sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Com Estado falho, pobreza persiste

O governo federal apregoa na sua propaganda institucional que “país rico é país sem pobreza”. Noves fora o pleonasmo do slogan, trata-se de uma situação que o Brasil ainda está longe de alcançar, como mostra mais um levantamento feito pelo IBGE. Distribuir renda não é suficiente quando o Estado falha em cumprir suas funções e em prover bem-estar naquilo que diretamente lhe cabe.

A Síntese dos Indicadores Sociais (SIS) 2012, divulgada ontem, buscou averiguar como andam as condições de vida do brasileiro, não se limitando à mera aferição de indicadores de renda. Constatou que o país não apenas mantém-se muito desigual, como também continua sem prover serviços básicos como saneamento adequado, água encanada, lixo coletado e luz elétrica a uma larga parcela da sua população.

Segundo o levantamento, 22,4% dos brasileiros ainda vivem em situação considerada “vulnerável”. Isso significa que, simultaneamente, não têm água tratada, nem esgoto coletado (seja por meio de redes públicas ou por meio de fossas sépticas), não têm lixo recolhido, não dispõem de eletricidade, não têm acesso à educação e estão excluídos do mercado formal de trabalho. Também ganham menos de R$ 370 por mês. Em números absolutos, 41,2 milhões de pessoas sobrevivem assim no Brasil hoje.

O grupo dos que têm renda classificada como “suficiente”, ou seja, acima de R$ 370 mensais, mas não têm acesso aos serviços básicos soma 30,6% dos domicílios urbanos do país ou cerca de 64 milhões de pessoas. Isso equivale a dizer que, para cada duas moradias habitáveis, há uma sem condições mínimas de vida. Entre 2001 e 2011, o total de domicílios com acesso simultâneo a todos os serviços subiu de 67,1% para 69,4%, um avanço muito tímido.

É verdade que a desigualdade de renda vem diminuindo entre nós, o que merece lauta comemoração. O coeficiente de Gini – parâmetro usado para medir a disparidade de rendimentos entre os mais ricos e os mais pobres – caiu a 0,508 em 2011. É a mais baixa taxa em 30 anos – em 1980, estava em 0,583. Quanto mais se aproximar do zero, melhor.

Ainda assim, o Brasil ainda é uma das mais desiguais nações do mundo. Na América Latina, conseguimos deixar alguns países para trás nas últimas décadas, mas ainda somos o quarto mais desigual do continente, como mostrou a ONU-Habitat em agosto. Aqui os 20% mais ricos ganham 16,5 vezes mais que os 20% mais pobres, relação que nos países desenvolvidos costuma ficar entre quatro e seis vezes apenas.

Ao analisar tanto as carências de renda quanto as sociais, o SIS fornece um retrato mais fiel das condições de vida no país. Permite jogar luz sobre as políticas públicas que vêm sendo praticadas pelo governo e analisar até que ponto elas têm sido bem sucedidas em efetivamente melhorar a vida dos brasileiros. A conclusão é que, onde mais é necessário, o Estado fracassa.

Nos últimos anos, a ênfase das políticas públicas levadas a cabo pelas gestões petistas tem sido ampliar o acesso ao mercado de consumo. A distribuição massiva de benefícios sociais e o aumento do salário mínimo foram orientados nesta direção, com sucesso. Mas viver bem é muito mais do que poder ter acesso a bens de consumo, e nisso o Estado petista tem malogrado de maneira recorrente.

Melhorar os serviços de saneamento, oferecer educação pública de qualidade, facilitar a formalização do mercado de trabalho e criar ambiente favorável à expansão da oferta de energia são, todas, atribuições do Estado. Não que a execução dos serviços seja necessariamente prerrogativa do poder público, mas cabe a ele gerar condições para que isso se dê de forma adequada.

Num Estado dominado pela ineficiência e pela predação, como temos visto no país nos últimos anos, as circunstâncias adequadas para que os avanços na prestação dos serviços públicos não se apresentam. Por mais dinheiro no bolso que o cidadão tenha, há atribuições inalienáveis ao aparato estatal, que, cada vez mais, menos cumpre o seu papel.

O levantamento do IBGE mostra, claramente, os limites das políticas públicas patrocinadas pelo PT, seu viés meramente consumista e distributivista. Escancara a ineficiência do Estado em prover bons serviços à população mais vulnerável e também seu retumbante fracasso em criar condições para que o investimento privado floresça em áreas essenciais. Com tanta pobreza e desigualdade, não há como transformar o Brasil num país rico.

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

A hora e a vez dos mequetrefes

O Palácio do Planalto e sua base de apoio parlamentar impediram ontem que o Congresso convocasse os funcionários presos ou indiciados pela Operação Porto Seguro para falar. Mais uma vez, a gestão petista resiste a esclarecer como mais uma rede de corrupção se instalou no coração do poder. Se a regra é a transparência, eles têm muito a dizer; para quem quer melar o jogo, o melhor é escondê-los.

O governo sustenta que, neste momento, a atribuição de ouvir gente como Rosemary Nóvoa Noronha, os irmãos Paulo e Rubens Vieira e José Weber de Holanda, o braço direito do braço direito da presidente Dilma Rousseff na Advocacia-Geral da União (AGU), é da Polícia Federal, e não do Congresso. Com base nisso, os governistas propuseram a ida dos chefes deles ao Senado.

Mas, num caso de polícia, quem tem muito a revelar é a arraia-miúda, quem pôs a mão na massa, quem teceu no dia a dia as teias da corrupção no aparato estatal. É a partir do que eles disserem que será possível, em sequência, chegar aos tubarões – que certamente existem e estão muito próximo dos mais estrelados gabinetes da República. A hora, agora, é de ouvir os mequetrefes.

Rosemary Noronha, por exemplo, poderá contar como atuava como faz-tudo de Luiz Inácio Lula da Silva dentro e fora do Brasil. Como portava um superpassaporte que só as mais altas autoridades – não era, formalmente, o caso dela – deveriam ter e por que viajou a torto e a direito com o então presidente da República: foram 24 países entre 2007 e 2010, que, além de passeios, lhe rederam R$ 62,9 mil em diárias.

Poderá explicar como influenciou a indicação dos irmãos Vieira para a ANA e a Anac, de onde eles operavam uma vasta rede de venda de pareceres oficiais para atender interessados privados. A ex-chefe de gabinete do escritório da Presidência da República em São Paulo poderá abrir a boca e aliviar suas tensões, que tanto temor causam aos capas pretas petistas.

Quem também tem muito a contar é José Weber de Holanda, que até ontem era o segundo na hierarquia da AGU. Ele poderá falar, por exemplo, sobre suas perigosas ligações com o ex-senador Gilberto Miranda, sua fixação por ilhas, seu empenho em liberar obras bilionárias em paraísos ambientais.

Atuando na AGU, Weber ajudou o polêmico político a manter a Ilha das Cabras, em Ilhabela (SP), cuja ocupação é objeto de contestação no Supremo Tribunal Federal. Informa O Globo que um parecer de Weber deu origem a pedido da AGU assinado pelo titular Luís Inácio Adams que corrobora as teses da defesa do ex-senador – Miranda construiu ilegalmente na ilha uma área para pouso de helicópteros, uma praia artificial e um deque.

Não foi só. O empenho de Weber também ajudou Gilberto Miranda a destravar o projeto de um complexo portuário de R$ 2 bilhões na Ilha de Bagres, área de proteção permanente ao lado do porto de Santos, como mostra a Folha de S.Paulo. No Congresso, o advogado poderá explicar como conseguiu fazer com que o empreendimento fosse aprovado em tempo recorde por órgãos como Ibama, Secretaria de Portos e Secretaria de Patrimônio da União.

Para tanto, ele certamente poderá contar como auxílio de Mário Lima Júnior, mais novo nome da lista dos nem tão mequetrefes assim abarcados pela Operação Porto Seguro. Trata-se do secretário-executivo da Secretaria de Portos ou simplesmente o número 2 na hierarquia da pasta, ligada à Presidência da República. Segundo O Estado de S.Paulo, Lima “negociou com a quadrilha acusada de vender pareceres técnicos” a liberação do projeto da Ilha de Bagres.

Por fim, os parlamentares poderão ouvir de Paulo Vieira como, a partir da ANA, operava com tanta desenvoltura e em tantos órgãos azeitando a concessão de benesses públicas para interesses privados. Ele também vai poder explicar como amealhou tanto poder no governo do PT mesmo sendo tão ruim de voto: em 2004, Vieira disputou, pelo partido, uma vaga na Câmara de Vereadores de um município paulista de 4 mil habitantes e só conseguiu 55 votos, como revela O Globo.

Como se vê, todos têm muito a contar, mas o petismo prefere escondê-los. “Esquisita a preocupação do Planalto em interditar testemunhas. Se a ideia da presidente é mesmo apurar e punir, em tese seria a maior interessada em acabar com essa história de blindagem e se postar de ouvidos bem abertos no aguardo de revelações úteis. O incentivo ao silêncio de quaisquer pessoas que possam contribuir para o esclarecimento dos fatos subtrai confiabilidade dos propósitos saneadores do Palácio do Planalto”, analisa Dora Kramer.

Todas as pessoas que o governo da presidente Dilma Rousseff conseguiu ontem evitar que sejam ouvidas no Parlamento ocupam ou ocupavam até este fim de semana cargos públicos na gestão petista. Para que estivessem lá, a regra número um é a transparência e a lisura no trato do patrimônio público. Sejam eles tubarões ou simples mequetrefes, falharam no cumprimento do dever e agora devem prestar contas à sociedade. Se o governo está contra isso, está contra o interesse público.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Os bebês de Lula

Alguma coisa está muito errada quando uma chefe de gabinete, ainda que seja da Presidência da República, exibe entre suas credenciais o poder de escolher nomes para compor a direção de agências reguladoras. Teria sido menos danoso para o país se o PT apenas tivesse transformado estes órgãos em cabides de emprego para a companheirada. Na prática, foi bem pior: eles se tornaram cobiçados balcões de negócios.

