quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Socorro tardio à Petrobras

Os combustíveis ficarão mais caros a partir de hoje. Não é uma boa notícia para consumidores, mas é crucial para que a Petrobras não continue sua trajetória ladeira abaixo patrocinada pela insana gestão que lhe foi imposta pelo PT. O socorro chega com atraso e não deve evitar que os maus resultados da maior empresa pública do país continuem a ocorrer.

O reajuste autorizado ontem é de 6,6% para o preço da gasolina e de 5,4% para o do óleo diesel, ambos nas refinarias. Para o consumidor final, a alta deve ser um pouco menor, em razão, por exemplo, da mistura de álcool: estima-se que, nas bombas, o aumento será de 4% para a gasolina e de 3% para o diesel.

Não é de hoje que o reajuste tornou-se premente. Usada pelo governo como instrumento de controle da inflação, a Petrobras vem sendo obrigada a importar gasolina – também se tornou uma mega-compradora de etanol nos últimos anos – e vendê-la a preços bem mais baixos no mercado interno. Há quase oito anos, o preço desse combustível ao consumidor não era alterado.

Só no ano passado, a defasagem entre o que paga lá fora e o que recebe aqui dentro rendeu prejuízo de R$ 25 bilhões à estatal. As perdas não irão desaparecer: mesmo com a correção dos preços a partir de hoje, a companhia deve continuar amargando rombo de R$ 1,2 bilhão por mês. A gasolina continuará com defasagem de 11,8% em relação aos valores internacionais e o diesel, de 12,2%, de acordo com o Valor Econômico.

O reajuste dos combustíveis terá impacto na inflação, porém modesto: 0,3 ponto percentual, segundo analistas. Mas o aumento só será possível em razão da redução das tarifas de energia e a postergação de reajustes nos transportes públicos de cidades como São Paulo. Ou seja, tanto num quanto noutro caso, com apoio de governos de oposição ao PT.

O aumento chega às vésperas da divulgação do resultado da Petrobras em 2012. Os números serão conhecidos na segunda-feira e devem ser bem ruins, com queda de cerca de 15% no lucro e de 2% na produção, segundo a Folha de S.Paulo. O governo antecipou-se para tentar evitar reações ainda mais amargas dos investidores, já desiludidos com a companhia.

A outrora maior empresa brasileira tem trilhado trajetória descendente nas garras do PT. A legenda de Lula, Dilma e José Dirceu transformou a estatal num verdadeiro feudo político, dobrando-a a frequentes investidas partidárias. Em dez anos, a Petrobras vergou sob o peso da exploração petista.

A expectativa é de que, daqui a cinco dias, a empresa anuncie a terceira queda anual de produção de seus 59 anos de história. Até agora, só Fernando Collor de Mello, em 1990, e Luiz Inácio Lula da Silva, em 2004, conseguiram a proeza. Com os resultados de 2012, Dilma Rousseff deve juntar-se a este nada memorável time: até novembro, a Petrobras produziu 2,3% menos do que em 2011.

Nos últimos 12 meses, a empresa perdeu R$ 86 bilhões em valor de mercado, anulando praticamente todo o valor capitalizado em 2009, por ocasião da operação de reforço de caixa feita com vistas à exploração do pré-sal. Ou seja, o que lá puseram, acreditando em boas perspectivas, os acionistas perderam.

“O caminho tomado até chegar a este ponto foi pavimentado por projetos com custos subestimados, investimentos de necessidade discutível, falta de manutenção em equipamentos estratégicos – dos quais depende a produção, em queda – e uma longa e desastrosa defasagem entre o preço interno de combustíveis e o custo de importação, mantida por Brasília”, analisou O Globo ontem em editorial.

A Petrobras tem um plano de negócios de US$ 236,5 bilhões estabelecido para o período 2012-2016. Dele depende, por exemplo, a expansão da exploração das reservas brasileiras do pré-sal. Mas a má gestão e o uso da companhia como instrumento partidário têm atrapalhado os investimentos nesta nova fronteira de produção, prejudicando o futuro do país como um todo.

Garrotear os preços dos combustíveis tem sido mais um dos artificialismos de que o governo petista tem tido de lançar mão para impedir que a inflação, já alta, saia do controle. Mas a incúria desta política está custando a saúde e a solvência da maior empresa pública do país. O socorro de agora pode ter chegado tarde: à Petrobras é impossível suportar os descalabros da gestão petista.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Por uma cultura da prevenção

O incêndio que deixou 231 mortos, além de 76 pessoas feridas ainda em estado gravíssimo, em Santa Maria desencadeou uma onda de reações de agentes públicos. Busca-se evitar a repetição da tragédia. O país ganhará se, da comoção em torno do infortúnio, forem tiradas não apenas lições, mas, principalmente, medidas que visem implantar uma verdadeira e duradoura cultura da prevenção entre nós.

Legislar sobre o funcionamento de casas noturnas tem sido até agora atribuição de órgãos estaduais e, mais frequentemente, municipais. Apenas algumas normas técnicas de segurança – como as da ABNT – têm alcance nacional. Constata-se que o ideal é a criação de uma legislação de cunho federal, que sirva para, pelo menos, estreitar as chances para a ocorrência de novas tragédias.

Num país de dimensões continentais e realidades absurdamente díspares, a padronização das normas facilitaria o trabalho de prevenção e de fiscalização de todos. Restritas apenas às órbitas estaduais e municipais, muitas vezes as iniciativas de segurança descambam para os meandros de burocracia e acabam se convertendo em oportunidades de corrupção.

Mais importante, porém, que legislar será garantir que as normas sejam rigorosamente cumpridas, o que não é comum no país. A comoção do momento não pode ser aplacada com mera fúria legislante, logo suplantada pela leniência e pela negligência dos que devem executar as leis.

Tragédias ocorridas em outros lugares do mundo podem fornecer aprendizados e apontar caminhos a seguir. Um incêndio ocorrido numa casa noturna de Rhode Island há dez anos, por exemplo, legou regulamentos antifogo ainda mais rigorosos aos Estados Unidos, país que há mais de um século já buscava prevenir com vigor ocorrências desta natureza.

