sábado, 29 de setembro de 2012

Se houve corruptos, há corruptores

O julgamento do mensalão avançou nesta semana na condenação de uma penca de parlamentares por corrupção passiva, e alguns também por lavagem de dinheiro. É mais um passo para chegar à conclusão inescapável: se havia quem aceitasse ser corrompido, também houve quem corrompesse. São estes que mais duramente merecem ser punidos.

Na sessão de ontem, a 29ª do julgamento, nove réus ligados ao PP, ao PL (atual PR) e ao PMDB foram condenados por terem levado grana para votar com o governo Lula. Confirmou-se, assim, o ponto central do mensalão: dinheiro desviado dos cofres públicos pelo PT foi usado pelo partido para comprar votos e apoio parlamentar no Congresso.

Com isso, outra das espúrias e fantasiosas alegações apresentadas por Lula – e repetidas por José Dirceu e os demais mensaleiros – também caiu por terra: a de que os recursos surrupiados foram empregados na quitação de dívidas da campanha eleitoral de 2002. Desabou, pois, a tese do caixa dois, nascida em 2005 na mais estapafúrdia das entrevistas concedidas por um presidente da República na história brasileira, realizada num jardim de Paris.

“Falar em recursos não contabilizados como se tratasse de mera falha administrativa no processo eleitoral é o eufemismo dos eufemismos. (...) Não se trata, evidentemente, de meras irregularidades formais, mas de desvio de vultosos recursos públicos e com o objetivo de obter apoio por parte dos parlamentares”, sentenciou ontem o ministro Gilmar Mendes.

Recapitulemos, portanto: em síntese, o governo do PT subtraiu dinheiro que deveria servir aos cidadãos brasileiros para usá-lo na compra da obediência de deputados, que deveriam retribuir na forma de votos no Congresso favoráveis ao projeto de poder petista. Isso agora está provado, com todas as letras, pelo Supremo Tribunal Federal.

Nas etapas anteriores, os ministros do STF já haviam comprovado o desvio de dinheiro dos cofres públicos, notadamente do Banco do Brasil e da Câmara dos Deputados. Em seguida, mostraram que operações financeiras fraudulentas foram montadas pelo PT junto a bancos para tentar dar ares de legalidade à falcatrua, embalada, por sua vez, em grossa lavagem de dinheiro.

Diante da avassaladora condenação que o Supremo está impondo aos mensaleiros, Lula lançou mão ontem novamente de seus costumeiros esperneios. Em mais um evento de sua caravana do desespero, para tentar salvar candidatos petistas à beira do naufrágio, o ex-presidente disse que seu governo notabilizou-se por “julgar e apurar” quem é “suspeito de cometer algum erro”, informou a Folha de S.Paulo.

Mas de que investigação levada adiante por seu governo Lula está falando? O que temos em marcha é o julgamento de um poder independente, o Supremo Tribunal Federal, que analisa acusação feita pela Procuradoria-Geral da República. Do governo petista não saiu uma gota de apuração. Pelo contrário.

No caso do mensalão, o caudilho petista fez tudo para impedir que a averiguação prosperasse. Lançou-se, ainda na condição de presidente da República, numa cruzada para “provar” que o maior esquema de corrupção da história política do país era uma “farsa”. Depois, tentou constranger o ministro Gilmar Mendes a postergar a apuração no STF para as calendas. E, já na semana passada, levou o PT e outros cinco partidos da base aliada a, sob coação, taxar de “golpismo” a legítima cobrança da oposição por esclarecimentos acerca da denúncia de que ele chefiou o mensalão.

Lula leva a extremos a tática petista de negar os fatos para se contrapor às revelações de seu envolvimento com corrupção. “Montado numa máquina publicitária, apoiado por uma miríade de intelectuais, orientado por competentes marqueteiros, o PT viverá em escala partidária a aventura individual de Maluf: negar as evidências. Até o momento nada indica que assumirá a realidade”, analisa, com argúcia, Fernando Gabeira n’O Estado de S.Paulo.

A despeito dos protestos de Lula, o julgamento prosseguirá e persistirá no caminho traçado. Na próxima segunda-feira, o STF concluirá a análise do capítulo atual, que trata das gordas remessas de dinheiro para parlamentares, acusados de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

Terminada esta fase, chegamos ao principal: quem operou o sistema de corrupção? No centro da cena estarão José Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares, gente que agiu dentro de “quatro paredes de um palácio presidencial”, como descreveu o procurador-geral da República. Certamente por isso é que Lula tanto vocifera. Certamente por isso, o PT tanto teme. Está chegando a hora de quem semeou a corrupção acertar as contas com a Justiça.

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Crack sem fronteiras

A expansão do uso de drogas, em especial do crack, é hoje uma das principais preocupações das famílias brasileiras. O Brasil tornou-se o país onde mais se consome o entorpecente derivado da cocaína. Fronteiras mal policiadas são o passaporte para que o mercado nacional seja inundado por quadrilhas internacionais. Tudo sob o olhar complacente e a inação das autoridades federais.

Antes confinado a grandes centros urbanos, o crack espalhou-se por todo o país nos últimos anos. Praticamente não há mais localidades onde o consumo da droga não esteja presente e seja motivo de angústia para familiares de usuários. O crack tornou-se uma epidemia nacional.

Pelo interior do país, espalham-se “minicracolândias”, perímetros onde reina a degradação e a falta de perspectiva. Segundo pesquisa feita pela Confederação Nacional dos Municípios em fins de 2011, 90% das cidades brasileiras registram consumo de crack; em 1.078 delas, o uso já atingiu níveis considerados altos.

O crack e sua desenfreada disseminação no território brasileiro foram um dos temas da campanha presidencial de 2010. Às vésperas do pleito, sem nunca ter feito nada para deter o avanço ao longo dos oito anos de seu governo, Luiz Inácio Lula da Silva lançou um retumbante programa de combate à droga, destinando R$ 400 milhões a ações que jamais foram realizadas.

Já na cadeira de presidente, no segundo mês de governo, Dilma Rousseff reiterou o compromisso de uma “luta sem quartéis” contra a droga. Em dezembro passado, relançou o programa que Lula lançara como mera peça eleitoral. Mas, infelizmente, até agora as providências não passaram de promessas vazias. A batalha contra o crack continua sendo perdida.

Em agosto, O Globo mostrou que o programa federal – batizado “Crack, é possível vencer” – “anda a passos lentos”. Mais correto seria dizer que simplesmente não sai do lugar. “Dados do Ministério da Saúde apontam que, dos 3.600 mil leitos que seriam criados ou qualificados até 2014, só 79 funcionam. Das 188 unidades de acolhimento infanto-juvenil, só uma saiu do papel (em Vitória, no ES). Dos 323 consultórios de rua prometidos, só 74 abriram”, informou o jornal.

É difícil saber onde estão indo parar os R$ 4 bilhões anunciados pela presidente da República para combater o flagelo do consumo de crack no país. A abertura de mais vagas de acolhimento em comunidades terapêuticas dedicadas a tratamento de dependentes também não ocorreu, como mostrou O Estado de S.Paulo na semana passada. “As exigências eram inúmeras. Foi um fracasso”, resumiu um dirigente.

Com tamanha leniência, não foi surpresa ver o Brasil alçado à condição de lugar do mundo onde mais se consome crack, segundo pesquisa feita pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Políticas Públicas do Álcool e Drogas divulgada no início do mês. Já são 1 milhão de usuários. No caso da cocaína, o consumo registrado no Brasil nos últimos 12 meses supera o de toda a Ásia. Lamentavelmente, é possível que os números estejam subestimados.

O mesmo levantamento mostra que o que colabora para a franca disseminação do mal no país é a facilidade de obter a droga. Nossas fronteiras são um verdadeiro queijo suíço por onde se contrabandeia de tudo, principalmente entorpecentes e armas – dois itens, aliás, intimamente irmanados na escalada de violência que também assola nossas cidades.

O descuido federal em relação a nossos 15,8 mil quilômetros de fronteiras tem proporções amazônicas. A despeito de toda a pirotecnia que, vira e mexe, o governo petista apronta, talvez tenhamos as divisas mais mal vigiadas do planeta, como restou mais uma vez evidente com os veículos aéreos não tripulados (VAT) que não voam.

Os VATs foram uma das estrelas da campanha eleitoral de Dilma, mas não decolam desde janeiro, conforme revelou a Folha de S.Paulo na segunda-feira. Vários motivos já colaboraram para isso: falta de combustível, de treinamento e, agora, de um contrato de manutenção a ser firmado com a empresa israelense que forneceu as aeronaves. Nisso, R$ 80 milhões já foram embora e a droga continua a passar, sem ninguém ladrar.

O desleixo do governo petista em relação ao combate ao crack e a negligência com nossas fronteiras ilustram à perfeição a inação que marca tanto a atual quanto a gestão anterior. Há muito marketing, mas pouquíssimos resultados. Há milhões de pais e mães desesperançados no Brasil aguardando que esta viagem sem volta acabe.

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Em casa de ferreiro, espeto de pau

A presidente Dilma Rousseff usou espetos de pau para falar de protecionismo ontem em Nova York. O país que mais tem adotado medidas restritivas de comércio no mundo ocupou a tribuna de abertura da Assembleia Geral da ONU para criticar quem faz exatamente o mesmo. A questão é saber se, na casa do ferreiro, menos comércio equivale a mais benefício para a população. Em geral, não.

Na tradicional cerimônia das Nações Unidas, Dilma classificou de “espúria e fraudulenta” a vantagem comercial obtida por meio de medidas protecionistas, bem como criticou “todas as formas de manipulação do comércio”. Em sua frase mais forte, disse: “Não podemos aceitar que iniciativas legítimas de defesa comercial dos países em desenvolvimento sejam injustamente classificadas como protecionismo”.

