasileira é capaz de afirmar ao certo quanto petróleo já vazou no mar. A petroleira tentou reduzir o ocorrido a uma gota no oceano. Um organismo de observações por satélite disse que o derramamento poderia ser pelo menos dez vezes maior do que o sabido até agora. Órgãos do governo brasileiro não fazem a menor ideia do tamanho do estrago.

A Chevron estima um volume total de 882 barris (ou 14 caminhões-pipa) de petróleo derramados. Já a ONG americana SkyTruth avalia o vazamento em 15 mil barris ou quase 238 caminhões-pipa. A Agência Nacional de Petróleo presumiu algo entre 1.400 a 2.310 barris. Se os cálculos da ONG, uma das primeiras a precisar a dimensão do acidente ocorrido em 2010 no Golfo do México, estiverem certos, este é o pior incidente do gênero já registrado no Brasil.

Independentemente da extensão da tragédia, é bastante insatisfatório o sistema nacional de prevenção, controle e fiscalização da poluição causada por lançamento de óleo e outras substâncias nocivas ou perigosas em águas sob jurisdição brasileira. O arcabouço em vigor data de 2000 e já deveria ter sido atualizado, à luz de desastres recentes no mundo e, principalmente, em razão do início da exploração em águas superprofundas do pré-sal.

Mas, como é tônica no governo do PT, grupos de discussão criados para estabelecer novas regras não saíram do lugar. O país não conta com um plano nacional de contingência abrangente. No início da gestão Lula, ele começou a ser elaborado, mas não foi adiante. No ano passado, após a tragédia ambiental do Golfo do México, causada pela British Petroleum, as discussões foram retomadas. Mas até hoje nada saiu do papel.

Se o acidente com a Chevron for maior do que se tem notícia até agora – o que, felizmente, parece não ser o caso – ninguém saberia como proceder para estancá-lo. Os planos existentes no país do pré-sal são de âmbito individual, ou seja, cada empresa cuida da área que explora.

“Para acidentes de proporções superiores à capacidade de resposta de determinada petroleira, não se conhece a cadeia de responsabilidades de estados, municípios, Marinha, ANP e órgãos ambientais”, ressalta o Valor Econômico. Para complicar, a proposta discutida pelo governo envolve uma quantidade indesejável de ministérios.

Outra evidência gritante da fragilidade do arcabouço legal existente para lidar com o problema no país é o valor da multa máxima que poderá ser aplicada à Chevron, de R$ 50 milhões. Para se ter ideia, 11 anos atrás a Petrobras foi multada no mesmo montante, em decorrência de um vazamento na refinaria de Duque de Caxias. Apenas a atualização do valor pela inflação já implicaria numa penalidade de R$ 116 milhões.

No país que sonha com o pré-sal, a perspectiva de aumento dos incidentes ambientais é uma ameaça tristemente concreta. Segundo o Ibama, acidentes em plataformas de petróleo no país triplicaram desde 2008. Mais de 20 deles são notificados por ano ao órgão. Pouca gente fica sabendo disso.

A distância entre o sonho do pré-sal, apregoado pelo ostensivo marketing petista, e a dura realidade também se mede pelas dificuldades que o país terá para explorar suas riquezas. A Petrobras – que, por lei, está obrigada a participar de toda e qualquer empreitada nas águas superprofundas – não tem tido fôlego sequer para levar adiante seus atuais investimentos, que já caíram 30% no trimestre passado e ficarão aquém do estimado para o exercício.

O incidente no Campo do Frade apenas reforça que, para alcançar o futuro venturoso que o país almeja, não bastam meras palavras ao vento. É preciso preparar-se, buscar as melhores soluções e trabalhar sério. A exploração das riquezas do pré-sal foi tratada até agora, seja pelo governo Lula, seja pelo de Dilma Rousseff, como uma dádiva dos céus. A realidade, porém, tem se mostrado bem mais amarga e viscosa como óleo.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Desmemoriados e desonestos

O Palácio do Planalto tornou-se ontem, mais que nunca, sócio cotista dos escândalos protagonizados por Carlos Lupi. Se Dilma Rousseff ficou satisfeita com o desempenho do ministro do Trabalho em seu depoimento no Senado e está mesmo disposta a mantê-lo no cargo, é porque aceita de bom grado que mentir e beneficiar-se do dinheiro público são parte do jogo de poder.

Ontem, perante os senadores, Lupi se contradisse com o que afirmara na semana passada, quando negara que conhecesse um empresário beneficiado por repasses do seu ministério e que usara uma aeronave providenciada por ele. Agora, já se sabe que o ministro conhece tanto Adair Meira, dono da ONG Pró-Cerrado, que até foi recebido em jantar na casa dele, em Goiânia, relata O Globo.

O pedetista justificou suas contradições dizendo que não tem “memória absoluta” e que, portanto, vive esquecendo as coisas. Pelo que os jornais divulgam hoje, o gabinete presidencial ficou contente com as explicações do ministro, por ele ter sido “comedido” e ter evitado “enfrentamentos”. O Planalto parece não se importar com as mutretas do desmemoriado.

Vejamos aonde chegamos: a torrente de escândalos é tão vasta que a mise-en-scène de um ministro passou a ser mais importante que seus atributos, suas qualidades, seu compromisso com o bem público. No modo petista de vida, pode-se roubar, locupletar-se, mentir. Desde que se saia bonitinho na foto.

Não bastassem os malfeitos já conhecidos de Carlos Lupi, ontem, durante o depoimento dele no Senado, mais um veio à tona: o ministro recebeu diárias pagas pelo Tesouro pela participação em eventos partidários do PDT no Maranhão. Foi na mesma ocasião em que voou nas asas do King Air providenciado pelo empresário Meira.