O PT não consegue entregar obras que promete, mas pode se vangloriar de ter levado a cabo um dos primeiros compromissos vocalizados por Luiz Inácio Lula da Silva quando chegou ao Palácio do Planalto: pôr fim à autonomia das agências reguladoras. Passados dez anos, a missão foi cumprida com retumbante sucesso.

A revelação de que apaniguados de Lula e José Dirceu usavam seus cargos na direção de agências como a ANA (de águas) e a Anac (de aviação civil) para traficar pareceres encomendados por empresas, feita pela Operação Porto Seguro da Polícia Federal, é a cereja do bolo. Não sobrou pedra sobre pedra nos órgãos de regulação do país.

Os irmãos Paulo Rodrigues Vieira, que navegara pela Antaq e estava na ANA, e Rubens Vieira, que levantava voo na Anac, agiam sob a proteção do gabinete presidencial em São Paulo. Até ontem, lá estava instalada Rosemary Nóvoa Noronha, fiel escudeira de Lula – com quem trocou 122 telefonemas entre março de 2011 e outubro deste ano, segundo reportagem publicada ontem pelo jornal Metro – e Dirceu – cuja teia de interesses também alcança negócios ora investigados pela PF, como revela O Globo hoje.

No mundo oficial, os irmãos Vieira eram conhecidos como “bebês de Rosemary”, mas, pelo que personificam da destruição das agências e da dilapidação do patrimônio público, deveriam ser chamados mesmo é de “bebês de Lula”. Tal como Paulo e Rubens, os órgãos reguladores do país estão cheios de filhotes do ex-presidente.

Eles simplesmente tocaram o terror na estrutura institucional criada no governo tucano para defender os direitos dos consumidores, limitar o apetite dos novos operadores privados e impedir que a elefantíase do Estado se manifestasse. Sob o petismo, as agências se converteram em órgãos de captura de um partido sobre o bem público.

São muitos os exemplos de enfraquecimento das agências reguladoras. Começam pela Anac, que em 2007 mergulhou o país no caos aéreo do qual até hoje não conseguimos decolar. Passam pela ANP, que vem assistindo o país afundar na expansão da exploração de petróleo, vergado pelo malfadado novo marco regulatório. Incluem a Aneel, avalista do salto no escuro que a gestão Dilma Rousseff promove no setor elétrico, e a Anatel, que, na maior parte do tempo, assiste muda as operadoras de telefonia lesarem seus clientes.

Também nas outras seis agências existentes acontecem movimentos suspeitos e episódios escabrosos. É o caso, por exemplo, da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Lá está sob análise um dos maiores negócios feitos no país nos últimos tempos: a compra da maior operadora de planos de saúde do país, a Amil, por um grupo americano, a UnitedHealth Group.

Trata-se de operação da ordem de R$ 10 bilhões, a maior já ocorrida no setor de saúde privada. Ocorre que tamanho negócio obteve aval da ANS em tempo recorde, para dizer o mínimo: em 13 dias estava tudo aprovado, apesar de toda a complexidade, mostrou a Folha no domingo. Na média, as análises por lá têm consumido 90 dias, além do que há operações que aguardam há mais de seis meses para ser apreciadas pelos diretores.

Também a Agência Nacional de Vigilância Sanitária está envolta em suspeitas de irregularidades, que viriam desde 2008. Há uma farra de aprovações irregulares de agrotóxicos, que sequer têm sido submetidos a testes de avaliação de danos à saúde. Imagine-se a qualidade dos alimentos que, com a leniência dos petistas, estão chegando à mesa dos brasileiros...

Desde que assumiu o governo, Dilma Rousseff vem prometendo limpar as agências da herança maldita legada por Lula. Passados dois anos, ainda não se viu, porém, qualquer avanço que possa ser considerado notável nesta área. Pelo contrário: os malfeitos só se repetem e acumulam. Se continuar assim, os bebês de Lula soltos por aí ainda vão fazer muita lambança e diabruras.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Sujeira para todo lado

Seria exagero dizer que corrupção é exclusividade do PT. Infelizmente, ela se manifesta, em diferentes proporções, em qualquer governo. Mas o que realmente chama atenção e assombra é como, nas gestões petistas, as falcatruas acontecem perto, muito perto, dos mais estrelados gabinetes, inclusive o presidencial.

Aconteceu de novo na sexta-feira, quando a Polícia Federal prendeu seis pessoas e indiciou mais 12, acusadas de fraudar pareceres em pelo menos sete órgãos federais. Entre os indiciados está a chefe de gabinete do escritório da Presidência da República em São Paulo, Rosemary Novoa de Noronha, e o segundo na hierarquia da Advocacia-Geral da União, José Weber Holanda Alves. Entre os presos, estão dois diretores de agências reguladoras.

Rosemary é a peça mais vistosa de mais esta rede de corrupção instalada no coração do poder petista. Ocupa o cargo desde 2003, nomeada por Lula, a quem também sempre acompanhava em viagens presidenciais e para quem marcava frenéticas reuniões com empresários. Antes disso, durante 12 anos esteve ao lado de José Dirceu. Agora, ela vai responder por corrupção ativa – quem sabe, com o desenrolar das investigações, não venha a fazer companhia a Dirceu na cadeia?

Quando os policiais chegaram ao apartamento de Rosemary, na região central de São Paulo, às 6h de sexta-feira, a primeira providência dela foi ligar para Dirceu e pedir-lhe socorro, conforme revelou a Folha de S.Paulo ontem. O PT está em pânico com o que a mulher que mantém estreitas ligações com a alta cúpula do partido dos mensaleiros pode vir a revelar. É preciso ouvi-la.

“Rosemary é conhecida por sua instabilidade emocional. Ela chora a todo instante. Em alguns momentos, chega a fazer ameaças – conforme os relatos – dizendo que não vai perder tudo sozinha e que não verá sua vida ser destruída sem fazer nada. ‘Não vou cair sozinha’, avisou”, informa hoje O Estado de S.Paulo. Há muito a ser desnudado.

Hoje O Globo mostra ligações entre o esquema revelado na sexta-feira e o mensalão. Um dos envolvidos, Paulo Rodrigues Vieira, diretor da Agência Nacional de Águas (ANA), preso na sexta-feira e apontado pela PF como o chefe da quadrilha, mantinha intensa troca de telefonemas com o deputado Valdemar Costa Neto, recém-condenado pelo STF por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Foram pelo menos 1.179 ligações.

Paulo Vieira chegou ao cargo depois de uma manobra espúria no Senado. Seu nome foi rejeitado pelos senadores em duas votações, mas, numa iniciativa inédita, foi novamente levado à apreciação do plenário, com as bênçãos de Lula. Em abril de 2010, Vieira finalmente recebeu aval para instalar-se na ANA e tocar de lá sua rede de negócios escusos.

Mas a agência das águas não é o único órgão regulador envolvido nas maracutaias: Rubens Vieira, irmão de Paulo e diretor da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), também foi preso pela PF, sob acusação de também criar dificuldades para vender facilidades. Registre-se que lá, em novembro de 2010, Rosemary conseguiu emplacar sua filha, Mirelle, como assessora da diretoria de Infraestrutura, conforme O Globo.

Reconheça-se que Dilma Rousseff agiu certo ao exonerar e afastar, já no sábado, os envolvidos na rede de escândalos. Mas não deixa de ser reprovável que, antes de decidir o que fazer com Rosemary, a presidente tenha primeiro “consultado” Lula, que teria “resistido” à ideia da demissão, informou a Veja Online.

“Não se explicou, claro, por que então a presidente manteve Rosemary no cargo por dois anos e permitiu que os cúmplices dela dirigissem e dilapidassem as agências reguladoras. Nada se falou, também, sobre Dilma ter transformado o gabinete paulistano no bunker de onde avaliou as eleições municipais na companhia de Lula e de cardeais do PT”, comenta Melchiades Filho hoje na Folha.

O que parece claro é que, atuando muito próximo das quatro paredes presidenciais de onde de urdiu o mensalão, gente como Rosemary, os irmãos Vieira e o segundo homem na hierarquia da AGU – que há apenas 11 dias tinha sido nomeado por Dilma para um órgão que irá movimentar bilhões de reais do fundo de previdência complementar dos servidores públicos, como mostra hoje o Correio Braziliense – tenham se sentido à vontade para também se locupletar.

Eles são apenas os mais novos nomes de uma lista que tem Erenice Guerra, Valdomiro Diniz e muitos outros. São o novo episódio de uma série que no ano passado levou sete ministros a serem defenestrados sob suspeita de corrupção. São mais um capítulo do assalto que o PT perpetra ao Estado. Quando o mau exemplo vem de cima, a sujeira se espalha para todo lado.

sábado, 24 de novembro de 2012

De cara amarrada

Dilma Rousseff participou ontem da posse de Joaquim Barbosa na presidência do STF de cara amarrada. A feição da presidente contrastou com o clima de saudação geral dos brasileiros à nova fase que se espera para o país a partir da condenação da Justiça aos mensaleiros. Mas não é só ela que se mostra contrariada: com alguns de seus principais líderes prestes a ir para a cadeia, os petistas em geral estão loucos para retaliar.

Desde que o julgamento do mensalão começou a caminhar para o fim, com a condenação e a definição das penas dos principais réus, o PT já ensaiou vários movimentos de revide. Mas logo os abortou para evitar maiores polêmicas antes que todas as decisões atinentes ao caso sejam tomadas pelos ministros do Supremo.

Mas a comichão do protesto não dá trégua. E se manifesta de várias maneiras: no espúrio relatório final da CPI do Cachoeira, produzido sob encomenda de Lula e de gente como José Dirceu; nos atos de desagravo aos mensaleiros que entidades aparelhadas como a UNE e a União da Juventude Socialista (UJS) prometem fazer nas próximas semanas; e mesmo nas plenárias nas quais condenados como João Paulo Cunha pretendem se defender junto à militância.