Como consequência, por exemplo, todas as casas noturnas norte-americanas com capacidade para mais de 100 pessoas tiveram que instalar chuveirinhos anti-incêndio nos tetos. Além disso, fogos de artifício passaram a ser admitidos apenas em locais com mais de 930 metros quadrados, mostra a Folha de S.Paulo.

Da Argentina, também podem ser tomados ensinamentos para prevenir tragédias. Lá, um incêndio numa casa noturna superlotada no penúltimo dia de 2004 deixou 194 mortos e mais de mil feridos. Além da interdição de quase 140 estabelecimentos em Buenos Aires, o país vizinho rapidamente aprontou uma férrea legislação preventiva após o acidente.

Algumas das medidas poderiam ser aproveitadas por aqui: divulgação das informações sobre as condições de segurança dos estabelecimentos na internet; obrigatoriedade de divulgação ostensiva relativa ao número máximo de pessoas permitidas na casa; reforço da sinalização interna indicando saídas de emergência.

Voltando ao Brasil, o que se tem são as velhas delongas de sempre. O Globo noticia hoje que um grupo de especialistas sugeriu, ainda em 2009, a criação de um código nacional de segurança contra incêndio ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Seria decorrência de um projeto contratado em 2005, intitulado Brasil sem Chamas. O estudo, porém, só será concluído no mês que vem. É de se questionar: por que tamanha demora?

Assim, as ações preventivas continuam restritas à órbita local. Neste momento, agem corretamente os prefeitos que determinaram inspeções em massa dos estabelecimentos noturnos e casas de espetáculos existentes em suas cidades. Mas, em seguida, a revisão das atuais normas gerais de funcionamento e a adoção de legislação de alcance nacional serão imprescindíveis.

O país ganhará com a uniformização das regras de prevenção a acidentes, valendo-se, inclusive, também da experiência dolorosa de outros países. Quem sabe não surge daí uma nova cultura que não se limite a evitar que a tragédia de Santa Maria se repita, mas que também ajude o Brasil a deixar para trás nefastas práticas cotidianas que só conspiram contra a segurança e o bem-estar de seus cidadãos.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Os jovens de Santa Maria

A tragédia ocorrida na madrugada deste domingo em Santa Maria (RS) une os brasileiros em torno do luto e do pesar pela morte de 231 pessoas, a maioria jovens ainda com a vida inteira pela frente. Para todos os que lidam com gestão pública, da dor devem emergir atitudes efetivas que visem evitar que desastres como estes, e mesmo acidentes cotidianos menores, continuem a se repetir no país. O Brasil está cansado de leniência, seja de quem for.

O incêndio na boate lotada de estudantes universitários foi causado por uma série de erros, segundo relatos feitos por autoridades e testemunhas e reproduzidos hoje pelos jornais. Equipamentos inadequados de prevenção, rotas de fuga e emergência inexistentes, uso indevido de fogos de artifício em local fechado. Nada disso, claro, se compara ao sofrimento de pais, familiares, amigos que perderam entes queridos na madrugada de domingo.

O episódio é a maior tragédia desta natureza ocorrida no país desde o incêndio do Gran Circo Americano, que fez 503 mortos em Niterói (RJ) em 1961. O fogo na boate Kiss – que também deixou 127 feridos, muitos deles ainda em estado grave – deve servir para que se adotem medidas rigorosas de prevenção e combate a acidentes, e não apenas em locais destinados a diversão, no país.

Temos uma cultura que privilegia a normatização, mas pouco cuida para que as regras sejam cumpridas. Que este lamentável acidente nesta cidade universitária no interior do Rio Grande do Sul sirva para mudar isso: é de cuidar e preservar vidas que se trata, e de fazer com que as leis sejam aplicadas em benefício dos cidadãos.

Vale lembrar que tragédia semelhante ocorreu em Buenos Aires em 2004: 194 pessoas morreram num incêndio numa discoteca, a República Cromañón. Lá o episódio acabou motivando a criação de uma legislação específica mais rigorosa de prevenção. Deveríamos trilhar o mesmo caminho.

Em suas diferentes esferas, os governos federal, estaduais e municipais precisam assegurar que os órgãos responsáveis por fixar normas para funcionamento de estabelecimentos comerciais e pela sua fiscalização ajam rigorosamente desde já para impedir que a tragédia de Santa Maria se repita.

Importa também fazer o que defende o Zero Hora, no editorial de sua edição de hoje: “O caso da boate Kiss deve servir de referência para que os legisladores revisem as normas de funcionamento de casas de espetáculos e para que os órgãos fiscalizadores adotem procedimentos mais criteriosos e mais transparentes na aferição das condições de segurança desses estabelecimentos”.

Numa hora como esta, não há governo e oposição; há seres humanos comovidos pela dor que poderia acometer diretamente cada um de nós. É esta sensação de que o risco nos espreita e de que, muitas vezes, é feito pouco para proteger os cidadãos e para zelar pela vida humana que nos aterroriza. Mas é possível evitar que o pior volte a acontecer: basta não esquecer, jamais, os jovens de Santa Maria.

sábado, 26 de janeiro de 2013

Trevas no palanque

Foi praticamente unânime a desaprovação ao tom político-partidário que a presidente da República imprimiu ao pronunciamento que fez à nação na noite de anteontem. Ficou evidente que Dilma Rousseff transformou um instrumento de Estado num palanque eleitoral. Ela conseguiu transfigurar o que poderia ser um triunfo administrativo numa atitude amplamente reprovável.
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Quase metade dos oito minutos e 23 segundos do pronunciamento que deveria servir para comunicar a redução das tarifas de energia foi destinada a atacar os que fazem críticas à forma como a medida foi tomada pelo governo federal ou levantam preocupações quanto ao suprimento energético num momento em que os reservatórios das usinas do país encontram-se em níveis historicamente baixos.

Nesta corrompida visão, à qual o marketing do PT lança mão principalmente em momentos em que se vê mais acuado, o país foi dividido entre “nós” e “eles”, entre os “a favor” e os “do contra”. É a versão petista do “Ame-o ou Deixe-o” celebrizado pela ditadura militar na década de 1970.