Em dezembro de 2009, o ministro passou três dias no estado. No terceiro, um domingo, 13, não teve compromissos oficiais, mas sim um encontro partidário com pedetistas na cidade de Timon. Mesmo assim, embolsou uma diária. No total, foram pagos R$ 1.736,90 por todo o período da estadia no Maranhão, de acordo com dados do Siafi.

Fuçando um pouco mais, deve ser possível encontrar mais dinheiro do contribuinte brasileiro que tenha ido parar indevidamente nos bolsos do ministro do Trabalho. Segundo a Folha de S.Paulo, neste ano Lupi já recebeu R$ 33.422,55 em diárias. É comum ele passar os fins de semana no Rio, enfurnado em eventos partidários.

Embora a Comissão de Ética Pública da Presidência da República recomende que ministros divulguem seus compromissos oficiais nas páginas dos ministérios na internet, a agenda de Lupi disponível na web não permite verificar quais obrigações ele cumpriu nas datas em que recebeu as diárias.

Mas o uso indevido de recursos públicos por Lupi não para aí. Vai muito mais além. O Correio Braziliense revela hoje que o ministro tinha um motorista empregado pela Superintendência Regional do Trabalho (SRT) do Rio à sua disposição quando estava no estado.

Motorista particular de Lupi há 10 anos, Felipe Augusto Garcia Pereira foi nomeado pelo ministro para um cargo comissionado de assessor técnico no órgão. Ganhava R$ 13,6 mil mensais para servir o presidente licenciado do PDT.

“Apesar de nomeado para a SRT, Felipe estava lotado no gabinete de Lupi no Rio de Janeiro, no 14º andar do prédio da superintendência regional. Ele continuou desempenhando o papel de motorista particular do ministro, à disposição de Lupi no Rio de Janeiro”, informa o jornal.

“Estava sempre com o ministro quando ele ia ao Rio de Janeiro, dirigindo para ele. Trabalho há muitos anos com Lupi”, admitiu o motorista ao Correio. O superintendente regional do Trabalho no Rio, Antônio Henrique Albuquerque, também confirmou que Pereira ficava à disposição de Lupi quando o ministro estava no Rio.

Carlos Lupi é um ministro cujo dia de amanhã no cargo é sempre incerto. No depoimento de ontem, dois dos três senadores do PDT pediram a sua saída; nenhum governista de peso compareceu à sala da Comissão de Assuntos Sociais do Senado.

Nada disso, porém, parece abalar a convicção da presidente da República, que estaria disposta a conceder ao ministro “sobrevida de tempo indeterminado” no cargo, segundo O Estado de S.Paulo. Com a postura que assumiu no atual escândalo, Dilma Rousseff não deixa dúvidas quanto a que lado defende. Sua sociedade com o “malfeito” foi definitivamente selada.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Esperando o quê?

Deve desenrolar-se hoje o ato final da extensa permanência de Carlos Lupi à frente do Ministério do Trabalho. Diante da ficha corrida exibida por ele ao longo deste período, é de se perguntar por que sua provável queda demorou tanto. O que Dilma Rousseff ainda espera para demiti-lo?

Lupi já teve todas as chances de provar que as denúncias contra ele são infundadas. Em todas as vezes que tentou, foi desmentido pelos fatos. Em todas as ocasiões, só enrolou-se mais e só deu novos e maiores motivos para ser defenestrado.

A presidente ainda quer, porém, dar-lhe nova oportunidade de explicar-se. A ocasião será o novo depoimento que ele dará hoje ao Congresso, desta vez no Senado. Pelo visto, só ela não está convencida de que Lupi tem de ir embora; até o partido dele, o PDT, já lavou as mãos e passou a defender a saída do ministro.

Antes de sair, Carlos Lupi tem muito a explicar: 1) seus assessores cobravam mesmo propina de até 15% de ONG beneficiadas pela pasta?; 2) por que os convênios firmados pelo Trabalho, principalmente com correligionários, não são fiscalizados, como cobrou o TCU? 3) as representações do ministério nos estados são mesmo distribuídas entre pedetistas amigos?; 4) por que a assinatura do ministro foi parar na documentação que referendou a criação de sindicatos-fantasmas que não representam coisa alguma?

Se terá muita dificuldade para dar respostas a qualquer uma das perguntas acima, mais ainda em relação aos suspeitíssimos voos em jatinhos feitos ao lado de pessoas beneficiadas por milionários repasses do ministério.

Na semana passada, em depoimento na Câmara, Lupi disse que não voou e sequer conhecia o empresário Adair Meira, da ONG Pró-Cerrado. Foi cabalmente desmentido pelos fatos: tanto o conhecia que aparece em fotos e vídeos ao lado dele, desembarcando da aeronave prefixo PT-ONJ.

Hoje, O Globo traz mais um indício de que a viagem feita por Lupi e o empresário– que providenciou o avião King Air usado nos deslocamentos – em dezembro de 2009 no Maranhão pode ter resultado em benefícios diretos para o bolso de Meira.

Apenas duas semanas depois da viagem, o Ministério do Trabalho assinou quatro convênios com a Pró-Cerrado prevendo a liberação de R$ 5,1 milhões. Destes, R$ 2,3 milhões já foram liberados até hoje. “Em nota divulgada no último sábado, a assessoria de Lupi sustentou que o ministro não usou avião providenciado por Meira e afirmou que, na época, o empresário não tinha negócios com a pasta”, salienta o jornal.

Lupi esteve ontem com a presidente da República para “explicar-se” de tudo isso. O esdrúxulo do episódio é que o ex-presidente Lula teria participado, por telefone em viva-voz, das conversas. Lula teria pedido que o ministro “resistisse e enfrentasse as denúncias da mídia”, segundo O Globo.

O ministro saiu da reunião prometendo ir atrás de notas fiscais que comprovariam que o jatinho usado na companhia do empresário foi pago pelo PDT. Mas a seção estadual do partido no Maranhão já disse que do seu caixa o dinheiro não saiu. De onde terá vindo, então?