São atos de uma mesma peça: a ladainha do PT de que é vítima das “elites”, da “imprensa burguesa”, de “justiceiros” que acusam e condenam sem provas. O enredo é velho e batido, mas o perigo está na manipulação que os partidários dos mensaleiros fazem de instrumentos caros à democracia, como as comissões parlamentares de inquérito, e no ataque reiterado às liberdades civis, do qual a imprensa é o alvo mais recorrente.

Há uma evidente articulação dos petistas para desacreditar as instituições. Se alguma delas lhes trai a vontade, tomem-se protestos, ameaças e panfletos de toda a natureza. O partido dos mensaleiros convive mal com a crítica e respeita, menos ainda, os preceitos da democracia e do Estado de Direito. Contrariado, arreganha os dentes.

A peça que o relator Odair Cunha produziu para encerrar a CPI do Cachoeira é o exemplo mais pronto e acabado disto. Sob orientação da cúpula do PT, incluindo Lula e Dirceu, foi transformada numa arma contra todos os que, de alguma maneira, se interpuseram no caminho do partido e suas negociatas: o Ministério Público, a imprensa independente, políticos que não abaixaram a cabeça para o lulismo.

Num balé ensaiado, os próceres do PT agora articulam levar estudantes às ruas, insuflar a militância e realizar atos em defesa dos mensaleiros condenados à cadeia, como o que um tal Fórum do Diálogo Petista está convocando para amanhã em São Paulo, como informa a Folha de S.Paulo.

Sempre com Dirceu à frente (enquanto ele não começa a cumprir seus 10 anos e 10 meses de cadeia...), os petistas vão montando sua agenda do esperneio. Nesta semana, o chefe da quadrilha do mensalão passou por Brasília e arregimentou apoios – alguns meio envergonhados, como mostrou O Globo – entre a bancada do PT no Congresso para sua sanha revanchista.

Ele também cobrou atitude dos presidentes da UNE e da UJS, que, junto com a Juventude do PT, agora prometem organizar os mesmos atos em defesa dos mensaleiros que haviam ameaçado realizar durante o julgamento do Supremo, mas não fizeram. Provavelmente, o ex-ministro lhes intimidou com a possibilidade de cortar-lhes a mesada...

Felizmente, não há o menor clima no país para acolher os protestos petistas. Pelo contrário: o ambiente está é para saudar a mudança de ares que o julgamento do mensalão marca na trajetória do país e a simbólica chegada do ministro relator do caso, Joaquim Barbosa, à presidência da mais alta corte de Justiça brasileira. Nunca foi tão patente a distinção entre de que lado está o que de melhor a sociedade pode ter e aquilo que ela deve, de uma vez por todas, destinar ao lixo da história.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

A CPI da vergonha

Uma Comissão Parlamentar de Inquérito criada sob o estímulo de Luiz Inácio Lula da Silva não tinha mesmo como acabar bem. Mas o que aconteceu na CPI que deveria apurar as ligações do contraventor Carlos Cachoeira com o submundo da política supera qualquer expectativa negativa. O PT transformou a investigação num meio de vingança e, mais uma vez, subverteu um instrumento legítimo de atuação do Congresso.

O relatório final da CPI, apresentado pelo petista Odair Cunha, é um escárnio do começo ao fim. Indicia pessoas que sequer foram ouvidas ao longo dos trabalhos da comissão, ignora políticos aliados cujos laços com negócios espúrios são evidentes e passa ao largo de uma investigação mais séria sobre os dutos que drenaram recursos públicos para campanhas eleitorais de petistas e aliados por meio da empresa Delta.

O relator pede indiciamento de 46 pessoas, com destaque para cinco jornalistas, entre eles o diretor da revista Veja em Brasília, e o governador de Goiás, Marconi Perillo. Também recomenda que o Conselho Nacional do Ministério Público investigue o procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Gente como os governadores do Distrito Federal, o petista Agnelo Queiroz, e do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, saíram incólumes.

O objetivo do relator com seu texto resta evidente: transformar as conclusões da CPI numa revanche do partido dos mensaleiros pela condenação impingida pelo Supremo Tribunal Federal ao maior esquema de corrupção da história política do país. “Quem não pôde desmontar ‘a farsa do mensalão’ tratou de montar a farsa de comissão”, sintetiza Dora Kramer n’O Estado de S.Paulo.

Todos os algozes do PT estão no texto de mais de 5 mil páginas preparado pelo deputado mineiro: a imprensa investigativa, o Ministério Público, políticos de partidos adversários. Não há novidade: a regra do jogo petista é transformar instituições republicanas em armas políticas – além, claro, de atrasar obras, como vimos nesta semana em relação ao PAC...

Insuflada por Lula, a CPI da vingança foi instalada em 25 de abril, quando o STF já havia marcado o julgamento do mensalão, mas ainda não haviam começado as sessões que magnetizariam a atenção do país e condenariam a passar anos na cadeia a cúpula do PT à época em que o partido ascendeu à presidência da República.

Tratou-se, portanto, de uma tentativa de rivalizar as atenções com o julgamento que, contudo, não funcionou como Lula e seus mensaleiros esperavam. Restou aos desesperados e condenados petistas, além de aliados seus com a estirpe de Fernando Collor de Mello, usar o relatório de Cunha como arma política.

Mas o texto é tão descaradamente desequilibrado e tão acintosamente manipulador que mereceu repúdio unânime da opinião pública e foi alvo de críticas até de aliados do petismo no Congresso e na sociedade civil, como a Fenaj. “A irrelevância já é um final lamentável para a CPI, mas seu completo desvirtuamento será um desserviço ainda maior”, adverte a Folha de S.Paulo em editorial.

A mais evidente frente de investigação que deveria ter sido trilhada pela CPI não o foi, por clara escolha do relator e do PT: a apuração da relação entre a Delta Construções, uma penca de empresas laranjas e o desvio de cerca de R$ 450 milhões de dinheiro público, originado do Dnit e de órgãos de diferentes estados e movimentado pelo esquema de Cachoeira para o bolso de políticos que orbitam em torno do petismo.

A CPI comandada pelos petistas simplesmente deixou de investigar 117 empresas, muitas delas fantasmas, que firmaram contratos suspeitos com a Delta, além de não identificar os beneficiários do dinheiro que azeitava as engrenagens do poder na máquina pública federal. O relator também deixou da abordar a revelação, feita em agosto por Luiz Antonio Pagot, de que o Dnit foi usado para levantar dinheiro para a campanha que elegeu Dilma Rousseff em 2010. Não espanta que, apesar de considerada inidônea pelo TCU, a Delta mantenha-se como vice-campeã entre as empresas contratadas para obras federais...

Mas tal manobra governista não passará incólume, já que parlamentares da oposição e independentes deverão apresentar ainda hoje relatório paralelo com conclusões consistentes resultantes das investigações dos últimos sete meses. Ali poderá estar o caminho para se chegar ao dinheiro surrupiado dos cofres públicos e rivalizar com o verdadeiro tribunal de exceção que o PT instalou na CPI do Cachoeira.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Quebrando tudo

Algum tempo atrás, o governo petista divulgou, com a pompa que lhe é peculiar, que estava em marcha uma iniciativa para transformar a Eletrobrás na “Petrobras do setor elétrico”. Parecia coisa boa. A promessa foi cumprida, mas por caminhos tortos. A gestão atual está conseguindo levar a estatal de eletricidade para o mesmo buraco em que vem enterrando a petrolífera.

Há anos a Eletrobrás tem claudicado. Há tempos seu valor de mercado não chega nem perto do valor contábil, o que indica a desconfiança dos investidores na qualidade da gestão e no futuro da companhia. Ineficientes, pessimamente administradas e muito politizadas, suas empresas controladas também são um manancial de prejuízos. Uma realidade sombria.

Em vista disso, o governo petista vinha dizendo que reorganizaria e sanearia a Eletrobrás, investiria em novos negócios e estudava até internacionalizar a atuação da companhia, com a compra, por exemplo, de parte da EDP portuguesa, além da expansão para Argentina, Colômbia, EUA e Peru. Foi feito até um retumbante “relançamento” da empresa, num dos últimos atos da campanha oficiosa da hoje presidente da República, ainda ministra do governo Lula.

Como de boas intenções o inferno está cheio, o plano de soerguer a Eletrobrás simplesmente evaporou desde que o governo Dilma Rousseff anunciou sua decisão de baixar, na base do tacão, as tarifas de energia elétrica praticadas no país. A estatal tornou-se, então, o mais novo instrumento de política anti-inflacionária da gestão petista, indo juntar-se à Petrobras no poço das amarguras.

Quando, há pouco mais de dois meses, o governo Dilma editou a medida provisória n° 579, lançou todas as empresas do setor elétrico brasileiro no abismo. Pela sua expressiva participação de mercado – responde por 67% da geração – a Eletrobrás é a companhia que mais sofreu até agora, secundada pela Cemig e pela Cesp.

No início do ano, a Eletrobrás valia R$ 26 bilhões; anteontem, R$ 11,3 bilhões. Apenas nos dois últimos pregões da Bovespa, 28,96% do seu valor de mercado virou fumaça, depois que seu conselho de administração recomendou a adesão da companhia às novas regras de concessão. Seus gestores disseram amém a Brasília e os acionistas minoritários disseram até logo, contrariados com os prejuízos que o governo lhes impõe goela abaixo.

As ações ordinárias (com direito a voto) da Eletrobrás valem hoje menos do que valiam oito anos atrás. Nesta situação, não há dúvida de que a empresa não terá como sobreviver e terá que ser socorrida pelo Tesouro. Ou seja, sob a alegação de que persegue tarifas mais baixas, o governo imporá o custo a todos os contribuintes. É o meu, o seu, o nosso dinheiro que vai bancar esta sandice.

