quarta-feira, 30 de junho de 2010

Trem-bala ou trem fantasma?

O Tribunal de Contas da União (TCU) vota nesta tarde o relatório em que analisa a viabilidade da construção do trem-bala. Trata-se de projeto bilionário que para uns é um sonho e para outros pode vir a se tornar um pesadelo. No mínimo, o TAV (trem de alta velocidade) é empreendimento para ser cuidadosamente avaliado.

Inicialmente o trem-bala custaria US$ 11 bilhões, ou R$ 20 bilhões nas cotações atuais. Agora já se estima que serão necessários R$ 34,6 bilhões para construir os 530 km de trilhos entre Campinas e Rio de Janeiro. Apenas ao longo do processo de avaliação, os custos já saltaram 70%. O que dizer quando, e se, saírem da prancheta para a realidade?

Como obra desta magnitude não é qualquer um que faz, a mãozinha salvadora do BNDES foi acionada. Até 70% do investimento poderá vir de financiamento e de aporte direto de capital por parte da União. A participação pública não para aí. O governo também já disse que pretende criar uma estatal só para cuidar do TAV: a Empresa de Pesquisas Ferroviárias. Estamos dispostos a pagar por isso?

Colocadas todas estas condicionantes, a discussão que realmente interessa é: o país precisa, de fato, de um trem-bala?

É claro que melhorar as condições de transporte atende a um “país que se agiganta” (para lembrar o hino do Brasil Grande tão amado por Lula...). Mas há obras viárias, e mais especificamente ainda, ferroviárias, muito mais relevantes para desatar os nós logísticos e prover melhores condições de mobilidade e vida para a população.

Com o dinheiro enterrado no trem-bala seria possível implantar 500 km de linhas de metrô, segundo dizem analistas do setor. Esta extensão é suficiente para pôr em funcionamento linhas que há anos não saem do lugar, como as dos metrôs de Salvador, Recife, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Porto Alegre, para não falar na sempre necessária ampliação da malha paulistana.

Investimento desta natureza é bem-estar na veia dos brasileiros, notadamente os mais pobres. A Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008-2009, divulgada na semana passada pelo IBGE, mostra que transportes é o item que mais cresce entre as despesas de consumo das famílias brasileiras hoje. Responde por 20%, tanto quanto alimentação e só abaixo dos dispêndios com habitação. Aprimorá-los é, pois, o grande desafio dos administradores públicos.

Saindo dos centros urbanos e indo em direção ao interior do país há mais uma pá de ferrovias à espera de recursos para deslanchar. É o caso da Transnordestina, da Norte-Sul, da Ferronorte, da Leste-Oeste e do ramal ligando o norte de Minas ao litoral. Nestas, o efeito é sobre o chamado “custo Brasil”, que hoje torna o transporte de uma tonelada de soja entre o Centro-Oeste e o porto paranaense de Paranaguá tão caro quanto dali até a China.

Tendo à disposição uma gama tão extensa de projetos ferroviários bons e comprovadamente necessários para o desenvolvimento do país e o bem-estar da população, as dúvidas quanto a implantar o TAV ficam ainda mais salientes. Já não há ponte aérea suficiente entre as duas metrópoles para suprir adequadamente a demanda?

O trem-bala é mais um dos projetos mastodônticos que o governo do PT põe na pauta no apagar das luzes. Junta-se à usina de Belo Monte, igualmente bilionária e igualmente envolta em dúvidas e contestações, e às atabalhoadas redefinições do marco de exploração do petróleo com vistas ao pré-sal.

Todos eles têm potencial para redesenhar, para o bem, o futuro do país, dando-nos mais competitividade e alavancando o crescimento. Mal calibrados, porém, têm capacidade para se transformar num peso morto que resultará numa conta descomunal a ser paga pelas próximas gerações. Não se pode rifar assim as oportunidades de uma nação.

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Pré-sal afunda Petrobras

A Petrobras anunciou na semana passada seu plano de investimentos para o período até 2014. Os números da estatal são gigantescos, assim como o são as dúvidas quanto à possibilidade de se tornarem realidade. A companhia encontra-se às voltas de um intrincado processo de capitalização que tem levado seus ganhos literalmente a um mergulho nas profundezas do oceano.

O xis da questão é a bolada que a Petrobras prevê investir nos próximos anos, principalmente na exploração do pré-sal, do qual foi designada pelo governo Lula como única operadora. São US$ 244 bilhões em quatro anos. Ocorre que a estatal já tem dívidas de R$ 100 bilhões e capacidade limitadíssima de endividar-se ainda mais.

Hoje a relação entre dívida líquida e patrimônio líquido esbarra no limite de 35% que garante à empresa o selo de grau de investimento. Para 2010, a Petrobras prevê investir R$ 88,5 bilhões, mas só conta com R$ 68 bilhões – entre o que tinha disponível em dezembro e o que prevê gerar neste ano. Por isso, depende da capitalização, cujo processo só tem tido percalços e não deve sair antes de setembro.