Dilma foi eleita para governar para todos os brasileiros, mas comportou-se como líder de facção. Repetiu, em todos os atos e com todas as letras, seu tutor, Luiz Inácio Lula da Silva – que, aliás, promete encontrar-se hoje em São Paulo com a presidente para ditar-lhe rumos para seu governo, assim como já fez com outro poste petista, o prefeito da capital paulista.

A rede nacional de rádio e televisão foi convertida por Dilma e seus marqueteiros em comício de campanha. Vinte e um meses antes da próxima eleição, na qual sua participação ainda não é dada como certa nem por parte dos petistas, a presidente fez proselitismo político, prometeu o que não pode garantir – a ausência de risco de racionamento – e anunciou uma medida que, mais uma vez, se vale de malabarismos contábeis para parar em pé.

Para a Folha de S.Paulo, em editorial na edição de hoje, Dilma manifestou-se “com um triunfalismo que não encontra respaldo na realidade”, usando o espaço institucional para “criticar, com uma agressividade inusual,” os que não lhe dizem amém. 

Também em editorial, O Globo avaliou que a presidente fez “exploração política da questão da energia” e empregou “um tom apelativo, beirando o sentimento de patriotismo a que governos autoritários militares recorriam com frequência”. Já O Estado de S.Paulo não tem dúvidas do caráter eleitoreiro da atitude da presidente: em cadeia nacional, Dilma “discursou como se estivesse em um palanque”.

A propaganda – oops, o pronunciamento – de Dilma fez constar em letras garrafais que não haverá “nenhum risco de racionamento” de energia no país, algo que nem São Pedro pode garantir, muito menos com base na incômoda situação em que se encontram os reservatórios brasileiros neste momento.

Nem mesmo a expansão da oferta de energia assegurada pela presidente pode ser dada como certa. Em cadeia nacional, ela anunciou acréscimo de 8,7 mil megawatts em 2013, o que equivale a mais que o dobro da média anual verificada na última década. Além disso, um terço do que ela promete são obras atrasadas que já deveriam estar em operação, como mostra hoje a Folha.

Não bastasse o caráter eleitoreiro do pronunciamento oficial e a inconsistência de cenários e dados apresentados à nação, confirmou-se ontem que a redução das tarifas de energia será viabilizada por mais uma operação temerária com dinheiro do contribuinte, ancorada em mais uma criativa manobra contábil.

Para honrar o corte nas tarifas, o Tesouro terá que aportar R$ 8,4 bilhões e não R$ 3,3 bilhões, como já se especulava. Para tanto, será preciso antecipar recursos a receber de Itaipu, emitir títulos da dívida pública e transferi-los ao BNDES. Em suma, consumir receita futura para financiar despesa corrente, com aumento da já alta dívida bruta, como analisa Mansueto Almeida em seu blog.

O governo nem sabe ao certo como fará isso. “De onde o Tesouro vai tirar o dinheiro é um problema do Tesouro”, desdenhou o ministro que deveria cuidar do setor de energia, mas não quer nem saber quem pagará a conta. A gestão petista também não faz ideia de quanto terá que desembolsar para bancar a redução tarifária – as estimativas divulgadas ontem vão só até 2014; depois disso, seja o que Deus quiser.

A redução dos custos de energia merece todo o apoio, porque busca atenuar pelo menos parte das deficiências e ineficiências de infraestrutura que grassam no país, contra as quais a gestão Dilma pouco tem feito. Mas, desde o primeiro instante, ficou claro que à administração petista importa menos o interesse nacional e muito mais os dividendos eleitorais. São atitudes recorrentes de um governo de trevas.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Quem vai pagar a fatura?

Conta de luz mais barata é bom e todo mundo gosta. Ninguém foi ou será contra a redução das tarifas da energia anunciada ontem pelo governo federal. A questão é saber as consequências da medida, seja para a segurança do abastecimento, ainda longe de estar garantida, seja no bolso do contribuinte. Afinal, quem vai pagar esta fatura?

Num passe de mágica, o governo federal diz agora que a redução das tarifas será ainda maior do que anteriormente previsto. A queda nas faturas residenciais alcançará 18% e não 16,2%, e para as indústrias será de até 32% e não de no máximo 28%, como vinha sendo anunciado desde setembro. Maravilha, mas... como?

A primeira explicação para a bondade adicional está no aporte que o Tesouro terá que fazer para bancar o desconto maior. Nos últimos meses, o governo vinha falando que seriam necessários R$ 3,3 bilhões para honrar o compromisso – custeado em sua maior parte, recorde-se, pelo beiço que o Planalto impôs às empresas de energia.

Mas ontem já começou a circular a hipótese de que o aporte terá que ser muito maior, superando R$ 8 bilhões, de acordo com o UOL. Que não restem dúvidas: o dinheiro virá do meu, do seu, do nosso dinheiro pago a título de impostos, taxas, encargos etc ao governo federal. Basta ver que o montante de tributos recolhidos pelos brasileiros ao poder central superou R$ 1 trilhão no ano passado, um recorde absoluto, conforme divulgou ontem a Receita.

Até agora, ninguém no governo se apresentou para mostrar de que maneira, efetivamente, o desconto prometido será alcançado. Tanto o órgão regulador do setor, a Aneel, quanto o próprio Tesouro emudeceram. Segundo a Folha de S.Paulo, “a decisão pegou de surpresa até mesmo integrantes do governo envolvidos com o tema”.

Também deve-se ter em mente que, por mais que procure, o consumidor não vai conseguir encontrar na sua conta de luz o robusto percentual de dois dígitos prometido pelo governo. A explicação é que, da promessa, terão que ser descontados os aumentos previstos para as tarifas de energia neste ano. Em suma, a conta vai cair, mas bem menos do que Brasília alardeia.