“Falta explicar por que essa empresa [a Eletrobrás] assumiu o controle de seis distribuidoras de energia elétrica estaduais deficitárias e por que está negociando o controle de mais duas delas (Celg e CEA). Belo exemplo de enxugamento e de racionalidade da gestão!”, analisou Cláudia Schüffner no blog Casa das Caldeiras. “O resultado final pode ser exatamente o oposto do desejado: menor investimento decorrente do maior risco de perdas regulatórias, provocando aumento no custo da energia ou até mesmo restrições de oferta”, avalia Elena Landau em artigo na edição de hoje do Valor Econômico.

As agruras por que passa a Eletrobrás – como, de resto, todo o setor elétrico nacional, que já perdeu mais de R$ 30 bilhões de valor de mercado em 60 dias – não diferem do que acontece há anos na Petrobras. A petrolífera é hoje o principal arrimo do governo federal para segurar a inflação, que, mesmo assim, sistematicamente mantém-se acima das metas. Vergada, tem se mostrado incapaz de dar conta do abastecimento de combustíveis no país, além de também penar nas bolsas de valores.

As consequências da danosa política são visíveis: a produção de petróleo no Brasil vem recuando, a Petrobras produz no menor nível dos últimos cinco anos na Bacia de Campos – como mostrou ontem O Estado de S.Paulo – e sua capacidade de investimento mostra-se seriamente comprometida, com o que até a exploração das reservas do pré-sal encontra-se afetada.

A Folha de S.Paulo informa hoje que a estatal clama por reajustes de pelo menos 12% nos preços dos combustíveis que vende ao longo de 2013, sob o risco de ter de brecar seu programa de obras, sem o qual o país corre sério risco de desabastecimento. De janeiro a setembro deste ano, a diferença entre os valores que a Petrobras pagou pelos combustíveis no exterior e os de venda interna foi de R$ 14,6 bilhões, segundo o Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).

Eletrobrás e Petrobras são lados da mesma moeda: a da intervenção destrambelhada da gestão petista na economia. Trata-se de um governo que não faz, não deixa quem quer fazer (os investidores) fazer e ainda atrapalha os que estão fazendo. A presidente Dilma age no limite da irresponsabilidade, desfigurando setores da economia que até pouco tempo atrás exibiam vigor e ajudavam na decolagem do país.

Ao invés de enxergar o óbvio, o governo do PT responde às críticas desqualificando os interlocutores, tentando impor-lhes a pecha de estar contra a redução das tarifas de energia e de preços menores para os combustíveis. Não admite que suas barbeiragens já estão produzindo efeitos danosos para o futuro do país e implodindo as condições para o desenvolvimento do Brasil. É um ambiente de trevas.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Atraso é a regra do jogo petista

O balanço do PAC apresentado ontem pelo governo federal só seria crível e verossímil se a seus números correspondesse a sensação do brasileiro de que as coisas, no que depende do investimento público, estão andando e acontecendo. Ninguém, em sã consciência, é capaz de afirmar isso. Basta olhar em volta e constatar que o ritmo de obras no país está longe de merecer o selo de “adequado” dado pelos burocratas petistas.

É preciso lançar mão de toda sorte de malabarismos para chegar aos números que o governo do PT alardeia. Na criativa contabilidade oficial, 40% do Programa de Aceleração do Crescimento já foi executado, equivalendo a R$ 386 bilhões investidos em obras. Dentro desta ótica, 84% dos empreendimentos caminham adequadamente. Nem a pau, Juvenal!

Na conta oficial, estão lançados investimentos privados, gastos de estatais e, principalmente, financiamentos habitacionais, que funcionam como o fermento do bolo. Um terço do valor total aplicado (R$ 129,7 bilhões) equivale a dinheiro que os brasileiros tomaram emprestado em banco para comprar uma moradia: não importa se nova, usada ou reformada, entra tudo como “investimento” na planilha do governo. Importa menos ainda se os valores terão que ser pagos de volta aos financiadores...

Nas mandracarias da contabilidade oficial petista também entram as constantes postergações de prazo das obras. Tem empreendimento que era para estar pronto há dois anos, como as refinarias da Petrobras no Rio e em Pernambuco, mas continua com evolução “adequada” na visão do governo. Deve ser porque, para a gestão petista, a regra é fazer tudo com atraso.

“Se eu colocar cada dia de atraso, tudo teria que ser vermelho. Então atraso é da regra do jogo”, afirmou ontem a ministra Miriam Belchior, segundo a Folha de S.Paulo. Vermelho é a cor que a gerência do PAC usa para indicar obras que estão com ritmo de andamento considerado “preocupante”.

O que Belchior afirmou é a mais pura verdade: seja na gestão Lula, seja na de Dilma Rousseff, atraso é, sim, a regra do jogo petista. O PAC foi lançado em janeiro de 2007 e está, portanto, prestes a completar seis anos de existência. Em todos estes anos, o percentual efetivamente pago no próprio exercício mal ultrapassou 31% da dotação prevista no respectivo Orçamento Geral da União (OGU).

Levantamento feito pela Assessoria de Orçamento da Liderança do PSDB na Câmara mostra, por exemplo, que, dos R$ 16,6 bilhões destinados ao PAC no OGU de 2007, 30% ainda carecem de pagamento quase seis anos depois.

De uma dotação de R$ 181 bilhões acumulada desde 2007, 61% (equivalentes a R$ 110 bilhões) foram efetivamente pagos até o último dia 31 de outubro. Isto significa que, considerados os últimos seis orçamentos da União, valor equivalente à dotação de aproximadamente dois anos (R$ 71 bilhões) continua esterilizado, guardado nos cofres do Tesouro.

Para 2012, a previsão era investir R$ 44,2 bilhões, mas até o início deste mês somente 19% haviam sido efetivamente aplicados. Do que já foi pago neste ano, 68% são restos a pagar provenientes de orçamentos anteriores, volume inédito. Segundo o Valor Econômico, de 651 ações previstas no PAC, 310 não tiveram nada executado neste ano.

A execução orçamentária no segundo ano da gestão Dilma consegue ser pior que a do primeiro, destaca a Folha. Órgão cruciais para “destravar o crescimento” – o objetivo original do PAC – têm desempenho medonho. No Dnit, só R$ 2 bilhões de um total de R$ 12,7 bilhões foram pagos até agora; na Valec, apenas R$ 332 milhões de um montante de R$ 2,2 bilhões; no Ministério das Cidades, R$ 2,9 bilhões de uma dotação de R$ 15,8 bilhões.

Por estas e outras tantas constatações, o governo Dilma mais parece um imenso laboratório, preso num interminável sistema de tentativa e erro. Há dez anos vemos os responsáveis por gerir os recursos públicos, e em devolver os tributos que a sociedade paga em forma de benefícios, praticando uma espécie de cursinho profissionalizante de gestão. Nada mais natural que, para esta gente, a regra do jogo seja o atraso. 

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Para europeu ver

Dilma Rousseff costuma ser mais loquaz quando está fora do Brasil. A presidente tem por hábito conceder extensas entrevistas a jornais estrangeiros e, assim como em seus discursos, tecer loas a ações de seu governo e de seu antecessor. Ela talvez aposte no menor conhecimento que tanto jornalistas quanto suas plateias internacionais tendem a ter do que realmente se passa aqui. O que Dilma diz é coisa para europeu ver.

É o que acontece agora na Espanha. A presidente foi até Cádiz para a 22ª Cúpula Ibero-Americana neste fim de semana e emendará o programa com um seminário sobre economia brasileira promovido pelo jornal El País. O principal tema de seus discursos tem sido a crítica à austeridade que, segundo ela, é a receita para o abismo que os governantes europeus adotaram para tirar o continente da crise.

Se conhecessem bem o que está se passando no Brasil, seus ouvintes não dariam um vintém pelas palavras da presidente brasileira. Dilma dá aulas de gestão da economia como quem pilota um país em franca decolagem, mas governa uma nação em processo de aterrisagem. O Brasil dos discursos dela só existe na propaganda oficial.

Dilma fala que o incentivo aos investimentos e o apoio ao ímpeto empreendedor privado são as chaves para o desenvolvimento. Mas promove, neste momento, o oposto disso no país. O governo petista não executa os projetos públicos e, para piorar, destroça as condições para que os investimentos privados aconteçam. Não se vê perspectiva de melhora.

A presidente também costuma dizer, como fez novamente no sábado em Cádiz, que a austeridade no controle das contas públicas não é a melhor forma de conduzir países em crise. Poderia aproveitar e esclarecer qual a visão dela sobre o assunto no Brasil. Afinal, aqui seu governo pratica uma política econômica que implode as condições que levaram o país a altas taxas de crescimento em passado recente.

Do antigo tripé herdado do governo Fernando Henrique, e que deu estabilidade e suporte a ações da gestão Lula, pouco resta em pé agora. Não há mais comprometimento estrito com a geração de superávits fiscais para reduzir o endividamento do Estado e gerar espaço para o investimento: neste ano, nem com toda a criatividade contábil do mundo, a meta será atingida.

Também não há compromisso firme com as metas de inflação, sistematicamente acima do alvo. Ao contrário, a política monetária do governo Dilma passou a mirar uma meta de juros e manipula toda a sorte de preços – como os dos combustíveis e agora também os da energia elétrica – para evitar um descontrole maior. Tampouco temos um sistema de câmbio realmente flutuante.

Mas o país que Dilma vende a seus interlocutores estrangeiros não difere da realidade apenas nos fundamentos da economia. A presidente também distorce os fatos quando reconta a história recente do país: “Poucos governos fizeram tanto pelo controle dos gastos públicos, como o do presidente Lula”, disse ela em entrevista publicada na edição de ontem do jornal espanhol El País. Em que mundo viverá a presidente?

Talvez ela não habite a Esplanada dos Ministérios em que hoje exista praticamente o dobro de pastas do que havia dez anos atrás; onde o contingente de servidores cresceu mais de 21%, incorporando mais de 170 mil novos funcionários; e em que os gastos com salários subiram 33% acima da inflação, como mostrou O Globo no domingo.

