quinta-feira, 24 de março de 2011

Trabalhadores pagam o PAC

Pipocam pelo país paralisações de empregados de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Eles reivindicam uma prerrogativa básica: respeito a direitos trabalhistas. Se greves são cada vez mais raras no ambiente econômico atual – em que os trabalhadores brasileiros têm conseguido aumentos salariais até maiores do que a inflação – por que será que a coisa está tão feia nos empreendimentos federais?

A onda começou na semana passada pela usina hidrelétrica de Jirau, em Rondônia. Seus cerca de 22 mil empregados tocaram o terror no canteiro de obras encravado na selva amazônica. Pediam condições mais dignas de trabalho. Muitos abandonaram o trabalho para nunca mais voltar, alguns chegaram a ser encarcerados.

Mas a leva de insatisfação não parou aí. Espraiou-se pela usina de Santo Antônio, também em Rondônia, e agora chega aos complexos portuários de Suape (PE) e Pecém (CE). Estima-se que, ontem, 80 mil operários da construção civil recrutados para obras do PAC estavam parados em todo o país. Em comum, o fato de atuarem nos empreendimentos mais vistosos do programa.

A crise bateu no Palácio do Planalto. Ontem, o secretário-geral da Presidência convocou as centrais sindicais para tentar pôr ordem na casa. Vai chamar também empreiteiras e Ministério Público.

A intenção, diz o Valor Econômico, é “tentar chegar a um acordo e impedir um colapso no principal programa de investimentos do governo”. Teme-se o que poderia ocorrer quando a carteira de obras mais robustas do PAC estiver caminhando a pleno vapor, empregando 1 milhão de pessoas. Hoje o despreparo é evidente.

Jirau, Santo Antônio, Pecém e Suape deixam antever um problema maior: a falta de atenção e de cuidados em relação aos efeitos dos empreendimentos do PAC nos ambientes em que estão inseridos. Não são novos os alertas de que intervenções deste porte trazem problemas sociais, ambientais e estruturais de grande monta. A experiência atual caminha para confirmar os temores.

Em sua edição de hoje, O Estado de S.Paulo relata a penúria que já se abateu sobre as comunidades vizinhas aos canteiros das hidrelétricas do rio Madeira, em Rondônia. Os moradores estão abandonando a prática da pesca, principal atividade econômica da região e agora dizimada pelas obras. “Antes, tirava 40 quilos de peixe por dia. Ontem, não tirei nada”, diz um pescador. Ribeirinhos agora engrossam filas de desempregados em Porto Velho.

A usina de Belo Monte (PA), por exemplo, só obteve licenciamento ambiental sujeito à obediência de 40 condicionantes. Até agora nenhuma delas foi cumprida, mas, mesmo assim, o governo autorizou o início da montagem do canteiro de obras – ocorrido no meio do Carnaval. Belo Monte é maior do que Jirau e Santo Antônio juntas. À luz do que já está ocorrendo em Rondônia, imagine-se o tamanho do estrago que pode acontecer no Pará.

Uma das hipóteses de explicação para a degradação observada nos canteiros de obras do PAC e nos seus entornos vem das condições decorrentes dos contratos firmados. Todas estas hidrelétricas ofertarão energia a preços bem menores que os atuais. Os empreendedores venceram leilões propondo tarifas surpreendentemente baixas. Para honrá-las, estão tendo de massacrar os empregados e o meio ambiente.

Funcionários envolvidos nos protestos de Rondônia relatam condições degradantes de trabalho. A impressão que se tem é de que estamos retornando a um passado que já se considerava remoto. O governo do PT fala em propor às empreiteiras procedimentos trabalhistas similares aos adotados nas lavouras de cana-de-açúcar – tais acordos visaram acabar com práticas análogas à escravidão nos canaviais brasileiros. Os canteiros do PAC estão revivendo esta chaga.

É inadmissível que obras financiadas com recursos públicos apresentem condições – sejam trabalhistas, sejam sociais e ambientais – tão inadequadas. O mínimo que se espera do governo que as contratou é que zele pelos direitos e pela saúde dos trabalhadores, pelo meio ambiente e pela sobrevivência das comunidades atingidas pelas obras. Nada disso, porém, está sendo respeitado. O PAC de Dilma e Lula está nos levando de volta à senzala.

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