Um exemplo, citado por O Globo: no Rio, a Ampla passa por processo de revisão tarifária, previsto nos contratos, e teria aumento de 14% em março, anulando boa parte da redução anunciada ontem. Com isso, a tarifa atual no estado deve ter queda de apenas uns 4% a 5%. A concessionária do Rio não é caso único: outras 28 das 65 distribuidoras do país têm revisão programada para este ano, num processo que acontece em ciclos de quatro ou cinco anos. Entre elas, estão a Eletropaulo e a Copel.

Outra parte da conta, fatalmente, será bancada pelo aumento dos combustíveis. Segundo analistas ouvidos por O Globo, a redução nas tarifas de energia anunciada ontem abre espaço para um reajuste de até 15% nos preços praticados nos postos. Não se nega que o aumento da gasolina e do óleo diesel seja necessário, mas o que se constata é que o governo dá com uma mão e tira com a outra.

É certo, como ensinou o economista norte-americano Milton Friedman ainda no início dos anos 1970, que não existe almoço grátis. De algum lugar partirá o dinheiro que possibilita ao governo petista fazer proselitismo político com as tarifas de energia: em se tratando das práticas vigentes em Brasília nos últimos dez anos, o bolso do contribuinte é a alternativa mais provável.

Um último aspecto a considerar são os efeitos da medida para o futuro do abastecimento de energia no país. A capacidade de geração de lucro e, consequentemente, de investimento das empresas concessionárias, que já deram toda a sua cota de sacrifício, foi definitivamente comprometida, com possíveis impactos danosos na expansão da oferta doravante.

Tal desequilíbrio – se, por ventura, não resultar em racionamento, como garantiu ontem a presidente Dilma Rousseff – irá demandar acionamento cada vez mais frequente das usinas termoelétricas. Em consequência, a energia que o governo hoje baixa na marra inexoravelmente voltará a ficar bem mais cara num curto horizonte de tempo. É possível que os brasileiros não levem muito tempo para se dar conta de que foram eletrocutados.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Guerra ao crack

Diante da explosão do consumo de crack, o governo de São Paulo tomou a ousada iniciativa de proceder a internação compulsória de usuários. Trata-se de medida extrema, diante de uma situação extrema: o limiar em que o ser humano perde, praticamente por completo, o controle de seus atos. Omitir-se perante esta realidade seria bem pior.

A iniciativa foi deflagrada no início desta semana na região central da cidade de São Paulo. Desde então, vem suscitando acalorados debates entre defensores e opositores. Mas os primeiros resultados efetivos começam a aparecer: dezenas de usuários têm procurado as equipes multidisciplinares escaladas pelo governo paulista para atender os dependentes químicos. Buscam ajuda.

O trabalho envolve parceria com o Ministério Público, o Tribunal de Justiça e a OAB, que atuam para agilizar a internação compulsória de viciados em casos extremos e encaminhá-los para internação e tratamento em órgãos públicos de atendimento e assistência social. Há quase 700 leitos disponíveis para acolhimento no estado de São Paulo.

Tudo tem amparo legal: a Lei Federal de Psiquiatria (n° 10.216, de 2001) permite tanto a internação compulsória quanto a involuntária. Para que a internação aconteça, são necessários laudo médico e decisão judicial, com objetivo de resguardar direitos e preservar a vida do cidadão. Um plantão judiciário acompanha toda a operação, que não envolve uso de força policial e pretende ser uma ação permanente do Estado.

O governo paulista é o primeiro a adotar a estratégia, mas outros estados já ensaiam seguir o mesmo caminho, como o Rio de Janeiro. Trata-se de iniciativas do poder público em suas diferentes esferas para enfrentar um problema que se transformou numa verdadeira guerra dentro do Brasil: o consumo de crack tomou proporções alarmantes e exige atuação urgente.

Antes confinada a grandes centros urbanos, a droga, um subproduto barato e devastador da cocaína, vem se espalhando por todo o país nos últimos anos. Praticamente não há mais localidades onde o consumo do crack não esteja presente e seja motivo de angústia para milhares de famílias. Jovens, adultos e idosos estão entre suas vítimas.

Segundo levantamento feito pela Confederação Nacional dos Municípios em fins de 2011, 90% das cidades brasileiras registram consumo de crack. O subproduto do uso da droga é a violência: pesquisa feita por estudiosos da PUC de Minas Gerais indicaram estreita correlação entre a disseminação da droga e o aumento de homicídios.

Tamanha ocorrência, em proporção de epidemia, deveria ser suficiente para comover o governo federal a agir com redobrada ênfase. Mas não é o que se vê. O tema já suscitou ações inócuas lançadas por Lula em fim de mandato, foi tema de campanha de Dilma Rousseff e deu origem a um novo programa, anunciado pela presidente em dezembro de 2011.

Batizado de “Crack, é possível vencer”, ainda está, contudo, muito longe de alcançar suas metas. Um exemplo: o governo anunciou que pretendia criar 2.460 leitos em enfermarias especializadas para acolher usuários, mas, até agora, segundo o Ministério da Saúde, foram abertas apenas 124 vagas, ou 5% do total prometido, informou O Globo na semana passada.

O que parece fora de questão é que o enfrentamento às drogas e a busca pela redução do consumo devem estar no topo da agenda das autoridades públicas brasileiras. Não há uma solução única para problema tão dramático quanto complexo. A ação do governo paulista mostra-se um esforço a mais nesta direção. Agir é muito melhor do que simplesmente ver a situação degringolar ainda mais, sem sair do lugar.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Balança maquiada e desequilibrada

Está cada vez mais difícil confiar na contabilidade oficial. A gestão petista especializou-se em artifícios de toda sorte para maquiar seus maus resultados. Agora é a vez de a balança comercial ser manipulada. Não fosse isso, o país poderia até ter apresentado déficit no seu comércio exterior em 2012.

A maquiagem está ficando explícita aos pouquinhos, na divulgação dos resultados semanais da balança neste primeiro mês do ano. O que começou com um rombo de US$ 100 milhões na primeira semana de janeiro, chegou a US$ 1,7 bilhão na terceira. Trata-se de comportamento inédito em 18 anos de medições.