Para completar, Dilma preside uma economia que neste ano terá apenas a segunda menor taxa de crescimento da América Latina, superando somente o Paraguai, país que hoje mal tem governo. Não são as credenciais mais vistosas para quem pretende ditar regras para países em crise...

Seria muito bom se o Brasil que Dilma Rousseff apresenta aos estrangeiros existisse de verdade. Mas a realidade teima em desmenti-la. Com base numa experiência de governo que em dois anos não fez nem deixou que se fizesse, a presidente brasileira ainda tem muito a aprender com o Velho Continente e com os países desenvolvidos. Só quem não a conhece a compra.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Prisão para quem precisa

O ministro da Justiça trata da questão da (in)segurança pública no país como se o problema não fosse com ele. Mas o governo do PT tem muito, muito mesmo, a ver com a crítica situação dos presídios e a aguda superlotação “denunciadas” ontem por José Eduardo Martins Cardozo. De tempos em tempos, promessas e planos mirabolantes são anunciados, sem, porém, jamais atingir os objetivos a que se propõem.

Cardozo está nas manchetes das edições de hoje de todos os jornais do país por ter dito o seguinte: “Infelizmente, os presídios no Brasil ainda são medievais. E as condições dentro dos presídios brasileiros ainda precisam ser muito melhoradas. Entre passar anos num presídio do Brasil e perder a vida, talvez eu preferisse perder a vida, porque não há nada mais degradante para um ser humano do que ser violado em seus direitos humanos”. 

O ministro da Justiça tem o apoio de larga parcela da sociedade brasileira quanto à indignação que exibiu em relação à situação do nosso sistema prisional. Sim, as condições são degradantes, as piores possíveis. Mas, diferentemente de todos os demais, está nas mãos dele o poder de mudar a situação. Cardozo fala muito, mas não faz.

Exatamente um ano atrás, o ministro da Justiça anunciou um plano “para valer” de criação de 42,5 mil novas vagas em penitenciárias, com a liberação de R$ 1 bilhão. “É uma questão de gestão. Este programa vai sair do papel. Seremos muito rigorosos na cobrança. Nunca se investiu tanto e se produziu tanto nessa área. Repito, este sairá do papel e será executado”, afirmou na ocasião.

Não se tem notícia de que a ação anunciada por Cardozo doze meses atrás tenha surtido algum resultado. A população carcerária não para de crescer no país e o déficit de vagas continua aumentando: segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, ao fim de 2011 havia 471.254 presos no Brasil para 295.413 vagas, o que representa déficit de 175.841.

A frustração de promessas na área da segurança – em especial em relação à melhoria das condições de encarceramento no país – é recorrente na gestão petista. Metade das 42 mil vagas prometidas por Cardozo há um ano já deveriam ter sido criadas ainda no governo Lula, mas a meta esteve longe de ser cumprida, como informou O Globo em novembro do ano passado.

Auditorias da Controladoria-Geral da União mostraram que apenas 5% da meta de 2010 fora alcançada: foram abertas somente 1.245 vagas de um total de 24.750 previstas. “As 13 reformas em estabelecimentos estaduais também prometidas no governo Lula não saíram do papel, da mesma forma que nenhuma das 3.800 vagas para o aprisionamento especializado de jovens foi criada”, mostrou o jornal.

O Departamento Nacional Penitenciário, do Ministério da Justiça de Cardozo, passou o ano passado inteiro pagando por obras não concluídas. Na mesma reportagem, O Globo revelou que 68 das 146 construções que deveriam ocorrer entre 2004 e 2010 dentro do plano petista ainda não haviam começado. É possível que pouco tenha mudado desde então.

Na semana passada, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgou seu anuário relativo ao exercício de 2011. Lá está dito que os gastos do governo federal com segurança pública caíram 21,26% na comparação com 2010, passando de R$ 7,3 bilhões para R$ 5,7 bilhões. Foi o menor valor desde 2006, já descontada a inflação. Corte ainda maior ocorreu na área de informação e inteligência, com 58% a menos aplicados no ano passado.

Entre todos os entes da Federação, a União é quem, proporcionalmente, menos investe em segurança pública: apenas 0,4% das despesas realizadas pelo governo federal têm esta finalidade. Entre os estados, o menor percentual é o do Distrito Federal, ainda assim seis vezes maior (2,3%), e o maior é o de Minas Gerais, que destina 13,6% de seus gastos para cuidar da segurança de seus cidadãos.

Não surpreende que um dos programas mais pomposos da lavra petista tenha redundado em retumbante fiasco: o Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania). Lançado em 2007, propunha-se a reduzir à metade os índices de criminalidade no país. Nada aconteceu, e o Brasil continua a ter taxa duas vezes maior que a aceitável segundo parâmetros internacionais: quase 23 homicídios para cada 100 mil habitantes.

Há, sim, um problema de superpopulação carcerária no país. Há, sim, um problema de presos que sequer deveriam estar presos (37% aguardam julgamento) e que lá estão fazendo pós-graduação em criminalidade. Há, sim, excessos em relação a algumas punições, que só contribuem para piorar o infrator e devolvê-lo à sociedade que o puniu bem pior do que entrou.

São questões que exigem ação dos governos estaduais, mas, principalmente, coordenação e articulação federal, coisa que não há. Inexiste uma efetiva política de Estado para a segurança, com ações estratégias e integração entre os diversos níveis e órgãos. Assim como seus colegas de ministério, José Eduardo Martins Cardozo deveria falar menos e agir mais para mudar esta vergonhosa situação. Só indignação não basta.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

O PT atrás das grades

O Supremo Tribunal Federal condenou os integrantes da cúpula responsável pela ascensão do PT ao poder a passar uma temporada atrás das grades. Se, com seus 26 anos de penas somadas, José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares eram o que de melhor o partido que há dez anos governa o Brasil tinha a oferecer, que outras mazelas os petistas não têm escondidas por aí?

Nos primórdios do mensalão, José Dirceu era presidente do PT e, já no governo, assumiu a chefia da Casa Civil. Era, em síntese, o “capitão do time”, nas palavras do próprio presidente da República. Se não tivesse sido apanhado montando e comandando o maior esquema de corrupção da nossa história política, provavelmente teria sido a opção dos petistas para suceder Lula na presidência do país.

Dirceu é, agora, um condenado da Justiça, com pena de dez anos e dez meses de cadeia pela prática dos crimes de corrupção ativa e formação de quadrilha. Pelo menos um ano, nove meses e 20 dias ele terá que gramar atrás das grades, provavelmente num presídio de segurança máxima em São Paulo. Também será banido da vida política brasileira, inelegível até 2031, quando terá completado 85 anos.

José Genoino também colecionara todos os cargos de relevo na direção partidária petista. Depois de liderar o partido na oposição, assumira a presidência do PT em sucessão a Dirceu, já com a estrutura do mensalão azeitada e operante. Cuidou de assinar contratos de empréstimos fictícios que compuseram a farsa montada para dar ares de legalidade a parte dos R$ 78 milhões já comprovadamente desviados dos cofres públicos.

Genoino também é, desde ontem, um condenado pela Justiça a seis anos e 11 meses de prisão pela prática dos mesmos crimes de corrupção ativa e formação de quadrilha. Terá, porém, melhor sorte que Dirceu, podendo cumprir a pena definida pelo Supremo em regime semiaberto, ou seja, terá apenas que passar as noites na cadeia.

Já Delúbio Soares era o responsável por movimentar a dinheirama que lubrificou a relação do PT com seus aliados e pavimentou a conquista do poder pelo partido em 2002. Com Lula na cadeira presidencial, tinha livre trânsito no Palácio do Planalto e andava despreocupadamente por aí com malas de dinheiro, talvez por acreditar que tudo jamais passaria de “piada de salão”.

O tesoureiro do mensalão pegou oito anos e 11 meses de cadeia, a serem cumpridos, assim como a pena de José Dirceu, também em regime fechado pelos mesmos crimes de formação de quadrilha e corrupção ativa. Na prisão, provavelmente terá regalias distintas daquelas do capitão do time e nenhum motivo para rir de nada.

Dirceu, Genoino, Delúbio e mais 22 réus do mensalão estão indo para a cadeia por comandar um esquema que desviou dinheiro público para corromper parlamentares, comprar voto no Congresso, subjugar um poder da República (o Legislativo) a outro (o Executivo) e, assim, perpetrar um ataque ao Estado Democrático de Direito. Terão um bom tempo de xilindró para se arrepender do que fizeram.

Com a decisão dos ministros do Supremo, a democracia brasileira começou a se defender de tanto acinte, de reiterados desrespeitos, de insidiosas investidas, que também se manifestam por meio da nefasta ocupação e instrumentalização do aparelho estatal por parte do PT e seus aliados.

“[Os condenados] estavam juntos a serviço de algo maior: de uma política de governo que usa agentes políticos, banqueiros, empresários, publicitários. De uma política de governo que usa o público e o privado, a lei, o contrato e os partidos políticos para ameaçar a democracia”, escreve Joaquim Falcão, professor da FGV, na Folha de S.Paulo. A tudo isso, o país, na figura do Supremo Tribunal Federal, dá agora um basta.

Não é do dia para noite que a corrupção será banida do país. Mas o julgamento do mensalão é certamente um passo definitivo nesta direção. Não devemos, porém, nos iludir: assim como outros notórios corruptos se transmutaram e renasceram sob as bênçãos do PT, os petistas estarão sempre tentando reescrever a história, para que o que há de pior na política continue a prevalecer. Irão defrontar-se, cada vez mais, com a resistência da oposição.

terça-feira, 13 de novembro de 2012

O fiasco da gerente

A presidente Dilma Rousseff caminha para concluir seu segundo ano de mandato sem passar nem perto de cumprir o principal objetivo a que se comprometeu quando eleita: dar uma gestão mais eficiente ao país. Seu fiasco se mede num crescimento econômico medíocre e numa máquina pública permanentemente emperrada.

O Brasil fechará este ano protagonizando o papel de país com a segunda menor expansão do PIB na América Latina, superando apenas o crítico Paraguai. Resta claro que nossos problemas vão muito além da desaceleração global que afeta a todos. Se crescemos menos que os demais, é porque temos nossas próprias deficiências.