Na realidade, Dilma foi dura na condenação de uma prática que, infelizmente, tem vicejado no país com especial vigor nos últimos anos. Diferentes levantamentos apontam o Brasil entre as nações que mais têm adotado práticas de restrição ao comércio como forma de se contrapor às dificuldades econômicas surgidas a partir da crise detonada pela quebra do banco Lehman Brothers, há exatos quatro anos.

Em junho, ONU, OMC e OCDE mostraram que o governo brasileiro foi recordista na aplicação de novas medidas protecionistas no mundo ao longo de 2012, conforme informou O Estado de S.Paulo à época. Foram erigidas 17 novas barreiras contra importações e 16 medidas antidumping entre outubro de 2011 e abril de 2012. Nem a empedernida Argentina ousou tanto.

Outro levantamento, feito pela consultoria Global Trade Alert, coloca o Brasil como o oitavo país que mais adotou mecanismos de restrição ao comércio desde 2008: foram 56 medidas, criando defesa para 33 setores da economia e afetando as taxas de 258 produtos, de acordo com a entidade. Se sete países foram mais fechados, outras 194 nações foram mais liberais que nós no enfrentamento da crise.

Nesta leva, não estão consideradas as novas rodadas de restrições brasileiras, como a decisão, tomada no início deste mês, de aumentar a alíquota de importação de cem produtos estrangeiros – alvo de protestos do Departamento de Comércio dos EUA na semana passada. Naquela ocasião, o governo Dilma antecipou que outro tanto de produtos também serão afetados em breve.

Ninguém aqui defende que o Brasil seja passivo às investidas de outras nações sobre o mercado local. Não: o interesse nacional deve, sim, ser firmemente defendido pela nossa diplomacia e pelos nossos governantes. Nisso, Brasília age corretamente.

A questão é identificar até onde a escalada protecionista beneficia o cidadão, o consumidor e as empresas nacionais. Mais comércio, e mais abertura, tendem a contemplar melhor os interesses das nações do que mecanismos que restrinjam os negócios. A burocracia é inimiga da eficiência.

Quando anunciou o pacote de aumento de alíquotas no início de setembro, o governo federal divulgou que estará monitorando o comportamento dos preços praticados no varejo para garantir que o consumidor não será prejudicado por preços mais altos. Não se tem notícia, porém, de como conseguirá ressuscitar práticas pretéritas que já não cabem no ambiente econômico contemporâneo.

Fechar as portas ao comércio internacional serve, em geral, para abrir oportunidades para interesses bem situados no mercado interno. Cada concorrente externo a menos é um estorvo que um mau empresário ineficiente consegue afastar do seu caminho. Por isso, o protecionismo deve ser sempre visto com redobrada cautela.

É positivo que a presidente da República defenda os interesses do país, de suas empresas e de seus cidadãos. Mas restringir o mercado local à participação de concorrentes estrangeiros não pode servir para salvaguardar o poder de lobbies bem articulados em Brasília. O país não deve se fechar. Deve, sim, tornar-se mais eficiente, competitivo, moderno. Para enfrentar seus concorrentes de peito aberto, e não apenas nos acarpetados salões da ONU.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

O código de ética da presidente

A Comissão de Ética Pública da Presidência da República tem poucos poderes. Mas, mesmo limitadíssimos, são suficientes para incomodar o governo do partido do mensalão. Ética, na gestão do PT, não é coisa que se pratique dentro de casa; é só da boca e da porta para fora.

O pouco caso que o partido de Lula, Dilma Rousseff, José Dirceu e sua quadrilha de mensaleiros faz de princípios e valores que a sociedade brasileira tanto preza ficou mais uma vez evidenciado com a atitude da presidente da República perante a Comissão de Ética Pública. Ali, na ótica petista, só pode ter assento quem não incomoda o governo.

No início do mês, Dilma indicou três novos integrantes para compor a comissão, que, esvaziada, há dois meses não se reunia por falta de quórum. Na nomeação, aproveitou para limar do órgão dois integrantes que lhe causaram dissabores: a professora Marília Muricy e o advogado e escritor Fábio Coutinho. Embora pudessem ser reconduzidos para mais três anos na comissão, foram preteridos por Dilma.

O pecado de Marília e Coutinho foi ter recomendado reprimendas, respectivamente, aos ministros Carlos Lupi, então no Trabalho, e Fernando Pimentel, ainda no Desenvolvimento. Dilma não gostou nem um pouco de ver seus auxiliares virarem alvo da comissão, cuja missão é “zelar pelo cumprimento do Código de Conduta da Alta Administração Federal” e “inspirar o respeito no serviço público”.

Insatisfeito com a atitude de Dilma, ontem o presidente da comissão, Sepúlveda Pertence, renunciou ao cargo. Ele esperou dar posse aos novos integrantes do órgão para se afastar. O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal não escondeu a irritação com a não recondução de Marília e Coutinho: “Lamento, devo ser sincero, a não recondução dos dois membros que eu havia indicado para a comissão e que a honraram e a dignificaram”, disse.

Marília havia recomendado, em novembro do ano passado, a demissão do então ministro do Trabalho. Carlos Lupi estava enredado numa “enxurrada de denúncias”, como ela descreveu à época, das quais não conseguia se desvencilhar e muito menos explicar. Iam desde convênios suspeitos do ministério beneficiando entidades ligadas ao PDT à acumulação de cargos públicos por Lupi na Câmara dos Deputados, em Brasília, e na Câmara Municipal do Rio.

Naquela altura, Lupi era o sexto ministro de Dilma na corda bamba em razão de uma série de suspeitas de corrupção. A presidente o segurava no cargo havia um mês, quando o relatório de Marília para a Comissão de Ética Pública recomendou-lhe a demissão. Lupi caiu quatro dias depois. (O pedetista, não custa lembrar, é um dos signatários da carta-desespero divulgada na semana passada em defesa do ex-presidente Lula.)

Foi com episódios desta natureza que Dilma construiu seu fantasioso, mas conveniente, figurino de “faxineira ética” de um governo que, apenas em seu primeiro ano de existência, teve seis ministros afastados por envolvimento em corrupção e irregularidades.

Já Fábio Coutinho nem ousou ir tão longe em seus atos na comissão. Coube a ele analisar o caso das polpudas e inexplicáveis consultorias prestadas por Fernando Pimentel à Federação das Indústrias de Minas Gerais, que lhe renderam R$ 2 milhões em dois anos.

Em junho passado, Coutinho propôs a aplicação de advertência ao ministro, por considerar que seu comportamento evidenciou conflito de interesses. A comissão optou por pedir mais explicações a Pimentel e ainda não deliberou a respeito, passado quase um ano do surgimento da denúncia. Recentemente, Coutinho voltou a incomodar ao propôr verificar a legalidade das participações de autoridades em diversos conselhos de estatais.

A decisão de mexer na Comissão de Ética Pública já estava selada desde fevereiro, quando foi aberto processo para investigar Pimentel. Na ocasião, Dilma, contrariada, manifestou a intenção de mexer em cinco dos sete integrantes. “A presidente entende que a comissão está ‘extrapolando’ em suas funções ao tomar decisões contra seus ministros, na avaliação dela apenas com base em denúncias de jornais, sem uma apuração concreta”, informou à época O Estado de S.Paulo.

Até os episódios de Lupi e Pimentel, a comissão tivera atuação ainda mais tímida. Nos casos dos ex-ministros Antonio Palocci, que também enriquecera prestando consultorias, e Erenice Guerra, que transformara a Casa Civil na casa da sogra sob as barbas de Lula e de Dilma, o órgão limitara-se a aplicar-lhes mera censura ética – única cabível, uma vez que já haviam deixado seus cargos.

Com as atitudes agora tomadas por Dilma Rousseff, a gestão petista reduz efetivamente a pó a função do órgão criado pelo governo tucano para zelar pela ética pública na administração federal. Nada mais condizente com um governo cujo partido tem dez importantes figuras sentadas no banco dos réus da mais alta corte de Justiça do país respondendo pelo maior escândalo de corrupção de nossa história. Dúvida não há: ética e PT não têm, mesmo, nada a ver.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Desprezo pelo Nordeste

O Nordeste deu a Lula e, depois, a Dilma Rousseff expressivas votações. Nas campanhas petistas, a região sempre foi apresentada em cores vistosas, dona de um futuro radiante e promissor. A realidade, porém, tem contrariado as edulcoradas promessas feitas pelos petistas. Na prática, o governo federal tem virado as costas para o Nordeste.

O Valor Econômico publica hoje, em manchete, levantamento mostrando que os grandes projetos prometidos pelo PT para os estados nordestinos acumulam atrasos, veem seus custos escalarem e estão longe, muito longe de se transformar em realidade. Sobraram promessas, faltou milagre. Para o petismo, o Nordeste continua servindo apenas para proselitismo político.

Lá se vão dez anos de governo petista, lá se vão quase seis anos do lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Mas a situação, infelizmente, pouco mudou na região. Os projetos mais esperados não foram concluídos e, possivelmente, não o serão na gestão atual. Será que na próxima campanha o PT ainda terá coragem de explorá-los eleitoralmente?

A lista de obras malparadas é extensa: a transposição das águas do rio São Francisco, as ferrovias Transnordestina e Oeste-Leste, as refinarias da Petrobras, a BR-101, os metrôs das principais capitais nordestinas e até mesmo os malfadados navios petroleiros que não conseguem navegar.

Segundo o Valor, a carteira de investimentos federais na região soma R$ 116 bilhões. Na média, estes empreendimentos estão três anos e meio atrasados. Mas há os que já nem entram mais na lista, pelas parcas perspectivas de sair do papel – as refinarias Premium, por exemplo, só continuam porque, diante de protestos no Ceará e no Maranhão, a Petrobras recuou de cancelá-las.

