quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

No fundo do poço

Não tinha como acabar bem a regulamentação do novo marco regulatório para exploração do petróleo no país. O último golpe foi a aprovação, na calada da noite, dos projetos que instituem o regime de partilha e criam o fundo social. No lusco-fusco da semana passada também foi alterada a forma de distribuição dos royalties do petróleo, suscitando uma verdadeira guerra federativa. Não há luz nas profundezas deste oceano.

Ontem, o presidente Lula disse que irá vetar as mudanças aprovadas pelos congressistas nas regras dos royalties. Comprou uma briga que ele mesmo semeara, ao transformar o pré-sal em bandeira política e em moeda de troca no toma-lá-dá-cá dos interesses partidários. Mexeu num vespeiro, está colhendo tempestades.

Tudo, ao longo deste um ano e três meses desde que as propostas do pré-sal foram enviadas ao Congresso pelo governo do PT, recendeu a improviso e a apropriação política. As discussões, se é que podem ser chamadas assim, desenrolaram-se de forma extemporânea e sem qualquer aprofundamento. Jogou-se no lixo uma das mais bem-sucedidas políticas de desenvolvimento adotadas no país nas últimas décadas.

O país corre o risco de ver comprometido algo que, bem conduzido, poderia representar nossa entrada definitiva no rol das nações mais desenvolvidas do mundo. A descoberta do pré-sal era a cereja do bolo de um modelo que, nos últimos 12 anos, transformou a indústria do petróleo num dos motores do crescimento econômico brasileiro.

O sistema de concessões adotado a partir de 1997 atraiu centenas de bilhões em investimentos para o país, criou centenas de milhares de empregos e transformou a Petrobras numa gigante mundial do setor – até então, nossa estatal sequer figurava entre as dez maiores. O petróleo responde hoje por cerca de 12% das riquezas brasileiras, quatro vezes mais que há 12 anos.

Travestida de um falso discurso nacionalista, a iniciativa do governo do PT substitui o ambiente da livre concorrência pelo controle mafioso dos contratos multimilionários do setor de petróleo. Troca-se a transparência de um regime testado, aprovado e bem-sucedido pela aposta nos riscos de um salto no escuro.

As consequências já não tardam a aparecer. Ativo cabo eleitoral de Dilma Rousseff, o próprio presidente da Petrobras agora reconhece: a capacidade de investimento no setor está atrofiada. Disse José Sérgio Gabrielli ao Valor Econômico: “O que pode vir a existir é uma limitação da capacidade do sistema produtivo de entregar o que precisamos. Não digo gargalos, mas há áreas críticas, estrangulamentos.”

E o que vai acontecer, segundo ele? Será “preciso modular o crescimento, mas ao mesmo tempo não pode ser muito rápido porque, se o for, chegaremos a uma situação em que a indústria nacional não conseguirá atender às necessidades. E, aí, teremos um problema de desindustrialização e de incapacidade para a indústria brasileira competir.”

Mas foram exatamente as incertezas semeadas pelo novo arcabouço legal proposto pelo governo do PT que desorganizaram o setor mais dinâmico da economia brasileira, paralisaram os investimentos privados e eliminaram qualquer traço de competição e concorrência nos negócios de petróleo, transformando todas as multimilionárias transações do setor em ações entre amigos.

Com as novas regras, a Petrobras fica obrigada a entrar em todos os negócios do pré-sal e as demais empresas tornam-se meras prestadoras de serviço contratadas. Isso significa que o Estado brasileiro, que é dono da maior fatia acionária da companhia, assume todos os riscos associados à delicada exploração das reservas situadas em águas ultraprofundas. No antigo modelo, era sócio dos lucros, apropriados por meio das participações especiais, que deixam de existir no regime de partilha, dos royalties e dos bônus de assinatura.

Não surpreendem, portanto, os frustrantes resultados que a Petrobras vem obtendo. O ritmo de expansão da produção de petróleo caiu a uma média anual de 4,2% desde 2002. Para comparar: no governo tucano, o avanço fora de 16% ao ano. O preço deste retrocesso é a sociedade brasileira quem está pagando. Na calada da noite e na escuridão do fundo do mar, vai ficando claro que o governo petista apostou o futuro do país no pano verde da política miúda.

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