Tanto o Palácio do Planalto quanto o Ministério da Fazenda gostam de repetir que as dificuldades devem-se a fatores externos. Mas o maior preço que o país paga hoje é por desastradas decisões internas – como as que travam os investimentos no setor de energia – e pela já quase anedótica incapacidade do governo de bem gerir o dinheiro do contribuinte.

A realidade é que a gestão petista – seja a atual, seja a anterior – não exibe a menor competência para investir os recursos que retira da sociedade na forma de impostos. O PT é bom de saliva e de gasto supérfluo, mas péssimo de investimento, incapaz de plantar as sementes que florescerão no amanhã.

No segundo ano da gestão Dilma e no décimo da administração petista, a execução orçamentária continua baixíssima. A despeito de o país depender cada vez mais da melhoria das condições de infraestrutura e logística, o governo não consegue realizar os investimentos públicos e, para piorar, ainda atrapalha o empreendedor privado.

Dos R$ 102,3 bilhões disponíveis no Orçamento Geral da União para investimentos neste ano, somente 44% foram aplicados até setembro, ou seja, R$ 45 bilhões, segundo O Globo. É assustador, mas o que já era ruim ficou pior: o valor aplicado neste ano é proporcionalmente menor do que em 2011, quando nesta altura do ano estávamos em 47%.

Do valor investido até setembro, a maior parte – R$ 30 bilhões – refere-se a restos a pagar, despesas de anos anteriores que estão sendo agora quitadas. Ou seja, do montante efetivamente reservado para 2012, a gestão Dilma só conseguiu gastar cerca de R$ 15 bilhões, ou 14,5% do aprovado pelo Congresso.

Ministérios como o da Integração Nacional e o de Transportes só executaram um terço do Orçamento, o que ajuda a explicar o fracasso das ações de enfrentamento à seca no Nordeste e a penúria da nossa infraestrutura. Os resultados seriam bem piores não fosse o cômputo dos subsídios do Minha Casa, Minha Vida como investimentos.

Saltam daí pelo menos duas conclusões. A primeira é que, de fato, os governos do PT não sabem transformar em realidade as prioridades expressas no papel. A segunda é que o governo atual não consegue sequer ter suas próprias prioridades, já que vive de honrar compromissos anteriormente assumidos. “Não tendo até agora encaixado uma bola, ela [Dilma] corre risco de ficar carimbada como a presidente que não produz e não deixa produzir”, analisa Melchiades Filho na Folha de S.Paulo.

Há, atualmente, uma sensação geral de desalento com o futuro próximo do Brasil. Depois do pau na máquina que Lula deu na economia em 2010 para embalar o país num clima de falsa euforia e forjar um ambiente favorável para a eleição de sua sucessora, o ritmo geral em voga atualmente é decadente. O ambiente de negócios no Brasil não está favorável.

Na média, a gestão Dilma terminará seus três primeiros anos com crescimento de 2,4%, estima José Roberto Mendonça de Barros em entrevista a’O Estado de S.Paulo. Especialista em analisar o lado real da economia, ele vê a mão peluda do Estado se metendo onde não deve e atrapalhando quem quer produzir e investir.

“O desmonte do investimento é o que mais me preocupa, porque o investimento de hoje é o crescimento da economia amanhã. (...) É o avião que fica parado na pista, os 65 apagões, a falta de gasolina que começa a pipocar e vai piorar, a queda na qualidade da telefonia. No curto prazo, tudo gera perda de eficiência na economia e reduz investimentos”, resume ele.

Na outra ponta, de janeiro a setembro a torneira das despesas de custeio jorrou dinheiro: elas cresceram 8,1% acima da expansão nominal do PIB em comparação com igual período do ano passado, segundo dados divulgados pelo Tesouro Nacional.

Diante de um cenário tão negativo, cabe questionar: onde está a “capacidade de planejamento” que a presidente da República tanto alardeia possuir? Cadê a gestora eficiente que ao longo de anos foi vendida pelo marketing petista ao Brasil? A constatação imediata é de que até Tiririca aprendeu a ser deputado, mas Dilma Rousseff está longe de se tornar a boa gerente que se apregoava. Pior do que está fica.

sábado, 10 de novembro de 2012

Nordeste: urgente e relevante

A presidente Dilma Rousseff volta hoje ao Nordeste levando na bagagem um monte de promessas que não cumprirá. O governo petista tem sido pródigo em anunciar grandiosas intervenções na região, que sofre com a mais rigorosa estiagem dos últimos 40 anos, mas absolutamente avaro quando chega a hora de realizá-las.

A incúria em relação aos problemas que já afligem 10,15 milhões de pessoas e põem 1.317 municípios em situação de emergência fica clara com a parca execução do Orçamento Geral da União voltado a obras e ações de infraestrutura hídrica no Nordeste. Dos R$ 2,2 bilhões destinados ao aumento da oferta de água na região neste ano, apenas 12% foram executados até agora.

Dos 34 projetos e atividades planejados para 2012, 19 não tiveram um único centavo pago até quarta-feira, de acordo com levantamento feito junto ao Siafi pela Liderança do DEM no Senado. Outros seis tiveram menos de 20% liquidados.

O governo petista pode querer argumentar que o grosso da execução deste ano é de despesas previstas no Orçamento de 2011. Mesmo que seja uma aberração em termos de finanças públicas, também não seria verdadeiro: dos R$ 601 milhões orçados para o ano passado, somente 34% foram efetivamente pagos até o último dia 7. Isto mesmo: quase dois anos para executar pouco mais de um terço do previsto para um exercício.

Novamente, a fileira de zeros se repete: dos 42 projetos e atividades orçados em 2011 com a função de melhorar a infraestrutura hídrica e levar mais água para os nove estados do Nordeste, nada menos que 27 não tiveram nadinha investido até agora.

Neste ano, às dotações originalmente destinadas pelo Orçamento da União somam-se os montantes previstos em quatro medidas provisórias editadas pelo Planalto entre abril e outubro últimos, que envolvem mais R$ 2,2 bilhões.

Os textos foram enviados para apreciação do Congresso sob alegação de urgência e relevância em aplacar os problemas decorrentes da estiagem no Nordeste. Por isso, contaram com o apoio decidido de deputados e senadores, inclusive da oposição, que correram para aprová-los. Mas, se houve urgência em propor e aprovar as medidas, o mesmo não está ocorrendo ao implementá-las.

Até agora, só R$ 760 milhões foram aplicados, ou pouco mais de um terço do total. Um exemplo: editada em 5 de junho, a MP n° 572, que destinou R$ 381 milhões a apoio a comunidades afetadas por desastres ou calamidades, teve menos de R$ 20 milhões investidos até agora, ou seja, apenas 5,2% do previsto, depois de transcorridos mais de cinco meses.

Estiagem não é um problema novo no Nordeste. Muito ao contrário: os períodos de seca se repetem na região. A despeito disso, parecem ter o poder de sempre pegar o governo federal de calças curtas. Mas a desgraça alheia acaba sendo transformada pelo poder público em oportunidade para se promover.

Hoje, em Salvador, Dilma promete anunciar R$ 1,7 bilhão em investimentos para ampliação da oferta de água na região, no que foi batizado pelo marketing petista de “PAC-Prevenção”. Serão 33 intervenções em 120 municípios inseridos na área de atuação da Sudene, segundo informa o Correio Braziliense.

O PAC-Prevenção talvez não fosse necessário se o PAC original, lançado há quase seis anos, tivesse entregado o que prometeu. Mas seu rol de fracassos – entre os quais um dos mais retumbantes são as obras da transposição das águas do rio São Francisco – supera com sobras as parcas realizações.

Como se não bastasse, à inação do poder federal soma-se também a penúria a que os municípios – e não apenas os nordestinos – estão sendo submetidos em razão da política econômica do governo petista. A desaceleração da economia e as medidas de desoneração tributária feitas com chapéu alheio – que retiraram pelo menos R$ 1,5 bilhão das prefeituras – deixaram prefeitos com pires na mão e muitos deles simplesmente estão fechando as portas de suas repartições, como está ocorrendo em Pernambuco.

Não pense a presidente da República que conseguirá enrolar, mais uma vez, o Nordeste com suas promessas vãs. O histórico de compromissos não cumpridos, de desídias em relação às necessidades da região e de injustiças com os entes federados é mais que suficiente para pôr em descrédito suas supostas bondades. Hoje na Sudene, caberá a Dilma Rousseff encenar uma pantomima na qual ninguém mais põe fé.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Um poço de confusão no petróleo

Era para ser um passaporte para o futuro, mas o PT conseguiu transformar em uma viagem, sem escalas, rumo às profundezas. A descoberta de novos e gigantescos campos de petróleo no país, ocorrida há cinco anos, jogou o setor num poço sem fundo de onde não consegue sair. O único culpado disso é o governo federal.

A nova confusão em torno das novas regras de partilha dos royalties é apenas mais um capítulo de uma novela de insucessos que vem desde a malfadada ideia de criar um novo marco legal para a exploração de petróleo no país, levada adiante pelo governo Lula, com patrocínio direto da ex-ministra de Minas e Energia e então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.

A partir daí, um setor que até então vinha de dez anos de pujança afundou em incertezas e retrocessos. Desde que o Brasil tirou o “bilhete premiado” do pré-sal, a indústria do petróleo agoniza no país, a produção anda de lado e nossa maior empresa, a Petrobras, acumula insucessos. Até o outrora promissor setor de etanol foi afetado: de produtor, o Brasil passou a importador do combustível.

Desde abril, a produção mensal de petróleo tem sido menor que a do mesmo mês do ano passado, segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Em setembro, ficou 8,4% abaixo de um ano antes e, no acumulado no ano, o desempenho também se tornou negativo, perfazendo queda de 0,6% na comparação com o mesmo período de 2011.