Por todas estas contradições e as falcatruas em que aparece metido, o ministro do Trabalho caminha para ser o sétimo ministro trocado por Dilma em menos de 11 meses de governo. A se considerar a data da primeira queda, a de Antonio Palocci, em 7 de junho, foram até agora seis substituições num período de cinco meses – uma média de uma a cada 24 dias.

Em todos os casos, sem exceção, Dilma jamais agiu de moto próprio. Veio sempre a reboque da imprensa, a cujas revelações sempre resistiu e tentou, num primeiro momento, desacreditar. Os fatos, porém, sempre se sobrepuseram.

“Na remoção de membros de sua equipe afogados em escândalos, porém, [Dilma] só parece agir quando percebe, na vigésima quinta hora, que a inação ameaça se transformar em desmoralização”, comenta O Estado de S.Paulo em editorial.

“O que está à prova é sua [de Dilma] decantada excelência administrativa. Se as denúncias são conhecidas e antigas, se o Ministério do Trabalho estava sendo monitorado pelo Palácio do Planalto desde o início do governo, por que deixar a situação se deteriorar até o limite de crise?”, pondera o Valor Econômico.

Exceto Pedro Novais, os ministros demitidos até agora foram todos herdados de Lula. Isso não exime a atual presidente das responsabilidades por tê-los mantido nos cargos que ocupavam desde a gestão passada. Mais que isso, como gerentona do governo do ex-presidente, Dilma sabia, ou deveria saber, que esta montanha de mutretas se avolumava. É o governo dela, e não o de Lula, que está em processo de demolição.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Nas asas do King Air

A situação de Carlos Lupi no Ministério do Trabalho tornou-se insustentável. O ministro falastrão tropeçou em mentiras em série, em bravatas excessivas e na constatação de que, sob seu comando, a pasta tornou-se mais um balcão de fornidos negócios escusos de todos os tipos. A permanência dele no cargo viaja nas asas de um King Air em queda livre.

A trajetória de falcatruas e mutretas de Lupi no Trabalho repete o mesmo padrão que marcou as denúncias de corrupção nos ministérios da Agricultura, do Turismo, dos Transportes e do Esporte. É, pois, sintoma de um fenômeno mais amplo e mais agudo: o uso, pelo petismo, de recursos públicos para fins particulares e partidários. Em suma, surrupio de dinheiro do contribuinte.

O ministro e o Planalto certamente contavam com a hipótese de que um feriadão de quatro dias colaboraria para esfriar o noticiário e amainar a torrente de denúncias contra Lupi. Não foi nada disso o que aconteceu nos últimos dias. Choveram novas revelações desabonadoras sobre o pedetista.

“A sobrevida dada a Lupi até a reforma ministerial em janeiro já não existe. Avaliação feita ontem por integrantes do núcleo do governo foi a de que Lupi deve uma explicação pública convincente. E, se isso não ocorrer, o Planalto espera que o PDT conduza o processo de substituição de Lupi o mais rápido possível”, resume O Globo.

Lupi foi pego na mentira quando a revista Veja revelou que ele usou um jatinho King Air de um empresário cuja ONG foi fartamente aquinhoada pelo Ministério do Trabalho nos últimos anos. Na semana passada, quando esteve no Congresso, ele fora questionado sobre seus laços com Adair Meira. Negou-os, mas a realidade o desmentiu agora.

Ontem, vieram a público fotos e vídeos em que Lupi aparece embarcando na aeronave prefixo PT-ONJ ao lado do empresário-amigo, que devolvia na forma de favores o tratamento e as verbas generosas (R$ 13,9 milhões para “qualificação profissional” nos últimos quatro anos) que sua ONG, a Pró-Cerrado, recebera da equipe do Ministério do Trabalho.

A revelação da mentira apenas coroa uma lista de malfeitos que vieram à tona nos últimos dias. Ontem, a Folha de S.Paulo revelara que sindicatos-fantasmas foram criados a rodo com o aval da assinatura de Carlos Lupi. Trata-se de entidades que “representam” setores de indústrias que não existem e que só se destinam a abocanhar um naco do imposto sindical.

Superintendências regionais do Ministério do Trabalho também se transformaram em sinecuras distribuídas entre partidários do PDT de Lupi, mostrou O Globo no domingo. E ex-funcionários da pasta, com conhecimento do próprio ministro, negociam a liberação de registros sindicais dentro do ministério, revelou O Estado de S.Paulo na segunda-feira: “Quem paga o pedágio do lobby tem a promessa de ser atendido rapidamente. Desde 2007, quando Lupi assumiu o Trabalho, 1.120 entidades conseguiram registros”.

Há um padrão que se reproduz em todos estes episódios. O petismo instrumentaliza entidades à margem do Estado para servirem de apoio a seu exercício de poder. Elas funcionam como dutos que irrigam contas de aliados, pagam apoio político e financiam campanhas eleitorais. O dinheiro que as financia sai do bolso do contribuinte.

Uma das fontes mais vistosas destas maracutaias é o imposto sindical. Criado por Lula em 2008, é cobrado de todos os trabalhadores com carteira assinada e do setor patronal. A cobrança ocorre uma vez por ano e, no caso dos trabalhadores, corresponde a um dia de salário, descontado diretamente em folha. No caso dos patrões, o valor é uma parcela do capital social da empresa.

O bolo do imposto sindical dobrou em quatro anos, ao mesmo tempo em que proliferaram novos sindicatos no país – foram mais 782 desde 2008. No ano passado, a arrecadação do imposto totalizou R$ 1,51 bilhão, e pode chegar a R$ 2 bilhões até dezembro.

