quarta-feira, 3 de abril de 2019

Conversar não dói

Nesta semana, Brasília parece ter finalmente começado a dar sinais de que resolveu desistir de pôr fogo no circo, acentuando crises. A boa política – nem velha, nem nova – está voltando a dar as cartas na relação entre Executivo e Legislativo.

Um dos primeiros testes desse novo tempo que se anuncia acontecerá nesta tarde, com a participação do ministro da Economia, Paulo Guedes, em audiência pública marcada para as 14h na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.

É ali que a reforma da Previdência dará seu primeiro passo na longa e árdua tramitação que precisará vencer no Parlamento. Guedes tem o difícil desafio de aplainar o caminho até a aprovação da proposta de emenda constitucional. 

Com o vazio da articulação política do governo Bolsonaro, o ministro tem buscado cumprir funções que, numa situação normal, caberiam ao presidente da República. Merece aplausos. Mas seus méritos não eliminam deficiências de quem, ao longo de sua longa vida como profissional do mercado financeiro, jamais foi talhado no traquejo da política. 

Guedes não pode repetir hoje alguns dos maus momentos que protagonizou na semana passada na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Não pode, por exemplo, cair em provocações da oposição, que costuma ser muito mais hostil entre deputados que entre senadores da República. 

Se possível, não deve repetir que tem mais o que fazer longe de Brasília se o Congresso não aprovar a reforma, isto é, tem de assegurar que estará na luta pela agenda de ajustes na alegria e na tristeza. Deve, enfim, ser mais político que técnico, numa casa em que a linguagem dos números nem sempre fala muito alto.

Paulo Guedes tem demonstrado méritos inegáveis, obrigado a remediar as lacunas deixadas pelo seu chefe do Executivo. 

Jair Bolsonaro passou os seus três primeiros meses no poder sem organizar sua base política, sem pacificar as discussões, sem dialogar com as partes e sem, em suma, assumir o figurino de presidente de todos os brasileiros. Pior: dedicou suas maiores energias a exacerbar discórdias tão inócuas quanto dispensáveis.

Tais atitudes acabaram por disseminar ceticismo em relação às chances de recuperação do país já no curto prazo. As diatribes do presidente adicionaram pitadas de dificuldades a uma retomada que naturalmente já seria árdua, dada a herança maldita que os governos do PT legaram ao país. 

Felizmente, a ficha parece ter começado a cair e Bolsonaro resolveu abrir sua agenda para o diálogo, recebendo líderes e presidentes de partidos políticos no Planalto amanhã. A ver como reagirão os sectários das redes sociais para quem dialogar equivale a vender a alma ao diabo e como o presidente da República responderá às possíveis pressões que surgirão de suas bases virtuais.

Seja com o presidente da República, seja com Paulo Guedes ou com quem mais tiver capacidade de articulação e disposição para combate, cabe agora ao governo desdobrar-se para fazer o que todos sabemos ser necessário para que a atual gestão não naufrague e leve junto o país: dialogar para transformar em realidade a necessária agenda de reformas que o Brasil exige. Conversar não dói.

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