quinta-feira, 24 de novembro de 2011

PAC do pó de arroz

O governo teve que usar muito pó de arroz para maquiar o balanço do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) divulgado ontem. Nem com todo o esforço, porém, deu para disfarçar o ritmo cadente de execução das obras neste ano, os atrasos expressivos em empreendimentos importantes e o impacto que a corrupção teve no andamento dos trabalhos.

Segundo o balanço divulgado pelo governo, 11,3% das obras e ações previstas para a segunda fase do PAC foram concluídas. À primeira vista, parece até razoável. Mas, quando se conhecem os detalhes de como o resultado oficial foi obtido, fica claro que o desempenho real está muito aquém do desejável: apenas 3% das obras foram finalizadas até 30 de setembro.

O governo diz ter executado R$ 80,2 bilhões do chamado PAC 2. Mas, disso, R$ 55,2 bilhões referem-se a financiamentos habitacionais para pessoas físicas. Ou seja, praticamente 70% do total que a gestão petista diz ter “investido” nada mais é do que empréstimos dados a mutuários que, ao longo de anos, terão de pagar o que agora receberam. Pior: parte do valor destina-se à compra de imóveis usados, com impacto nulo na expansão da economia.

Continuemos. Outros R$ 41,4 bilhões foram aplicados pelas estatais, principalmente Petrobras, e R$ 25,6 bilhões pelo setor privado. O governo propriamente dito só comparece com uma parcela ínfima dos valores informados: do Orçamento Geral da União saíram, segundo o Ministério do Planejamento, R$ 13,2 bilhões, ou 16% do total.

Quando se desce a detalhes, a cara do PAC fica ainda mais feia. Só 1% das obras de transporte foram concluídas, ressalta O Globo. Isso equivale a R$ 1,6 bilhão aplicados em rodovias, portos e aeroportos neste ano. Para um país que, segundo o Ipea, precisa de R$ 183 bilhões apenas para recuperar suas estradas existentes e construir novos trechos, estamos bem...

Uma das razões para que o andamento das obras de transportes fosse ainda pior do que a média geral atende pelo nome de corrupção. O próprio ministro dos Transportes admitiu ontem que as mudanças que teve que fazer na pasta em razão dos escândalos que resultaram na saída de Alfredo Nascimento afetaram o desempenho.

O volume investido no setor caiu 20% em comparação com 2010. Das 42 licitações do Dnit que estavam em andamento na época da troca de comando na pasta dos Transportes, 14 foram revogadas e 27 suspensas. Ou seja, estava tudo carcomido pelos cupins da corrupção da gestão petista.

De maneira geral, o governo classifica 14% dos projetos do PAC como tendo andamento “fora do adequado” e outros 4% como “preocupantes”. Mas a classificação está longe de ser precisa: de acordo com a conveniência, os cronogramas vão sendo acochambrados para diluir atrasos. Mesmo sem cumprir prazos, alguns empreendimentos receberam a indicação de andamento “adequado” – que caiu de 76% para 72% desde o balanço anterior, realizado em julho, segundo o Valor Econômico.

Tome-se, como exemplo eloquente das maquiagens, o que está acontecendo na refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco: anunciada em 2005, pelo cronograma inicial ela ficaria pronta no ano passado, a um custo de US$ 2 bilhões. Com obras iniciadas em 2007, será concluída, se for, apenas em 2016, a um custo superior a US$ 14 bilhões.

“O novo balanço do PAC 2 traz duas datas para a refinaria, uma de operação, em 30 de junho de 2013, e outra de conclusão, de 30 de junho de 2016. Nos relatórios anteriores, havia apenas uma única data, de conclusão, que já teve os anos de 2010, 2011, 2012 e 2013”, registra o Jornal do Commercio, de Recife.

Os números edulcorados do PAC não conseguem disfarçar a situação desfavorável que emerge da realidade das obras. Em Minas Gerais, por exemplo, apenas um grande empreendimento foi concluído: a duplicação de um trecho de 83 km da BR-262. Mesmo assim, as obras começaram na primeira fase do PAC e já deveriam ter terminado há tempo, registra o Estado de Minas.

Nem o próprio governo concorda com a suposta importância do PAC para a vitalidade da economia brasileira. Ontem, enquanto a ministra do Planejamento tecia loas ao programa, o secretário-executivo da Fazenda, Nelson Barbosa, afirmava, segundo a Folha de S.Paulo: “A manutenção do investimento do PAC no mesmo nível do ano passado significa que o PAC neste ano não contribuiu para acelerar o crescimento”.

Já é certo que, também em termos de proporção do PIB, o  desempenho será declinante neste ano, caindo de 3,1% para 2,7%. É de se perguntar: para que tem servido, então, o PAC, senão como peça de marketing? O governo poderia ao menos nos poupar da pantomima que protagoniza a cada seis meses a título de “balanço” do programa.

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