Na soma, as transações comerciais com o exterior acumulam até agora US$ 2,7 bilhões no vermelho, de acordo com informações divulgadas ontem pelo Ministério do Desenvolvimento. Mantida a tendência, a balança brasileira terá, neste janeiro, o pior resultado mensal verificado desde o início da série histórica da Secretaria de Comércio Exterior, iniciada em 1995.

Terão as condições piorado tanto, e de maneira tão repentina? A resposta é não.

A explicação para o que está acontecendo com as transações de comércio exterior neste início de 2013 deve ser buscada no último trimestre de 2012, quando a Petrobras deixou de registrar suas importações de petróleo e derivados no sistema. São estas operações que estão agora engordando as estatísticas da balança e inflando o déficit.

A postergação dos registros na contabilidade não tem nada de fortuito. Baseia-se numa decisão da Receita Federal, que passou a permitir, desde junho último, que a esta­tal registrasse suas operações de compra e venda de combustíveis até 50 dias após o desembaraço nas alfândegas.

Estima-se que a Petrobras tenha deixado de lançar algo como US$ 10 bilhões na conta das importações do país em 2012. As exportações, porém, foram todas computadas até o fim de dezembro. Com isso, o governo conseguiu manobrar para evitar que o saldo da balança comercial decaísse para terreno negativo no ano passado, como mostra O Globo em sua edição de hoje.

A maquiagem pode até ter impedido o déficit em 2012, mas não evitou que a balança comercial brasileira exibisse seu pior desempenho em dez anos: o superávit foi de apenas US$ 19,4 bilhões, com queda de 34,8% sobre 2011.

Como se sabe, as ocorrências exotéricas nas estatísticas do comércio exterior brasileiro estão longe de ser caso isolado. As contas públicas foram objeto de manipulação muito mais grave na virada do ano, com objetivo de engordar o superávit fiscal e forjar a consecução da meta fixada para o ano.

Trata-se de lambança com a qual o PT conseguiu superar-se em criatividade e ousadia. O nefasto histórico inclui, ainda, as bilionárias transferências para o BNDES feitas ao longo dos últimos quatro anos e o encontro de contas feito com papéis da Petrobras – sempre ela – por ocasião da capitalização da empresa, em 2009.

As manobras levadas a cabo pela equipe econômica – seja com as bênçãos de Lula, seja agora com as de Dilma Rousseff – comprometem a credibilidade das informações divulgadas pelo governo federal e corrompem a necessária prestação de contas à sociedade. 

Ilustram, também, o desprezo petista em relação à transparência e a lisura que devem nortear a administração pública. Se o partido que está no poder é capaz de todo tipo de maquiagem na contabilidade oficial para ludibriar os contribuintes, imagine o que não acontece de ainda pior por debaixo dos panos. 

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Entre palavras e atos, uma estrada esburacada

Há uma distância enorme entre as palavras e intenções expressas pela presidente da República e suas efetivas realizações. Dilma Rousseff promete eficiência e celeridade, mas produz quase só atrasos e malversações. Não adianta traçar metas ambiciosas, se a capacidade de executá-las não existe. Entre as palavras e os atos presidenciais, há uma longa estrada esburacada.

Na sexta-feira, aboletada em cima de um palco convertido em palanque no Piauí, Dilma prometeu “crescimento sério, sustentável e sistemático” para este ano. Seu discurso não corresponde aos fatos e só com lábia não se movem montanhas nem tampouco se sensibilizam os cofres de quem constrói o futuro do país.

Uma minuciosa análise do Orçamento Geral da União feita neste fim de semana pela Folha de S.Paulo comprova quão devagar as ações do governo federal têm andado sob o governo de Dilma. Áreas fundamentais para destravar o desenvolvimento do país, como a de infraestrutura, estão à míngua.

Gastos em transportes, saneamento, urbanismo e segurança pública foram mais baixos em 2012 do que no último ano da gestão Lula. Em dois anos, as despesas com transportes caíram 22% em termos reais – ou seja, descontada a inflação do período. As com saneamento e urbanismo diminuíram 19,5% e as com segurança pública, 25,7%.

Entre as razões apontadas, estão os escândalos de corrupção e roubalheira que marcaram os primeiros meses da gestão Dilma em ministérios como o dos Transportes e o das Cidades, paralisando o governo.

“Em contraste com sua imagem pública de gestora de obras, a presidente Dilma Rousseff deixou a infraestrutura minguar em sua primeira metade de mandato”, estampou a Folha na sua manchete de domingo. O texto informa que, em contrapartida, cresceram os investimentos federais em educação e saúde, o que é bom.

Os exemplos de incúria em relação aos investimentos federais pipocam pelo país. No setor elétrico, o descasamento entre obras de geração e empreendimentos de transmissão de energia contribui para aumentar o risco de racionamento. Já vem acontecendo com as usinas eólicas e afetará também a operação da hidrelétrica de Santo Antônio.

“A décima das 27 turbinas da usina hidrelétrica Santo Antônio, em Rondônia, acaba de entrar em funcionamento, mas a energia que gera não pode ser levada para a região Sudeste, onde os consumidores enfrentam risco de apagão, porque a linha de transmissão do Madeira — apelidada de “linhão” — está atrasada e sem plano de conexão”, mostra hoje o Brasil Econômico.

Ao mau planejamento, soma-se a lentidão. Um e outro tornaram-se marcas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), cada vez mais transformado de filho dileto em parente renegado pelo governo petista.

Em sua edição de ontem, O Estado de S.Paulo analisou 107 obras rodoviárias do programa e concluiu que elas avançam, em média, 1,3 quilômetro por mês. Numa conta simples, significaria dizer que cada uma delas executa 12 metros a cada 30 dias. Como isso é possível, senão com uma caprichada ineficiência?

O país encontra-se às voltas com o dilema de voltar a crescer para sustentar um ciclo duradouro de desenvolvimento e ascensão social. Mas o governo não tem demonstrado capacidade de responder o desafio à altura e, para piorar, resiste a permitir que a iniciativa privada tome a frente dos investimentos. Só promessas não serão suficientes para alterar um vistoso histórico de fracassos e frustrações.

sábado, 19 de janeiro de 2013

Passeando no Nordeste

Dilma Rousseff retorna hoje ao Nordeste. A presidente pretende mostrar que seu governo está agindo em prol da região. Infelizmente, suas intenções não correspondem aos fatos. Os estados nordestinos só têm recebido atenção de Brasília no papel e na saliva.

