Governo e Congresso empacotaram ontem um presente – literalmente – de grego para os brasileiros neste Natal. Ao adiar a votação da reforma da Previdência, quem sabe para as calendas, jogaram o país num torvelinho que, quando o ano novo vier, pode nos fazer ter saudade de 2017.
Depois do suspense em torno da possibilidade de votar logo a emenda constitucional, ontem suas excelências decidiram deixar o assunto para depois que o Carnaval passar. Concessões, cargos e verbas liberados a rodo nas últimas semanas não foram suficientes para convencer nossos políticos da urgência e emergência da situação.
Exceto os poucos que, nos últimos meses, batalharam de cara limpa e firmeza de propósitos pela reforma previdenciária, a maioria dos parlamentares deve ter respirado aliviada: vai poder passar as festas de fim de ano sem ser admoestada. Mas o acerto de contas com a urna os aguarda logo ali, em outubro.
Por seu turno, lobbies e corporações se atiçaram com a mudança de cronogramas. Sua intensa pressão e mobilização podem resultar em “flexibilizar” ainda mais a proposta e retirar da reforma o que ela tem de mais meritório: tratar todos de maneira igual e acabar com privilégios.
A reforma não se justifica somente por razões fiscais, mas sobretudo de justiça. Servidores públicos não têm que ter regime especial, regra própria ou benefício cativo. O que fundamenta continuarem custando para a sociedade brasileira um múltiplo do que custa um trabalhador assalariado comum?
Forçoso admitir que o adiamento obedece à realpolitik. Significa que, hoje, não existem os 308 votos necessários para aprovar as mudanças no iníquo sistema de aposentadorias e pensões brasileiro. Pobre país em que nem 3/5 de seus representantes legislativos conseguem enxergar o óbvio.
As chances de aprovação da reforma são declinantes. Se já estava difícil hoje, mais ainda estará em fevereiro, depois que o Carnaval passar, data em que governo e lideranças do Congresso estimam levar a proposta a voto. Vão ter que rebolar muito para conseguir aprovar...
Diante do cenário, é lícito antever desalento econômico nos meses à frente. Juro ainda menor, por exemplo, é melhor esquecer. Mais empregos? Desencana. Em contrapartida, o Brasil deve ganhar das agências de classificação de risco mais um ou dois rebaixamentos. O dinheiro vai ficar mais caro e a recuperação econômica, mais difícil.
O país brinca com fogo ao achar que a Previdência nacional pode continuar como está. Não pode. O rombo acelerou-se nos últimos anos em função de políticas de desoneração e gastança petistas. Hoje 55% das receitas líquidas do governo já são engolidas por aposentadorias e pensões. O percentual cresce ano a ano e, se nada for feito, logo vai faltar dinheiro para tudo – já está faltando para muita coisa: em dez anos, chegaria a 80%.
Alguns advogam que a reforma é tão séria que só deve ser feita depois de debatida em campanha eleitoral e chancelada nas urnas. Isso é ludibriar o risco e desdenhar da realidade. Todos sabemos o grau de engodo, manipulação e demagogia com que um assunto desses tende a ser tratado em cima de palanques – o Lula de ontem e hoje mais toda a história do PT estão aí para não deixar ninguém mentir.
Governo e Congresso podem continuar achando que é possível empurrar com a barriga, “flexibilizar”, desidratar ao máximo e, no limite, tornar anódina a reforma previdenciária. Só enganam a si mesmos ao agirem assim. Não basta qualquer mudança, mas sim algo que produza resultados robustos, tamanha é a nossa ruína. Grécia e Portugal estão aí para mostrar como acabam presentes desta natureza. Quem vai pagar pela covardia e pela esperteza somos todos nós.
sábado, 16 de dezembro de 2017
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