Do total arrecadado, os sindicatos têm direito a 60%; as federações, a 15%; as confederações, a 5%; as centrais sindicais, a 10%; e o governo, a 10%. Tudo isso sem qualquer controle externo: a fiscalização do Tribunal de Contas da União sobre tais repasses foi aprovada em lei, mas foi vetada por Lula.

O ex-presidente sabia o que estava fazendo: a rede de interesses irrigada com recursos do Estado, tendo no imposto sindical apenas um de seus exemplos mais polpudos, foi estruturada para dar apoio ao projeto de perpetuação de poder do PT. A sobrevida, até aqui, do ministro do Trabalho no cargo tem tudo a ver com a preservação deste jogo.

Carlos Lupi é mais um elo desta cadeia – e dos mais resistentes, por ter um partido, o PDT, quase inteiramente sob seu comando férreo. Mas caminha para ser o próximo a se romper, assim como os cinco ministros do governo Dilma Rousseff envolvidos em suspeitas de corrupção que já caíram desde junho. Certamente ele não será o último tripulante deste voo cego.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Amores bandidos

Virou dramalhão a saga de corrupção que se desenrola no governo Dilma Rousseff. Em seu capítulo mais recente, desenrolado no Ministério do Trabalho, tem como protagonistas um ministro com pinta de canastrão e uma presidente com pose de superstar. Ao distinto público, o que ambos oferecem é o escárnio.

Carlos Lupi foi ontem ao Congresso se defender das acusações de corrupção que assolam sua pasta. Adotou um estilo algo fanfarrão para esgrimir-se das críticas que lhe foram desferidas. Mas coroou sua atuação diante dos parlamentares com um “te amo” endereçado à presidente da República.

“Presidente Dilma, desculpa se fui agressivo. Te amo. Só pede desculpa quem é humano e sabe que pode errar”, disse Lupi, teatralmente, dois dias depois de ter declarado a plenos pulmões que só deixaria o cargo de ministro do Trabalho se fosse “abatido à bala”.

A resposta de Dilma veio no mesmo tom galhofeiro. “Sabe como é que é? Tinha, se eu não me engano, um líder gaúcho, que não vou dizer qual, antigo, que dizia o seguinte: o passado simplesmente passou. Gente, o passado passou. Não tem crise com o ministro do Trabalho”, afirmou ela, segundo O Globo. Em que novela de TV esta gente está?

Se havia dúvidas de que a faxina que a presidente por vezes disse ensaiar nunca passou de mentirinha, agora fica claro que o que interessa a Dilma é passar uma bucha no que para ela é “passado”. Para a sociedade brasileira, porém, a roubalheira praticada e avalizada pelo governo petista continua sendo muito presente. Mais que presente, é caso de polícia.

A Folha de S.Paulo mostra hoje que Lupi liberou verbas para a organização não governamental (ONG) de um pedetista mesmo depois de a entidade já ser alvo de inquérito da Polícia Federal por suspeitas de irregularidades em convênio com o Ministério do Trabalho. Os valores envolvidos chegam a R$ 6,9 milhões.

O Globo retrata caso parecido ocorrido em Confins, na região metropolitana de Belo Horizonte. Em dezembro passado, o Ministério do Trabalho assinou convênio de R$ 1,9 milhão com uma Oscip (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) investigada pela PF, denunciada pelo Ministério Público e suspeita de desviar recursos públicos.

O objetivo do curso patrocinado pelo ministério de Lupi em Minas era treinar 2,4 mil operadores de telemarketing, mas até ontem, faltando um mês para o término do prazo do convênio, só 200 pessoas tinham sido capacitadas.

Ontem, O Estado de S.Paulo havia divulgado caso parecido: o da ONG Oxigênio, de um amigo do ex-presidente Lula, que recebeu R$ 24 milhões para projetos de qualificação profissional. Sob investigação desde 2006, sob suspeita de não entregar o que promete, só na semana passada a entidade foi repreendida pelo ministério de Lupi.

O que, então, é passado, como diz a presidente Dilma, nesta saga de corrupção? “A onda que assola o País não é essa [de denuncismo], é a da corrupção. As denúncias são apenas consequência. E a demissão de cinco ministros de estado por elas atingidos revela que todas têm tido fundamento”, opina o Estadão em editorial.

Nos sinais que emite, o governo federal demonstra horror à luz desinfetante do sol. Como, por exemplo, quando vetou, anteontem, o acesso da imprensa a um seminário destinado a discutir o novo “marco regulatório das organizações da sociedade civil”, ou seja, ONG e assemelhados, várias das quais no foco das denúncias de corrupção.

Ou quando o ministério de Lupi desvirtua o trabalho de apuração da imprensa ao divulgar, antes da publicação pelos próprios meios, perguntas e respostas endereçadas por jornais, rádios e TV à pasta. O mesmo estratagema, de constranger a investigação isenta dos veículos de comunicação, já fora adotado pela Petrobras em 2009.

O que resta claro é que a novela da corrupção protagonizada pelo governo Dilma entrou numa nova fase do enredo. Nos primeiros capítulos, com Antonio Palocci no papel, o denunciado estrebuchou por semanas a fio antes de cair. Nos seguintes, com Alfredo Nascimento e Wagner Rossi como protagonistas, a queda foi rápida. Com Orlando Silva, tentou-se uma queda de braço com a opinião pública, que mais uma vez se sobrepôs.

Agora, com os escândalos no Ministério do Trabalho, Carlos Lupi e Dilma Rousseff ensaiam cenas de pura canastrice, com suas falas de menosprezo ao que pensa e quer a sociedade brasileira. Ao agir desta maneira, relevar as denúncias e querer transformá-las em pretérito, a presidente da República mostra que só faz o que deve ser feito quando se torna impossível atuar de maneira diferente. Lupi está confortável no seu papel.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Tolerância zero

Merece ser comemorada a aprovação, pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, das alterações que tornam a aplicação da Lei Seca mais rigorosa no país. O Congresso seguiu clamor que emanava da sociedade em prol da proteção da vida. Resta o governo fazer a sua parte e cuidar da condição das vias de trânsito.