De tempos em tempos, Dilma volta à região para o conhecido “bater de bumbo”, jargão do mundo político para se referir à promoção de ações de governo. Hoje, ela estará no Piauí para entregar algumas moradias.

Inicialmente, o programa oficial previa a inauguração de um sistema adutor de água, cuja conclusão fora prevista para o primeiro semestre de 2012. Mas, na última hora, constatou-se que ainda não havia o que entregar e a presidente terá que se contentar com uma mera visita à obra, localizada no município de São Julião (PI).

Dilma pretende rodar a região nas próximas semanas, num giro que inclui ainda Pernambuco, Ceará, Alagoas, Paraíba e Rio Grande do Norte. Seus assessores terão que montar as agendas presidenciais com cuidado redobrado: nas últimas vezes em que foi ao Nordeste, Dilma não conseguiu encontrar as realizações que alardeava.

Foi o que aconteceu, por exemplo, em fevereiro do ano passado, quando ela quis visitar obras da transposição do rio São Francisco e da ferrovia Transnordestina. Só conseguiu ver canteiros malparados e ainda teve que evitar decepções maiores, riscando na última hora sua passagem por Missão Velha (CE) e Cabrobó (PE), onde o quadro era mais desolador.

A lista de obras periclitantes é extensa: além da transposição e da Transnordestina, inclui a Ferrovia Oeste-Leste, o porto de Ilhéus, as refinarias da Petrobras, a BR-101, os metrôs das principais capitais nordestinas e até mesmo os malfadados navios petroleiros que só conseguem navegar depois de muito atraso.

Em setembro, o Valor Econômico mostrou que a carteira de investimentos federais na região soma R$ 116 bilhões, mas, na média, estes empreendimentos tinham três anos e meio de atrasos. A julgar pelo baixíssimo desempenho orçamentário do governo federal em 2012, a situação não mudou desde então.

A transposição do Velho Chico, por exemplo, só recebeu 18% da verba prevista para o ano passado, mostrou O Estado de S.Paulo no último dia de dezembro. A execução se restringiu, basicamente, a restos a pagar dos anos anteriores. Com isso, a obra, inicialmente prometida pelo PT para 2010, teve menos de 50% executados até agora e só ficará pronta em 2015, na melhor das hipóteses.

Em outubro, a Confederação Nacional da Indústria divulgou levantamento em que mostra que somente um quarto de uma lista de 83 projetos prioritários para o Nordeste estava em andamento. Um extenso rol de obras continua na gaveta ou avança a passos de tartaruga. A penúria é maior no caso das ferrovias e dos portos.

É o que acontece no Piauí que Dilma visita hoje. A agenda presidencial guardou profilática distância das obras da Transnordestina no estado, onde está 30% do traçado da ferrovia – situado entre Eliseu Martins (PI) e Salgueiro (PE). Há dois anos, a presidente afirmou que pretendia entregar a obra até 2013, mas, segundo técnicos do governo, só 20% dos trilhos foram assentados, como mostra hoje o Estadão.

Por suas belíssimas atrações turísticas e suas paradisíacas praias, o Nordeste tem sido o refúgio de presidentes em férias. Mas, quando estão a trabalho, eles não deveriam ir à região apenas a passeio, como fará Dilma Rousseff hoje. Quem sabe numa próxima vez a presidente tenha, de fato, algo a mostrar por lá.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Gasolina no fogo

Depois de muito postergar, o governo passou a admitir que reajustará o preço dos combustíveis nos próximos dias. A medida, correta, chegará com largo atraso, como parte dos “jeitinhos” dos quais Brasília tem lançado mão para evitar que sua política econômica desmorone de vez.

Os preços da gasolina e do diesel vêm sendo manipulados há anos para evitar altas maiores na inflação – sem muito sucesso, diga-se de passagem. Estima-se que a defasagem em relação aos preços internacionais seja atualmente de 16% no caso da primeira e de 23% no do segundo, conforme estimativa do Centro Brasileiro de Infraestrutura.

Isso causa um tremendo rombo nas contas da Petrobras e compromete o plano de investimentos da companhia (de US$ 236 bilhões até 2016), com consequências daninhas, por exemplo, para a expansão da oferta de derivados no mercado nacional. Hoje, a estatal paga pelo combustível que é obrigada a importar para suprir a demanda interna mais do que cobra dos consumidores finais.

O reajuste previsto até agora cobrirá apenas parte da diferença. Especula-se que o aumento ficará em torno de 7%, percentual que autoridades do Ministério da Fazenda consideram “plausível”. A justificativa é que, se a elevação for maior que esta, a inflação poderia sair do controle. Equivale a dizer que, se soprar, a casa cai.

O “jeitinho” custa caro à Petrobras, mas cobra preço ainda maior na forma da total desorganização que causou ao setor de combustíveis no país. Hoje, o Brasil tornou-se dependente de importação não apenas de gasolina, mas também de etanol, do qual até pouco tempo atrás era tido como produtor imbatível.

Em 2012, os gastos com importação de gasolina cresceram 82% na comparação com o ano anterior e o volume de etanol comprado lá fora cresceu 57%. Foram adquiridos 3,78 bilhões de litros de gasolina, que fizeram o país torrar US$ 2,9 bilhões, e 3,1 bilhões de litros de etanol, informou a Folha de S.Paulo na terça-feira.

O setor de combustíveis serve para ilustrar a ingerência excessiva do governo na atividade econômica e os desequilíbrios que daí advêm. A manipulação dos preços acabou gerando uma inflação reprimida que, agora, a gestão petista busca contornar por meio de malabarismos de toda sorte, que o Financial Times ironizou como “jeitinho monetário”.

Neste ambiente, o governo federal agora tem de apelar a estados e municípios – como no caso da postergação dos reajustes das passagens de ônibus em São Paulo e no Rio – para que as práticas capengas de Brasília não descambem. Mais uma vez, as finanças subnacionais são chamadas a pagar a conta dos desequilíbrios cometidos pelo poder central.