Não é apenas pelos números que o resultado deve ser analisado, mas, principalmente, pelas circunstâncias. O Brasil produz menos petróleo hoje a despeito de novos campos do pré-sal terem entrado em operação. Descobrimos mais reservas, mas não só não conseguimos explorá-las a contento, como estamos vendo os demais poços secarem.

O que impera atualmente no setor brasileiro de petróleo é a chamada insegurança jurídica. Ninguém sabe ao certo como tocar seus negócios depois que o governo do PT embolou de vez o meio de campo com o novo margo legal, implodiu o bem sucedido modelo de concessões e instaurou o regime de partilha, que ainda não se conhece como funcionará.

Havia outros caminhos a seguir, mas a gestão petista optou pela trilha mais ideológica, mais dogmática e menos eficiente. É admissível que a descoberta de uma nova e gigantesca reserva de petróleo alterasse a modelo de repartição dos ganhos. Afinal, os riscos de insucesso tornam-se menores, ainda que as condições de exploração sejam até mais drásticas nas águas ultraprofundas do pré-sal.

Mas não era necessário desmontar todo o arcabouço que, testado durante dez anos, apresentara vistosos resultados: o mais reluzente foi o aumento significativo da participação do setor de petróleo no PIB, que passou de 2,75% para 12% após a adoção da nova lei no governo Fernando Henrique. Bastava, por exemplo, alterar os percentuais de participação especial dos entes federativos – União, estados e municípios – fixados em decreto presidencial. Mas, para o PT, o caminho preferível é sempre o mais tortuoso.

Foi esta trilha que acabou desembocando na decisão, tomada esta semana pela Câmara, de redefinir a partilha dos royalties, jogando estados e municípios produtores numa luta fratricida contra os demais. O que os parlamentares tentam agora consertar é a lambança que o governo do PT começou a produzir lá trás e que só produziu despautérios.

Mesmo querendo, o empreendedor privado não consegue investir na exploração de petróleo porque o setor está travado por indefinições e incertezas, agora agravadas pela possibilidade de a discussão da divisão dos royalties ser levada para deliberação do Supremo Tribunal Federal, num processo que não se sabe quando pode ter fim.

Segundo a Folha de S.Paulo, esta é hoje a tendência: “A presidente Dilma Rousseff está inclinada a sancionar sem vetos o projeto de lei aprovado na Câmara dos Deputados que muda a divisão dos royalties do petróleo, na esperança de que a nova lei será derrubada mais tarde pelo Supremo Tribunal Federal.”

O problema é que, da definição dos royalties, depende a retomada dos leilões de exploração de novos campos de petróleo, prometida pela ANP para maio de 2013. Desde 2008 não se realizam novos certames e o resultado veio de roldão: o tamanho da área prospectada no país hoje é metade do que era no passado. Se os leilões não vierem, cairá novamente à metade já em fins de 2013, segundo O Globo, e tende a zerar até 2016.

O modelo que o PT preconiza para a exploração do pré-sal superdimensiona a presença do Estado no setor, além de também pôr o futuro da indústria do petróleo na dependência da Petrobras, convertida em participante obrigatória de todos os consórcios. Transformada num esteio do governo para segurar a inflação, a estatal não demonstra fôlego para cumprir tal incumbência.

Estados e municípios produtores preparam-se para travar uma guerra com os demais, em defesa de seus royalties. O governo assiste impassível e acena com a possibilidade de passar a bola para o STF, como se nada tivesse com a pendenga. Mas nada disso estaria acontecendo agora se a gestão petista não tivesse transformado uma “dádiva de Deus”, nas palavras de Lula, num monumental problema de difícil solução. Perde o país.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Insegurança pública

O governo federal parece muito preocupado com a segurança pública no país. Mas se satisfaz em aplacar suas aflições com simples retórica. A atenção no combate ao crime não tem se traduzido em prioridade orçamentária: os investimentos no setor despencaram no primeiro ano da gestão Dilma Rousseff.

O Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgou ontem seu anuário, relativo ao exercício de 2011. Na comparação com 2010, a queda dos gastos do governo federal com segurança pública foi de 21,26%. Os investimentos da União no setor caíram de R$ 7,3 bilhões para R$ 5,7 bilhões.

São, portanto, R$ 1,6 bilhão a menos, que fazem toda a diferença num país em que a taxa de homicídios está estacionada em torno de 23 por 100 mil habitantes – a despeito da promessa de reduzir o índice à metade, feita, e obviamente não cumprida, pelo governo Lula quando lançou o malfadado Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania).

Mais grave é que o maior corte ocorreu na área de informação e inteligência: foram 58% a menos em 2011, nos mais baixos desembolsos do governo federal para esta finalidade desde 2006. Cabe notar que, dos R$ 5,7 bilhões gastos com segurança pública, somente 0,6% são destinados a esta área, justamente onde estão as melhores armas para se combater o crime, segundo é consenso entre especialistas.

Os números oficiais desmentem a suposta boa vontade da gestão petista em participar do esforço das unidades da Federação para derrotar a criminalidade. Além da União, somente seis estados reduziram suas despesas com segurança no ano passado: só o Rio Grande do Sul, governado pelo também petista Tarso Genro, foi mais avaro, cortando as despesas em mais de 28% entre 2010 e 2011.

A explicação do Ministério da Justiça para o corte faz corar de tão absurda. Segundo a diretora do Departamento de Pesquisas da Secretaria Nacional de Segurança Pública, Isabel Seixas de Figueiredo, é comum os orçamentos serem “repensados” “nos primeiros anos de governo”, conforme afirmou a’O Estado de S.Paulo. Até serviria como justificativa se o PT não estivesse por lá há dez anos...

“Desde a criação do plano nacional de segurança pública, no governo Fernando Henrique Cardoso, houve um consenso de que os governos estaduais não têm condições sozinhos de implementar sua política de segurança. Se a União reduz esse investimento na área, certamente há um impacto negativo”, contrapõe o pesquisador Vasco Furtado à Folha de S.Paulo.

Enquanto alguns estados chegam a comprometer mais de 10% de suas despesas com segurança pública, a União gasta apenas 0,4%, percentual que vem caindo desde 2009. Mais: o gasto per capita do governo federal é de R$ 29,86, para uma média nacional de R$ 267,95, enquanto estados como Minas Gerais chegam a investir R$ 335,27.

O gasto em segurança no Brasil é de má qualidade. Em percentual do PIB, aplicamos mais ou menos o mesmo que Alemanha e Argentina (1,3%), mas obtemos resultados muito piores em termos de redução da criminalidade. Enquanto aqui a taxa de homicídios é de quase 23 por 100 mil habitantes, no país europeu não chega a 1 e no vizinho, a 6.

Os números do Fórum Brasileiro de Segurança Pública vieram a público numa má hora para a gestão petista: justamente quando o ministro da Justiça de Dilma, José Eduardo Martins Cardozo, tentava empurrar para o governo paulista a responsabilidade por não querer a ajuda federal para combater o crime no estado.

Na realidade, o compromisso de colaborar com os estados foi uma das primeiras medidas anunciadas pelo governo da presidente, mas a propalada “união contra o crime” jamais existiu. Ao mesmo tempo, a União vem descuidando de ações que são de sua exclusiva alçada e que têm impacto direto na insegurança nas cidades: a vigilância nas fronteiras e o combate ao tráfico de drogas e armas.

O anuário divulgado ontem mostra que São Paulo aparece agora como o estado com a mais baixa taxa de homicídios do país, superando Santa Catarina: são 10,1 por 100 mil. Vale recordar que, com reiterado esforço da gestão tucana no estado, a taxa caiu mais de 70% (era 35,27 por 100 mil em 1999) em pouco mais de dez anos. Ano a ano, os investimentos em segurança sobem no estado. É, como se percebe, um quadro bem diverso do que reina no país como um todo. Não há politicagem rasteira que consiga se contrapor a isso.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

A mais cara energia

O governo federal conseguiu produzir um choque de alta voltagem no setor elétrico brasileiro. No mesmo momento em que o abastecimento de energia tem apresentado falhas, na forma de apagões cada vez mais frequentes, baixou regras draconianas para a renovação dos contratos de concessão de hidrelétricas e linhas de transmissão que podem simplesmente travar os investimentos na expansão da oferta no país.

Reduzir as tarifas de energia tornou-se uma obsessão da presidente Dilma Rousseff. Se todos concordamos com os fins, é ampla, geral e irrestrita a discordância quanto aos meios. Das duas, uma: ou o governo está muito certo ou todo o mundo está completamente enganado. Difícil fiar-se na primeira hipótese.

As regras definidas para a renovação dos contratos têm sido consideradas drásticas demais por todos os agentes do setor. Não há vivalma que aplauda o que o governo vem fazendo, embora seja unânime o reconhecimento de que o país precise ter tarifas de energia mais baixas.

Mas a questão é: da forma como o governo quer proceder, o risco é não haver quem se interesse em investir no setor elétrico no Brasil. E aí cairemos no pior dos mundos, porque a energia mais cara é aquela que não existe.

Na noite de quinta-feira, véspera de feriado, o governo publicou os valores das indenizações que pretende pagar às empresas detentoras de 15 usinas hidrelétricas e às nove de transmissão por investimentos ainda não amortizados e ativos que possuem. No total, R$ 20 bilhões, com base numa redução média de 72% nas tarifas. É muito menos do que as companhias esperavam receber.

A regra representa um corte expressivo nas receitas previstas pelas empresas de energia – há casos, como o de Chesf, em que a perda atinge 80%. Conclusão lógica: faltará dinheiro para assegurar a continuidade, a confiabilidade e a preservação dos ativos do sistema elétrico nacional, que hoje já não está lá estas coisas.

A constatação entre agentes do setor, empresários, analistas e investidores é unânime: as tarifas impostas pelo governo não cobrem os investimentos necessários para a expansão e põem em risco a manutenção e a segurança do sistema elétrico brasileiro. “As novas tarifas beiram o ridículo. As usinas vão valer um cafezinho”, comentou um ex-conselheiro de Furnas a’O Estado de S.Paulo.

