sábado, 30 de junho de 2012

A piada sem graça do pibizinho

Dias atrás, Guido Mantega estrilou com um banco estrangeiro que previu que o Brasil teria expansão modestíssima neste ano. Se estiver mesmo convicto das projeções que faz, e nunca se cumprem, o ministro da Fazenda agora terá que partir para cima do Banco Central: desde ontem, tornou-se oficial que o PIB brasileiro irá crescer menos neste ano do que em 2011. O que era um pibinho virou um pibizinho.

No Relatório de Inflação divulgado ontem, o BC reviu as projeções de crescimento da economia brasileira de 3,5% para 2,5%. Confirmada a previsão, o Brasil avançará em dois anos o mesmo que o governo Dilma Rousseff prometia crescer apenas neste. A gestão petista está devendo, e muito.

Segundo o BC, o desempenho de todos os setores econômicos será bem pior agora do que foi no fraquíssimo 2011. Para a agropecuária, a previsão é de queda de 1,5% – antes esperava-se elevação de 2,5% no ano. O desempenho da indústria cairá à metade, para 1,9% anual. O dos serviços será o menos afetado, passando de uma alta de 3,3% para 2,8%.

Até poucos dias atrás, a Fazenda alardeava que o Brasil cresceria de “3% a 4%” em 2012, percentual do qual o Planalto nunca divergiu. Em seguidas ocasiões, Mantega sustentou que o patamar do ano passado – expansão de 2,7% – era ótimo “piso” para a economia brasileira numa época de vacas magras como a atual. Resta saber o que o ministro acha de tê-lo agora como teto inalcançável...

Depois de ter chamado de “piada” a previsão de que o PIB só avançaria 1,5% em 2012, feita pelo Credit Suisse na semana passada, Mantega agora terá de se contentar com o que, seguindo o ponto de vista do ministro, seria uma pilhéria do BC. De forma abrupta, a Fazenda também passou a falar dos mesmos 2,5% ora previstos no Relatório de Inflação. Como se faz uma revisão tão súbita sem que o governo se explique?

Infelizmente, é possível que, assim como o errático Mantega, também o BC esteja equivocado. A média dos prognósticos feita por mais de 100 instituições financeiras, estampada semanalmente no boletim Focus, já aponta para um crescimento de apenas 2,18% neste ano. A reversão das expectativas foi fulminante: há um mês, esperava-se algo pouco acima de 3%.

Para que o país cresça efetivamente os 2,5% previstos pelo Banco Central, a economia teria que acelerar muito no semestre que começa no próximo domingo. A LCA Consultoria estima que, para que o BC acerte, o ritmo de crescimento atual teria de ser triplicado. Para a Tendências, significa atingir algo como 9,5% ao ano. Alguém crê nesta possibilidade? Difícil.

A dura realidade econômica que ora vai se consolidando no país resulta da dificuldade do governo petista de agir adequadamente e na hora certa. A gestão Dilma demorou demais a baixar os juros, insistiu além da conta no incentivo ao consumo e até agora não conseguiu destravar os investimentos – alternativa que, de fato, teria o condão de melhorar a situação geral do país.

“O governo Dilma entendia que bastaria derrubar os juros, puxar as cotações do dólar e espremer os bancos para que baixassem os juros para que o PIB disparasse. Não é o que está acontecendo”, comenta Celso Ming no Estadão. Para Miriam Leitão, n’O Globo, “o problema não é apenas o mundo. É a qualidade da nossa resposta. Ela tem sido fraca e sem nexo”. “O Banco Central exime com excesso de condescendência a política econômica de responsabilidade pelo fraco desempenho do PIB”, concorda o Valor Econômico em editorial.

Mais indicadores reforçam a percepção de que a resposta do governo do PT à crise é inadequada. O modelo de expansão da economia a reboque do consumo caminha para a exaustão, se é que ela já não chegou: o brasileiro nunca esteve tão endividado. Mostrou o BC ontem que o valor das dívidas já corresponde a 43,3% da renda das famílias no ano, recorde histórico desde 2005. Neste período, o endividamento mais que dobrou (era de 18,4% há sete anos).

A ferocidade com que os importados tomam conta do mercado brasileiro é outro agravante. No ano passado, os bens vindos do exterior atenderam todo o aumento de consumo de bens industriais verificado no país. Neste ano, contudo, estão indo ainda mais além: enquanto a demanda interna por estes itens caiu 2,4% entre janeiro e abril, a presença dos importados cresceu 0,4%, mostra o Valor em sua edição de hoje.

A um quadro que piora a olhos vistos, a presidente da República responde com o trivial simples da receita petista: medidas a esmo, desconectadas, fragmentárias. Os pacotes se sucedem e o país afunda, sem merecer do governo petista um plano de ação capaz de efetivamente evitar que o pior aconteça. Agindo assim, Dilma Rousseff e sua equipe brincam à beira do precipício.

sexta-feira, 29 de junho de 2012

Crise empacotada

O governo federal lançou mais um de seus pacotes de estímulo à economia. A medida foi recebida com unânime ceticismo: será incapaz de alterar a trajetória descendente do PIB neste ano; é fragmentada como as anteriores; e servirá, novamente, para ajudar o mesmo setor de sempre, o de veículos. O Brasil está dançando à beira do precipício.

Importa pouco se pacote de ontem é oitavo desde a crise de 2009 ou o sétimo desde o fim do ano passado. Batizado de PAC (mais um!) Equipamentos, o que ele de fato escancara é a forma errática como tem agido a gestão Dilma Rousseff para fazer frente à crise econômica. Passamos, rapidamente, da postura confiante de algumas semanas atrás para o semipânico atual, sem que Brasília demonstrasse qualquer sinal de que sabe o que está fazendo.

Pelo pacote, o governo Dilma prevê aumentar as compras governamentais em R$ 8,4 bilhões neste ano. Do valor, R$ 6,6 bilhões são recursos novos, que não estavam anteriormente previstos no Orçamento da União. Serão pulverizados na aquisição de itens tão díspares quanto carteiras escolares, armamentos, retroescavadeiras e medicamentos. Que coerência há nisso?

O traço comum com os pacotes anteriores é que, mais uma vez, a indústria de transportes será a maior beneficiada pelas medidas. O carrinho de compras de Dilma inclui a aquisição de 8 mil caminhões, 3 mil patrulhas agrícolas, 3.591 retroescavadeiras, 1.330 motoniveladoras, 2.125 ambulâncias, além de ônibus e motocicletas. É o Brasil motorizado que não para...

Na melhor das hipóteses, o efeito da antecipação das compras governamentais no PIB deste ano será de 0,2%. Na mais provável, beira a nulidade: licitações demoram a ser feitas – a menos que o governo pretenda engolfá-las no vale-tudo do Regime Diferenciado de Contratações aprovado ontem no Senado – e o calendário eleitoral impede que novos contratos sejam firmados de julho a outubro. Tudo considerado, o pacote é de vento.

“Iniciativas desse tipo cumprem mais a função de mostrar que o governo está fazendo alguma coisa do que de garantir eficácia para sua política”, comenta Celso Ming no Estadão. “Todas [as medidas] juntas mostram que o governo não tem visão estratégica. É uma política econômica hiperativa e sem resultados”, afiança Miriam Leitão n’O Globo.

Ontem também foi anunciada a redução da TJLP, praticada nos empréstimos do BNDES. Agora em 5,5% ao ano, equivale a uma taxa real próxima de zero. Parece um sonho, mas possivelmente não servirá para ressuscitar o “espírito animal” dos empresários brasileiros. Hoje, dado o desânimo reinante, eles não investem em razão da incerteza que paira no horizonte e não por falta de crédito barato.

A gestão petista apela para tanta pirotecnia porque não consegue fazer o óbvio: bem gerir. É mais fácil lançar um monte de medidas ao vento, semana após semana, do que tornar as ações de governo um todo coerente, bem organizado e, sobretudo, eficiente. Isso não parece ser cogitado no Planalto.

Basta verificar aquele que ainda é o melhor termômetro para aferir o desempenho governamental: a execução orçamentária. Dos R$ 80 bilhões aprovados no Orçamento para investimento em 2012, apenas R$ 16,7 bilhões foram executados até agora, segundo a Tendências Consultoria. Ou seja, chegamos à metade do ano com somente um quinto dos recursos aplicados – no Dnit, por exemplo, os desembolsos estão 42% menores em relação ao primeiro semestre de 2011.

Pior: a imensa maioria dos investimentos refere-se a restos a pagar dos anos anteriores. Vale questionar: afinal, que rumo tem um governo que sequer consegue gastar o Orçamento a que se propôs e limita-se a executar obras herdadas de seu antecessor? Recorde-se que, em sua avaliação sobre as contas do primeiro ano da gestão Dilma, o TCU considerou que só houve execução satisfatória de 54% das ações classificadas como prioritárias no OGU.

A situação brasileira tende a se agravar, e não apenas porque a Europa não sai do buraco. A arrecadação tributária está diminuindo, os gastos continuam crescendo ainda mais que no passado, os superávits fiscais estão ficando mais difíceis de serem alcançados e as perspectivas de crescimento desceram ladeira abaixo. Já é certo que o PIB per capita brasileiro cairá neste ano. É um quadro que não apenas preocupa, como também amedronta.

quinta-feira, 28 de junho de 2012

O mensalão e seus filhotes

Agora é oficial: o mensalão começa a ser julgado no próximo dia 2 de agosto. Será a chance de passar a limpo o maior escândalo da história política do país, marcado pela compra de apoio parlamentar pelo governo do PT. Também poderá servir para inibir a proliferação de esquemas de corrupção, uma ninhada de filhotes que o mensalão gerou.

O último passo para que a data do julgamento fosse fixada foi dado ontem com a conclusão do relatório do ministro revisor do caso, Ricardo Lewandowski. Funcionou, portanto, o empenho da sociedade para que a revisão fosse finalizada dentro do cronograma aprovado no início do mês pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF).