Como se não bastasse, a paralisação da exploração de petróleo em terra por produtores independentes também golpeia a saúde econômica da região. Estas empresas concentram sua atividade em locais pobres da Bahia, Sergipe, Alagoas, Rio Grande do Norte, Maranhão e Piauí, mas estão fechando em razão da suspensão dos leilões da ANP.

Tem mais: no recente pacote de privatizações lançado por Dilma, nem um único quilômetro de rodovia ou de ferrovia situado nos noves estados da região foi contemplado pelo governo do PT. É muita maldade para um Nordeste só.

A visão do PT sobre o Nordeste é a dos coronéis que se locupletam com a pobreza na região. As obras são usadas para ludibriar eleitores, cobrar-lhes fidelidade na hora do voto, minar-lhes a autonomia. Vejamos o trato que o governo federal vem dando às intervenções contra a seca – que, neste ano, castiga os estados nordestinos como não acontecia há mais de três décadas.

Tornou-se notório o uso político de iniciativas que deveriam servir para atenuar o flagelo. O virtuoso programa de construção de cisternas, por exemplo, cujo objetivo era instalar 1 milhão de equipamentos, foi desvirtuado e distanciou-se de sua meta. A transposição das águas do São Francisco praticamente derreteu sob o sol inclemente.

Mas o que há de mais abjeto é a exploração política da calamidade. Em sua edição de hoje, O Estado de S.Paulo revela que o grupo político do ministro da Integração Nacional usa água para angariar votos para eleger Fernando Coelho Filho, deputado federal pelo PSB e filho do ministro, para a prefeitura de Petrolina (PE).

“Na Superintendência da Codevasf em Petrolina, responsável por todo o estado, nada menos que 95% dos pagamentos gerados a partir de emendas em 2011 (R$ 3,3 milhões) foram para projetos apadrinhados pelo deputado”, ressalta o jornal. Reuniões da Codevasf para cadastramento e capacitação de beneficiados com cisternas ocorrem no mesmo imóvel em que funcionam comitês do candidato. Se isso não é o velho cabresto, o que mais é?

O Nordeste tem quase 28% da população brasileira, mas continua participando com parcela desproporcional da riqueza gerada no país: pouco mais de 13% do PIB. No discurso, o PT prometeu reduzir este abismo, mas na prática apenas realimentou práticas que a sociedade abomina e que o país busca deixar, definitivamente, no passado.

Deve ser pelo pouco caso que tem dispensado à região que o partido de Lula, Dilma e José Dirceu está prestes a tomar uma surra também dos nordestinos no pleito de 7 de outubro. O desprezo e o desdém do PT em relação ao rol de promessas empenhadas e não cumpridas terão resposta à altura dos eleitores.

sábado, 22 de setembro de 2012

O PT e o horror à democracia

Dois fatores confluíram para despertar a iracunda reação do governo contra os partidos e as forças que não lhe dizem amém: a iminência de derrotas fragorosas nas urnas daqui a duas semanas e a comprovação, feita pelos ministros do Supremo Tribunal Federal, da existência do mensalão e suas vis características. Quando viu seu poder contestado, sua aura santa implodida e sua perspectiva de vitórias minada, o PT rasgou a fantasia.

Mais uma vez, o partido de Lula, Dilma, José Dirceu e sua quadrilha de mensaleiros mostrou que não consente com críticas, trata adversários como inimigos e só convive com a democracia por conveniência. Só quem tem horror ao estado democrático de direito e suas instituições vê “práticas golpistas” onde só existe o sagrado direito à crítica, o exercício do contraditório, a manifestação do livre pensar e do livre agir.

O PT esperneia diante da constatação de que foi no governo de sua maior estrela, Luiz Inácio Lula da Silva, que ocorreu o maior escândalo de corrupção da história do Brasil. Vocifera por ver alguns de seus principais capas-pretas prestes a serem condenados a passar anos atrás das grades por crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

Os petistas desesperam-se ainda mais ao constatar que a força eleitoral do partido perde ímpeto em todo o país e esfumaça-se nas principais cidades brasileiras – só numa das capitais a candidatura petista sai-se bem, ao mesmo tempo em que o PT corre risco de sequer ir ao segundo turno em locais fundamentais como São Paulo, Porto Alegre e Recife.

O Estado de S.Paulo revela que foi Lula quem articulou a raivosa “nota à sociedade brasileira” divulgada ontem pelo PT e assinada por mais cinco partidos da base: PMDB, PSB, PRB, PDT e PCdoB – noticia-se que os três primeiros teriam aderido sob coação. Além disso, segundo a Folha de S.Paulo, o texto teria envolvido José Dirceu e sido levado previamente à presidente Dilma Rousseff, que o avalizou, em mais uma atitude inadequada para o cargo que ocupa.

Seria absolutamente legítimo – mais que isso, é desejável – que o ex-presidente se manifestasse a respeito das denúncias veiculadas na revista Veja desta semana. A saber: de que ele foi o chefe do mensalão; de que ele articulava a arrecadação de dinheiro sujo dentro do Palácio do Planalto; e de que o esquema criminoso ora julgado e condenado pelo Supremo movimentou uma dinheirama muito maior do que se sabia até agora.

Mas não. Sobre isso, Lula mantém silêncio constrangido. Mais uma vez, como de hábito, em lugar de rebater fatos, ataca quem lhe pede explicações, como fizeram os partidos de oposição na última terça-feira, por meio de nota à imprensa. Ao invés de desmentir, se é possível desmentir, as acusações publicadas pela revista, ele parte para o ataque contra os que lhe reivindicam algo simples: prestar esclarecimentos sobre fatos que teriam ocorrido, com sua suposta participação, quando o petista era o presidente da República Federativa do Brasil.

Não há golpismo na atitude do PSDB, do Democratas e do PPS. Pelo contrário, há cautela e respeito pelas instituições democráticas. Tanto que os três partidos só cogitam pedir investigações ao Ministério Público sobre as denúncias publicadas por Veja quando concluído o julgamento no STF, o que só ocorrerá quando também as eleições municipais já terão transcorrido.

Mas o PT vê nas atitudes oposicionistas fantasmas de um passado que nem de longe estão presentes agora. É o desespero. Bastou a oposição colocar o dedo na ferida para os petistas destrambelharem de vez, numa escalada que teve início a partir da análise do presidente Fernando Henrique Cardoso sobre a “herança pesada” legada por Lula a Dilma, em artigo veiculado no último dia 2.

Daí em diante, o que se viu foi a marcha da insensatez do PT e do governo em ação. Já tivemos, por um lado, a presidente da República divulgando nota oficial para rebater o artigo do líder tucano, ocupando rede nacional de rádio e televisão para atacar a oposição, usando cerimônia oficial para os mesmos fins e trocando ministro para tentar interferir na campanha eleitoral à prefeitura paulistana.

De outro, a Executiva petista aloprou de vez com uma nota em que conclama seus seguidores a travar uma “batalha do tamanho do Brasil” para “desfazer mentiras”, enquanto alguns de seus dirigentes passaram a criticar o STF e a ver no julgamento do mensalão um “golpe” contra o PT, um “risco para a democracia” e uma “grande falácia”.

Neste ínterim, Lula, mesmo depois das graves revelações da Veja, não se dirigiu diretamente à opinião pública nenhuma vez, para, simplesmente, elucidar os fatos. Mas não se furtou a excursionar pelo Brasil subindo em palanques de candidatos petistas para desferir críticas irascíveis a concorrentes, como ocorreu com Arthur Virgílio em Manaus na quarta-feira e com ACM Neto em Salvador na semana passada. Ou seja, sobra-lhe disposição para atacar, mas nenhuma para esclarecer.

É lamentável que o partido que governa o país há dez anos não tenha aprendido até hoje a conviver com quem não lhe diz “sim, senhor”. Não tenha desenvolvido, neste longo período, o apreço e o carinho que a democracia merece. Não tenha reservado às instituições o respeito que qualquer partícipe de uma república lhe deve devotar. É lastimável que o PT trate tão mal a liberdade, os direitos e os valores que o povo brasileiro tanto preza.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

O petróleo e suas circunstâncias

Ensina um importante pensador espanhol que o homem é ele mesmo e suas circunstâncias. A máxima também se encaixa em decisões de governo. Atitudes corretas tomadas fora da hora não têm o condão de se tornar, por si sós, onipotentes. É o caso da demora na retomada dos leilões de exploração de petróleo: as delongas geraram – e continuam gerando – efeitos deletérios para o país que dificilmente serão compensados com a reativação das licitações.

Depois de muita resistência, o governo petista anunciou anteontem que voltará a licitar áreas para exploração de petróleo. Os certames serão retomados em 2013. Já não era sem tempo. Afinal, há quase quatro anos nenhum novo poço é levado a leilão no país. O preço saiu caro: a negligência minou o vigor que a indústria do petróleo vinha exibindo no Brasil.

Desde que o governo Fernando Henrique Cardoso aprovou a nova lei do petróleo, em 1997, a participação do setor no PIB multiplicou-se por quatro: saiu de 2,75% para 12%. Mas tamanha arrancada perdeu ímpeto na gestão petista e estancou de vez após a chegada do novo marco legal adotado após a descoberta das reservas do pré-sal.

De estrela fulgurante, o país passou a patinho feio. Sem novos negócios à vista, empresas e investidores do setor começaram a desmontar suas posições no Brasil e buscar novas fronteiras, como a África e mesmo os EUA, onde ganha impulso a exploração de gás de xisto. No ritmo atual, sem a abertura de novas fronteiras, temia-se que a área prospectada sob regime de concessão acabasse em 2016, mostra hoje Míriam Leitão n’O Globo.

Com a retomada dos leilões, renasce a esperança. O Ministério de Minas e Energia promete ofertar 174 blocos em maio de 2013. Destes, 87 são em terra e 87 no pós-sal marítimo. E, em novembro do ano que vem, as áreas do pré-sal serão oferecidas pela primeira vez à iniciativa privada. Apenas em bônus de assinatura poderão ser arrecadados US$ 1 bilhão.