Sem a capitalização, a conta não fecha e seriam necessários mais R$ 20,5 bilhões, os mesmos capazes de estourar o limite entre dívida e patrimônio que orienta a avaliação de risco das agências de rating. Neste estado de coisas, a gigante e toda-poderosa Petrobras está a um passo de ser considerada investimento especulativo, com expressiva perda no seu valor. Basta que a capitalização não ocorra até setembro, hipótese bastante provável.

Não é surpresa constatar que foram as mudanças patrocinadas pelo governo federal no marco legal do setor de petróleo que desencadearam os prejuízos.

Desde que as novas regras foram anunciadas, em 31 de agosto do ano passado, as ações da Petrobras caíram 10,8%. No mesmo período, o Ibovespa subiu 14,7%. A companhia perdeu R$ 45 bilhões de valor de mercado – o que, apenas para comparação, equivale a fatia expressiva do que se pretende obter com a capitalização da empresa, algo em torno de R$ 100 bilhões.

O mergulho das ações e as dúvidas em torno do futuro da empresa nasceram da opção equivocada do governo petista por implodir um modelo de exploração que até agora se mostrara adequado e bem sucedido: nos 12 anos em que o sistema de concessões vigora, a produção da Petrobras avançou a uma média de 5,8% anuais; seus lucros cresceram 943%.

A opção pelo sistema de partilha, tendo a Petrobras como única operadora, gerou toda uma sorte de dúvidas que ora cobra seu preço. O modelo atual seria melhor porque os investimentos poderiam ser divididos com o mercado como um todo. “Há um esforço fora de propósito de uma companhia só”, comparou Miriam Leitão na edição de ontem de O Globo.

“O maior problema da Petrobras é político, na medida em que uma simples operação de aumento de capital resolveria seu problema. Mas o governo insiste em uma operação complexa envolvendo barris de petróleo repassados com base em uma lei que ainda precisa ser sancionada pelo presidente da República”, avalia o Valor Econômico hoje.

Para piorar, há uma série de decisões eminentemente políticas sendo tomadas na condução dos negócios da petrolífera. A mais saliente delas é a que envolve a construção de novas refinarias.

O problema é que não há, segundo análises técnicas feitas pela própria Petrobras, qualquer necessidade, neste momento, de aumentar a capacidade de refino no país. Mas Lula bateu no peito e mandou a companhia incluir as novas unidades no seu plano de investimento. São módicos US$ 35 bilhões para esta finalidade.

O mais surpreendente é que decisões desta complexidade, envolvendo tantas variáveis e consequências, estão sendo tomadas em ano de eleições gerais, em que o país redefinirá seu futuro. Já se dizia que a imprevidência com que age o governo do PT em relação ao pré-sal logo, logo cobraria seu preço. O que não se esperava é que a fatura começasse a ser apresentada tão cedo. A Petrobras e seus acionistas estão sentindo isso no bolso.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Crônica de mais uma tragédia anunciada

O Nordeste foi novamente vítima de uma calamidade. Com uma semana de duração, as chuvas já provocaram 41 mortes em Pernambuco e em Alagoas, onde também ocorreram mais de 600 desaparecimentos, de acordo com a Defesa Civil. É mais uma crônica de uma tragédia anunciada, como vira-e-mexe acontece. Por que o governo federal não age antes para evitar que isso volte a ocorrer?

Há muita verba no Orçamento da União para que desastres como os desta semana sejam prevenidos. Mas a balbúrdia administrativa e a má gestão não deixam os recursos chegar aonde devem: às obras e ações para evitar enchentes, inundações e calamidades. Se isso ocorresse, os dramas pessoais que todo o país tem acompanhado nos últimos dias poderiam ser evitados, ou, pelo menos, minorados.

Decorrido metade do ano, o governo federal só liberou R$ 3,2 milhões de um total de R$ 442 milhões reservados para prevenção de desastres no país em 2010. Isso dá míseros 0,74% do que há disponível, de acordo com o Siafi.

Outros R$ 67,3 milhões foram liberados, mas referentes a orçamentos de anos anteriores, os chamados restos a pagar. Mesmo assim, a conta não fica favorável ao governo: entregou apenas 14% do que se comprometeu, conforme mostrou a ONG Contas Abertas. Para Pernambuco, por exemplo, R$ 70 milhões estão disponíveis, mas foram liberados apenas R$ 172 mil. Execução orçamentária tão sofrível não é minimamente aceitável num governo que entra em seu oitavo e último ano.

Situações como a que vivem os dois estados nordestinos neste momento transformam estes números frios em drama humano. Além das dezenas de mortes e das centenas de desaparecidos, o número de casas destruídas está próximo de 12 mil só em Alagoas. Em todo o Nordeste, o número de desabrigados passa de 115 mil. Muito disso poderia ter sido evitado com a ação tempestiva do poder público federal.

Esta lamentável situação de descaso e improviso não é novidade. É, infelizmente, rotina nos anos recentes. Em 2009, saíram dos cofres federais apenas R$ 47,2 milhões de um orçamento de R$ 646 milhões. Como explicar que, diante de tantas e recorrentes tragédias associadas à má ocupação de áreas e às cíclicas intempéries climáticas, o governo Lula só tenha gasto 7% da verba que tinha para prevenção de acidentes no ano passado?