A data permite a apreciação do mensalão com a Corte completa e sem atropelos. Será possível ao ministro Cezar Peluso, que se aposenta compulsoriamente em setembro, votar, bem como ao atual presidente do STF, Carlos Ayres Britto, que se retira em novembro.

Não se conhece, ainda, o teor do voto do revisor. Mas, nos jornais de hoje, especula-se que Lewandowski possa ter assumido postura mais favorável aos réus do processo. N’O Globo, Merval Pereira arrisca: “O voto do revisor (...) caminha no sentido de indicar que, na sua opinião, o Supremo Tribunal Federal deve optar por penas mais brandas para os réus”.

Por penas mais brandas, entenda-se a prescrição de crimes como formação de quadrilha, pelo qual respondem 22 dos 38 réus, entre eles José Dirceu. O prazo de prescrição varia de acordo com a condenação a que são submetidos: pode se dar em quatro ou em oito anos. Como a denúncia foi recebida pelo Supremo em 2007, a hipótese existe.

O Estado de S.Paulo também reforça a suspeita de que, no voto concluído ontem, Lewandowski tenha tendido a beneficiar os réus. O ministro levou seis meses no trabalho de revisão e, se dependesse estritamente de sua vontade, consumiria mais uns tantos, empurrando o julgamento do mensalão para depois das eleições municipais de outubro.

“O cronograma adotado por Lewandowski indica que ele desceu ao mérito das questões. Nos bastidores, a avaliação é de que o ministro construiu um voto que faz reparos ao voto do relator, ministro Joaquim Barbosa”, especula o jornal.

Não custa lembrar que Lewandowski foi o mesmo flagrado pela Folha de S.Paulo alguns anos atrás num telefonema indiscreto. Teria dito, em conversa ouvida pela repórter Vera Magalhães, que o STF votara o acolhimento da denúncia do mensalão, em agosto de 2007, “com a faca no pescoço” e a tendência dos ministros era “amaciar para [José] Dirceu”.

Também por estas razões, o julgamento do mensalão servirá para dissipar todas as suspeitas, punir culpados e, se for o caso, inocentar quem nada deve. O que não cabe é os atos da “sofisticada organização criminosa” denunciada pela Procuradoria-Geral da República continuarem sem ser apreciados pelo Supremo. Quanto antes, melhor.

O julgamento do esquema de compra de apoio parlamentar montado pelo governo Lula para garantir sua perpetuação no poder também terá o condão de coibir a proliferação de malfeitos similares país afora. Depois que tentou reduzir o mensalão a um crime eleitoral “que todo o mundo faz” e, posteriormente, transformá-lo em “farsa”, o PT deu a senha para que seus seguidores exorbitassem nos ilícitos.

Basta ver como os casos de corrupção envolvendo petistas se sucederam desde então. Há o escândalo dos aloprados, agora denunciados pelo Ministério Público no Mato Grosso; o esquema de desvio de dinheiro público recém-descoberto no Banco do Nordeste, e que envolve a mesma turma celebrizada pelos dólares na cueca; o submundo da arapongagem usado na campanha presidencial de 2010 contra o candidato da oposição... A lista é extensa.

Com a marcação do início do julgamento, o STF também mostrou reação adequada à tentativa de Lula de interferir no processo, postergando-o. A imprudência do ex-presidente acabou por precipitar os trâmites, ou seja, mostrou-se um favor a quem deseja ver o caso julgado mais celeremente. Resta agora esperar que os ministros do Supremo deem aos integrantes da quadrilha do mensalão o destino que lhes cabe na História: bem longe da vida pública, quitando suas dívidas com a Justiça.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Petrobras no fundo do poço

A Petrobras tornou-se o retrato mais bem acabado da ineficiência do governo petista. Desde o governo Lula, a maior empresa do país vive uma espiral descendente, vitimada pela manipulação política de seus negócios e de sua gestão. Patrimônio dos brasileiros, a companhia precisa ser, urgentemente, soerguida.

A apresentação do novo plano de negócios da empresa para o período 2012-2016, realizada ontem no Rio, escancarou a forma deletéria com que a Petrobras vem sendo gerida na era petista. É um histórico de metas não cumpridas, atrasos em obras, investimentos frustrados, planejamento inadequado e desperdício de recursos.

A previsão da companhia é investir US$ 236,5 bilhões, ou US$ 47,3 bilhões ao ano, até 2016, o que representa 5% além da estimativa anterior. Entretanto, a produção será menor do que anteriormente se projetava, chegando a 1 milhão de barris menos em alguns períodos de 2017.

“A estatal vinha divulgando metas que sistematicamente descumpria, convivia com falta de planejamento, controles insuficientes e ineficiência operacional. As antigas projeções de produção, consideradas irrealistas pelo mercado e, agora, assumidas pela nova administração, indicou a presidente [Graça Foster], contavam com a sorte para serem atingidas”, resumiu o Valor Econômico.

Segundo Graça Foster, as metas anteriores eram “muito ousadas” e, por isso, foram revistas em direção a algo “mais realista”. Uma coisa é certa: não se estipulam objetivos irrealistas numa empresa do porte da Petrobras inadvertidamente. A realidade é que, na era petista, a empresa foi convertida em peça de campanha publicitária, ao mesmo tempo em que vem sendo carcomida nas entranhas.

Especialmente na gestão Lula, a Petrobras definhou sob enorme ingerência política. Segundo atestam funcionários, a influência de Brasília e dos partidos desceu a níveis de gerências menores, algo nunca visto na história recente da companhia. Além de gerar ineficiência, tamanha manipulação deu origem a vários empreendimentos que agora estão simplesmente naufragando.

Foster admitiu ontem que, desde que o PT assumiu a companhia, a Petrobras jamais cumpriu as metas de produção a que se propôs. Ao mesmo tempo, pôs-se a tocar megaprojetos que primam por atrasos e pela escalada de custos. A lista é longa e vai de refinarias emperradas no Nordeste a sondas que chegam a ultrapassar o cronograma em 864 dias.

Desde que foi lançada, em 2005, a refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, por exemplo, já teve seu custo multiplicado por nove, passando de US$ 2,3 bilhões para US$ 20,1 bilhões. No Comperj, no Rio, já foram gastos R$ 2,9 bilhões e não há sequer data para que a obra seja concluída. As refinarias de Maranhão e Ceará foram postas na geladeira, sabe-se lá até quando.

Não é só na gestão de seu plano de investimentos que a Petrobras derrapa. A companhia também se vê constrangida por ter sido convertida em instrumento de controle da inflação pelo PT. Há sete anos, período em que as cotações de petróleo oscilaram loucamente no mundo, o consumidor brasileiro paga, artificialmente, o mesmo preço nos postos.

Mesmo com o reajuste anunciado na semana passada, ainda subsiste uma defasagem em relação ao mercado internacional que está em torno de 7% na gasolina e entre 13% e 18,6% no diesel. A empresa cobra novos aumentos, mas é certo que, se ocorrerem, só virão após as eleições, uma vez que não é mais possível evitar que batam no bolso do consumidor.

Criou-se no país uma cadeia de distorções que torna os combustíveis fósseis mais atraentes que os renováveis e está freando o uso de etanol nos motores brasileiros. Ao mesmo tempo, o país da autoproclamada autossuficiência em petróleo é obrigado a importar 80 mil barris diários de gasolina e óleo diesel. Sem um necessário realinhamento nesta política, o fôlego da Petrobras para investir e reagir continuará curto.

O inferno astral da Petrobras também pode ser dimensionado pela sofrível condição em que ela se encontra no mercado de capitais. Apenas ontem, a empresa perdeu R$ 22,3 bilhões em valor de mercado, com os investidores decepcionados com os rumos da companhia.

Só neste ano, as ações da Petrobras já caíram 15% (preferenciais) e 17,7% (ordinárias), prejudicando também os cerca de 300 mil cotistas que investiram seu FGTS na empresa em 2000. O valor de mercado da companhia caiu ontem para apenas 70% do patrimônio líquido, o que representa o menor nível histórico, segundo a consultoria Economática.

O PT vive dizendo que deu novo ímpeto ao Estado e às empresas públicas desde que chegou ao Planalto. Na realidade, transformou-as em instrumentos a serem manipulados em favor da sua perpetuação no poder. A atuação desastrosa do governo petista à frente da Petrobras e a situação lastimável a que a empresa foi empurrada são mais que suficientes para mostrar o que não deve ser feito.

terça-feira, 26 de junho de 2012

Pendurados no crediário

O aumento do crédito e o estímulo ao consumo foram as alavancas usadas pelo governo brasileiro para enfrentar a crise econômica desde 2008. Num primeiro momento, funcionou, mas, repetida por anos a fio, a receita está conduzindo o país a um mau caminho. A desconfiança internacional com o Brasil já começou.

Neste fim de semana, o BIS, uma espécie de banco central dos bancos centrais do mundo, divulgou documento em que alerta para o excesso do crescimento do crédito no Brasil e em outros países emergentes, como China, Índia e Turquia.

Para a instituição, sediada na Basiléia, o risco de descontrole é iminente. Os banqueiros enxergam “desaceleração acentuada” na economia brasileira e, pior, a ameaça de que aqui se repita o estouro de crédito verificado nos EUA há quatro anos e que agora também arrasta a Europa para o buraco.

O BIS fez as contas e concluiu que, nos últimos três anos, o crédito no país cresceu 13,52 pontos percentuais acima do PIB brasileiro. Em outros momentos, uma arrancada desta magnitude no volume de empréstimos, descolando-se do resto da economia, redundou em ondas de quebradeira. Tomara que não seja o caso desta vez.