Em fins de setembro, o Supremo Tribunal Federal já decidira que dirigir bêbado é crime, envolvendo-se ou não o motorista em acidente de trânsito. Faltava, porém, eliminar brechas legais – como a possibilidade de não submeter-se aos testes de bafômetro – que permitiam a condutores alcoolizados escapar de punições.

Pela proposta aprovada ontem pelos senadores, torna-se crime dirigir sob efeito de qualquer teor de álcool no sangue. Atualmente, o mínimo imputável são 6 decigramas de álcool por litro de sangue, quantidade atingida com o consumo de uma lata de cerveja ou uma taça de vinho.

Os policiais também passam a poder comprovar a embriaguez dos condutores de veículos por outros meios e/ou evidências que não apenas o bafômetro, contornando a recusa de motoristas de produzir provas contra si mesmos.

Também foram elevadas consideravelmente as penas previstas. As punições dependerão da gravidade do acidente: se resultar em lesão corporal gravíssima, a pena varia de 6 a 12 anos de prisão; se for grave, de três a oito anos; e se for lesão corporal, de um a quatro anos. Para quem dirigir bêbado e matar, a pena pode chegar a 16 anos.

O texto ainda será submetido à apreciação da Câmara dos Deputados. Se for mantido como saiu do Senado, a pena mínima para quem mata ao volante após beber será maior do que para quem comete homicídio doloso a tiro, por exemplo, como salienta a Folha de S.Paulo: “O homicídio simples (artigo 121 do Código Penal) prevê de seis a 20 anos de prisão. (...) O artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro inclui pena de oito a 16 anos”.

O endurecimento da legislação chega em boa hora. A Lei Seca completou três anos em junho passado e, de acordo com as estatísticas mais recentes, vem perdendo a sua eficácia no combate à violência no trânsito. Morre-se hoje como nunca no Brasil vítima de acidentes automobilísticos.

No ano passado, foram 40.610 mortes, recorde absoluto na série compilada pelo Ministério da Saúde. Houve aumento de 8% em relação a 2009, com mais 3.016 mortes. São 111 pessoas mortas por dia, ou seja, é como se diariamente despencasse um Boeing no Brasil.

Entre as razões para esta escalada estão o aumento da frota de veículos, sob forte incentivo fiscal do governo federal nos últimos anos; o crescimento dos óbitos de motociclistas, que tiveram a profissão de mototaxista regulamentada na gestão Lula; e, sobretudo, as más condições das rodovias do país.

Junte-se às mortes registradas o elevado número de internações hospitalares em decorrência de ocorrências de trânsito. Apenas no primeiro semestre deste ano, foram 72,4 mil, quase metade delas resultantes de acidentes envolvendo motos. Motociclistas, aliás, formam hoje o maior contingente de vítimas fatais, com 25% do total ou 10.134 em 2010.

Cabe às polícias estaduais coibir os abusos nas cidades. Mas isso não significa que o governo federal não tenha muito a fazer para atacar o problema da violência no trânsito. Precisa, primeiro, aumentar a fiscalização e, concomitantemente, recuperar as péssimas condições de nossas estradas, das quais 27% estão em condições críticas, segundo a Confederação Nacional do Transporte.

A fiscalização nas rodovias tem se revelado falha e colabora muito para o desrespeito à vida. A Polícia Rodoviária Federal opera com déficit de 4 mil patrulheiros, o que corresponde a 40% do pessoal na ativa. Os postos de pesagem, que poderiam evitar o tráfego de caminhões sobrecarregados que deterioram as vias e aumentam a insegurança, não funcionam: dos 240 que deveriam operar, existem apenas 70 construídos e poucos em atividade.

Há quatro anos, radares eletrônicos para controlar o excesso de velocidade em rodovias federais foram desativados, depois que chegou ao fim contrato do governo federal com as empresas que os operavam. Só neste ano o governo recomeçou a instalá-los – num total prometido de 2.696 até 2012. Em locais onde existem, os radares colaboram para reduzir acidentes em 70%.

O Senado fez a sua parte ontem entrando firme na luta contra a impunidade e a violência no trânsito. Espera-se que a Câmara faça o mesmo e torne a lei ainda mais adequada ao que clama a sociedade brasileira. O que não é aceitável é a gestão petista assistir a tudo de braços cruzados: há 55 mil quilômetros de rodovias esperando para serem mais bem cuidados e não se transformarem em estradas da morte. 

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Uma nova agenda (2)

O Brasil tem sérios problemas sociais a resolver, mas dispõe hoje de condições privilegiadas para equacioná-los. Há recursos orçamentários suficientes para melhorar o atendimento na saúde, a qualidade da educação e os níveis de segurança pública. O que tem faltado, e muito, é capacidade do governo petista de aplicar bem o dinheiro dos contribuintes em prol destas melhorias.

O que se percebe é que o poder do Estado para transformar a realidade tem sido desvirtuado para atender interesses localizados. É assim na economia, tanto quanto na área social. “Temos um governo capturado por interesses espúrios, incapaz de produzir o bem comum”, resumiu Edmar Bacha, um dos pais do Plano Real e moderador do painel sobre a área social do seminário “A Nova Agenda – Desafios e Oportunidades para o Brasil”, promovido pelo Instituto Teotônio Vilela na segunda-feira no Rio.

Nenhum país se transforma de fato sem uma boa educação. Mas o que temos hoje no Brasil é um ensino dissociado da realidade dos alunos. No governo tucano, alcançamos o ideal de pôr todas as crianças na escola e o ensino fundamental praticamente se universalizou no país. Desde então o que mais foi feito?