O caos que marca a atuação federal fica ainda mais evidente quando se observa os gastos necessários para remediar a situação depois que as tragédias já ocorreram. Em abril, a vítima foi o Rio de Janeiro. Até então o estado não recebera quase nada para prevenir e preparar-se para desastres. Mas, depois das centenas de mortes na capital e Niterói, foram liberados R$ 542 milhões em menos de três meses.

Trata-se de algo lamentavelmente repetitivo. No ano passado, o governo federal precisou gastar R$ 1,13 bilhão para reparar a destruição causada pelas enchentes do verão em Santa Catarina. Ou seja, dinheiro há, mas, só depois que os infortúnios já deixaram seu rastro, a verba aparece. O que explica uma postura tão deplorável da parte do poder público federal?

A propósito, o governo Lula anunciou ontem a liberação de R$ 100 milhões para Alagoas e Pernambuco. É mais um exemplo de ação que mira holofotes, mas que, infelizmente, vem tarde. A burocracia não dará trégua mais uma vez: o dinheiro só chegará às regiões necessitadas daqui a um mês, como mostrou o portal G1.

Não é só o entrave burocrático que prejudica quem mais precisa do Estado numa hora de desespero como a que vivem agora os alagoanos e os pernambucanos. Há a deplorável manipulação política na liberação de verbas, como ficou-se sabendo à época das chuvas de abril no Rio.

Levantamento feito então pela ONG Contas Abertas mostrou que 61% da verba disponível para prevenção e preparação para desastres em todo o país havia ido para a Bahia: o estado recebeu R$ 24 milhões; juntos, outros 15 estados brasileiros foram contemplados com R$ 15,4 milhões. Não por acaso, o então ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, responsável pelo manejo dessas verbas, é postulante ao cargo de governador baiano.

No apagar das luzes, o governo petista resolveu tomar providências. Com a capacidade de raciocínio de um caracol, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, acaba de descobrir que “a nossa sistemática (de repasses) é muito burocrática”. Foram necessários sete anos para chegar a esta brilhante conclusão.

Temos aí um exemplo pronto e acabado da inoperância da gestão Lula. Parece que, para eles, as vítimas têm mais é que aguardar pacientemente. Provavelmente até que a próxima tragédia aconteça.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Varrendo tudo para debaixo do tapete

Uma das características mais espantosas desta eleição tem sido o silêncio de dona Dilma. Ninguém sabe ao certo a que se presta a escolhida pelo presidente mais popular da história recente do país para sucedê-lo. Nada pior para uma democracia como a brasileira, que vive seu mais longevo período de estabilidade.

A intenção do petismo parece clara: transformar Dilma em algo etéreo, para levar os eleitores a fazer exatamente como o presidente Lula mandou na convenção do PT, ou seja, personificá-lo no “vazio” da cédula. É uma espécie de voto eletrônico de cabresto.

Numa mal disfarçada estratégia de fugir de polêmicas, na semana passada a candidata do PT escapuliu para a Europa, dando bolo em debates e sabatinas. De quebra, foi produzir imagens arquitetadas para apresentá-la no horário eleitoral como celebridade política internacional que não é. Mas Dilma é Dilma em qualquer lugar do mundo: em seu tour pelo Velho Mundo, conseguiu superar-se e produziu uma montanha de insignificâncias e grosserias.

Em Paris, onde avistou-se com um constrangido Nicholas Sarkozy, a candidata do PT desdenhou os repórteres que a seguiam (a seguiam não porque estivessem gostando daquilo, mas simplesmente pelo dever de ofício de acompanhar a agenda de uma candidata à presidência da República, fosse ela quem fosse): “Vou fingir que não os conheço, que são todos um bando de argentinos”. Espirituosa, essa Dilma; entrou no clima de arquibancada de estádio de futebol...

Minutos antes, exibira toda a sua noção de cidadania e finesse ao pular no meio de carros para atravessar uma avenida parisiense: “Eu não tenho medo nenhum”, disse ela. Santo Deus! Medo? Será que esta senhora não sabe o que é boa educação? Em Paris não se atravessa com sinal fechado, muito menos fora da faixa de pedestre! (Como, aliás, já acontece em algumas cidades brasileiras, a exemplo de Brasília. Mas, na sua alienação da realidade, a ex-ministra não deve ter percebido isso nos quase oito anos em que lá vive.)

Ao ausentar-se do país, Dilma fugiu, por exemplo, da sabatina promovida pela Folha de S. Paulo, à qual José Serra deve comparecer hoje. Fugiu de questionamentos da opinião pública; fugiu da possibilidade de esclarecer sua visão sobre os mais diversos e relevantes assuntos; fugiu de deixar de ser o “vazio” nominado por Lula e por ela docemente aceito.

Dilma diz preferir o “quebra-queixo”, como os jornalistas chamam as tumultuadas entrevistas em que o mais comum é as perguntas não serem adequadamente formuladas, tampouco as respostas, satisfatoriamente dadas. Fica claro que ideias e propostas estão em terceiro ou quarto planos para a candidata, como, aliás, reza a cartilha do comando de campanha do PT.