No entanto, o nível de endividamento – medido pela proporção do PIB que as famílias destinam ao serviço da dívida – já é tão alto no país quando em fins dos anos 1990. Sem contar financiamentos feitos via crediários em lojas, que não são contabilizados pelo Banco Central, o comprometimento mensal da renda das famílias brasileiras atingiu 22%. Para se ter ideia, quando a crise das hipotecas foi detonada nos EUA este percentual estava em 16% por lá.

Segundo números da Serasa Experian, a inadimplência do consumidor pessoa física subiu 21% nos últimos 12 meses, na série sem ajuste sazonal. A provisão que os bancos têm de fazer para créditos podres, isto é, aqueles em que o devedor está com o pagamento da dívida atrasado há mais de 180 dias, aumentou 24% até abril.

A situação dos endividados é tão preocupante que os credores estão oferecendo condições especiais para tentar rever o dinheiro emprestado. Segundo O Globo, está em marcha em bancos, financeiras, varejistas e operadoras de cartão de crédito um movimento que só encontra precedentes na época do Plano Collor, quando o Brasil mergulhou numa de suas mais severas crises.

Mesmo com condições facilitadas, a inadimplência não cede. “Diferentemente da crise iniciada em 2008, em que a inadimplência foi causada por uma abrupta escassez de crédito na economia e depois caiu rapidamente quando o fluxo financeiro retornou, o novo patamar de calote foi causado pela expansão, por vezes desordenada, do crédito”, avalia o jornal.

Muitos destes novos devedores entraram no mercado de crédito recentemente, incentivados pelo governo federal. Uma parte deste contingente simplesmente não tinha condições de tomar empréstimos, e agora se vê com a corda no pescoço – o mercado de automóveis é onde isso fica mais evidente, com as taxas de calote no nível mais alto desde 2000.

Os alertas quanto aos riscos da escalada do crédito e da inadimplência vêm sendo feitos já há algum tempo. Mas a reação do governo federal veio sempre na direção contrária: botar mais lenha na fogueira do consumo, incentivar o endividamento das famílias e postergar medidas realmente necessárias, como o estímulo ao investimento.

Constata-se, agora, que a “marolinha” que arrebenta as praias do mundo desenvolvido há quase quatro anos, também atinge o Brasil – ainda que, felizmente, em menor grau, por ora. Resta ao governo Dilma Rousseff acordar para a gravidade do problema e deixar de insistir numa estratégia esgotada. E torcer para que o pessoal que cuida da dinheirama no mundo esteja equivocado.

sábado, 23 de junho de 2012

O Brasil implodiu a Rio+20

A Rio+20 termina hoje com saldo muito aquém do que dela se esperava. O mais lastimável é que a atuação do governo brasileiro foi decisiva para a frustração. Em busca de um consenso amorfo, a nossa diplomacia construiu um documento final desidratado de avanços. O Brasil foi protagonista de um fracasso.

Desde que foi apresentado na última terça-feira, o texto da declaração final da Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável – da lavra do Itamaraty – foi alvo de críticas. A insatisfação com os seus 283 parágrafos, esparramados por 49 páginas de muita retórica e pouca decisão, é geral.

As primeiras a estrilar foram as ONGs. Anteontem, pediram que uma expressão (“com plena participação da sociedade civil”) fosse retirada do documento oficial, como forma de deixar registrado que não compactuam com a solução construída pelo Brasil. Não foram atendidas.

Mas as ONGs não falaram sozinhas. Para espanto geral, críticas ainda mais contundentes vieram da delegação da Comunidade Europeia – decepcionada com a timidez dos negociadores brasileiros – e até mesmo do secretário-geral da ONU: Ban Ki-Moon causou tamanha contrariedade ao governo brasileiro que ontem teve que se desdizer.

Também contrariados se manifestaram representantes de empresas e academia. No documento “A Rio+20 que não queremos”, repudiaram o caminho trilhado pelos governos, guiados pela diplomacia brasileira, na Rio+20, seja pela timidez das deliberações, seja pela falta de ambição com compromissos objetivos.

“A Rio+20 passará para a história como uma conferência da ONU que ofereceu à sociedade mundial um texto marcado por graves omissões que comprometem a preservação e a capacidade de recuperação socioambiental do planeta, bem como a garantia, às atuais e futuras gerações, de direitos humanos adquiridos”, diz o texto.

Ex-líderes políticos mundiais, como Fernando Henrique Cardoso, Gro Harlem Brundtland (Noruega) e Mary Robinson (Irlanda), também externaram sua decepção com a conferência recepcionada pelo Brasil. Reunidos no grupo denominado “The Elders”, disseram, num comunicado, que a Rio+20 não fez o suficiente para pôr a humanidade na trajetória de desenvolvimento sustentável.

Vale recordar que, até o início da semana, era generalizada a expectativa de que a conferência resultasse em pelo menos três avanços: a criação de um fundo para promover o desenvolvimento sustentável em países pobres; a definição de metas de produção e consumo sustentáveis; e o fortalecimento de órgãos de governança da ONU voltados ao meio ambiente, em substituição ao Pnuma.

As discussões preliminares, que se desenrolaram por meses a fio, não haviam conseguido lograr êxito em atingir o consenso em torno destes objetivos. Mas, em compensação, os negociadores também ainda não haviam jogado a toalha: apostava-se no diálogo de alto nível dos chefes de Estado para se chegar a um entendimento no Rio.

Bastou, porém, o Brasil assumir as negociações para, em quatro dias, as esperanças estarem sepultadas. Nenhum dos três principais pontos em torno dos quais havia maiores expectativas foi preservado pelo Itamaraty no documento final. Tudo em nome de um mínimo denominador comum que compromete ao máximo o futuro do planeta.

Não apenas a busca de avanços mais evidentes foi abandonada, como alguns compromissos que estavam quase fechados foram dizimados do texto final pela diplomacia brasileira. É o caso, por exemplo, de um programa de ação de mudança nos padrões de produção e consumo que havia levado oito anos para ficar pronto e agora deixou de constar da declaração final da Rio+20. Dada antes como certa, a proteção dos oceanos nas áreas além das fronteiras territoriais também naufragou.

Com seu trator, o governo brasileiro reduziu a cúpula dos chefes de Estado, iniciada na quarta-feira, a um mero referendo das decisões insossas costuradas pelos ministros. As contribuições da sociedade civil, elaboradas num ciclo de diálogos de alto nível integrante da Rio+20, também foram simplesmente ignoradas – o texto final foi fechado antes que os debates fossem finalizados.

Até a proverbial rispidez que cerca os modos da presidente brasileira marcou presença na conferência do Rio. Os jornais registram a maneira “pouco suave” com que Dilma Rousseff reclamou de críticas feitas ao Brasil pela ONU. Também salientam gestos de “truculência e constrangimento” exibidos pelos negociadores brasileiros junto às delegações de outros países na pressa por fechar o documento final da Rio+20.

Tudo considerado, as atitudes do governo brasileiro nos últimos dias parecem indicar que a Brasília importou muito mais salvar o país-anfitrião do vexame de não conseguir produzir um texto de consenso, qualquer que fosse ele, do que pavimentar avanços globais rumo a um mundo mais sustentável. Na Rio+20, prevaleceram o interesse menor e as veleidades da diplomacia do governo Dilma Rousseff.

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Um partido nas páginas policiais

Notícias sobre partidos costumam ser publicadas nas sessões dos jornais dedicadas à política. Mas, com o PT, esta prática está mudando: a legenda de Lula, Dilma e José Dirceu tem figurado, também, nas páginas policiais. Nunca antes na história se viu um partido tão envolvido em escândalos.

A profusão de falcatruas nas quais militantes petistas estão metidos é assustadora. Além do escândalo-mãe, o mensalão, gente ligada ao PT está sendo investigada, entre outros crimes, por corrupção, falsificação de documentos e desvio de recursos públicos para financiamento de campanhas. Vejamos alguns casos.

No último dia 14, o Ministério Público Federal de Mato Grosso denunciou nove pessoas que se envolveram no episódio que ficou conhecido como escândalo dos “aloprados”. Elas amealharam R$ 1,7 milhão nas eleições de 2006 para tentar prejudicar campanhas tucanas por meio de dossiês fajutos.

Seis dos acusados eram diretamente ligados à campanha à reeleição de Lula e ao hoje ministro Aloizio Mercadante, então candidato ao governo de São Paulo. Contra eles, pesam denúncias de crimes de formação de quadrilha, contra o sistema financeiro, de lavagem de dinheiro e declaração de informação falsa em contratos de câmbio.

A lista de delitos cometidos pelos aloprados assemelha-se à que pesa sobre os 36 réus enredados no mensalão: formação de quadrilha, corrupção ativa e passiva, peculato, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e gestão fraudulenta. O maior escândalo de desvio de dinheiro público da história do país começa a ser julgado em 1° de agosto pelo Supremo.

O rol de petistas envolvidos em crimes ganhou mais alguns personagens recentemente. Ontem, a direção do Banco do Nordeste do Brasil (BNB) foi toda afastada em meio a investigações sobre um rombo de R$ 100 milhões que, segundo a Polícia Federal, podem ter sido usados em campanhas do PT no Ceará.

O esquema cearense lembra muito o do mensalão. Entre 2009 e 2011, empréstimos concedidos a empresas teriam sido usados para irrigar o caixa dois de campanhas eleitorais petistas no estado. Não por coincidência, gente ligada aos mensaleiros também tem suas digitais no escândalo do BNB...

Os maus exemplos contaminam também administrações municipais petistas. O caso mais célebre continua sendo o do trágico assassinato do prefeito Celso Daniel em Santo André, sob grossa suspeita de que uma máfia comandada a partir da cúpula do PT desviava dinheiro de contratos de prestação de serviço na cidade para os cofres do partido.

Mas não é apenas no ABC paulista que prefeituras petistas estão sob investigação. Em Campinas, o prefeito foi defenestrado no ano passado por corrupção. Agora, os olhos se voltam para Maricá, cidade no estado do Rio abençoada por reservas – e polpudos royalties – de petróleo e amaldiçoada por ser administrada pelo PT.