As potencialidades são imensas. Há 7,5 milhões de quilômetros quadrados de bacias sedimentares pesquisados no país, mas, desta extensão, atualmente apenas 4% está sendo explorada. O pré-sal é uma gota neste oceano, praticamente intocado por ora: representa menos de 9% da produção nacional corrente de petróleo.

A expectativa em relação à retomada dos leilões vem acompanhada de apreensão, dadas as regras nas quais o governo federal amarrou a exploração das novas fronteiras. Dois são os fatores mais preocupantes: a participação da Petrobras como operadora nas áreas do pré-sal e a exigência de conteúdo mínimo nacional nas compras de insumos e equipamentos.

Pelas regras definidas há três anos, a estatal terá participação, obrigatoriamente, de pelo menos 30% nos consórcios que buscarão petróleo nas águas ultraprofundas das bacias brasileiras. O receio deve-se à limitada capacidade que a Petrobras vem demonstrando para tocar seu ambicioso plano de investimentos, que soma US$ 236,5 bilhões até 2016.

Afundada num mar de atribuições das quais não consegue dar conta, a maior empresa brasileira não cumpre suas metas de produção desde 2003, ou seja, desde a chegada do PT ao governo. Além disso, registrou a proeza de ter prejuízo, depois de 13 anos no azul. Tudo por ter sido convertida pelo Planalto em instrumento de controle da inflação e ter se metido em negócios pra lá de duvidosos. Manietada, a Petrobras travou todo o resto da indústria.

Já a exigência de conteúdo nacional mostrou-se restritiva aos negócios e um entrave à expansão da indústria de petróleo no país. São comuns itens que custam até três vezes mais no país, como tubos flexíveis usados para a ligação de poços com as plataformas. Uma atividade que, por si só, já envolve muitos riscos tornou-se, em muitos casos, proibitiva em razão dos marcos legais impostos pelo PT.

Os maus resultados desta estratégia são palpáveis. A produção brasileira de petróleo tem declinado e a média diária de julho foi 8% menor que a de dezembro passado e 2,6% abaixo da de um ano atrás, segundo a ANP. Além disso, o país que se jubilava de ser autossuficiente em petróleo agora é franco importador de combustíveis, com déficit de US$ 10 bilhões na balança de derivados em 2011.

No memorável artigo que publicou no início do mês, Fernando Henrique Cardoso afirmou: “O que mais pesa como herança [de Lula para Dilma Rousseff] é a desorientação da política energética”. Em nenhum momento, o presidente teve os fatos que denunciou rebatidos. Ao contrário: só foi corroborado por decisões e manifestações recentes do governo. Ainda que tardia, a retomada dos leilões de concessão de petróleo dá mais uma razão ao líder tucano. 

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Dilma Mãos de Tesoura

O governo petista gosta de se dizer “dos trabalhadores”, mas só faz agrados a patrões. Em seu balcão de negócios, distribui benesses bilionárias e isenções fiscais a grandes empresas com acesso aos gabinetes de Brasília, mas veta benefícios que se destinam diretamente à parcela mais pobre da população. É o que aconteceu com a desoneração da cesta básica, vítima das mãos de tesoura de Dilma Rousseff.

A proposta de isentar alimentos e produtos da cesta básica da incidência de tributos federais foi vetada sem dó ontem pela presidente da República. O texto havia sido incorporado à medida provisória n° 563 por iniciativa do deputado Bruno Araújo, líder tucano na Câmara, e aprovado no Congresso. Talvez tenha sido seu maior pecado: Dilma não aceita repartir louros com a oposição; dane-se a população.

A postura mesquinha ficou evidente com as declarações dadas ontem pelo burocrata do Ministério da Fazenda escalado pelo governo para tentar explicar o inexplicável: por que os alimentos e os itens mais básicos e essenciais para a vida dos brasileiros não podem ter o mesmo tratamento tributário que têm, por exemplo, os tablets, os smartphones, os carrões de luxo?

Segundo Dyogo Henrique de Oliveira, secretário-executivo-adjunto do Ministério da Fazenda, o governo aceita, sim, a desoneração. Mas desde que patrocinada pelo próprio governo, jamais por meio de ousadia da oposição. A presidente promete aposentar suas reluzentes tesouras mais adiante e anunciar ela mesma as isenções. Neste ínterim, a população que continue a pagar mais – a Fiesp estima que 70% das famílias brasileiras comprometam mais de um terço de sua renda com a compra de alimentos.

Pelas estimativas do PSDB, a desoneração permitiria reduzir em cerca de 10% os gastos das famílias com produtos da cesta básica. Seriam isentos de PIS/Pasep, Cofins e IPI, todos tributos de âmbito federal. No veto, o governo também argumentou que a proposta da oposição era imperfeita “técnica e juridicamente”, por não incorporar, também, a isenção de ICMS.

Mas como o Congresso Nacional pode legislar sobre tributo da alçada dos estados? Mais: se esta esdrúxula justificativa fosse válida, a desoneração das contas de luz – proclamada em rede nacional de rádio e televisão pela presidente no último dia 6 – é igualmente capenga, porque não alcança o tributo estadual, sabidamente o que mais onera as faturas de energia.

Desde a eclosão da crise de 2008, o governo petista já anunciou pelo menos dez pacotes de incentivos tributários. No ano passado, as isenções distribuídas por Brasília alcançaram a estupenda cifra de R$ 187 bilhões, segundo o TCU. Mas para ter acesso a esta dinheirama é preciso ser amigo do rei e ter portas abertas nos gabinetes acarpetados de Brasília.

Não é de hoje que o governo do PT usa a distribuição de benefícios fiscais para amealhar apoios e calar protestos. Este é também um dos componentes do toma lá dá cá que o Planalto estabelece com os que estão dispostos a se alinhar ao projeto de poder em voga. Enquanto isso, ao povo sobram as batatas, na forma de impostos cada vez mais altos a pagar.

Até o fim de agosto, os brasileiros haviam deixado mais de R$ 1 trilhão nos cofres do fisco. A cada ano do governo do PT que passa, a marca é atingida mais cedo. Para se ter ideia, em 2008, quando pela primeira vez a arrecadação de tributos no país foi trilionária, a soma só foi alcançada em 15 de dezembro. No ritmo atual, os brasileiros pagamos R$ 4 bilhões de tributos por dia.

Mas as mãos de tesoura de Dilma não barbarizaram apenas os alimentos e a cesta básica. Também ceifaram emenda à mesma MP, incluída pelo senador tucano Flexa Ribeiro (PA), que alterava regras para a cobrança da CFEM (Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais), tributo pago pelas empresas mineradoras a municípios, estados e União.

Com isso, estados como Minas e Pará – ambos atualmente governados pelo PSDB – deixarão de acrescentar cerca de R$ 300 milhões e R$ 200 milhões por ano, respectivamente, a suas receitas com royalties de minério. Para se ter ideia, neste ano foram recolhidos a título de CFEM menos de R$ 1 bilhão, enquanto apenas as exportações de minério de ferro já tinham superado US$ 22 bilhões até julho.

É evidente que a presidente pretende posar mais à frente de benfeitora, quando, e se, anunciar as desonerações que ela mesma acaba de vetar. Ainda que tardia, a bondade ainda será bem-vinda, em favor da população mais carente. Mas ninguém esquecerá que Dilma Rousseff ontem, mais uma vez, abriu seu saco de maldades e as distribuiu sem piedade aos brasileiros mais pobres. 

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

O mensalão comprovado

Agora não há mais como negar: o dinheiro desviado dos cofres públicos pelo PT foi usado para comprar o voto de parlamentares no Congresso. Está comprovado o ponto central do mensalão. A chegada de Lula, José Dirceu e seu partido ao poder representou a montagem de um balcão de negócios nunca antes visto na história deste país.

O Supremo Tribunal Federal (STF) começou ontem a julgar a destinação dada aos recursos surrupiados pelos mensaleiros, conforme já provado nas etapas iniciais do julgamento. Para o ministro relator, Joaquim Barbosa, não há a menor sombra de dúvida: “Os réus receberam dinheiro em razão da função parlamentar e em troca da fidelidade do partido ao governo”.

Barbosa ateve-se, na 24ª sessão do julgamento, ao caso mais emblemático: o do PP. O partido, que em 2002 apoiara o candidato tucano José Serra, bandeou-se para o governo logo no primeiro ano do mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. Foi, literalmente, comprado pelo petismo para assegurar-lhe votos e apoio parlamentar. O relator cruzou o mapa de votações com o de pagamentos na boca do caixa e viu: a dinheiro no bolso equivalia apoio no Congresso.

Tivessem um projeto de país e não um mero projeto de perpetuação de poder, Lula e sua quadrilha de petistas talvez não tivessem tido que lançar mão de seu espúrio método de, digamos, “convencimento”. Mas o governo do balcão ancorou-se mesmo foi no milhão, ou, para ser mais preciso, nos milhões.

Nos autos, está comprovado que as transferências aos mensaleiros comprados somaram R$ 55 milhões. Mas o esquema criminoso envolveu muito mais. Há, ainda, os R$ 74 milhões desviados da Visanet/Banco do Brasil, mas há, também, a suspeita, levantada por Marcos Valério, de que pelos dutos da corrupção tenham vazado pelo menos R$ 350 milhões. (Nunca se deve esquecer o que disse Silvio Pereira, o petista que se livrou do processo após acordo com a Justiça: a meta era desviar R$ 1 bilhão.)

O PT sentiu o golpe desferido ontem pelo ministro relator. Bastou o Supremo chegar ao coração do mensalão para que o petismo mostrasse suas garras. A reação veio na forma de uma nota oficial de sua Executiva Nacional, que conclama os partidários de Lula, Dilma, José Dirceu e sua quadrilha de mensaleiros a “uma batalha do tamanho do Brasil”. A dimensão da guerra deve ser proporcional ao assalto que o partido perpetrou aos cofres públicos...