Não espanta que a petista não vá comparecer ao debate promovido pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) no próximo dia 1º, como já adiantou. Não quer estar em nenhum lugar em que possa ser devidamente escrutinada. Alega que participará apenas de debates exibidos pelas TVs abertas. Pura tentativa de esconder suas deficiências, já que as regras dos eventos televisivos, pelo menos no primeiro turno, tendem a impedir discussões mais francas – ou dá para esperar coisa diferente de algo com sete candidatos, a maioria ilustríssimas nulidades, em volta da mesa?

Na prática, o que se pretende é não deixar o prezado eleitor saber quem é a candidata na qual querem que ele vote daqui a pouco mais de 100 dias. Tudo parte da “estratégia” petista de reduzir ao máximo a sua exposição. Dilma de verdade? Só depois de 3 ou 31 de outubro. Quem vai pagar pra ver?

Mas o que dona Dilma e sua turma tanto temem, para tentar escapar assim, de fininho, das discussões? Histórias obscuras como dossiês, quebra ilegal de sigilo fiscal e outros de seus métodos invasivos já caíram na boca do povo. Uso de dinheiro público e da estrutura do Estado de forma fraudulenta para promover a candidatura de Dilma Vana Rousseff já nem o mais renhido militante petista nega.

A resposta para tanto receio pode estar, veja só, caro leitor, dentro do próprio governo, mais precisamente no Ministério do Planejamento. Na semana passada, a pasta pôs na internet sua página de debates, com textos para discussão produzidos por técnicos do órgão. Qual o quê! Foi o suficiente para deixar-nos, à oposição, para trás, a comer poeira.

Os burocratas do Planejamento escreveram, sem medo, que a infraestrutura, área supostamente “bem gerida” por dona Dilma quando ministra, não anda lá muito bem das pernas – coisa que a gente já cansou de dizer aqui. Mais: o sistema tributário brasileiro é ruim; a burocracia é um bicho-papão enorme e o governo Lula não tem se preocupado em resolver a contento o gargalo logístico. Tu-di-nho de acordo com o ministério chefiado pelo petista Paulo Bernardo, conforme relatou o Valor Econômico em sua edição de sexta-feira.

Para o Planejamento, o país tem muitos problemas, entre outras razões, porque os ministérios de Minas e Energia, Transportes e Meio Ambiente simplesmente não se entendem. Além disso, a política de reforma agrária é um fracasso, projetos como o do biodiesel não têm futuro e a educação não avançou na atual gestão (50% dos jovens em idade apropriada não estão no segundo grau). Cadê a toda poderosa e eficiente gerentona, a mãe do PAC?

No entanto, assim como dona Dilma, o governo do PT tem horror à crítica: na sexta-feira mesmo, logo depois que a reportagem do jornal foi publicada, mandou tirar do ar o portal do Planejamento. Varreu tudo para debaixo do tapete, para longe dos olhos do cidadão. Está chegando a hora em que não vai dar mais para essa gente esconder o que se passa no reino da Dinamarca. Alguma coisa parece estar podre e vai desmoronar bem antes de 3 de outubro.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

O petróleo é nosso

A imagem é surrada, mas é válida em época de Copa do Mundo. O governo está mexendo em time que está ganhando ao modificar radicalmente o arcabouço legal para exploração de petróleo no país. As mudanças votadas na semana passada no Senado equivalem a substituir um Maicon da vida para pôr em campo um cabeça-de-bagre como Júlio Baptista.

Diferentemente da opaca seleção de Dunga, o regime em vigor desde 1997 era exemplo de uma bem-acabada experiência de sucesso. Mas isso não foi suficiente para demover o governo do PT de aprovar, às vésperas de eleições gerais e sem discussões à altura, um marco legal completamente distinto daquele que produziu os bons resultados dos últimos 12 anos.

A partir de agora, o país passa a conviver com um novo sistema, o de partilha, em substituição ao modelo de concessões previsto pela lei em vigor. Saímos de um regime de ampla transparência e abertura para outro em que o jogo será fechado, controlado e com grande risco de ter resultados combinados.

Não se trata aqui de uma discussão meramente teórica ou conceitual. Os resultados efetivos provam o sucesso da legislação implantada no governo Fernando Henrique. Apenas para ficar em dois exemplos: aumento da produção petrolífera de 870 mil barris/dia para cerca de 2 milhões/dia e multiplicação das receitas geradas para União, estados e municípios de R$ 200 milhões para R$ 25 bilhões entre 1997 e 2009, conforme estudo patrocinado pelo ITV. Para que mexer em time tão entrosado?

Não por acaso, o modelo que o Brasil está jogando fora é o utilizado por países como Canadá, Estados Unidos, Reino Unido, Austrália e mesmo a Noruega – tão paradigmaticamente citada pelo petismo para justificar seus sonhos megalômanos a partir do pré-sal. Mas parece que este não é o tipo de companhia que o petismo preza: agora, estaremos perfilados ao modus operandi de nações como Nigéria, Angola, Líbia, Argélia, Cazaquistão e China (que não é grande produtora de petróleo).