Com a má qualidade do que se aprende em sala de aula, a evasão continua alta: entre os jovens com 15 anos de idade, apenas 43% estão na 8ª série ou no 2º grau. No ensino médio, as matrículas despencam. “Os estudantes perdem o caminho. É um problema que tem a ver com o conteúdo que é ensinado. Falta uma ideia clara do que o aluno quer aprender”, pondera Simon Schwartzman, do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade.

Na saúde, é visível que um ciclo de importantes avanços foi rompido nos últimos tempos, a despeito de o setor contar com orçamentos crescentes, assegurados pela emenda constitucional nº 29. Nos últimos oito anos, saúde passou a ser o tema de maior preocupação dos brasileiros, de acordo com pesquisa da CNI. Por que é assim?

Porque o tempo de espera por consultas é alto; porque faltam medicamentos básicos e médicos; e porque a qualidade do atendimento ainda é precária. Programas importantes como o Saúde da Família foram simplesmente descontinuados: seu ritmo de crescimento caiu de 94% ao ano entre 1995 e 2002 para 8% desde então. “O que vemos é ineficiência e maus resultados”, disse André Medici, especialista e consultor do Banco Mundial.

Se os brasileiros não aprendem como deveriam, não obtêm o atendimento de saúde de que necessitam, também se veem diante da necessidade de suportar uma previdência social cada vez mais pesada e onerosa. Com apenas 10% da população com idade acima de 65 anos, o Brasil tem gastos previdenciários equivalentes aos de nações onde esta faixa etária já representa um terço dos habitantes.

Com o aumento da expectativa de vida, são crescentes entre os brasileiros os casos de aposentados cujo tempo de contribuição à Previdência é menor ou igual ao tempo de fruição dos benefícios. “Não haverá carga tributária capaz de suportar o nível de gastos que temos hoje. Quanto mais prorrogarmos o enfrentamento da questão, mais forte terá de ser a solução”, alertou o economista Marcelo Caetano.

Problema cada vez mais aflitivo – e não só nos grandes centros – é o da segurança pública. O dado novo é que as ocorrências policiais estão migrando das capitais do Sudeste para os estados do Nordeste, que atualmente é a região onde se registra o maior número de casos: 36% do total no ano passado, ante 24% em 2004.

Claudio Beato, coordenador do Centro de Estudos em Criminalidade e Segurança Pública da UFMG, vê a necessidade de mudanças institucionais na organização das polícias e a modernização da legislação processual como essenciais para melhorar os instrumentos de combate ao crime no país. “São armadilhas institucionais que dificultam a ação dos estados no controle da violência”, resume.

O seminário promovido pelo ITV mostrou que a oposição tem disposição e condições de apontar caminhos para um país melhor. E não é só para o futuro: administrações tucanas nos estados – oito são hoje governados pelo PSDB – também já têm obtido resultados animadores, por exemplo, no combate à violência, como São Paulo, e na melhoria na educação básica, como Minas Gerais.

Até por isso, a iniciativa do ITV foi saudada pelos principais jornais do país. “O seminário mostrou um partido ainda capaz de produzir ideias criativas. (...) Uma democracia forte requer igualmente uma oposição vigorosa”, opinou o Valor Econômico em editorial. “O PSDB dá um primeiro sinal de ter reencontrado o caminho para se firmar como principal partido da oposição e se apresentar ao povo brasileiro como alternativa viável de poder no plano federal”, agregou O Estado de S.Paulo, também em editorial hoje. “O PSDB mostrou que sabe reunir gente boa para pensar”, comentou Dora Kramer.

Ninguém tem dúvida de que os tucanos sabem fazer melhor para o país. O grupo que anteontem se reuniu para debater ideias no Rio já mudou o Brasil uma vez e está pronto para mudar de novo. Cada vez mais é preciso formulação e mobilização política. Em suma, perseverar no caminho que estamos seguindo.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Uma nova agenda

Oposição existe para se opor. E para fiscalizar e apontar erros e incapacidades de quem está no governo. Mas existe, também, para pensar e propor novos rumos para o país. Foi assim no seminário realizado ontem pelo Instituto Teotônio Vilela no Rio. Novos caminhos se abriram, sempre voltados a buscar um Brasil melhor.

A constatação mais explícita é de que o país equilibra-se hoje sobre os avanços que o governo do PSDB conseguiu construir, e cujos passos iniciais caminham para completar 20 anos. Tal constatação evidencia que uma nação que se transformou enormemente nestas duas últimas décadas precisa reinventar-se – e não regredir, como tem acontecido.

O PSDB deu mostras ontem, mais uma vez, de que é capaz de apresentar propostas coerentes e transformadoras para o Brasil. Mais que isso, demonstrou coragem para enfrentar e romper interesses espúrios que se apoderaram do aparato estatal e o tornaram refém de grupos de pressão. O que nos interessa é tornar o Brasil, de fato, um país de todos e não um país para poucos.

O seminário “A Nova Agenda – Desafios e Oportunidades para o Brasil” reuniu cerca de 600 pessoas. Foram dois painéis, tratando de temas econômicos e sociais. Alguns de nossos melhores especialistas não se ocuparam apenas em apontar defeitos do modelo atual, algo que sempre foi uma marca do PT quando na oposição. Cuidaram, também, de sugerir alternativas, novos rumos. Construir, em suma.

É o caso, por exemplo, da proposta apresentada por Pérsio Arida, ex-presidente do Banco Central e um dos formuladores do Plano Real. Ele sugere agora uma revolução na remuneração das três principais fontes públicas de crédito: FAT, FGTS e poupança. Hoje, tais fundos fornecem recursos a baixo custo a apenas alguns grupos de eleitos. Em contrapartida, remuneram mal seus cotistas, ou seja, a massa de trabalhadores e poupadores brasileiros.