Não deixa de ser, também, uma forma de os petistas reagirem aos sinais enviados por Marcos Valério neste fim de semana – seja pelas declarações dele publicadas pela revista Veja, seja pela revelação, feita por Ricardo Noblat ontem, de que o publicitário gravou quatro cópias de um vídeo em que desnuda o funcionamento do esquema mafioso comandado pelo PT.

Marcos Valério ameaçou contatar tudo, se, de fato, afundar sob o peso das penas que o relator está disposto a lhe impor – até 28 anos de cadeia, conforme parte do relatório que a assessoria do ministro Barbosa, descuidadamente, fez publicar no site do STF. O PT parece ter entendido que é melhor tentar amansar o bicho, antes que seja tarde. Por isso, convocou suas tropas e mostrou os dentes. Não vai adiantar.

As conclusões a que os ministros do STF estão chegando desnudam, com riqueza de detalhes, a concepção que o PT e seus quadrilheiros fazem do aparato estatal. Trata-se, na visão do partido dos mensaleiros, de um butim trilionário a ser roído até a medula, no intuito de promover, viabilizar e financiar a prevalência de seu grupo político no poder. A qualquer preço, a qualquer pena.

Mas o julgamento do mensalão está servindo para dar um basta a este estado de coisas. “O Brasil não é tão arcaico, desorganizado, institucionalmente desqualificado nem tão apinhado de vendidos como supunha o PT ao assumir a Presidência da República”, analisa Dora Kramer, com a acuidade que lhe é habitual, n’O Estado de S.Paulo.

A esta altura, já restam comprovados pelo STF o desvio de verbas públicas, as fraudes bancárias para encobrir as falcatruas e a existência de uma lavanderia de dinheiro montada em conluio entre banqueiros e petistas. Desde ontem, também tornou-se notório que os dutos da corrupção serviram à compra de votos no Parlamento. Se corrupção houve, corruptores também houvera. Agora falta só mais um pouquinho para o julgamento chegar até eles: aqueles que estiveram atrás do imenso balcão de negociatas montado no país nestes últimos dez anos.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

O mensalão nas barbas do chefe

Luiz Inácio Lula da Silva não consta da lista dos réus acusados pela Procuradoria-Geral da República de integrar a “sofisticada organização criminosa” que assaltou os cofres públicos para se perpetuar no poder. Mas, a cada dia que passa, a ausência do nome dele no processo torna-se mais incômoda e injustificável. A cada dia que passa, parece mais evidente que as “quatro paredes de um palácio presidencial” onde o mensalão foi urdido e executado foram as do gabinete presidencial.

A revista Veja desta semana dá mais um passo no sentido de envolver ainda mais o ex-presidente na trama criminosa. Com base em declarações de Marcos Valério, o homem que privava de total confiança palaciana, era frequentador assíduo do Planalto e ainda hoje mantém franca interlocução com a entourage petista, a conclusão é indubitável: Lula era o chefe da quadrilha.

Há muito mais na reportagem da revista. Também com base no que diz o homem que operou o esquema, o mensalão envolveu muito mais dinheiro do que se admitia até agora. A caixa preta petista teria movimentado R$ 350 milhões, ou seja, quase três vezes mais do que já se provou – até agora, só se sabia dos R$ 74 milhões surrupiados da Visanet/Banco do Brasil e dos R$ 55 milhões lavados nos bancos Rural e BMG.

Sendo Lula “um sujeito safo” como é, como sublinhou o ministro Marco Aurélio Mello noutro dia, ninguém, em sã consciência, é capaz de acreditar que ele nada sabia do mensalão. Mas, pelo que divulgou a Veja nesta semana, o envolvimento do então presidente da República desceu a níveis muito mais profundos do que se admitia até agora.

Marcos Valério revela que Lula operava, dentro do Palácio do Planalto, a arrecadação de recursos para irrigar o esquema mafioso petista e, com a dinheirama, comprar apoio parlamentar no Congresso. Só a confiança na impunidade possibilitaria a alguém agir com tamanha desenvoltura para pôr o Estado a serviço de seu projeto de poder.

“Lula teria se empenhado pessoalmente na coleta de dinheiro para a engrenagem clandestina, cujos contribuintes tinham algum interesse no governo federal. (...) Muitos empresários se reuniam com o presidente, combinavam a contribuição e em seguida despejavam dinheiro no cofre secreto petista”, informa a revista.

Há farto material para que o Ministério Público volte a examinar o caso e, se assim o entender, inclua também Lula entre os investigados num inquérito para apurar o envolvimento do ex-presidente no mensalão. Por muito menos que isso, um presidente da República sofreu impeachment...

Ricardo Noblat agrega hoje, n’O Globo, que Valério tem munição ainda mais pesada guardada para detonar seus antigos comparsas. O publicitário teria gravado um vídeo em que narra, com riqueza de detalhes, como funcionava o esquema e como cada um se envolveu na tramoia. Foi uma forma, diz ele, de assegurar que não seria executado antes de poder contar a verdade.

“O que Valério conta no vídeo seria capaz de derrubar o governo Lula se ele ainda existisse, atesta uma pessoa íntima da estrela do mensalão dona da quarta cópia. Na ausência de governo a ser deposto, o vídeo destruiria reputações aclamadas e jogaria uma tonelada de lama na imagem da Era Lula”, escreve o colunista.

Outro que estaria prestes a botar a boca no trombone é Delúbio Soares. Segundo o Valor Econômico, o ex-tesoureiro do PT está arrependido de ter assumido sozinho a responsabilidade pelas operações que o Supremo comprovou, na semana passada, serem fraudulentas. Delúbio estaria se sentindo “abandonado” pelos companheiros.

“Os ressentimentos não são apenas de Delúbio com Dirceu e o PT. Dirceu também andou se queixando do ex-tesoureiro do PT, que fizera ‘uma lambança só’ quando ocupava o cargo. Outros integrantes do núcleo petista, que analisam estratégias para a travessia do mensalão, também criticam Delúbio”, expõe o jornal.

Hoje os ministros do Supremo Tribunal Federal começam a se debruçar especificamente sobre este lodaçal que, a cada dia que passa, conhecemos um pouco mais e, a cada dia que passa, mais repulsa causa. Nesta etapa, 23 mensaleiros, entre eles José Dirceu, Delúbio e José Genoino, estarão no banco dos réus, acusados por crimes de formação de quadrilha, corrupção ativa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Como numa legítima máfia, Lula e os mensaleiros ancoravam sua crença na impunidade nos compromissos mútuos que firmaram entre si. Com ele no vértice, fiavam-se no fio de bigode de um presidente que se julgava intocável e inimputável. Mas a atitude decidida dos ministros do STF no julgamento do organograma criminoso minou-lhes a confiança. O código de silêncio que sustentou o maior escândalo de corrupção da história política do país está sendo rompido: se faltava um chefe, agora não falta mais.

sábado, 15 de setembro de 2012

Lavanderia Mensalão

Terminada mais uma fase do julgamento do mensalão, nenhuma das acusações feitas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) foram desmentidas pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) até agora. O próximo passo é comprovar que o dinheiro desviado dos cofres públicos alimentou a compra de apoio parlamentar ao PT. Avizinha-se a hora da verdade.

Ontem, os ministros atestaram a existência de uma lavanderia montada para dissimular a origem dos recursos que o esquema surrupiou de empresas como o Banco do Brasil para molhar a mão de políticos da base aliada ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Oito dos dez réus acusados pela PGR foram condenados.

Os casos mais vistosos são os de Marcos Valério e seus dois sócios na agência de publicidade SMP&B. O operador do mensalão já soma o suficiente para passar, pelo menos, 13 anos na cadeia. Equivalem à pena mínima por duas condenações por corrupção ativa, três por peculato e uma por lavagem de dinheiro, calcula O Globo.

O próximo elo da cadeia – sem trocadilho – é comprovar que os recursos desviados dos cofres públicos foram usados para comprar apoio parlamentar e dar sustentação ao projeto de poder do PT. Disso, há evidências de sobra.

Por exemplo: um dos depoimentos colhidos pelos promotores no processo, de um ex-tesoureiro do Rural, atesta que, mal começado o governo Lula, os saques tornaram-se frenéticos e vultosos na agência do banco em Brasília. Saíam de lá para os mensaleiros, como o já condenado João Paulo Cunha, ex-presidente da Câmara dos Deputados.

Da rodada desta semana no Supremo, restou provado que o PT montou uma Operação Paraguai para escamotear a origem suja do dinheiro que usou para remunerar parlamentares e partidos que lhe serviram de esteio em seu projeto de perpetuação no poder. Tudo bem longe da vista do Banco Central e do Coaf, órgão de inteligência financeira do governo.

Os “empréstimos” concedidos pelo Banco Rural ao partido eram fajutos, fictícios, rolados em condições a perder de vistas em prol de um devedor que sequer requisitos para obter crédito na praça tinha. Pelas operações, passaram R$ 32 milhões, que, devidamente lavados, irrigaram os bolsos mensaleiros.

“O dinheiro é, para o crime, o que o sangue é para a veia. Se não circular, não temos esquemas criminosos como esse. Há uma necessidade enorme de que existam instituições financeiras que se prestem para situações como essa”, resumiu, com precisão, a ministra Cármen Lúcia, ao concluir, ontem, pela existência de crime de lavagem de dinheiro.

Na semana que vem, o julgamento começa a chegar perto de quem realmente interessa: o núcleo político que, entre quatro paredes de um palácio presidencial, manipulou todo o esquema mafioso de assalto aos cofres do Estado e desvirtuamento da representação legislativa. É a parte que realmente interessa.

A fatia do julgamento referente à acusação de compra de apoio político envolve 23 réus, tendo à frente o ex-ministro da Casa Civil do governo Lula José Dirceu. Pelas decisões precedentes tomadas pelos ministros do Supremo até agora, ficará difícil para eles provar que não sabiam que manipulavam dinheiro ilícito para fins tenebrosos.