Pelo modelo de concessões, empresas disputavam em leilão as áreas petrolíferas a serem exploradas. Em caso de sucesso, o Estado ficava com boa parte dos recursos por meio de transferências denominadas “participações especiais”, definidas e/ou modificáveis por meio de simples decreto. Em caso de prejuízo, o bolso do contribuinte ficava protegido. Com a nova lei, a União controla tudo: o sucesso e o fracasso, tudo plasmado em rígida lei.

No regime de partilha somem as participações especiais, cujos valores, em muitos casos, hoje superam o que os royalties rendem a estados e municípios. Em 2009, foram transferidos R$ 8,5 bilhões de participações especiais, ante R$ 8 bilhões a título de royalties – no estado do Rio, esta relação foi de quase dois para um. Este dinheiro agora vai para o guloso governo federal. Mínguam também os repasses para educação, seguridade social e para o FAT.

No pré-sal, novamente aflora a visão que o PT cultiva das políticas públicas. Para o partido, prevalecem os interesses de governo e não os de Estado. Como os petistas alimentam o sonho de perpetuar-se por mais alguns quadriênios no poder, o pré-sal surge como o cofrinho mágico de onde podem brotar os recursos para financiar o que quer que seja.

Mas dinheiro, como petróleo, um dia acaba e uma política de Estado serve justamente para definir a trajetória da bonança à escassez para que a população não saia prejudicada. Mas, na visão do PT, vale mais ser cigarra do que ser laboriosa formiga sempre a pensar no futuro.

Em questão energética, porém, principalmente num país pleno de carências como o Brasil, o que está em jogo é, sobretudo, o porvir. Não é votando uma lei de tamanha relevância com tanto atropelo que se conseguirá pavimentar este caminho.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

A escolha entre o bem e o mal

Um espectro ronda o país: a aposta petista no maniqueísmo absoluto, no “quem está comigo tudo pode e contra mim nada pode”. É o epitáfio de uma era cujo principal legado é tentar igualar todos, por baixo. O partido que conviveu gostosamente com ilegalidades, irregularidades e imoralidades briga, agora, para impor ao país o cabresto da unanimidade.

Hoje, basta ser um aliado do governo para ter todos os seus atos justificados. Parlamentares comprometidos com o PT têm portas abertas para desvios, corrupção e proteção. Governante de qualquer lugar do mundo que teça loas ao presidente Lula ganha suas bênçãos, mesmo que seja um perigoso ditador.

Em contrapartida, criticar o governo tornou-se altamente perigoso. A ordem disseminada é desmoralizar quem ousa manter-se independente, na oposição ou na parcela minoritária que desaprova a atual gestão. Tudo é feito de forma a aplacar quem diga que o governo erra.

Caso uma instituição, seja o Tribunal de Contas da União ou o Ministério Público, descubra alguma irregularidade, a ordem é desmontar e esvaziar o órgão impertinente. Se um jornal ousa apontar graves desvios em políticas quaisquer do governo, a ordem é desmoralizar a imprensa como um todo.

É contra este estado de coisas que se insurge o agora candidato oficial da oposição José Serra. O ex-governador de São Paulo, mais uma vez, teve coragem de enfrentar a unanimidade truculenta que procura ser imposta a todos.

No lançamento de sua candidatura, sábado, em Salvador, Serra apresentou suas propostas e fez suas críticas sem abrir mão de um valor que parece estar um pouco esquecido em tempos petistas: o respeito à democracia e à liberdade de pensamento e expressão. “Ao contrário dos adversários políticos, para mim o compromisso com a democracia não é tático. Não é instrumental. É um valor permanente, inegociável”, afirmou.

O candidato tucano deixou claro que a lei deve estar acima das intenções e planos de governantes de plantão, por mais que isso possa parecer absurdo ao petismo. O Estado se subordina à sociedade, e não ao governo de turno: assim é a regra nas democracias, assim deve ser no Brasil. “O tempo dos chefes de governo que acreditavam personificar o Estado ficou para trás há mais de 300 anos. Luis XIV achava que o Estado era dele. Nas democracias e no Brasil, não há lugar para luíses assim”, disse Serra, numa época em que tentam transformar o lulismo em um novo peronismo-maoísmo.

Aos que justificam irregularidades e roubalheiras atuais à sombra de episódios pretéritos, Serra pespegou uma precisa definição: “Acredito que são os homens que corrompem o poder e não o poder aos homens. Quem justifica deslizes morais dizendo que está fazendo o que os outros fizeram, ou que foi levado a isso pelas circunstâncias, deve merecer o repúdio da sociedade. São os neocorruptos”.

Não foi preciso nem esperar para ver quem iria vestir a carapuça: a resposta veio ontem mesmo, na convenção petista. Para os partidários de dona Dilma, da boca da oposição escorre “veneno”. Curiosa a concepção desta gente sobre o livre manifestar. Veneno é tudo aquilo que os incomoda, tudo aquilo que desnuda o rei-sol. Sim, pode ser veneno aquilo que busca aniquilar o vírus da mentira que o PT tenta disseminar pelo país usando os mais espúrios meios.

O nome do jogo de Serra é coerência. Coerência com uma trajetória política de quatro décadas, reconhecida por milhões de brasileiros: “Não comecei ontem e não caí de paraquedas. Apresentei-me ao povo brasileiro, fui votado, exerci cargos, me submeti ao julgamento da população, fui aprovado e votado de novo”.