A sugestão de Arida é tão singela quanto inovadora: adotar para FGTS, FAT e poupança as mesmas taxas de juros de longo prazo praticadas pelo mercado. O resultado seria a multiplicação do patrimônio dos trabalhadores, um aumento considerável da poupança doméstica e a redução de tributos, como PIS/Pasep. Trata-se, segundo ele, de “promover o bem geral em detrimento de privilégios localizados. Hoje, os mecanismos de crédito dirigido penalizam fortemente os trabalhadores”.

Assim como a estabilização da moeda foi capaz de promover a maior justiça social que se tem notícia na história do país, as novas propostas em gestação na socialdemocracia também buscam estender a todos os brasileiros os benefícios de um mercado de consumo que se agiganta. E também assegurar-lhes melhores condições de vida, saúde e educação para que progridam com as próprias pernas e não sob a tutela do Estado, como preza o modelo petista.

Assim, ficou explícita a necessidade de que novas reformas estruturais sejam levadas adiante, como sugeriu Gustavo Franco, também ex-presidente do BC. “Elas atacam privilégios de minorias e geram benefícios para a maioria. Mas, exatamente por isso, sempre se chocam com a resistência destes grupos privilegiados”.

Nos últimos anos, o que se viu no Brasil foi justamente o contrário disso: grupos de privilegiados ocupando e loteando cargos, numa briga desenfreada por poder. “Estamos na direção errada: a de um Estado capturado, cada vez menos eficiente e incapaz de suprir e preencher lacunas”, resumiu Armínio Fraga, que também comandou o BC no governo Fernando Henrique Cardoso.

Junte-se ao cenário o baixo nível de investimentos públicos. Coube a Armando Castelar, da FGV, desmontar a falácia de que o PAC está redimindo os investimentos feitos pelo governo. Em proporção do PIB, eles caíram de 5,4% na década de 1970 para 2,32% atuais. Se tudo o que estiver programado se concretizar, em 2014 serão equivalentes a exatos 2,33% do PIB, ou seja, não sairão do lugar. “O problema não é falta de dinheiro; é de estratégia”, disse ele.

Na síntese da economista Monica de Bolle, que atuou como moderadora do painel sobre a economia brasileira, o país está hoje estacionado sobre um “tripé perverso”: elevadíssima carga tributária, taxas de juros muito altas e investimentos muito baixos. “Temos de partir para a reconstrução de um Brasil que se tornou velho, clientelista e intervencionista”.

O PSDB demonstrou que está começando a reinventar o futuro do Brasil. Deixou claro que tem opiniões próprias e diverge frontalmente da orientação que o governo do PT dá ao país, com sua impotência para produzir ideias novas e sua ineficiência para aproveitar as enormes potencialidades que se abrem. Como disse o presidente Fernando Henrique: “O país cansou de grandes tiradas genéricas; é hora de saber fazer”. Uma nova agenda nesta direção começou a ser construída ontem. (Continua amanhã.)

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Trabalho sujo

O governo do Partido dos Trabalhadores corrompeu o mundo do trabalho. A estratégia espúria que vem sendo usada como método de governo desde 2003 espraiou-se pela Esplanada e orienta também a relação oficial com sindicatos e centrais sindicais, além dos demais “movimentos sociais”. Não espanta que o escândalo da hora esteja abrigado na pasta comandada por Carlos Lupi.

O Ministério do Trabalho já vinha sendo apontado como a bola da vez depois da queda de Orlando Silva no Esporte. Demorou menos do que se imaginava a eclosão da crise por lá: soube-se, pela edição da revista Veja desta semana, que a pasta de Lupi transformou-se numa central de achaques. Dois funcionários citados pela reportagem já caíram; o ministro garante que “morre, mas não joga a tolha”.

No centro das falcatruas estão, novamente, organizações não governamentais (ONG) de fachada usadas para desviar recursos públicos. Assessores de Lupi no Ministério do Trabalho cobravam propina delas para normalizar pendências que eles mesmos criavam. O preço da extorsão variava entre 5% e 15% do valor dos contratos.

Desde 2007, quando Lupi assumiu o ministério, cerca de um terço dos convênios, envolvendo R$ 449 milhões, foram firmados com instituições privadas sem fins lucrativos, incluindo ONG. Estes repasses, porém, estão sujeitos a parca fiscalização e controle da pasta. É uma farra que começa com a liberação de dinheiro dos contribuintes e termina no bolso de gente mal intencionada ligada aos partidos da base governista.

Mais de 500 relatórios de prestação de contas apresentados por ONG e outras entidades que receberam verbas públicas estão engavetados no ministério, sem fiscalização, de acordo com o Tribunal de Contas da União (TCU), informa o Valor Econômico hoje. “Metade deles corre o risco de completar cinco anos no fundo dos armários”, completa O Globo, em manchete. Pela legislação em vigor, os órgãos públicos devem analisar as prestações de contas no prazo de 90 dias.

O descalabro no Ministério do Trabalho ecoa o mesmo modus operandi que já fora identificado no Turismo e no Esporte: o uso de instituições não governamentais para desviar recursos públicos para partidos e financiar a perpetuação de um projeto de poder.

Em dez meses de governo, cinco ministros de Dilma Rousseff já caíram por envolvimento em casos de corrupção; Lupi pode ser o sexto. “Em qualquer outro lugar já se teria dito com todas as letras e a ênfase necessária que o governo apodreceu”, comenta Ricardo Noblat n’O Globo.

Não é apenas a estrutura oficial que está carcomida. A gestão petista aplicou os recursos do Estado para também implodir a atuação independente dos sindicatos e centrais sindicais, num peleguismo redivivo da Era Vargas.

Também ao largo da fiscalização de órgãos de controle como o TCU – cujo escrutínio foi vetado pelo então presidente Lula – sindicatos, federações, confederações e centrais sindicais usam e abusam do grosso dinheiro que lhes é repassado do imposto sindical, criado pelo PT.