A cúpula petista já percebeu que os magistrados não estão dispostos a deixar pedra sobre pedra no julgamento do maior escândalo de corrupção da escola política do país – noves fora as deprimentes exceções de Ricardo Lewandowski e José Antônio Dias Toffoli, cada dia mais evidentemente devotados a amaciar para os criminosos. Estão em pânico, porque se julgavam inimputáveis.

Como a desfaçatez do PT não encontra limites, pode-se esperar que o partido dos mensaleiros tente de tudo para desferir um contra-ataque. Mas a disposição dos ministros do STF de fazer valer a justiça e reservar um cantinho na cadeia a quem lesou os cofres públicos é razão suficiente para acreditar que quem mais deve mais pagará.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Choque de alta voltagem

Redução de tarifa é bom e todo mundo gosta. O problema começa quando, a pretexto de beneficiar o consumidor, o governo patrocina uma radical intervenção num setor cuja continuidade dos investimentos é crucial para o desenvolvimento do país. As companhias de energia elétrica brasileiras estão sendo submetidas a um choque de alta voltagem que ninguém sabe ao certo no que vai dar. Reina a escuridão.

A diminuição dos custos de energia é algo que há muito vem sendo reclamado no país. Isto porque, apesar de ser uma das nações que mais usa a mais barata das fontes, a hídrica, o Brasil aparece liderando os rankings globais de tarifas: as nossas indústrias, por exemplo, pagam a quarta mais alta do mundo, 53% acima da média mundial e três vezes maior que a praticada nos EUA.

Na semana passada, Dilma Rousseff convocou cadeia nacional de rádio e televisão e – além de aproveitar o espaço institucional para fazer proselitismo político-partidário – anunciou que as tarifas ficarão 16,2% mais baixas para os consumidores residenciais e até 28% menores para as indústrias a partir de janeiro. Até aí, uma beleza. Mas o diabo deu as caras quando se soube os detalhes de como os preços baixariam.

Parte da redução se deve à eliminação de alguns das dezenas de penduricalhos que ornamentam as faturas de energia. O governo federal aceitou alterar a cobrança da RGR (Reserva Global de Reversão) e da CCC (Conta de Consumo de Combustíveis), criadas há décadas para, respectivamente, subsidiar a universalização do serviço e a produção de energia na Amazônia, que até pouco tempo atrás era toda gerada à base da queima de óleo.

No entanto, a fatia mais relevante do corte tarifário virá da diminuição do que é pago a geradoras, transmissoras e distribuidoras pela energia produzida. O governo aproveitou o vencimento de uma montanha de contratos de concessão, concentrados em 2015 e 2017, para impor condições draconianas às companhias elétricas e antecipar mudanças que só ocorreriam daqui a três anos. De quebra, deu um beiço nas indenizações que as empresas esperavam receber por investimentos realizados em seus ativos.

Pode estar em marcha uma brutal reestatização do setor. Explica-se: para renovar as concessões, as empresas precisarão aceitar preços até 60% mais baixos que os atuais. Há casos em que tamanho deságio tornará o negócio simplesmente um mico e será mais vantajoso às atuais concessionárias devolver a concessão à União, que pode ficar com um monte de ativos nas mãos.

Para piorar, o processo está sendo feito da forma mais opaca e autoritária que se pode imaginar, sem discussões maiores com os agentes do setor. Decisões que afetarão, ao longo de décadas, os planos de dezenas de empresas de faturamentos bilionários estão sendo tomadas por meio de medida provisória, imposta goela abaixo. Mudança como a atual deveria ser alvo, no mínimo, de projeto de lei a ser discutido e aperfeiçoado no Congresso – há quem defenda mesmo a necessidade até de emenda constitucional.

O consumidor pode até estar pensando: “O que importa é que vou pagar menos”. Mas há um chavão no setor que cai como luva em resposta a esta equivocada impressão inicial: a energia mais cara é aquela que não existe. E é justamente este o risco que o país corre doravante. Com o curto-circuito que Dilma e sua equipe estão gerando, o setor de energia no Brasil torna-se um negócio muito arriscado, no qual poucos irão se dispor a aventurar-se.

A consequência é a pior possível: falta de investimentos. As margens nas quais os burocratas de Brasília esperam espremer as empresas de energia serão, muitas vezes, incapazes de bem remunerar o serviço. Com isso, não sobrarão recursos no caixa das companhias para financiar a ampliação do parque elétrico e sustentar a necessária expansão da economia nacional.

A reação não tardou a acontecer. Nos últimos dois dias, as 24 empresas do setor que têm ações negociadas na Bovespa perderam R$ 21,3 bilhões em valor de mercado, informa O Estado de S.Paulo. Num setor em que oscilações são tênues e quedas expressivas como as dos últimos dias, raras, empresas como a Cesp perderam 28% num único pregão. A avaliação é uma só: o governo quebrou contratos, pelo que, muito provavelmente, terá de enfrentar longas batalhas judiciais doravante.

O setor elétrico é apenas a mais nova vítima do intervencionismo voraz que o governo petista patrocina na economia. Nele reproduz-se agora o que já acontece há anos, por exemplo, na área de combustíveis. E o que a manipulação dos preços da gasolina e do diesel produziu? O desmonte da Petrobras – agora convertida numa empresa deficitária, apesar de deitada num esplêndido berço de petróleo – e a completa desestruturação do setor de etanol, do qual até pouco tempo atrás o Brasil era a maior estrela mundial.

Mais uma vez, o governo do PT transforma em lambança uma iniciativa que poderia render benefícios para a sociedade. O país precisa, sim, passar por importantes transformações estruturais, das quais a redução dos custos de produção, em especial de energia, é capítulo essencial. Mas reformar a economia brasileira é tarefa que exige diagnóstico, diálogo e decisão ponderada. Tudo o que não cabe nos pacotes arbitrários que Brasília produz em série.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Cultura do vale-tudo

Não é segredo para ninguém que o PT é capaz de tudo para atingir seus fins. O mensalão está aí para comprovar. Mas é na forma como articula seus apoios e maneja suas bases parlamentares que o petismo revela-se na sua inteireza. Trata-se do partido do vale-tudo, o mais legítimo representante do toma lá, dá cá da política brasileira.

Se um dia teve na ideologia o seu esteio, hoje o PT baseia suas práticas no mais deslavado fisiologismo que se tem notícia. Agora, nem o apoio de seus próprios correligionários é obtido na base da convicção e da adesão desinteressada. Tudo é objeto de barganhas e de escambo de nacos de poder. O que aconteceu ontem com Marta Suplicy é apenas mais um capítulo desta saga de deplorável degradação política.

A senadora eleita por São Paulo recebeu o Ministério da Cultura como moeda de troca para apoiar o periclitante Fernando Haddad na disputa pela prefeitura paulistana. Ela substituirá Ana de Hollanda, 13ª a deixar o ministério de Dilma Rousseff. Fechada na bacia das almas do mercado eleitoral, a transação é tão explícita que chegaria a constranger – isso se vergonha na cara houvesse.

Na mensagem em que comunica a demissão de Ana do cargo, a presidente afirma que Marta “dará prosseguimento às políticas públicas e aos projetos que estão transformando a área da cultura nos últimos anos”. Provavelmente, Dilma está se referindo à ruína que a agora ex-ministra denunciou há um mês em carta tornada pública pelo jornal O Globo. A degradação que se apossou da centenária Biblioteca Nacional no Rio é a melhor tradução do caos.

Tal como está, o Ministério da Cultura só serve mesmo de butim no mercado de compra de apoios, não só político, mas também no meio artístico. Dispõe de orçamento modesto, para dizer o mínimo: são R$ 2,2 bilhões, que equivalem a 0,2% das despesas não financeiras da União neste ano. Ainda assim, 20% deste valor foi tesourado pelo ajuste fiscal.

Marta assume um ministério para o qual seu, digamos, maior atributo é ser mãe de dois músicos de qualidades pra lá de duvidosa – também é ex-mulher de um senador notável por interpretar a mesma música onde quer que o vento sopre... A intimidade dela com o setor cultural é nula, mas sua afinidade com o mundo do vale-tudo petista é enciclopédica.

A senadora desembarca no ministério uma semana após ter estreado na campanha petista em São Paulo, depois de muito relutar. Seu apoio foi negociado a peso de ouro – dada a pequenez do Ministério da Cultura na estrutura oficial, melhor seria dizer de bronze – diretamente com Luiz Inácio Lula da Silva e com a atual presidente da República. Dois encontros com Dilma (em 22 e 30 de agosto) e um almoço com Lula (em 27 de agosto) selaram seu destino.

Marta toma posse amanhã na pasta como quem vai para uma pós-graduação no exterior, com o agravante de não ter nem uma vaga ideia na cabeça sobre o que fará lá. “Vou mergulhar no ministério e descobrir o que fazer. Vou estudar”, respondeu ela ontem, ao ser questionada sobre suas prioridades na Cultura. Pelo jeito, câmera na mão não vai ter...

Não ter o menor conhecimento sobre o assunto do qual seu ministério cuida é o de menos. Afinal, Marta não é avis rara na Esplanada. Pelo contrário, este é o padrão na era petista. Desde Lula, ministérios tornaram-se feudos amealhados entre os que se prestam a dar sustentação ao projeto de poder do PT. Não surpreende que escassas tenham sido as iniciativas realmente inovadoras surgidas em Brasília nestes últimos dez anos.

Marta é apenas a mais nova moeda deste baú de troca-troca no qual o PT baseia sua prática política. Como Fernando Haddad e quase todos os candidatos petistas às prefeituras das capitais não conseguem entusiasmar nem sua militância, o partido do mensalão utiliza no mercado eleitoral o mesmo expediente que Lula empregou para inchar sua base congressual: a compra explícita de apoio e voto. A senadora paulista não é caso isolado.