Mas a atração do partido de Lula, Dilma e José Dirceu por quem tem contas a acertar com a Justiça transcende a jurisdição brasileira. Nas eleições de outubro, o partido andará de mãos dadas com o deputado Paulo Maluf, impedido de deixar o país por constar da lista de procurados internacionalmente pela Interpol.

Companhias que, para partidos e políticos éticos, deveriam causar incômodo já se tornaram comuns ao universo petista. Em sua insalubre estratégia de ampliação e manutenção de poder, o partido se juntou a Fernando Collor, José Sarney, Renan Calheiros e mais uma penca de políticos com extensa ficha corrida.

O partido que há quase dez anos governa o Brasil pratica um abjeto vale-tudo para perpetuar-se no poder. Produz, com isso, péssimos exemplos, que vão se disseminando pelo país afora. Quando tudo isso for passado, uma constatação terá lugar: a pior herança que o PT terá legado ao país será a sua leniência com a corrupção. 

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Um fim lamentável para a Rio+20

Serão muito pequenas, quase invisíveis, as conquistas que sairão da Rio+20. A diplomacia brasileira conseguiu uma proeza: a aprovação de uma declaração final que até poucos dias atrás parecia improvável. Mas, para isso, tornou o texto tão anêmico que “o futuro que queremos” buscado pelas 193 nações participantes da conferência se tornou bem mais longínquo.

O documento-base a ser referendado pelos chefes de Estado a partir de hoje não contempla boa parte dos temas e propostas que poderiam representar avanços e novos compromissos dos signatários em prol do desenvolvimento sustentável. As expectativas positivas que cercavam a Rio+20 se frustraram.

No texto, não há definição de objetivos e metas; não há fontes de recursos estipuladas; não subsistem instituições com força capaz de enquadrar as nações do planeta. Há apenas princípios genéricos, reafirmações de intenções firmadas há 20 anos e rigorosamente nada mais. No bom e velho diplomatiquês, há muito “consideramos” e pouco “decidimos”.

A diplomacia brasileira se deu por satisfeita com o simples fato de não ter havido retrocessos. Lutou a todo o custo para fechar um texto que evitasse o fracasso absoluto, isto é, a Rio+20 acabar sem documento algum. Entre o nada e o desejável, parou nas platitudes.

“Decisões concretas, com metas e objetivos, não saíram do Riocentro”, resumiu o Valor Econômico. O documento final é “muito mais fraco do que se poderia esperar”, decretou O Globo. É significativo que o Brasil tenha sido o único país a comemorar abertamente o resultado das negociações da Rio+20, como mostrou O Estado de S.Paulo.

A solução costurada pelo Brasil é muito tímida diante da necessidade premente de que se construam avanços globais rumo a formas sustentáveis e menos agressivas de desenvolvimento. É ainda mais frustrante diante do protagonismo que se esperava da nação que guarda a maior reserva de biodiversidade do mundo.

O resultado formal da Rio+20 é uma decepção e o documento que o Itamaraty fez aprovar ontem é apenas uma manifestação disso. Textos diplomáticos são sempre enfadonhos e rocambolescos. Mas a declaração final da conferência é ainda mais lamentável pelo que demonstra de falta de ousadia, de imprecisão e de incerteza quanto aos objetivos que se deve perseguir rumo ao desenvolvimento sustentável.

Na busca do consenso, o Brasil optou por afastar os pontos de conflito – justamente os que representavam alguma esperança de avanços e novas conquistas. Nossa diplomacia optou por empurrar para um futuro incerto o enfrentamento dos problemas, deixados a cargo de grupos de trabalho que nunca se sabe bem aonde conseguirão chegar.

Apenas reiterar rumos que foram traçados na Eco-92, como se limitou a fazer o Brasil, é muito pouco, uma vez que já há um razoável consenso em torno da necessidade de agir para assegurar um desenvolvimento sustentável doravante. Desperdiçar a disposição demonstrada pelos vários tipos de atores para assumir compromissos imediatos poderá mostrar-se uma falha imperdoável.

Apesar dos ecocéticos de sempre, entidades civis, academia, investidores e empresas deixaram claro nas centenas de discussões havidas nos últimos dias no Rio que é preciso modificar a forma como lidamos com os recursos naturais. Sem isso, ficará difícil, para não dizer impossível, manter os padrões atuais de produção e consumo e até mesmo garantir a disponibilidade de alimentos.

Se as coisas continuarem caminhando tal como são hoje, a consequência será a escassez e, com ela, a escalada de custos. Numa situação assim, quem mais perderá serão justamente os mais pobres. Por isso, era tão desejável que houvesse na Rio+20 um sinal de que os exageros e equívocos do passado não continuarão a se repetir.

Em resumo, saímos da Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável menores do que entramos, com perspectivas menos animadoras. Sob a batuta do Brasil, as nações mostraram-se muito aquém do que delas espera a sociedade civil. Para nossa sorte, independentemente da tibieza da diplomacia, empresas, organizações não governamentais e pesquisadores já estão agindo para mudar o planeta. 

quarta-feira, 20 de junho de 2012

A economia despenca e o governo silencia

Com a maioria das atenções voltadas para os problemas globais em discussão na Rio+20, a economia brasileira segue, lentamente, dia após dia, sua trajetória ladeira abaixo. Até agora não se ouviu do governo Dilma Rousseff nenhuma explicação sobre as razões de a situação ter piorado tanto e em tão pouco tempo. Falta um mea culpa.

Vale recordar que, até bem pouco tempo atrás, a presidente da República propagandeava aos quatro ventos que a economia brasileira aceleraria neste ano. Dilma não falava sozinha: seu ministro da Fazenda apostava ainda mais alto e previu, durante muito tempo, crescimento de 5% em 2012. Era só bravata ou foi má-fé mesmo?

De repente, sorrateiramente, o discurso róseo do governo foi sendo deixado de lado. As projeções fantasiosas de dias atrás foram sendo abandonadas, sem, contudo, merecer qualquer explicação oficial do governo petista ao distinto público.

A portas fechadas, em encontro com governadores na semana passada, a presidente Dilma disse não enxergar “luz no fim do túnel” para a crise europeia. Foi uma forma de dizer que, por aqui, a escuridão também deve prevalecer. Por que ela não vem a público manifestar-se com o mesmo realismo?

Já se dá de barato que o desempenho da economia brasileira neste ano deverá ficar aquém até mesmo dos 2,7% do pibinho de 2011. No boletim Focus divulgado ontem pelo Banco Central, os prognósticos despencaram. A previsão prevalecente entre analistas financeiros agora é de que o nosso PIB crescerá apenas 2,3% em 2012.

A deterioração nas expectativas foi rápida, e implacável: as projeções caíram quase um ponto percentual em pouco mais de um mês, algo incomum neste ambiente. Não há dúvida de que a onda virou. E o pior é que o chamado “mercado” não é muito costumeiro em acertar prognósticos de PIB; quase sempre erra para mais.

Não são apenas as projeções que azedaram. A economia real continua amarga no segundo trimestre: de acordo com a prévia do PIB divulgada pelo BC na sexta-feira, em maio a economia caiu 0,02% sobre o mesmo mês de 2011, na primeira queda neste tipo de comparação desde setembro de 2009. No acumulado em 12 meses, o crescimento é de 1,65%.

Ocorre que o governo brasileiro apostou alto numa única estratégia: a do aumento do consumo, parecendo julgar que a curva ascendente verificada nos últimos anos poderia perdurar para sempre. Descuidou, neste ínterim, de incentivar os investimentos e os empreendimentos privados, apesar de toda a fama de boa gerente de que a presidente gozava.

Com as vendas no comércio já refluindo, o governo simplesmente ignorou – ou será que desconhecia? – que o consumidor tem limites para se endividar. Estrilou quando a federação que representa os bancos fez um alerta nesta direção, mostrando que não bastaria os juros baixarem na marra, se o tomador não quer beber da água da dívida.

Erros acontecem. O que não se admite é a insistência neles, a despeito de todos os alertas em contrário. Não é de hoje que o governo vem sendo criticado pelo seu samba de uma nota só na economia, o do incentivo ao consumo desenfreado – e justamente no momento em que o mundo todo discute como tornar o planeta mais sustentável e menos agredido pelos excessos.

Não é de hoje também que se pede mais celeridade para destravar investimentos privados, concessões, parcerias público-privadas no país. Mas, aos apelos, novamente a gestão petista responde com promessas tardias, voltadas agora a incitar o “espírito animal” do empresariado – apenas, porém, no ano que vem, porque neste Inês já é morta.

Em dezembro, Mantega falava que havíamos batido “no fundo do poço” e começaríamos a decolar. Meses depois, afirmou que “ter 2,7% como piso de crescimento tá é muito bom”. Em ambos os casos errou feio, mas nem na primeira nem na segunda ocasião foi desautorizado pela presidente. Caberia agora a ambos justificar por que alcançar o pibinho de 2011 tornou-se tarefa impossível.

terça-feira, 19 de junho de 2012

Rio+20: Empurrando com a barriga

O Brasil assumiu na semana passada a condução das negociações da Rio+20 e foi logo causando frisson. Apresentou no sábado uma versão desidratada do documento destinado a ser a síntese da conferência. Nela, as ambições são reduzidas e os prazos, postergados. É o velho estilo petista de enfrentar problemas: empurrando com a barriga.

Depois de meses de negociações, os 193 países envolvidos na Rio+20 ainda estão longe de se aproximar de um consenso. Há mais conflito do que acordo, mais controvérsias do que convergências. Apenas questões paralelas obtêm a aprovação unânime exigida pela ONU em seu processo decisório.