Foram R$ 1,7 bilhão nos nove primeiros meses de 2011. O valor equivale a todo o dinheiro transferido pelo governo federal para os 5.565 municípios brasileiros e para o estado do Amapá, segundo mostrou O Globo na semana passada. Até o fim do ano, serão R$ 2 bilhões. É de se perguntar o que a sociedade brasileira ganha com isso.

A melhor síntese da lastimável situação que se tornou norma na gestão federal é dada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso em artigo publicado na edição de ontem de O Estado de S.Paulo: “O que era episódico se tornou um ‘sistema’, o que era desvio individual de conduta se tornou prática aceita para garantir a ‘governabilidade’. (...) Estamos diante de um sistema político que começa a ter a corrupção como esteio, mais do que simplesmente diante de pessoas corruptas”.

A praga da corrupção ganha ares de infecção generalizada no governo federal. O que se percebe é que tudo veio sendo montado de caso pensado, desde o primeiro dia da gestão Lula, para garantir a perpetuação do projeto de poder petista. A ética do trabalho foi substituída por uma lógica deturpada que perverte o que encontra pela frente.

domingo, 6 de novembro de 2011

Direção certa

O Brasil é um país de trânsito selvagem. É um dos locais onde mais se morre em consequência de acidentes causados por automóveis, situação agravada pela péssima condição de nossas estradas e pela deficiente fiscalização nas nossas cidades. Por isso, é mais que bem-vindo o endurecimento de leis que punem motoristas que dirigem bêbados.

Uma destas decisões foi tomada em fins de setembro pelo Supremo Tribunal Federal (STF), mas só veio a conhecimento público nesta semana. Por ela, motoristas flagrados embriagados, mesmo que não causem acidentes, responderão criminalmente pelos atos. Ou seja, em termos mais claros: em quaisquer circunstâncias, dirigir bêbado é crime, passível de detenção.

Parece algo óbvio, mas foi preciso o STF se pronunciar sobre o assunto para que o artigo 306 do Código Brasileiro de Trânsito fosse interpretado da forma correta. Ele prevê “detenção de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor” para quem “conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de  álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência”.

A decisão vem no momento em que a Lei Seca, com pouco mais de três anos completados, vai se mostrando incapaz de combater a selvageria no trânsito brasileiro. Depois de uma estreia triunfal, em que, pela primeira vez desde 2000, o número de mortes causadas por acidentes automobilísticos caiu no país, a situação voltou a piorar, e muito, no ano passado.

Em 2010, nada menos que 40.610 pessoas morreram no Brasil em decorrência de acidentes de trânsito em rodovias e ruas. Trata-se de aumento de 8% em relação ao ano anterior, o que, em números absolutos, equivale a mais 3.016 mortes. É o “maior número registrado pelo Ministério da Saúde em ao menos 15 anos”, sintetizou a Folha de S.Paulo no sábado. São 111 mortes por dia no trânsito ou uma a cada treze minutos.

O Brasil vive situação oposta à de outros países que, muito antes de nós, tornaram as leis de trânsito mais rigorosas e vêm conseguindo impor a civilidade na direção. No Brasil, o número de acidentes com vítimas fatais cresce a uma taxa média anual de aproximadamente 3%, aponta o Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes (IPC-LFG). “Na última década, enquanto nos países da comunidade europeia as mortes no trânsito decresceram em 41%, no Brasil verificou-se um crescimento de 40%”, revelou a revista IstoÉ desta semana.

Não fosse pela inaceitável perda de vidas humanas, os custos desta insanidade também são astronômicos. Segundo a Confederação Nacional do Transporte (CNT), foram R$ 14 bilhões só no ano passado, ou mais do que o governo federal investe na área rodoviária. Só o INSS gasta R$ 8 bilhões por ano com vítimas de acidentes.

Para enfrentar o problema das mortes no trânsito, seria preciso atacar pelo menos três frentes. Em primeiro lugar, melhorar a legislação, já que, na prática, a Lei Seca acabou abrindo brechas na possibilidade de punição aos infratores, ao exigir a comprovação, por meio do teste do bafômetro, do nível de álcool no sangue dos motoristas.

Como o cidadão pode se recusar a produzir provas contra si e não fazer o exame, muitos, mesmo visivelmente embriagados, não são punidos com o rigor devido. Sujeitam-se apenas ao pagamento de multa de R$ 957,70, suspensão da carteira de habilitação e apreensão do veículo. Aguarda-se para breve pronunciamento do STF sobre se a polícia pode usar outros métodos para aferir embriaguez de motorista que se recusa a passar pelo bafômetro.

Urge, também, tornar a fiscalização mais rigorosa. Como é visível nas grandes cidades – porque nas pequenas elas inexistem – as blitze para flagrar bebuns ao volante são cada vez mais raras. Com isso, os motoristas se sentem à vontade para beber. Segundo a PM de São Paulo, neste ano, até outubro, 1.167 pessoas foram flagradas na capital paulista com álcool no organismo em quantidade que caracteriza crime de trânsito, número 32% maior do que os 879 registrados em todo o ano passado.

Um último ponto diz respeito à qualidade das nossas estradas, cenário da maior parte das mortes no trânsito. A Pesquisa CNT de Rodovias 2011 mostra que 57,4% delas têm deficiências e 27% estão em condições críticas. O número de pontos críticos nas rodovias subiu de 109 para 219 desde o último levantamento, feito pela entidade no ano passado. É uma situação inaceitável.

O Brasil ostenta o triste título de detentor de um dos mais altos índices de mortes no trânsito por habitante. É hora de uma mobilização sem precedentes para mudar este quadro, a começar pela recuperação do espírito original da Lei Seca, tornando-a um instrumento efetivo para prevenir acidentes. Da parte do governo federal, cabe transformar nossas estradas em algo decente e não no palco macabro que são hoje. Assim, começaremos a tomar a direção correta.