O petismo de hoje tem horror a gente que age e pensa assim; a ordem é silenciá-las. Pela cartilha governista, é preciso esconder, de qualquer forma, opiniões desagradáveis como aquelas que mostram os sucessos da atual gestão, em grande parte, como resultado da maneira como o Brasil foi conduzido desde a redemocratização e mais notadamente a partir do Plano Real.

Neste gulag, ninguém deve saber que, em muitos quesitos, nos anos Lula o Brasil se desenvolveu bem menos do que devia: a educação ficou paralisada, a saúde não progrediu, os acordos comerciais não saíram do papel, a segurança pública piorou, a carga tributária avançou, os juros continuam nas alturas. Também é proibido dizer que, apesar do fenomenal crescimento de 9% do PIB no último trimestre, o Brasil é ainda um dos países que menos se expandiu na América do Sul nos últimos oito anos. Para os petistas, isso é só um monte de verdades inconvenientes.

Nesta guerra contra quem não está do “nosso lado”, o governo abre seus cofres para batalhões de militantes, patotas coorporativas, centrais sindicais pelegas e órgãos de Estado transformados em aparelhos partidários.

Este é o dilema dos brasileiros. De um lado, um grupo que se beneficia do sucesso da implantação de ideias que sempre condenou e está disposto a massacrar, como inimigos, quem denuncia seus equívocos e erros. Um grupo que luta para aboletar na presidência da República alguém que mantenha seus privilégios e continue a jogar para debaixo do tapete as mazelas descobertas, mas que, afora isso, não se sabe a que mais virá. Do outro lado, José Serra, que se apresenta com suas ideias rigorosas e propostas claras, com orgulho de não ter a ajuda ilegal de uma máquina que os petistas querem transformar em mortífera. O maniqueísmo real é outro: é entre o mal e o bem.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Muito lenha na fervura pode dar queimadura

Depois de amargar no ano passado a primeira recessão desde o governo Collor, a economia brasileira voltou a crescer no primeiro trimestre. Não é ainda um ritmo efetivamente chinês: enquanto lá a expansão foi de 11,9%, cá foram 9%, ambos calculados sobre igual período de 2009. Trata-se de um resultado a ser saudado, embora emprenhado de sinais preocupantes.

A primeira constatação a fazer é que a impressionante marca – a maior para este tipo de comparação desde 1996 – foi obtida sobre uma base de comparação deprimidíssima. No primeiro trimestre do ano passado, auge da crise econômica, a economia brasileira recuara 2,1%. Ponderados estes dois extremos, o resultado alcançado agora ficaria mais ou menos no nível do início de 2008. Ainda assim bom, embora não tão exuberante.

O crescimento da economia foi impulsionado por uma política fiscal francamente expansionista, adotada pelo governo no ano passado. Equivale a dizer que houve mais gastos e corte de alguns impostos – portanto, mais grana para consumo, tanto do poder público quanto das pessoas e das empresas.

Em paralelo, o nível dos investimentos ainda continua baixo para ancorar uma economia que queira crescer em velocidade efetivamente asiática: com toda a alta deste início de ano, aquilo que o economês chama de “formação bruta de capital fixo” ou FBCF corresponde agora a 18% do PIB.

Bom? Vejamos: no início do bombástico 2008, os investimentos estavam em 18,1%. Ou seja, apenas voltaram ao mesmo patamar de dois anos atrás e, retroagindo um pouco mais, encontram-se também no mesmo nível de 2001, ano reconhecidamente difícil para a economia mundial. (Em todos os demais anos do governo Lula, o percentual esteve abaixo deste padrão. Nunca é demais lembrar que a promessa do PAC era elevá-lo a 25% do PIB...)

Resultado é que a economia do país roda hoje num ritmo maior do que sua estrutura produtiva comporta. Tenta ser Ferrari com carcaça de fusquinha. O problema é que, se não há investimento suficiente, os gargalos afloram, os preços sobem, a inflação recrudesce (basta olhar os alimentos, com a terceira maior alta desde 1995 para os cinco primeiros meses do ano, conforme divulgado há pouco).

Onde se veem estes contratempos com total clareza? Olhe ao redor e não será difícil perceber: estradas cada vez mais abarrotadas e perigosas; aeroportos em petição de miséria; transportes públicos de qualidade insuficientes ou mesmo inexistentes; dificuldade para encontrar mão-de-obra para tocar qualquer obrinha ou serviço.

Para complicar a equação, há também a insuficiência da nossa poupança. No trimestre, a sua correlação com o PIB foi a 15,8%, bem abaixo, também, do nível anterior à crise, quando oscilou em torno de 17,5%, chegando ao pico de 18,2% em 2004. Como o Brasil, principalmente o setor público, poupa pouco (o paradigma chinês neste quesito alcança 40% do PIB), vê-se obrigado a recorrer a dinheiro de fora. Com isso, fica dependente do humor do capital externo, nem sempre seguro.