Foi neste ambiente que o Brasil, como país-sede da conferência, assumiu a condução do processo negociador na semana passada. A expectativa era de que a diplomacia brasileira desempenhasse uma postura de liderança e conseguisse destravar alguns impasses. Mas bastaram algumas horas para que a frustração prevalecesse.

A proposta apresentada neste fim de semana pelo Itamaraty mostra-se tímida demais para a urgência que a falta de perspectivas de desenvolvimento sustentável para o mundo tal como hoje estão os padrões de produção e consumo exige.

Foram retirados do texto menções à criação de fundos para financiar práticas mais sustentáveis, que desagradavam o grupo de nações mais ricas e atualmente mergulhadas em crise econômica. Vale lembrar que a Rio+20 começara com estardalhaço trazendo a perspectiva de adoção imediata de um fundo de US$ 30 bilhões, que agora virou fumaça.

A definição de metas e objetivos de desenvolvimento sustentável também foi jogada para frente, mais precisamente para 2015. Questões cruciais como o fim de subsídios a combustíveis fósseis foram igualmente excluídas da nova versão apresentada pelos diplomatas brasileiros.

A reação veio imediata, tanto de parte dos negociadores quanto de entidades da sociedade civil. A proposta brasileira mereceu ampla desaprovação. Com ela, a diplomacia de Dilma Rousseff ganhou até prêmio das entidades ambientalistas: o de “fóssil do dia”.

A Climate Action, rede internacional que congrega mais de 700 organizações não governamentais que lutam pela sustentabilidade, considerou que “o Brasil está perdendo a chance de ser uma força frente às ambições crescentes, à esperança e à confiança que o mundo depositou em seus ombros”.

O Greenpeace foi mais longe e colocou os negociadores brasileiros na posição de arautos do apocalipse. “Se adotado por completo, o texto (...) condenaria o mundo a um futuro de poluição, destruição e fraude”. Vai mal a liderança brasileira...

O descontentamento não foi apenas de radicais ambientalistas. Está também na comitiva europeia, por exemplo. Mesmo o continente atualmente mais prejudicado pela debacle econômica gostaria de ver mais ousadia no Brasil. “O texto não tem a ambição necessária, sobretudo no que diz respeito ao desenvolvimento sustentável e à economia verde”, avaliou Janez Potocnik, comissário da União Europeia para o Meio Ambiente.

Palavras e verbos polêmicos foram substituídos por termos mais amenos pelos negociadores brasileiros. A estratégia poderia ser ferramenta útil para transpor impasses, mas de tão exacerbada acabou por transformar a proposta alternativa apresentada pelo Itamaraty numa saída anódina e, pior, num mau caminho rumo a um necessário mundo mais sustentável.

Na realidade, a comunidade diplomática internacional está sendo apresentada a uma velha prática das gestões do PT: a de sempre deixar para amanhã decisões cruciais para o destino do país, apostando que a maré pode virar por conta própria. Trata-se de uma onipresente e prejudicial lei do menor esforço vigente entre os petistas.

Não é preciso procurar muito para ver paralelos entre a diplomacia protelatória que o Itamaraty pôs em marcha na Rio+20 e as delongas que marcam as decisões – ou melhor, a falta delas – no governo Dilma, assim como já ocorria na era Lula. Aqui, jogar a solução de um problema para frente tornou-se o esporte preferido da administração federal. Agora, contudo, o que está sendo colocado em xeque não é apenas o futuro do Brasil, e sim o de todo o planeta.

sábado, 16 de junho de 2012

A Petrobras na encruzilhada

É sempre relevante quando um gigante como a Petrobras revela seus planos para o futuro. A companhia anunciou ontem que investirá mais e produzirá menos até 2016. Também diminuirá seus projetos baseados em fontes renováveis, em favor de energias sujas. Políticas equivocadas definidas por Brasília estão desvirtuando as perspectivas da maior empresa do país.

A Petrobras divulgou seu plano de negócios para 2012-2016, período em que prevê investir US$ 236,5 bilhões. O valor representa aumento de 5% em relação à previsão anterior. Em contrapartida, a estatal agora estima produzir 15% menos do que previa estar produzindo em 2015. Conclusão lógica: empresa que investe mais para produzir menos gera menos resultados, é menos eficiente. Naturalmente, as ações da companhia despencaram.

Neste e no próximo ano, a produção da empresa se manterá estável. Com isso, a Petrobras terá completado cinco anos estagnada. Não por coincidência, trata-se do mesmo período desde que, com enorme oba-oba, o então presidente Lula e sua pupila Dilma Rousseff anunciaram a redenção do país na forma do novo marco regulatório do petróleo e do pré-sal. Está se vendo no que deu...

A Petrobras está garroteada pelo cabresto que o Planalto lhe impôs. A empresa não consegue avançar na produção e no refino porque tem de obedecer a uma política de conteúdo nacional mínimo que não encontra fornecedores à altura no país. Por esta razão, o Brasil tem tido, inclusive, que importar quantidades crescentes de combustível.

Há atrasos em todas as grandes obras da estatal, de sondas de perfuração a novas refinarias – algumas das quais, como as do Ceará e do Maranhão, caminham para ser arquivadas. Há também sobrepreços em relação ao mercado mundial: a Petrobras se vê obrigada a gastar mais para obedecer às ordens de Brasília.

Para complicar um pouco mais, a empresa tornou-se um dos esteios do governo federal para manter a inflação controlada. A despeito de uma defasagem que hoje chega a 15% em relação ao mercado internacional, a companhia é obrigada a manter congelados os preços dos combustíveis que vende. Perde dinheiro.

A política traçada pelo governo petista para o setor de petróleo no país não atravanca apenas a vida da Petrobras. Paralisa, também, suas concorrentes. Desde 2008, a Agência Nacional do Petróleo não licita novas áreas de exploração e só prevê tornar a fazê-lo no ano que vem. Com isso e com as dificuldades que a estatal vem enfrentando, as riquezas do pré-sal continuam nas profundezas do Atlântico, praticamente intocadas.

Os novos planos da companhia também vão na contramão do mundo em tempos de Rio+20. A participação dos biocombustíveis nos investimentos da Petrobras cairá de 2% para 1,6% do total, “deixando clara uma mudança de foco na empresa que, no plano anterior, previa aumentar de 5% para 12% sua participação no mercado de etanol”, destaca a Folha de S.Paulo.

A Petrobras destoa, assim, da urgência reinante no mundo em direção a uma economia de baixo carbono. Mas não destoa da orientação equivocada que o próprio governo brasileiro dá ao setor de combustíveis: no país do etanol, 81% da matriz provém de combustíveis fósseis, segundo os consultores Adriano Pires e Abel Holtz. Recorde-se que, em 2011, enquanto o consumo de gasolina cresceu 19%, o de etanol caiu 28%, reforçando o desequilíbrio.

Tal situação desmente, na prática, as palavras da presidente Dilma, que ontem louvou a produção brasileira de etanol: “O Brasil, hoje, tem uma matriz energética das mais renováveis do mundo, porque tem, na sua composição, principalmente na matriz de combustível, o etanol”, disse ela. Vê-se que, se dependesse dos estímulos que partem do governo, provavelmente estaríamos sujando um pouco mais o planeta.

A Petrobras tem poder ímpar não só de movimentar a economia, mas também de influenciar a vida de milhões de pessoas e a saúde do ecossistema. Os passos de um gigante como ela têm consequências imediatas para o futuro do Brasil. Mas, já há alguns anos, a maior companhia do país tem se mostrado trôpega, desnorteada com as rasteiras que Brasília lhe passa. 

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Enfim um apoio aos estados

O governo federal finalmente resolveu admitir o que há muito já se sabia: os estados são muito mais eficientes que o poder central para realizar investimentos. Em vista disso, é positiva a decisão da gestão Dilma Rousseff de transferir recursos às unidades subnacionais para destravar as obras necessárias ao desenvolvimento do país.

Estima-se que estados e municípios respondam por cerca de dois terços dos investimentos públicos no Brasil. Mas, ao invés de reconhecer isso, nos últimos anos o governo federal só agiu para atrapalhá-los, impondo-lhes entraves e retirando-lhes oxigênio e recursos – como no caso das desonerações fiscais baseadas na redução de impostos que compõem os fundos de participação.

A boa-nova é que, a partir de agora, os governadores deverão passar a contar com uma nova linha de crédito do BNDES no valor de R$ 10 bilhões, a ser provavelmente oficializada amanhã pela presidente. Também poderão tomar empréstimos no Banco do Brasil até o limite de R$ 39 bilhões.

É de se questionar por que o governo petista demorou tanto para enxergar o óbvio. É gritante a distância que separa a capacidade dos estados de executar investimentos da que exibe a União. Na área federal, o volume despendido em obras atualmente é o menor em três anos – razão pela qual a economia brasileira deverá sofrer severa desaceleração neste ano, com ritmo ainda menor do que o do pibinho de 2011.

Infelizmente, a medida ora conhecida não chegará a tempo de ajudar a levantar o PIB neste ano, seja por limitações fiscais, seja pelo cronograma eleitoral, que impede a concessão de empréstimos entre 7 de julho e a data de realização do segundo turno das eleições municipais.

Além disso, será importante atentar para a posterior regulamentação das operações de empréstimo e a fixação dos limites de endividamento de cada estado, função a cargo do Conselho Monetário Nacional. Há risco de manipulação.

“O CMN poderá favorecer governos regionais aplicando critérios meramente políticos, num momento em que as eleições municipais estarão na fase mais ativa. (...) É preciso que os critérios sejam unicamente técnicos, levando em conta as necessidades de cada estado e seus compromissos”, alerta O Estado de S.Paulo em seu editorial econômico de hoje.

Também se espera que – da mesma forma que, ainda que tardiamente, enxergou na proeminência dos estados uma possibilidade de destravar os investimentos públicos – o governo central também acelere ações em favor dos empreendimentos privados nas demais áreas. Porque, até agora, tem feito justamente o contrário.