“Os truques, adiamentos, defasagens e subsídios criam uma inflação reprimida. Como sabemos, não adianta esconder, negar, varrer para debaixo do tapete porque a inflação sempre aparece. (...) Como aprendemos dolorosamente, em economia não dá para apenas quebrar o termômetro”, escreve Miriam Leitão n’O Globo.

Vai ficando claro que as autoridades do governo Dilma Rousseff já não dispõem de instrumentos eficazes de gestão da economia e, mais especialmente, de controle da inflação. O histórico de improvisos cobra agora seu preço. Ter agido assim ao longo de tantos anos, a despeito dos muitos alertas em contrário, equivaleu a atiçar gasolina no fogo.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Alegria que dura pouco

Não deve durar muito a alegria dos consumidores pela redução das tarifas de energia patrocinada pelo governo federal com o chapéu alheio das empresas concessionárias. Com os desequilíbrios que a atual matriz energética do país tem acarretado, os ganhos de agora tendem a virar fumaça em curto espaço de tempo. O governo dá com uma mão e tira com a outra.

Na semana passada, o governo admitiu que o acionamento das usinas térmicas para tentar evitar o racionamento de energia encarecerá as contas de luz, anulando parte da redução obtida com a renegociação forçada dos contratos de concessão. As autoridades oficiais disseram que o custo não ultrapassaria 3%, mas a conta será muito mais salgada, como mostra O Globo na manchete de sua edição de hoje.

O jornal ouviu especialistas e concluiu que, se as térmicas tiverem que funcionar durante todo o ano, as tarifas ficarão 15% mais caras a partir de 2013. “Isso significa que o consumidor teria de pagar a mais pela energia R$ 14,4 bilhões em 12 meses, o que anularia, já no ano que vem, a redução média de 20% na tarifa, sancionada esta semana pela presidente Dilma Rousseff”, alerta o jornal.

A possibilidade de que as térmicas tenham que ser mantidas ligadas o tempo todo não é desprezível. Atualmente, praticamente todo o parque gerador do país movido a termoeletricidade já está em operação: são 11,9 mil megawatts médios sendo produzidos em usinas a gás, óleo ou carvão, o equivalente a  20% da carga total do sistema elétrico nacional. Mesmo com a volta das chuvas, a tendência é manter a fumaça a pleno vapor.

Em função da severa seca dos últimos meses, os reservatórios das hidrelétricas ainda estão nos menores níveis dos últimos 12 anos. Houve leve melhora desde a última semana, mas é improvável que se repita a situação de 2012, quando as barragens começaram o período seco com a água armazenada em níveis recordes.

No ano passado, mesmo com a situação hidrológica confortável no fim do verão, o sistema elétrico chegou a dezembro no osso, com os reservatórios em baixa histórica. O governo já sinalizou que não pretende correr o risco de ver a situação se repetir e indicou que o uso intensivo das térmicas é prática que veio para ficar.

“O plano do Ministério de Minas e Energia é fazer com que, no médio prazo, essas usinas passem a fazer parte constante da geração do país. Isso significa que as térmicas entrarão para a base do sistema nacional e funcionarão durante todo o ano, 24 horas por dia, sendo paralisadas somente para manutenção”, informou o Valor Econômico há uma semana.

A redução das tarifas de energia é uma medida muito bem-vinda, por aliviar os orçamentos domésticos e, principalmente, colaborar para recompor, pelo menos em parte, a combalida competitividade das empresas brasileiras. Entretanto, a forma como o governo conduziu a mudança foi deplorável e indicava, desde o primeiro momento, que a novidade poderia vir a ter fôlego curto, como agora se percebe.

A mudança nos custos de energia exigia uma abordagem estrutural do problema, que atacasse, primordialmente, a alta carga de tributos e encargos pendurada nas contas de luz. O governo, porém, optou pela via do imediatismo, numa ação que tende a se esgotar num prazo muito mais exíguo do que se poderia imaginar – a despeito de, pelo caminho, ter implodido a capacidade de investimento das concessionárias e, ainda, comprometido a expansão futura do setor elétrico brasileiro.

O modelo energético gestado por Dilma Rousseff desde que foi ministra de Minas e Energia do governo Lula é uma bomba-relógio pronta para explodir. Tem se mostrado incapaz de assegurar a energia necessária para alimentar a demanda, depende excessivamente do imponderável – as chuvas mandadas por São Pedro – e não consegue sequer garantir os benefícios que alardeia, como a redução tarifária. Produz, em suma, lusco-fusco e não luz.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Cochilando com a inflação

A estabilização da moeda é uma das maiores conquistas da história recente do país, que, ao longo de décadas, conviveu com a chaga da hiperinflação. Infelizmente, nos últimos anos, e na contramão de todo o resto do mundo, o Brasil voltou a flertar perigosamente com o descontrole de preços. A experiência ensina: com a inflação não se brinca.

Nos últimos dez anos, a inflação brasileira só não superou o centro da meta estipulada pelo Comitê de Política Monetária em três ocasiões: 2006, 2007 e 2009. Em todos os demais exercícios, inclusive o de 2012, os preços subiram acima do planejado – desde 2005, a meta anual é de 4,5%.

No ano passado, o IPCA, que baliza o regime de metas para inflação no país, atingiu 5,84%. A julgar pelas projeções mais recentes, não deve decair deste patamar: segundo a edição do boletim Focus divulgada ontem pelo Banco Central, o índice deve atingir 5,53% até dezembro. Não será surpresa, porém, se a realidade contrariar os prognósticos, para pior.

Para 2014, a previsão também é de novo estouro da meta, com os agentes de mercado trabalhando com a perspectiva de inflação de 5,5% no ano. Se isso se confirmar, Dilma Rousseff terá entrado e saído do governo sem conseguir fazer com que a média geral de preços na economia se comporte de acordo com os objetivos da política oficial.