Isso fica claro no descompasso entre o crescimento das importações e das exportações no trimestre. Enquanto as primeiras subiram 13% ante o último trimestre de 2009, as nossas vendas ao exterior expandiram-se apenas 1,7% no mesmo período. Disso resulta uma necessidade de financiamento externo da economia (via ingresso de dólares) que deve chegar a US$ 48,5 bilhões este ano, a maior da história.

Tudo considerado, a expansão do crédito, de benefícios assistencialistas e dos gastos públicos aponta para a continuidade do ritmo de crescimento do consumo, com a geração de potenciais desequilíbrios. Trata-se de uma bomba H de demanda, que eleva a temperatura da economia e exige do Banco Central doses mais cavalares de juros já altos – como deve sair da reunião de hoje do Copom. O risco é derraparmos na curva do superaquecimento e tocar fogo no que pode dar muito certo.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Ilegal, imoral ou engorda

Oficialmente a campanha presidencial nem começou, mas a turma do PT já mostrou o figurino com o qual irá desfilar nestas eleições: o da marginalidade descarada. Até agora, respeitar a lei foi o que menos importou para fazer dona Dilma crescer nas pesquisas. Para o petismo, notável por incluir o termo “mensalão” no léxico político brasileiro, o processo eleitoral é um vale tudo sem fim.

Os confrontos com a legislação começaram há dois anos com as viagens eleitorais, disfarçadas de atos oficiais, para fazer a candidata petista ser conhecida. Continuaram com a panfletagem explícita feita pelo presidente Lula, repetidamente multado pelo TSE. Ficaram sem graça com a instrumentalização das centrais sindicais, financiadas com polpudos recursos públicos. Agora, com a montagem de dossiês e equipes de arapongas, chegam à bandidagem pura e simples. É o velho PT de sempre – o do mensalão, dos aloprados – mostrando a sua cara.

Se o desrespeito às regras do jogo se limitasse aos rotineiros abusos verbais e ao uso ilegal do nosso dinheiro para fortalecer uma candidata, já seria suficiente para manchar o pleito de 2010. Mas a equipe do PT literalmente aloprou ao contratar gente do submundo policial para investigar tanto adversários como a si próprios. A regra era não ter limite, incluindo devassas na vida privada de oponentes e seus familiares, grampos telefônicos e divulgação de documentos e dossiês falsos na internet. Para o PT, disputa democrática é pura e simplesmente guerra de extermínio.

A estratégia veio a público na semana passada, por meio de várias reportagens. Os chefes petistas se apressaram a desmentir tudo. Chegaram até a insinuar que a própria oposição estaria se autobisbilhotando. Quanto cinismo! Não contavam que um dos envolvidos abrisse a boca para contar tudo. Na edição desta semana da revista Veja, Onézimo Sousa, delegado aposentado da Polícia Federal, admite que seria contratado por R$ 1,6 milhão para fazer o serviço sujo para o PT. Não só ele, mas toda uma equipe de arapongas agiria nos subterrâneos eleitorais.

Como costuma ocorrer em certas organizações criminosas, após a revelação um peixe pequeno rapidamente foi sacrificado – talvez para proteger os tubarões graúdos. No sábado, quando a revista começou a circular, Luiz Lanzetta, um dos chefes de comunicação da campanha de dona Dilma, “pediu demissão”. Como parte do script, disse que agia sozinho na espionagem. Conta outra...

Os tentáculos da ilegalidade e da imoralidade petista vão muito além do submundo. Espraiam-se por instituições e entidades representativas, cooptadas e instrumentalizadas. É o caso das centrais sindicais, que, custeadas por dinheiro público, também fazem sua parte nesse festival infame.

Com sua antiga vertente mais combativa amansada por toneladas de dinheiro público e outra parcela igualmente dócil, sob o comando de gente acusada de desviar verbas do BNDES, elas torraram R$ 800 mil para fazer mais um evento ilegal de apoio a Dilma, ocorrido em São Paulo. Pode-se dizer que saiu barato, quando se sabe que o governo Lula patrocinou uma lei que permitiu às centrais receber R$ 200 milhões saídos do nosso bolso por meio do imposto sindical – aquele um dia de salário que todo ano descontam do seu contracheque.

A subversão da lei atinge até mesmo o mais alto mandatário do país. Na semana passada, pela quinta vez o TSE multou o presidente Lula por propaganda eleitoral antecipada. De novo: sai barato. Afinal, o que são R$ 35 mil diante da perspectiva de continuar comandando montanhas e montanhas de dinheiro público? O exemplo que Lula dá à formação ética do nosso povo é o pior possível: “Desrespeitem a lei; vale a pena!”, parece querer dizer. Em que democracia madura um chefe da nação que age dessa maneira tem tanta benevolência?

O PT demonstra mover-se melhor no submundo. O partido exibe horror às regras do jogo. Diante de qualquer crítica, vocifera contra “os donos do poder”, “as elites burguesas”. Vive tentando criar instâncias paralelas que pretendem sobrepor-se às instituições da democracia representativa. Subsiste no petismo a utopia primitiva da democracia direta, e, se esta não pode ser alcançada por meios legais, que se subvertam as normas: o que interessa é manter-se grudado ao poder, custe o que custar.