Tome-se o que acontece nas concessões dos aeroportos. Apenas hoje, 45 dias após a data prevista no cronograma inicial, devem ser assinados os primeiros contratos repassando a exploração de três terminais – Guarulhos, Viracopos e Brasília – a empresas privadas. Com prazo exíguo para realizar as melhorias necessárias até a Copa de 2014, cada dia a menos é uma agonia a mais para concessionários e, principalmente, usuários.

Além da demora na assinatura dos contratos, frustrou-se a expectativa de hoje também ser anunciada a abertura do processo de privatização de mais terminais, entre eles Galeão e Confins. Novamente, a hipercentralização das ações do governo federal nas mãos da presidente da República postergou a decisão.

Até aqui, quando instado a agir para destravar obras emperradas, a única medida que o governo federal havia sido capaz de articular fora a implosão da Lei de Licitações, em favor do vale-tudo do Regime Diferenciado de Contratação, agora estendido a toda a carteira do PAC. O incentivo à realização de investimentos públicos por parte dos estados pode ajudar a melhorar um cenário que se apresenta desolador.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Um anfitrião atrapalhado na Rio+20

A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, começa hoje sem grandes chances de produzir resultados significativos. Como anfitrião, esperava-se que o Brasil capitaneasse as discussões em prol de um mundo mais próspero, ambientalmente mais correto e socialmente mais justo. Mas faltou liderança.

É importante que encontros desta natureza gerem comprometimentos formais por parte dos participantes. São estas as poucas oportunidades de se obter, de fato, a aderência de um largo número de nações a uma orientação comum. Na Eco-92, por exemplo, logrou-se alcançar uma declaração com compromissos globais de combate ao desmatamento e ao aquecimento. Houve então, portanto, avanços.

No caso da Rio+20, o rascunho da declaração nasceu com menos de 20 páginas, pulou para quase 200 e segue por aí, indicando as dificuldades dos negociadores de focar as discussões. De todo o texto, apenas cerca de 20% obtiveram consenso entre os países-signatários até agora. Tudo o mais ainda é passível de debate, o que permite concluir que dificilmente a cúpula que começa na próxima semana conseguirá produzir um documento à altura das necessidades do planeta.

“A conferência não produzirá tratados marcantes como as convenções sobre mudança do clima e biodiversidade adotadas na Eco-92, duas décadas atrás. O documento final será provavelmente uma declaração anódina sobre economia verde, mais um slogan que preocupação real de governos e empresas”, previu a Folha de S.Paulo em editorial no domingo.

O esforço dos países – e, em especial, dos anfitriões brasileiros – em direção a um novo acordo em torno do desenvolvimento sustentável deveria ser ainda maior depois que se tornaram conhecidas as conclusões do Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) sobre o desenrolar das metas ambientais estipuladas nos últimos 40 anos.

Constatou-se um fracasso quase absoluto. Das 90 metas ambientais estabelecidas pela comunidade internacional em 1972, ano do primeiro grande encontro mundial sobre o tema, apenas quatro registraram avanços significativos. Em outras 24, o mundo estagnou e, em 14, o cumprimento dos objetivos sequer pôde ser medido, por falta de informações.

Para piorar, oito metas apresentaram retrocessos – entre os mais dramáticos está o aumento da poluição do ar, responsável, diretamente, por 6 milhões de mortes prematuras por ano. O mundo também andou para trás em objetivos relacionados a mudanças climáticas, desertificação, seca e manutenção dos recifes de coral no mundo.

Não apenas como anfitrião, mas também pelo potencial ímpar de que dispõe, o Brasil poderia liderar as discussões rumo ao desenvolvimento global sustentável. Mas o que menos se viu nos últimos meses foi algum protagonismo do governo Dilma Rousseff no debate e na preparação da Rio+20.

A esta altura, os anfitriões parecem se dar por satisfeitos se a conferência não descambar para problemas de logística e organização. A preocupação é tamanha que a própria presidente se lançou na microgestão da cúpula, num claro sinal de que lidera uma equipe com evidentes deficiências de desempenho.

“Dilma supervisiona pessoalmente a estrutura da conferência e chegou até a analisar o mapa de chegada dos chefes de Estado, calculando com a caneta o tempo de aterrissagem para evitar que os voos se sobrepusessem e tumultuassem a chegada de delegações estrangeiras”, relatou a Folha na segunda-feira. Não tem como funcionar.

O descompasso e as dificuldades em lidar com a Rio+20 talvez possam ser explicadas pela postura da presidente e sua renitente adesão aos princípios da sustentabilidade. Desde que assumiu o Ministério de Minas e Energia, e depois como ministra da Casa Civil, ela sempre optou por confrontar os valores do conservacionismo. E assim se mantém.

Seu governo adota como lema “crescer, incluir e conservar”, deixando clara qual é a ordem de suas prioridades. Não é de hoje que Dilma flerta com posturas antagônicas ao que propugnam os novos tempos de defesa do patrimônio ambiental e do desenvolvimento mundial sustentável. Em linha com seu temperamento, continua a agir como trator. Apresenta-se, portanto, como a pior líder com que a Rio+20 poderia contar.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

A miopia oficial na Rio+20

O Brasil chega mal à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, que começa oficialmente amanhã. O país que sediará a Rio+20 poderia estar apresentando ao mundo formas modernas de produzir, em harmonia com a conservação ambiental, mas estreará no evento tendo até uma ministra de Meio Ambiente que defende mais carros nas ruas e consumo ascendente de bens supérfluos.

Num momento em que o futuro do planeta aponta para uma economia de baixo carbono, o Brasil se apresentará como país em que a produção de carros movidos a gasolina é mais incentivada que a de modelos elétricos; onde etanol paga tanto ou mais tributo que combustível fóssil; e onde a geração de energia baseia-se cada vez mais em fontes sujas.

Parece, contudo, que a nossa ministra de Meio Ambiente não vê problema algum nisso. Izabella Teixeira considera que as recentes medidas de incentivo ao consumo, inclusive de carros, anunciadas pelo governo Dilma Rousseff não colidem com metas sustentáveis de longo prazo que as nações de todo o mundo tentarão traçar na Rio+20.

Segundo ela, pôr mais carro para circular é algo salutar: “Temos empregos e a indústria está em jogo”, afirmou a ministra em debate no Rio, segundo O Estado de S.Paulo. “Tem limite para a miopia ambiental. (...) Temos de debater como gente grande. Vamos acabar com o achismo ambiental.” Na realidade, a miopia – ou seja, a incapacidade de enxergar longe – parece acometer é o governo brasileiro.

Não só no curto prazo, mas também em estratégias de horizonte mais longo, o Brasil tem trilhado caminhos ambientalmente equivocados, de alcance meramente imediatista. Sob a ótica da sustentabilidade, o país que tem uma das melhores condições de desenvolver uma economia verde, com a produção agropecuária se expandindo sem devastar o meio ambiente, tem adotado políticas condenáveis nos últimos anos.

É o que acontece, por exemplo, no setor de combustíveis. Uma estratégia caolha de contenção da inflação transformou o Brasil de antigo maior produtor mundial de etanol em importador do produto – vindo dos EUA – e grande consumidor de gasolina. Na contramão do mundo, a política oficial, seja por meio do congelamento de preços da Petrobras, seja por tributação, incentiva as fontes mais poluentes.

Em 2011, enquanto o consumo de derivados de petróleo no país cresceu 19%, o de etanol caiu 29%. Ao mesmo tempo, a tributação sobre a gasolina, por meio da Cide, foi reduzida de 14% para 2,6%. “Enquanto as nações se debruçam para encontrar soluções capazes de esverdear sua (suja) matriz energética, por aqui se desperdiça uma oportunidade de ouro, retrocedendo no uso do combustível renovável”, escreve Xico Graziano hoje no Estadão.

Da mesma forma, pode-se citar a opção pelo transporte rodoviário, em detrimento das alternativas ferroviária e hidroviária, muito menos agressivas ao meio ambiente. Atualmente, caminhões são responsáveis por dois terços de toda a carga movimentada no país, enquanto os outros dois modais somam apenas cerca de 31%, segundo a CNT.

Expandir nossas ferrovias ou tornar nossos rios navegáveis tem sido tarefa hercúlea nos meandros da burocracia petista. Exemplos clamorosos são o da ferrovia Norte-Sul – cuja conclusão foi novamente postergada, agora para fins de 2013 – e a demora do governo federal para realizar obras de derrocamento (retirada de rochas do leito) de rios como o Araguaia e o Tocantins.

Outra péssima experiência a ser mostrada pelo Brasil na Rio+20 é o incremento do uso de combustíveis fósseis para a produção de energia. O país que tem a maior disponibilidade hidráulica do mundo tem usado crescentemente fontes sujas, como óleo diesel e carvão, para gerar eletricidade.

Alternativas ascendentes em todo o mundo, como a energia eólica e a solar, ainda são tratadas aqui como “fantasia”, como a elas se referiu a presidente da República em abril passado. Nos próximos dez anos, a composição da matriz brasileira não deverá sofrer alteração, com as fontes não renováveis mantendo o mesmo peso que exibem hoje, enquanto o resto do planeta caminha na sua redução.

Como anfitrião da Rio+20, o Brasil deveria envergonhar-se de exibir credenciais como estas. Ter uma ministra de Meio Ambiente que se orgulha de ver as ruas do país tomadas por carros também não ajuda. Na nova agenda mundial da sustentabilidade, quem está míope é o governo brasileiro. Faltam-lhe lentes para enxergar mais longe.

terça-feira, 12 de junho de 2012

Hora de julgar o mensalão

Bastou o Supremo Tribunal Federal fazer o que dele a sociedade brasileira espera para o PT mostrar suas garras. O anúncio da data de julgamento do maior escândalo da história política do país deflagrou os arreganhos autoritários de sempre nos capas-pretas do partido. Como tudo o que cerca o mensalão, os convocados do PT para a “batalha” também têm muito a dever à Justiça.