Isso significa que há, portanto, clara desconfiança dos chamados formadores de preços em relação à consistência da política econômica posta em prática por Brasília. Como a autoridade monetária projeta atingir determinado alvo, mas não se importa quando, de maneira recorrente, erra a mão, sua credibilidade vê-se arranhada.

O quadro inflacionário só não piorou mais porque o governo federal vem adotando uma série de malabarismos para domar os índices. Postergou reajustes necessários, como o da gasolina; mudou metodologias de cálculo; atuou arbitrariamente na formação de preços; manipulou tarifas públicas, como as de energia e transportes públicos, como mostra a Folha de S.Paulo hoje. Sem estes moderadores, a situação já estaria bem mais preocupante.

Quando Dilma assumiu o poder, a inflação vinha em escalada, alimentada pelos deslavados gastos da gestão Lula para excitar a economia e produzir ambiente favorável à eleição da petista. O primeiro remédio adotado pela presidente foi aumentar os juros, para, em seguida, cortá-los a machadadas – redução, diga-se, elogiável. Mas os preços mal se alteraram: altos estavam, altos continuaram.

É corrente entre petistas a tese de que uma inflação mais alta é aceitável a fim de estimular a economia. A formulação é uma das mais furadas da teoria econômica e a experiência da atual gestão está aí para comprovar: embora o nível geral de preços tenha se mantido em alta no país, o crescimento econômico mergulhou à pior média em 20 anos, de 1,8% anual.

Com isso, o Brasil de Dilma tornou-se uma jabuticaba mundial: cresce pouco, mas convive com uma inflação alta demais para os padrões globais. Alguns exemplos: a Rússia tem uma inflação relativamente próxima à nossa, porém cresceu 2,9% até o terceiro trimestre; a China fechou 2012 com inflação de 2,5% e crescimento de 7,4%; a Índia terá inflação de 7,24% com expansão de 5,3%; e os EUA devem fechar o ano próximo a 2%, com crescimento de 3,1%, conforme levantamento do economista Jason Vieira.

A inflação é uma das manifestações mais salientes da política econômica desequilibrada que a gestão petista põe em prática no país. O mais lamentável é que são justamente os mais pobres os que mais sofrem com a carestia e com o descontrole de preços. Preservar a estabilidade da moeda – uma conquista lograda pelos presidentes Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso – é um valor do qual a sociedade brasileira não abre mão. O governo Dilma não pode cochilar.

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

O risco do racionamento

O ano de 2013 começou com a repetição de velhos problemas e a constatação de outros tantos. Bastou a folha do calendário virar para nos depararmos com uma incômoda verdade: o país não tem hoje energia suficiente para sustentar suas atividades. Não eram estas as férias que Dilma Rousseff esperava ter.

O temporal de más notícias deste verão veio embalado na ameaça cada vez maior de que o país tenha que sofrer um racionamento de energia neste ou no próximo ano – quando, para piorar, ainda haverá a Copa do Mundo. O Brasil está atualmente no fio da navalha, equilibrando-se entre uma demanda que não para de crescer e uma oferta que não corresponde ao que o governo prometera.

Os reservatórios das principais regiões produtoras de hidroeletricidade iniciaram janeiro no menor nível dos últimos 12 anos: 28,9% da capacidade, abaixo do registrado em igual período de 2001, ano em que o país teve de lidar com a falta de energia em razão da falta de chuvas. Será preciso cair muita água do céu nas próximas semanas para que as perspectivas se desanuviem.

Atualmente, as usinas hidrelétricas e térmicas estão gerando energia no limite de suas capacidades. Não há qualquer folga, o que indica um péssimo planejamento no setor. Especialistas como Mario Veiga calculam em pelo menos 9% o risco de o governo decretar um racionamento daqui a quatro meses – o dobro do percentual considerado aceitável nos modelos oficiais.

Entre as razões para o risco de faltar energia, está o deficiente planejamento do governo para o setor, cuja concepção atual é toda da lavra da então ministra de Minas e Energia de Lula, Dilma Rousseff. Como se tornou comum no governo do PT, boa parte das obras prometidas não sai do papel.

O comitê oficial que monitora o setor já reconheceu que 55% das obras de geração estão atrasadas – em média, sete meses em relação ao prazo contratual – e 76% das obras de transmissão têm atraso médio de 15 meses. Para complicar, obras já prontas, como parques eólicos na Bahia, não conseguem produzir porque faltam linhas para transmitir a energia.

A primeira vítima desta incúria são os consumidores. Com a escassez, a operação do sistema elétrico nacional tem tido que recorrer a fontes de energia mais caras, como a gerada pelas térmicas, e os preços no mercado vêm disparando. A consequência virá nas contas de luz: parte da redução prometida pelo governo não acontecerá.

Segundo publicou o Valor Econômico na semana passada, “até o momento, dois pontos da queda prometida de 20% nas contas já foram tolhidos pelo alto custo da geração térmica. Até março, mantidas as condições meteorológicas atuais, esse impacto poderá chegar a cinco pontos”. Além disso, o governo já admitiu que as tarifas poderão subir até 3% em 2014 apenas em função do maior acionamento das térmicas.

Além de trazer uma conta mais salgada para os consumidores residenciais, a atual crise energética também derrubou a confiança dos empresários. Eles já não creem que poderão contar com um fornecimento firme de energia para fazer frente a seus planos de investimentos.

A maior parte das grandes empresas já trabalha com a possibilidade de um “racionamento branco”, ou seja, a redução voluntária de consumo para evitar a escuridão total. Com menos energia, é certo que produzirão menos e o país crescerá menos.

A presidente Dilma acha que consegue mudar o ânimo dos frustrados empreendedores no gogó. Desde que interrompeu suas férias na semana passada, ela tem se dedicado a audiências com pesos pesados da economia para convencê-los a acreditar nas promessas de que o governo fará sua parte e não faltará energia.

Mas suas novas promessas são tão consistentes quanto as que a presidente fez nos seus primeiros dois anos de mandato em relação ao desempenho geral da economia e jamais cumpriu: o PIB que não cresce, a inflação que não baixa, os investimentos que não acontecem. A energia inexistente tende a ser apenas mais um capítulo desta saga de infortúnios.