Antes dela, ao PRB já havia sido dado o Ministério da Pesca, ocupado por um Marcelo Crivella que nem de minhoca, nem de anzol diz entender. Ao PP fora entregue a Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades, como forma de mercadejar o apoio de Paulo Maluf a Haddad. E a Aloizio Mercadante fora destinado o Ministério da Educação, numa tentativa de evitar novas aloprações na campanha eleitoral. Todas tenebrosas transações no toma lá, dá cá petista.

Constata-se que Dilma Rousseff não só mergulhou na campanha eleitoral, como o faz de maneira exorbitante e em franca colisão com a postura institucional e republicana que o cargo lhe exige. Distribui cargos, usa rede nacional de rádio e TV para atacar adversários e, no horário eleitoral, ameaça eleitores de deixar suas cidades à míngua caso os candidatos petistas não vençam as eleições de outubro – como ocorreu tanto em São Paulo, quanto em Belo Horizonte.

A presidente da República não faz, porém, nada diferente do que Lula fez dois anos atrás para elegê-la. É farinha do mesmo saco da escola da desfaçatez que forma alunos aplicados na cultura do vale-tudo do PT. Nela, o que mais se faz é relaxar e gozar as benesses do poder – do que Marta Suplicy entende bem. Respeitar o interesse dos eleitores e dos cidadãos é o que menos conta neste nefasto mercado de barganhas.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Chegando perto do Palácio

José Dirceu nem era um dos réus na pauta da sessão de ontem no Supremo Tribunal Federal. Mas sua onipresença na “sofisticada organização criminosa” é tão evidente que bastou o ministro Joaquim Barbosa deslindar um pouco a meada para se aproximar das “quatro paredes de um palácio presidencial” citadas pelo procurador-geral da República. O julgamento do mensalão vai chegando perto de quem mais deve.

O STF trata agora da terceira das sete partes em que foi fatiada a análise do caso pelos magistrados. Debruça-se, ao longo das próximas sessões, sobre a prática de crime de lavagem de dinheiro. Ontem, o relator pediu a condenação de nove réus dos chamados núcleos financeiro – leia-se Banco Rural – e publicitário, ou seja, as agências de Marcos Valério.

O esquema fraudulento desnudado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e ratificado ontem pelo ministro Barbosa perpetrou 46 operações de lavagem. Delas, saiu o dinheiro que irrigou o mensalão. O dolo era reiterado: registros contábeis fajutos, empréstimos milionários de fachada, desrespeito a leis do sistema financeiro.

No vértice de todo este organograma de malfeitorias, pontuava ninguém menos que o ministro-chefe da Casa Civil do governo petista de Luiz Inácio Lula da Silva. A onipresença de José Dirceu no esquema mafioso é conhecida e sabida, mas ontem, pela primeira vez, o nome dele foi citado pelo ministro relator em seu voto, vinculando-o aos repasses de recursos surrupiados dos cofres públicos. Foi a entrada triunfal em cena dos capas-pretas do PT no julgamento que apura o maior escândalo de corrupção da história política do país.

Barbosa mostrou que os frequentes encontros entre Dirceu e Kátia Rabello, executiva do Rural, serviram para cuidar da operação do mensalão, que tinha no banco mineiro uma lavanderia montada para embranquecer dinheiro desviado dos cofres públicos. Dali saíram, pelo menos, R$ 32 milhões para financiar a compra de apoio parlamentar no Congresso.

“Embora Kátia Rabello e José Dirceu não admitam ter tratado do esquema de lavagem de dinheiro, é imprescindível atentar para o contexto em que tais reuniões se deram. Não se trata de um fato isolado, de meras reuniões entre uma dirigente de banco e o ministro da Casa Civil, mas de encontros ocorridos no mesmo contexto em que se verificaram as operações de lavagem de dinheiro levadas a efeito pelo grupo criminoso apontado na denúncia”, afirmou o ministro relator.

Em sua defesa, Dirceu alegou que tais encontros se prestavam a exposições da “situação do Brasil e das coisas que acreditava importantes para o país naquele momento”. Mas ali se tratava de algo muito mais polpudo: a participação do banco no esquema de desvio de dinheiro público e compra de apoio parlamentar. Em troca, a benevolência do governo petista em relação a uma operação de R$ 1 bilhão que interessava ao Rural: o levantamento da liquidação extrajudicial do Banco Mercantil de Pernambuco, do qual o banco mineiro era um dos donos. Como se vê, Dirceu estava em tudo de ruim que pudesse ocorrer.

O líder petista foi denunciado pela PGR por formação de quadrilha, como chefe da “quadrilha”, e por corrupção ativa. Só será diretamente julgado quando o Supremo ingressar no exame dos itens seis e dois do processo, que tratam de distribuição de recursos a políticos aliados e formação de quadrilha, respectivamente.

Um dado novo, hoje só destacado pelo Correio Braziliense, ressalta uma das características centrais do mensalão, que os advogados dos réus petistas sempre tentaram negar em sua defesa: a existência de pagamentos frequentes e continuados nos guichês do Rural. A constatação se baseia em depoimento do ex-tesoureiro da agência do banco em Brasília, lembrado ontem pelo ministro relator.

José Francisco de Almeida Rêgo contou ter presenciado a entrega de quantias vultosas de dinheiro sacado das contas de empresas de Valério. E o mais importante: a partir de 2003, quando começou o governo Lula, os saques de dinheiro passaram a ser mais constantes e eram comuns retiradas de R$ 100 mil até duas vezes por semana.

Ao longo das mais de 20 sessões realizadas até agora, o Supremo já demonstrou que os recursos que alimentaram o valerioduto foram desviados de cofres públicos; que se tratou de um esquema para comprar o apoio de políticos no Congresso; e que instituições financeiras foram usadas para lavar dinheiro sujo e dar ares de normalidade a um imenso organograma da corrupção. A partir de agora, o fio da meada encaminha-se para quem orquestrou e dirigiu o mensalão. Na mira, o que se passou dentro de quatro paredes de um palácio presidencial.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Disparates em cadeia nacional

Por uns tempos, Dilma Rousseff até se comportou adequadamente, dentro do figurino institucional que o cargo lhe impõe. Mas o uso do cachimbo petista entortou-lhe a boca. No dia em que o Brasil comemorou 190 anos de independência, a presidente da República voltou a fazer proselitismo político-partidário. Desta vez, ela fez uso de uma data pátria para cometer disparates em cadeia nacional de rádio e TV.

Pronunciamentos oficiais em datas cívicas sempre foram, tradicionalmente, marcados pela sobriedade e pelo estrito respeito institucional. Afinal, no dia em que o país comemora seu mais importante feito histórico, quem se dirige aos cidadãos é o chefe da nação e não o chefe de uma facção. É assim em qualquer democracia madura do mundo, era assim também no Brasil. Até que o PT desvirtuasse mais este símbolo da República.

Dilma ocupou 10 minutos e 35 segundos no rádio e na televisão na noite de quinta-feira, véspera do Dia da Independência. Usou o direito e o espaço que a Constituição lhe dá, mas os transformou numa oportunidade para desferir ataques e veicular batatadas em cadeia nacional. Assim como a nota oficial que divulgara há uma semana, ancorou seu discurso em um monte de mistificações.

Para começar, seguindo o padrão já adotado pelo seu antecessor no cargo, Dilma, oportunisticamente, tentou se apropriar de conquistas pretéritas para justificar resultados – alguns deles bastante questionáveis – do governo petista. Disse que o Brasil “criou, nos últimos anos, um modelo de desenvolvimento inédito, baseado no crescimento com estabilidade, no equilíbrio fiscal e na distribuição de renda”.

Das três pernas do tripé, duas lhe foram legadas pelo governo de Fernando Henrique Cardoso. Mas não custa lembrar que o PT foi contra o Plano Real, que dizimou a inflação no país, trazendo-a níveis comportados – na época, o plano de estabilização foi considerado por Lula um “estelionato eleitoral”. Os petistas fizeram de tudo para sabotar a conquista da estabilidade da moeda pelos brasileiros.

Também é sempre bom recordar que o PT opôs-se à Lei de Responsabilidade Fiscal. O partido não apenas votou em peso contra o projeto de lei de equilíbrio fiscal no Congresso, como, derrotado, foi ao Supremo Tribunal Federal arguir-lhe a constitucionalidade. É de se perguntar o que seria dos governos petistas que se seguiram – tanto no plano federal, quanto nos estaduais e municipais – sem a legislação que pôs as finanças públicas do país em ordem...

Em seguida, Dilma anunciou que doravante a competitividade estará na agenda nacional. De pronto, é de se perguntar: Mas só agora, cara-pálida? Repetidamente, o Brasil tem figurado nas piores colocações em rankings globais que medem este requisito. No que é publicado pelo Fórum Econômico Mundial, por exemplo, temos feito muito feio.

Na edição mais recente, entre 142 países, fomos o 118° na qualidade rodoviária, 122° na aeroportuária e o 130° na portuária. Na média geral deste quesito, recuamos 20 posições em relação a 2010. Pelo visto, vai demorar muito até que nos tornemos “um dos países com melhor infraestrutura, com melhor tecnologia industrial, melhor eficiência produtiva e menor custo de produção”, como prometeu a presidente no pronunciamento.

Com pompa, Dilma também anunciou aos brasileiros que descobriu a roda. Disse, no meio do pronunciamento, que acaba de adotar “um conjunto de medidas que vai provocar, no médio e no longo prazo, uma verdadeira revolução no setor de transportes no nosso país, (...) em um novo tipo de parceria entre o poder público e a iniciativa privada”.

A esta “verdadeira revolução”, damos o singelo nome de privatização, contra as quais Dilma e seu partido, sistematicamente, se contrapuseram quando eram oposição e também ao longo dos dez anos em que estão governo. Será que o PT demora tanto a acordar para tudo o que é bom para a sociedade?