Em 1° de agosto, desde já uma data histórica para o país, o STF começará a julgar o caso. Com o cronograma previsto, por volta de fins de setembro as sessões do julgamento terão terminado e o Brasil terá, enfim, passado o episódio a limpo, condenando quem merece a pagar pelo que fez e livrando quem nada deve.

Algo simples assim, pelo menos em democracias, está sendo tratado pelo PT quase como um golpe de Estado. É a velha dificuldade que os partidários de Lula, Dilma Rousseff e José Dirceu têm de conviver com o contraditório, dentro dos estritos marcos legais de um Estado democrático de Direito.

O primeiro a espernear foi o secretário de comunicação petista. “Infelizmente, as ações do Supremo não são cercadas da austeridade exigida para uma Corte Suprema”, disse o deputado André Vargas na quinta-feira a O Globo.

No sábado, foi a vez do ex-ministro Márcio Thomaz Bastos – o mesmo que, por R$ 15 milhões, defende o contraventor Carlos Cachoeira, envolvido em grosso desvio de dinheiro público no submundo da política. Em entrevista à BandNews, o advogado disse que a imprensa “tomou partido” contra os réus do mensalão.

Mas quem foi mais longe na afronta a um dos poderes da República foi, como sempre, o ex-ministro e deputado cassado José Dirceu. O chefe da “sofisticada organização criminosa” denunciada pelo Ministério Público Federal conclamou os militantes da UNE a ir para as ruas defendê-lo.

“Todos sabem que este julgamento é uma batalha política. E essa batalha deve ser travada nas ruas também porque se não a gente só vai ouvir uma voz, a voz pedindo a condenação. Eu preciso do apoio de vocês”, discursou Dirceu, conforme registrou O Globo Online na noite de sábado.

Dirceu é o mesmo que, nos idos dos anos 1990, incitou grevistas de escolas de São Paulo a fazer os governantes tucanos do estado “apanhar nas ruas e nas urnas”. Como se vê, os métodos truculentos continuam os mesmos, só os aliados da hora é que mudaram.

Os domesticados militantes da UNE, outrora protagonista de importantes ações em defesa da democracia e do Estado de Direito no país, agora precisam se ocupar em explicar como gastam em farra e bebedeira dinheiro público repassado para capacitação de estudantes e promoção de eventos culturais e esportivos.

Investigação feita pelo Ministério Público aponta irregularidades em convênios do governo federal com a UNE e a União Municipal dos Estudantes Secundaristas (UMES) de São Paulo, que receberam R$ 12 milhões da União entre 2006 e 2010 e usaram notas frias para comprovar os gastos. São aliados desta natureza que Dirceu espera ter na sua “batalha” pela absolvição no Supremo.

“Ao analisar as prestações de contas do convênio do Ministério da Cultura com a UNE para apoio ao projeto Atividades de Cultura e Arte da UNE, o procurador [Marinus] Marsico constatou gastos com a compra de cerveja, vinho, cachaça, uísque e vodca, compra de búzios, velas, celular, freezer, ventilador e tanquinho, pagamento de faturas de energia elétrica, dedetização da sede da entidade, limpeza de cisterna e impressão do jornal da UNE. Além disso, encontrou diversas notas emitidas por bares”, mostrou O Globo na sexta-feira.

O escândalo do mensalão foi conhecido há sete anos e há cinco a denúncia foi apresentada ao Supremo. Neste ínterim, o então presidente Lula – que hoje diz que tudo não passa de uma “farsa” – chegou a pedir desculpas pelo malfeito. Já passa da hora de julgar o caso, algo que os ministros têm plena condição de fazer dentro dos estritos cânones do Direito.

O país só tem a perder com maiores delongas. Basta ver o que está acontecendo, novamente, no Banco do Nordeste. Lá, o mesmo grupo de petistas mensaleiros envolvido no folclórico episódio dos dólares escondidos na cueca está de novo enredado em escândalos e desvios de dinheiro público, como mostrou a edição da revista Época desta semana.

A reação irada de gente como José Dirceu à decisão do Supremo – tomada, aliás, por unanimidade pelos ministros da corte – deixa claro o horror que o PT tem do acerto de contas que terá de fazer com a sociedade brasileira por ter alimentado, durante anos, o maior duto de desvio de dinheiro público da história do país e que até hoje serve de inspiração para malfeitores ao redor do Brasil.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

A marolinha que não passa

Baixou o santo de Lula em Dilma Rousseff. Como o ex-presidente, ela parece crer que, com muita saliva, vai espantar a crise. Nos últimos tempos, dia sim, dia também, tem lançado frases de efeito para dizer que o país não vai ser tragado pela desaceleração da economia. Infelizmente, já foi.

Ontem, a presidente afirmou, em discurso por ocasião da abertura oficial dos debates da Rio+20, que “quem aposta na crise, como alguns quatro anos atrás, vai perder de novo”. Dilma refere-se à “marolinha” a que Lula tentou reduzir o tsunami recessivo que assola o mundo desde 2008 e até hoje não passou. No Brasil, não foi diferente. Basta olhar os números.

Desde então, o comportamento do PIB foi errático, e medíocre. Em 2009, queda de 0,3%, a primeira desde o calamitoso governo de Fernando Collor. No ano seguinte, exuberantes, e insustentáveis, 7,5%, obtidos à base de muito estímulo ao crédito e ao consumo, gastos públicos desmesurados e recidiva inflacionária.

Em 2011, primeiro ano da gestão Dilma, o resultado alcançado foi o pibinho de 2,7%. A presidente e sua equipe rebolaram para tentar convencer o distinto público que se tratava de um ponto fora da curva ascendente do crescimento brasileiro. Chegaram a prometer expansão de 5% para 2012, mas, pelo que se observa agora, ela mal deve encostar na média do ano passado.

Ou seja, quem “apostou na crise” há quatro anos, como disse a presidente, acertou. Desde então, tivemos uma recessão, um PIB inchado por anabolizantes, um resultado medíocre e um quarto ano igualmente decepcionante no horizonte. Se conseguirmos repetir em 2012 o pibinho do ano passado, teremos obtido uma expansão média anual de 3,1% a partir de 2008.

Numa lista de 24 economias emergentes, alcançamos apenas o 15° lugar no ranking pós-2008. Alargando o período de análise, quando considerados os últimos dez anos, e a se confirmarem os anémicos prognósticos para 2012, o Brasil terá avançado exatamente à mesma taxa média mundial, nem mais nem menos: 45%.

“Será mais do que as economias desenvolvidas e menos do que outros países emergentes. Nos dez anos terminados em 2012, a China terá crescido nada menos que 160%. (...) Crescemos com o mundo e como ele – não lideramos nada”, analisou Luís Eduardo Assis n’O Estado de S.Paulo na semana passada.

As razões para a derrocada são sobejamente conhecidas: uma opção equivocada pelo incentivo ao consumo em detrimento da realização de investimentos necessários à decolagem do país. Novos levantamentos publicados hoje nos jornais dão contornos claríssimos à má condução da economia sob Dilma.

Os investimentos públicos não estão apenas desacelerando em relação ao ano passado; estão no nível mais baixo desde 2009. Ou seja, são hoje os menores dos últimos três anos. Em valores corrigidos, de janeiro a maio deste ano os desembolsos chegam a R$ 14,3 bilhões, ante R$ 14,7 bilhões em 2011 e R$ 17,7 bilhões em 2010, informa o Estadão.

Em termos reais, isto é, já descontada a inflação do período, a queda é de 2,7% na comparação com o ano passado e de 19,2% sobre 2010. Como é que a “gerente” Dilma explica desempenho tão ruim? Na outra ponta, os gastos correntes aumentaram R$ 13 bilhões reais até abril, segundo Alexandre Schwartsman, na Folha de S.Paulo.

Também O Globo mostra que, nem somando os restos a pagar, a situação melhora. Com base em números levantados pelo DEM, o jornal informa que, até maio, os ministérios de Transportes, Integração Nacional e Cidades – responsáveis por obras de infraestrutura – executaram apenas 15% dos investimentos previstos para o ano, bem abaixo da média razoável.

De uma dotação de R$ 33,3 bilhões aprovada pelo Congresso para as três pastas, foram gastos R$ 5 bilhões até maio. No mesmo período de 2011, as três pastas já haviam executado 24% dos investimentos previstos – ruim, mas não tanto quanto agora. Quando se considera somente o Orçamento de 2012, até abril o Ministério dos Transportes, por exemplo, só aplicara R$ 40 milhões dos R$ 17,7 bilhões reservados.

Uma das formas que o governo petista encontrou para mascarar o mau desempenho foi passar a computar os subsídios destinados à equalização das taxas de juros dos financiamentos do Minha Casa, Minha Vida como investimentos. Trata-se de uma tremenda mandracaria. Tanto que, quando se observa o número de residências efetivamente construídas, o resultado é pífio.

Segundo o Valor Econômico, das 1,2 milhão de moradias para famílias de baixa renda prometidas para a segunda fase do programa, lançada no início do ano passado, apenas 191 mil foram contratadas e menos de 4 mil foram entregues até agora. E das 418 mil previstas na primeira fase, iniciada três anos atrás, só 159 mil (38%) ficaram prontas.

No dia a dia de seu governo, Dilma Rousseff tem demonstrado, sobejamente, que sua propalada competência para bem gerir é uma fantasia. Talvez por isso, a presidente esteja agora apelando para a tentativa de se transformar em boa oradora. Mas à revelia da realidade e só com saliva, a economia brasileira não levanta.

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Verniz verde num governo acinzentado

A menos de dez dias para o início da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, o governo brasileiro resolveu agir para dar um verniz ambiental a suas ações. Mas a postura da gestão Dilma Rousseff nesta seara é devastadora: há muito tempo não se viam tantos retrocessos no país em relação à preservação do meio ambiente.