Mesmo que tudo isso seja bem sucedido no curto prazo, certamente não sobreviverá ao escrutínio dos eleitores e ao julgamento da História. Até lá, a expectativa é que essa turma seja rapidamente enquadrada pelo Código Penal Brasileiro.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Impostos, uma quase unanimidade nacional

Tem gente que é contra baixar os juros; tem gente que é a favor. Tem gente que é contra expandir o Bolsa Família; tem gente que é a favor. Muita gente é favorável a reduzir os impostos; ninguém, exceto dona Dilma, é contra. A escorchante carga tributária brasileira é quase uma unanimidade nacional. Diminuí-la é bandeira que interessa a todos, menos à candidata do PT, que quer ressuscitar a CPMF.

O Brasil tem 83 tributos, taxas e contribuições. Para piorar, nosso sistema é perverso e penaliza quem mais necessita: de acordo com o Ipea, famílias que ganham até dois salários mínimos pagam 54% de tributos, em média. Para quem ganha mais de 30 salários mínimos, a carga é um pouco menor, mas nem por isso baixa: 29%.

Como a maior parte dos tributos arrecadados vem camuflada nos preços que pagamos por mercadorias e serviços, nos últimos anos foram inventadas maneiras didáticas de se ilustrar a montanha de dinheiro que deixamos nos cofres do governo. Uma delas é o impostômetro, criado pela Associação Comercial de São Paulo.

Nesta manhã, o placar, que fica no centro de São Paulo, alcançou a marca de R$ 500 bilhões pagos pelos brasileiros em tributos desde 1º de janeiro. Cada vez mais, a cifra simbólica é atingida mais cedo: em 2009, esse valor só foi alcançado em 24 de junho, ou seja, 22 dias mais tarde. Em 2008, foi em 25 de junho.

A previsão para este ano é de que o Brasil registre um novo recorde de arrecadação de impostos: R$ 1,2 trilhão, ante R$ 1,09 trilhão no ano passado. A carga tributária representa algo em torno de 35% do PIB. E não para de crescer: entre janeiro e abril, a arrecadação federal subiu 12,5% acima da inflação. Trocando em miúdos, em média, de cada R$ 1.000 que ganha, o brasileiro paga quase R$ 400 em impostos. Xô!

Outra forma ilustrativa de mostrar quão altos são os tributos que destinamos ao governo é transformá-los em quantidade de dias trabalhados. Hoje, o brasileiro labuta 148 dias do ano para sustentar a máquina pública: isso equivale a dizer que todo o salário recebido entre 1º de janeiro e 28 de maio ficou com os governos federal, estaduais e municipais.

A situação só tem piorado: em 2001 eram 130 dias; em 1991, 90. Pelo “padrão-calendário”, nos anos Lula os governos apropriaram-se de mais 13 dias de trabalho do contribuinte. Em países como Argentina, Chile e México, a carga equivalente à renda do trabalho é proporcional a 90 dias do ano. Será que algum brasileiro quer continuar pagando tanto para ter tão pouco retorno em termos de saúde pública, educação etc?

Parece que não. E isso abarca até mesmo quem, teoricamente, justificaria a cobrança de impostos maiores. De acordo com sondagens do Instituto Análise, 75% dos brasileiros que recebem o Bolsa Família votariam em um candidato que reduzisse os impostos incidentes sobre os alimentos. O índice sobe para 84% entre os que não ganham o benefício. Já 67% dos brasileiros acreditam que “é melhor para os pobres que o governo reduza impostos, tenha menos funcionários públicos e, com isso, os produtos fiquem mais baratos”.

Cortar impostos não é uma elucubração teórica, nem conversa de sonegador. Num país em que os serviços públicos são de qualidade sofrível, o peso dos tributos manieta as possibilidades de poupança e crescimento individual e dificulta investimentos e o desenvolvimento empresarial: o governo ficou com 45% da renda gerada pelas 100 maiores empresas abertas do país em 2009, conforme mostrou o Valor Econômico em sua edição de segunda-feira

Tributação é o principal empecilho para o aumento dos negócios, segundo pesquisa feita entre empresários. Incomoda mais, muito mais, que juros e créditos. Uma continha rápida ilustra por quê. Sobre um contracheque de R$ 2 mil de um trabalhador brasileiro, uma empresa paga R$ 596 a título de INSS, Sistema S, salário-educação, contribuição para acidentes de trabalho, Sebrae e até para o Incra! Já o trabalhador tem R$ 241 descontados do contracheque para INSS e imposto de renda. Ou seja, do salário de R$ 2 mil, o governo recebe R$ 837, calculou Carlos Alberto Sardenberg.

Até agora, na campanha eleitoral, a única proposta de aumentar tributos foi feita pela candidata do PT. Para ela, foi um erro ter acabado com a CPMF, que até 2007 rendia polpudos R$ 40 bilhões anuais ao governo federal: “Não houve resultados práticos no que se refere ao bolso do consumidor”. Em contraponto, José Serra prometeu zerar PIS e Cofins de investimentos em obras de saneamento básico.

Dizia Nelson Rodrigues que toda unanimidade é burra. Como dona Dilma não nos deixa ser unânimes, resta claro que diminuir a carga de impostos praticada no Brasil é medida inteligente. E urgente.