As privatizações que ora serão tocadas pelo PT são as mesmas que Dilma Rousseff – deselegante e equivocadamente – criticou no pronunciamento que deveria ser de chefe de nação, mas transformou-se em mais uma peça de campanha eleitoral. É dever do presidente da República dirigir-se aos seus concidadãos a cada 7 de setembro. Mas, daqui a um ano, veremos que as 1.336 palavras proferidas na última quinta-feira foram lançadas ao vento. Pouco delas sobreviverão ao choque de realidade de um governo que fala muito mais do que faz.

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

A verdadeira ‘farsa’ do mensalão

Uma a uma, estão caindo as teses que buscavam transformar o maior escândalo de corrupção da história política do país numa “farsa” ou numa “piada de salão”. Sessão após sessão, os ministros do Supremo Tribunal Federal vão punindo exemplarmente os integrantes da quadrilha que perpetrou assaltos continuados aos cofres públicos para se eternizar no poder. A verdade do mensalão está prevalecendo.

Já são sete os condenados pelo STF até agora. Seus crimes: peculato, corrupção ativa, corrupção passiva, lavagem de dinheiro e, desde ontem, gestão fraudulenta de instituição financeira. Uma lista de dar inveja a qualquer poderoso chefão do planeta. Ontem foi a vez de os dirigentes do Banco Rural, de onde saiu a grana que irrigou o mensalão, serem abatidos.

Os guilhotinados da hora importam menos pela relevância que tinham no organograma mafioso, mas muito para mostrar que de “farsa” o mensalão não teve nada. Sua condenação também será importante para encaminhar o veredicto dos ministros a respeito dos próximos réus. Desnuda-se uma estrutura que tinha tronco, membros e cabeça – a esta, por certo, o Supremo chegará nas etapas finais do julgamento.

A participação dos dirigentes do Banco Rural no mensalão foi periférica, mas essencial, ao prover a dinheirama usada no esquema criminoso. A condenação deles significa muito para fins de sepultar de vez os estratagemas com os quais os mensaleiros pretendiam se livrar do acerto de contas com a Justiça: jamais existiram os tais “empréstimos” com os quais o PT disse ter se abastecido. O que houve foi, esta sim, uma fraude.

Saíram dos cofres do banco R$ 32 milhões, repassados a tomadores que sequer tinham crédito na praça. As operações eram renovadas a cada 90 dias, ad infinitum, mesmo sem a apresentação de garantias mínimas por parte dos devedores. Ou seja, tudo pró-forma, para não ser pago nunca. Ao longo de dois anos, em dez sucessivas renovações, os créditos foram rolados; com isso, o valor da operação saltou a R$ 59 milhões.

Os “empréstimos” eram fictícios e as operações, fraudulentas. O Rural servia apenas como casa de banhos para embranquecer o dinheiro que o esquema mafioso – comandado “entre quatro paredes de um palácio presidencial”, conforme as palavras do procurador-geral da República – desviava dos cofres públicos para comprar apoio de políticos ao projeto de poder do PT.

Em seu voto pela condenação dos réus, ontem, o ministro Luiz Fux foi preciso na definição do que, realmente, se passou no Rural, como parte do esquema do mensalão: “A entidade bancária serviu de verdadeira lavanderia de dinheiro. (...) Nem gestão fraudulenta nem gestão temerária, o crime deveria ser gestão tenebrosa, pelos riscos e pelas consequências que acarreta à economia popular”.

Transcorridas 20 sessões do julgamento, já estão dizimadas praticamente todas as teses centrais que os mensaleiros, seus defensores e seus patrocinadores vêm bradando para sustentar que a acusação não passa de uma “farsa”. Nesta altura, só destemperados como Rui Falcão continuam a achar que a Justiça está imbuída de desferir um “golpe” contra os petistas.

Primeiro, restou provado que o dinheiro que alimentou o valerioduto era público, desviado de empresas como o Banco do Brasil. Segundo, que o mensalão não era “apenas” um crime eleitoral, de uso de recursos não contabilizados, mas sim um esquema que drenou recursos do erário para comprar o apoio de políticos no Congresso.

Agora, com as sessões desta semana, ficou cabalmente comprovado que instituições financeiras foram usadas para lavar dinheiro sujo e dar ares de normalidade a um esquema corrupto. A lorota inventada pelo PT para tentar provar que o dinheiro usado no mensalão vinha de empréstimos absolutamente corriqueiros caiu por terra.

A quadrilha denunciada pela Procuradoria-Geral da República vai, aos poucos, sendo desnudada. Se houve recurso público surrupiado, se a grana foi usada para corromper, se sua origem era fraudulenta, então esteve claramente em ação um grupo que pretendia tirar proveito do esquema mafioso de desvio de dinheiro do cidadão. Foi nestas bases que o PT fincou sua bandeira – esta, sim, uma verdadeira farsa.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

As mentiras deslavadas do PT

Pode parecer o maior pleonasmo da paróquia, mas não custa repetir: oposição existe para se opor. O que em qualquer democracia madura do mundo é tratado com naturalidade, no Brasil da era petista transformou-se em heresia. É espantoso como o partido que é réu no processo que investiga o maior escândalo de corrupção da história política do país reage às críticas: à base de muita lorota.

A função de quem, pela vontade das urnas, não foi escolhido para governar é fiscalizar, apontar equívocos e desacertos e sugerir alternativas. Até que a próxima eleição chegue, e o eleitor novamente se manifeste, é este o papel que cabe aos partidos de oposição. É esta a tarefa a que eles devem se dedicar, diuturnamente. Democraticamente.

Mas o exercício da crítica incomoda bastante o PT. O partido de Lula, Dilma e José Dirceu convive pessimamente com o contraditório, tem horror à contestação e lança-se com faca nos dentes a trucidar qualquer obstáculo que se interponha no caminho de sua busca pela hegemonia a qualquer preço. Excede-se numa luta que deveria respeitar, regiamente, os preceitos da democracia.

As armas que o PT maneja com incomparável maestria são a mentira e a mistificação. O partido dos mensaleiros é pródigo em transmutar-se de réu em vítima, de acusado em acusador. É o que está ocorrendo agora, por exemplo, quando a mais alta corte da Justiça brasileira tem sentados no banco dos réus dez petistas, alguns deles da linha de frente partidária nos seus mais de 30 anos de existência.

Qualquer partido decente deveria envergonhar-se da situação. Mas o PT dá-se até ao descaro de escalar o presidente da legenda para arrostar o Supremo Tribunal Federal e acusar os ministros de estarem sendo partícipes de um “golpe grande”, como disse Rui Falcão anteontem.

Onde foi feita a afirmação? Em Osasco. Em qual circunstância? Durante evento em que os petistas foram obrigados a lançar um novo candidato a prefeito depois que o original foi condenado a passar alguns anos na cadeia por corrupção, peculato e lavagem de dinheiro. É este partido que exibe os dentes e parte para cima de seus adversários, com a maior sem-cerimônia do mundo...

A esperteza não é utilizada pelo PT apenas como arma do embate eleitoral. O partido usa de muita fancaria também para transmudar péssimas realidades em feitos extraordinários, por meio de ilusionismos embalados em vistosas doses de marketing. O mundo petista é muito diferente do mundo real, do mundo que gente de carne e osso tem de enfrentar todos os dias.

Veja-se o que está ocorrendo agora no processo de privatização da infraestrutura viária do país. Foram anos de recusa petista a admitir a solução, ao mesmo tempo em que as condições logísticas do país iam para o buraco, não decolavam ou trafegavam em marcha lenta. Eis que, numa mágica, o PT alardeia agora que privatiza sem privatizar, apenas para dizer que não tisnou suas carcomidas bandeiras ideológicas.

Indo a fundo, ver-se-á que o PT não só privatiza, como o faz como nem o privatista mais renhido jamais ousou fazer. Pelos jornais de hoje, fica-se sabendo que a presidente Dilma Rousseff encontra-se num vai-e-vem infindo sobre o que fazer com a concessão dos aeroportos, principalmente Galeão e Confins, e que, para atrair os desejados operadores estrangeiros, tenciona entregar-lhes o negócio praticamente de bandeja.

“Para convencer as grandes operadoras, o governo oferece ao futuro sócio da Infraero total liberdade para administrar os dois aeroportos”, informa a Folha de S.Paulo. Note-se que o lance desesperado é agora cogitado pelo governo porque o interesse dos investidores em serem sócios minoritários da Infraero, num modelo de Professor Pardal inventado pelo Planalto, é quase nulo.

N’O Globo, Ilimar Franco revela mais: as concessões serão entregues a preço de banana, como se estivessem sendo ofertadas na hora da xepa. “Para serem sócios na empreitada, os estrangeiros terão de entrar só com know-how para administrar os aeroportos. O investimento será mínimo”. O modelo assemelha-se ao que foi usado cinco anos atrás por Lula na concessão de sete lotes de rodovias federais: tudo muito baratinho, tudo muito ordinário, com menos de 10% dos investimentos previstos realizados até hoje.

Outro retumbante, ultraprofundo trololó é a dita autossuficiência brasileira em petróleo. Com o sucateamento imposto nos últimos anos pelo PT à Petrobras, o Brasil compra combustível como nunca no exterior e vê a produção interna e a produtividade da sua maior empresa mergulharem ao fundo do poço, como mostram várias reportagens publicadas hoje pela Folha.

O que vale apena reter de tudo isso é que o PT e suas lorotas devem ser contrapostos com destemor. Só numa situação em que as instituições vão sendo postas de pernas para o ar e os valores são corrompidos sob as bênçãos de quem se arvora ser líder máximo da nação, é que um partido com tamanha ficha corrida mete tanto medo. A cada mentira deslavada que os petistas contarem, serão rebatidos com verdades cada vez mais incômodas.