No Dia Mundial do Meio Ambiente, comemorado hoje, a presidente deve anunciar um pacote de medidas que inclui a criação de duas reservas extrativistas e seis indígenas, além de novas regras para incentivar compras públicas de produtos sustentáveis.

Trata-se de tentativa de romper um jejum que vem desde o início do atual governo. Dilma notabiliza-se por ser a presidente que menos criou novas unidades de conservação no país – modelo criado em 2000 e que já resultou na implantação de 728 áreas protegidas, entre parques, reservas, estações, florestas e refúgios. Se confirmadas, as reservas anunciadas hoje serão as primeiras da atual gestão.

Não contente por ter freado a expansão de unidades de conservação, o governo da petista também agiu para diminuí-las. A medida provisória n° 558, recém-aprovada no Congresso, reduzia em 170 mil hectares as áreas de sete unidades da Amazônia, destinando-as à construção de usinas hidrelétricas. Modificações incluídas pelos parlamentares, porém, compensaram a diminuição prevista no texto original da MP com a ampliação de outras áreas.

Já a política de compras sustentáveis que a presidente deve anunciar parece piada de mau gosto, tamanha a sua timidez. Fala-se em tentar adquirir R$ 100 milhões em itens menos nocivos ao meio ambiente. No ano passado, tais operações somaram R$ 14,6 milhões. Para se ter ideia de quão pouco isso representa, basta lembrar que, em 2011, o setor público federal adquiriu um total de cerca de R$ 63 bilhões em produtos e serviços.

Dilma Rousseff nunca foi reconhecida como uma senhora amiga do meio ambiente. Seus embates com a área à época em que ocupava a chefia da Casa Civil no governo Lula tornaram-se folclóricos. Na presidência, ela deu tratos à imagem de devastadora, mas cuidou de manter o trator ligado.

Em novembro passado, por exemplo, lançou um rol de medidas para “destravar” o rito de licenciamento ambiental exigido no país. Em linhas gerais, impôs prazos exíguos (de até 90 dias) e reduziu as possibilidades tanto de apuração dos órgãos licenciadores – cujas estruturas são minguadas – quanto de alegações dos empreendedores.

A opção estratégica adotada pelo país nos últimos anos também está em franca oposição à desejada economia de baixa emissão de carbono. Tem sido crescente, por exemplo, a participação de fontes não renováveis na geração de energia elétrica. A tendência, recente, não deve inverter-se.

Segundo a EPE (Empresa de Planejamento Energético), ao contrário do que acontece em todo o resto do mundo, não deve haver alteração significativa na composição da matriz de geração energética nos próximos dez anos no país: as fontes renováveis deverão variar de 45,5% em 2011 para 46,2% em 2020 e as não renováveis, de 54,5% para 53,8%.

Exemplo do alheamento do governo Dilma em relação ao meio ambiente é o pacote recém-anunciado de apoio ao consumo e à indústria automobilística, em aberta oposição às melhores práticas de sustentabilidade que orientam políticas públicas ao redor do planeta.

Não há um mísero incentivo ao uso de veículos movidos a combustíveis não fósseis: hoje, o Brasil chega ao cúmulo de cobrar menos imposto de um carrão que emite 100 gramas de CO2 por quilômetro rodado do que de um carro elétrico que emite zero carbono – simplesmente por este ser importado. O que prevalece é sempre a visão imediatista.

A baixa capacidade do governo para articular medidas favoráveis à preservação ambiental também ficou evidente com a tramitação e o posterior veto presidencial ao novo Código Florestal. Mesmo com sua gigantesca base de sustentação, o Planalto foi incapaz de construir uma proposta de consenso no Congresso, e agora amarga mais de 620 emendas à MP editada sobre o tema.

Mesmo propostas positivas, como a criação do Fundo Amazônia, não decolam por excesso de burocracia e baixa adesão do governo, como mostra hoje a Folha de S.Paulo. O mecanismo – que pode vir a contar com US$ 1 bilhão do governo norueguês para ações de combate ao efeito estufa – empacou nas exigências do BNDES, responsável por repassar os recursos a fundo perdido: transcorridos quatro anos, apenas R$ 259 milhões foram firmados.

Entidades de defesa do meio ambiente não têm dúvida de que a atual gestão representa o “maior retrocesso da agenda socioambiental desde o final da ditadura militar, invertendo uma tendência de aprimoramento da agenda de desenvolvimento sustentável que vinha sendo implementado ao longo de todos os governos desde 1988”, conforme documento divulgado em março passado.

Sob o comando de Dilma Rousseff, o governo federal não tem demonstrado capacidade nem ousadia para articular propostas aderentes aos novos tempos, em que a sustentabilidade tem importância central. Numa atitude acomodatícia, o difícil é sempre deixado para depois. É um triste papel para o país que irá sediar a conferência da ONU que deveria servir para redefinir o futuro de um planeta cada vez mais sufocado em cinza.

terça-feira, 5 de junho de 2012

Hora de mudar

O péssimo resultado do PIB brasileiro no primeiro trimestre do ano produziu uma rara convergência de avaliações sobre a gestão da economia no governo Dilma Rousseff: o caminho perseguido até agora está equivocado, não está produzindo resultados positivos e precisa ser mudado. É hora de humildade para redirecionar o rumo e evitar o pior.

Os dados do IBGE mostraram que a alternativa de levantar o PIB por meio da expansão do consumo, definitivamente, deixou de funcionar. A demanda das famílias ainda cresce, mas num ritmo incapaz de contrabalançar a anemia de outras áreas, principalmente os investimentos – tanto os públicos, quanto os privados.

Há anos ouvem-se clamores para que o governo realize os investimentos necessários para melhorar as condições de competitividade do país. Há anos o que se vê, como resposta, é um desempenho medíocre das gestões petistas neste quesito. Foi assim com Lula, continua sendo assim com Dilma.

Neste ano, os investimentos federais correspondem a 0,9% do PIB, menos que o registrado em 2010 (1,2%) e em 2011 (1%). Especificamente em infraestrutura, investe-se hoje menos que na década de 80 – aquela que era chamada de “perdida” até pouco tempo atrás: segundo a OCDE, são 0,4% do nosso PIB, menos da metade da média mundial.

A crítica situação atual dos investimentos representa uma espécie de acerto de contas com os descalabros em série produzidos ao longo de toda a era petista. O Estado não apenas não fez a sua parte, como também erodiu as condições para que os empreendedores privados fossem adiante.

As condições de concorrência se deterioraram com o aumento da intervenção estatal nas condições de mercado, marca dos governos petistas. Com os vencedores sendo escolhidos nos gabinetes brasilienses, investir para produzir mais tornou-se temerário.

Ao mesmo tempo, a estrutura regulatória – tão cuidadosamente erigida na era Fernando Henrique Cardoso – foi sendo, dia após dia, implodida. Em toda e qualquer área, passou a imperar a discricionariedade e o interesse político-partidário. Quem se aventura a investir num ambiente assim?

Estímulos ao investimento privado jamais foram adotados. As parcerias público-privadas continuam engavetadas. Concessões e privatizações demoraram anos para serem retomadas, levando nossa infraestrutura literalmente para o buraco. Com tanto desincentivo, não é surpresa que seja tão difícil acreditar na decolagem do Brasil.

Mais alguns números servem para ilustrar a marcha à ré. Os investimentos em infraestrutura viária feitos neste ano até agora representam apenas metade do que foi aplicado no mesmo período de 2011. O Dnit está paralisado, com 55% da malha rodoviária nacional, ou 33 mil quilômetros de estradas, sem contratos de manutenção e recuperação, como mostra hoje o Valor Econômico em manchete.

Outro exemplo: por absoluta incompetência gerencial, o governo não consegue concluir uma das mais importantes obras logísticas do país, a ferrovia Norte-Sul. A estatal Valec deixou vencer contratos com empreiteiras e a obra só ficará pronta no ano que vem, prolongando sobrecustos de transporte que chegam a R$ 12 bilhões ao ano, informou a Folha de S.Paulo ontem.

Para piorar, as intenções de investimento nos próximos quatro anos já diminuíram R$ 35 bilhões, segundo O Estado de S.Paulo. As maiores quedas são em siderurgia, celulose, petroquímica e eletroeletrônicos. Neste ano, os gastos em máquinas e equipamentos – ou seja, em modernização e aumento de produção – devem cair 11%, de acordo com a Fiesp.

Se os empresários brasileiros tiraram o pé do acelerador, os estrangeiros pisaram fundo no freio: investimentos em carteira caíram de US$ 17,4 bilhões no primeiro quadrimestre de 2011 para apenas US$ 3,2 bilhões neste ano. O encantamento e a euforia com o país “não existem mais”, como atestam até aliados importantes do petismo, como o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles.

Diante desta avalanche negativa, as expectativas estão convergindo pesadamente para baixo. Há pouco, o BC divulgou que a previsão para o PIB deste ano afundou para 2,72%. Foi a quarta queda seguida de um prognóstico que não costuma ser alterado tão bruscamente em tão curto espaço de tempo pelos analistas – há um mês, estava em 3,23%.

Os resultados do primeiro trimestre do ano não são um ponto fora da curva; o país atravessa um claro momento de estagnação – para se ter ideia, entre 24 economias emergentes, estamos apenas em 15° lugar no ranking do crescimento pós-2009. Para este ano, uma expansão de 2,5% passou a ser tida, majoritariamente, como teto para nosso PIB.

Passou da hora de recuperar uma agenda de reformas voltada a dar melhores condições de competitividade à economia brasileira, impulsionando tanto o investimento público quanto o privado. Há uma lista enorme de medidas modernizantes clamando para ser implementada. A política do puxadinho, com benesses esparsas, favores dirigidos, incentivos desconexos, falhou, e só o PT não vê.