É possível que muitas das companhias não adiram às novas regras e abram mão de concessões. Com isso, deve se frustrar a meta do governo de redução nas tarifas – entre 16,2% e 28%. Já há quem preveja que este percentual pode cair a 12%.

Como reação às novas regras, as companhias de energia vêm perdendo valor de mercado. Segundo O Globo, foram R$ 19,064 bilhões em pouco mais de dois meses. Ontem, os papéis voltaram a despencar, em consequência dos baixos valores que o governo se dispõe a pagar a título de indenização pelos ativos das empresas.

Quem mais perde até agora são as companhias cujos principais controladores são os governos tucanos de Minas Gerais e São Paulo. Por que será? Desde o começo de setembro, as ações da Cemig já caíram quase 32% e as da Cesp, mais de 45%. Nem a federal Eletrobrás – que, segundo análise do banco UBS, passará a ter geração de caixa negativa e dependerá da injeção de capital por parte do governo para financiar seus investimentos – sofre tanto.

As chances de as águas que movem as turbinas das usinas voltarem a um curso normal estão todas depositadas no Congresso, onde tramita a medida provisória (n° 579) que definiu as regras para a renovação das concessões. O texto, editado em 14 de setembro pelo Planalto, já recebeu 431 emendas e começará a ser discutido hoje em audiência pública.

Até 4 de dezembro, as companhias terão que decidir se aceitam ou não as regras impostas a fórceps pelo governo petista. Ou seja, terão 30 dias para definir o futuro de seus negócios pelos próximos 30 anos. Se não acatarem, simplesmente devolverão as concessões ao poder concedente. E aí ficará a incógnita: quem vai tocar adiante os investimentos em energia de que o país necessita?

A presidente Dilma Rousseff se apresenta como especialista no setor. O sistema atual foi todo desenhado quando ela era ministra de Minas e Energia, com forte viés estatal e, agora, também com condições desfavoráveis ao investimento privado. O modelo preconiza a modicidade tarifária, mas pode acabar produzindo a mais cara das energias: a que não existe. Ainda há tempo de corrigir o erro, antes que se instaure a escuridão.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Mensalão: muito ainda a investigar

Faltam apenas quatro sessões para que o julgamento do mensalão seja concluído. Mas está cada vez mais claro que muitos e importantes aspectos do maior caso de corrupção da história política do país ainda precisam ser esclarecidos. Incluindo o principal deles: afinal, até que ponto o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva envolveu-se nas falcatruas?

Nos últimos dias, voltaram a pulular histórias em que Lula aparece mergulhado até o último fio do bigode em histórias para lá de cabeludas. Entre elas, a morte do então prefeito de Santo André, Celso Daniel, assassinado em 2002 pouco antes de assumir a coordenação da campanha vitoriosa do PT à presidência da República.

Em sua edição desta semana, a revista Veja traz novas revelações feitas pelo publicitário Marcos Valério em depoimento dado em setembro ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Apareceram novas evidências de que o mensalão foi ainda mais longe do que já se sabe até agora, envolveu grosso dinheiro movimentado no exterior e pode ter até um cadáver no seu histórico.

Depois de, na quinta-feira, O Estado de S.Paulo também ter mostrado que o operador do mensalão implicou de vez Lula e Antonio Palocci na trama, a revista levantou a suspeita de que pessoas ligadas à morte de Daniel cobraram extorsão para não abrir o bico e envolver o ex-presidente no assassinato, bem como a Gilberto Carvalho, hoje secretário-geral da Presidência.

Valério já está condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a 40 anos, um mês e seis dias de prisão pelos crimes de corrupção, peculato e formação de quadrilha. Tem pouco, portanto, a perder e estaria disposto a contar tudo o que sabe, segundo as histórias que voltaram a circular com força desde o último domingo de outubro.

O publicitário “tem revelações importantes a fazer sobre o mensalão, inclusive sobre o verdadeiro papel do então presidente Lula no esquema. Valério diz ter como provar que Lula sabia de tudo”, resume a Veja.

Outro aspecto importante a esclarecer é o trânsito do dinheiro sujo, desviado dos cofres públicos, que abasteceu o gigantesco esquema de corrupção montado pelo PT. A suspeita é de que os cerca de R$ 350 milhões que o mensalão teria movimentado foram transferidos para o exterior e de lá irrigaram não só esta como outras maracutaias petistas, como a compra de dossiês nas eleições de 2006, no escândalo que ficou conhecido como “aloprados”.

O PT sentiu o clima adverso dos últimos dias e recolheu suas armas, que estavam preparadas para ser disparadas tão logo fossem fechadas as urnas do segundo turno das eleições municipais.

O partido dos mensaleiros já abortou a divulgação de um manifesto em defesa dos condenados pelo STF e, além disso, fez apaziguarem os ânimos belicosos de José Dirceu e José Genoino – com a participação direta de Lula, segundo publicado pela imprensa nos últimos dias. Quem deve, teme.

Tudo para não atiçar ainda mais os ministros do Supremo no momento em que eles irão definir o tamanho das penas que serão aplicadas aos 25 réus condenados pelo mensalão, que serão conhecidas até meados deste mês. Ainda por um longo tempo, será posteriormente discutido o texto do acórdão com a sentença, bem como as previsíveis contestações dos condenados. Só então, os mensaleiros passarão a cumprir suas penas.

O país viveu momentos de júbilo com o julgamento que se desenrola no Supremo Tribunal Federal desde o início de agosto. Os ministros protagonizaram verdadeiras lições de cidadania e respeito aos princípios democráticos e republicanos. Mas isso não significa que a apuração já tenha chegado a bom termo.

Enquanto existirem suspeitas – e, principalmente, enquanto tais suspeitas envolverem gente que continua por aí posando de líder magnânimo e de exemplo para o povo – as investigações precisam prosseguir. Até para que o Brasil se livre da ameaça de ver um esquema nefasto como o do mensalão repetir-se.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

O Nordeste à míngua

O Nordeste impôs ao PT uma derrota acachapante nestas eleições. A região mostrou, em primeiro lugar, que não aceita tutela de quem quer que se arvore líder de sua população. Mas exprimiu, igualmente, repúdio a um governo que não vem dando a merecida atenção aos nordestinos.

Tanto Lula quanto Dilma Rousseff foram eleitos com votações acachapantes no Nordeste: tiveram 61% e 70% dos votos, respectivamente, nas eleições de 2006 e 2010. Em campanha, o PT prometeu a redenção da região, por meio de obras há muito aguardadas pela população. Mas, depois de uma década de governo petista, nada, rigorosamente nada, foi concluído.

A lista de promessas é robusta e, se tivesse sido concretizada, poderia ter contribuído para que a região diminuísse expressivamente o hiato que ainda a separa do restante do país – o Nordeste tem quase 28% da população brasileira, mas participa com pouco mais de 13% do PIB. Inclui refinarias, melhoria da malha rodoviária, em especial a BR-101, a conclusão da ferrovia Transnordestina e, principalmente, a transposição das águas do rio São Francisco.

Nesta semana, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou levantamento em que mostra que, de uma lista de 83 projetos prioritários para o Nordeste, somente 25% estão em andamento. Um extenso rol de obras continua na gaveta ou avançam a passos de cágado, como é mais notável no caso das ferrovias e dos portos.

Isso torna as condições logísticas da região muito prejudicadas, impedindo maior expansão da economia local. Enquanto a carteira de obra classificadas como prioritárias na região atinge R$ 25,8 bilhões, os gastos com transportes no Nordeste somam a R$ 30 bilhões. “Os investimentos nos projetos de infraestrutura teriam retorno em pouco mais de quatro anos”, avalia o Valor Econômico.

O exemplo mais gritante da incúria do governo federal em relação ao Nordeste continua a ser a transposição das águas do Velho Chico. A obra foi apresentada no governo de Luiz Inácio Lula da Silva como a salvação do semiárido, assolado por frequentes estiagens e indesejáveis faltas d’água. Prometida para 2010, não deve ficar pronta sequer na gestão Dilma, sobrando para 2020.

Lançada como uma das vedetes do hoje esquecido PAC, em janeiro de 2007, a transposição deveria assegurar oferta de água a cerca de 400 municípios dos estados de Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. Mas oito dos 16 lotes que compõem a obra estão hoje paralisados – muitos a cargo da Construtora Delta, blindada pelo governo petista e sua base aliada na CPI do Cachoeira – e somente um foi concluído: o chamado canal de aproximação do eixo norte, em Cabrobó (PE).

Mas, mesmo já inaugurado, este trecho não leva água alguma para as famílias do semiárido, conforme mostrou o Correio Braziliense há um mês: “Ninguém foi beneficiado pelo canal com pouco mais de dois quilômetros porque, até hoje, uma estação de bombeamento e uma ponte não estão prontas.” A ponte sequer começou a ser construída e a estação só deve ser finalizada no fim de 2014.

A transposição envolve obras numa extensão de 713 quilômetros de canais. Orçada inicialmente em R$ 4,5 bilhões, já praticamente dobrou de valor, mas continua longe da conclusão. Sobram denúncias de sobrepreços, superfaturamento e desvio de recursos públicos. A Controladoria Geral da União também já apontou deficiências graves nos projetos básico e executivo das obras e falhas de fiscalização por parte do Ministério da Integração Nacional.

Enquanto isso, o semiárido nordestino agoniza com a falta d’água e a perspectiva de um verão rigorosíssimo. A estiagem já atinge 80% de Pernambuco e 90% da produção agrícola de Ceará e Piauí está comprometida. O Jornal do Commercio mostra hoje em manchete que 2012 já é o ano mais seco na região desde 1985.

Alterar as condições climáticas é algo que escapa à intervenção humana. Mas ações que poderiam reduzir as agruras que o sol inclemente impõe ao Nordeste poderiam muito bem ser desenvolvidas pelo poder público. A região exige e merece mais atenção do governo federal, e não apenas promessas vãs e compromissos nunca honrados.