Do pouco que já se
conhece do esquema montado a partir dos negócios de Carlinhos Cachoeira, depreende-se
que os rigores da lei que rege a contratação de obras públicas no país já não
são capazes de constranger os contraventores. O turbilhão de falcatruas parece
infindável e é preciso achar novas maneiras de tentar detê-las.
A lei que rege a
contratação de obras públicas no Brasil data de 1993. Lá se vão quase vinte
anos e urgem mudanças. Por um lado, a legislação estipula ritos e processos muitas
vezes excessivos, que acabam abrindo espaço para ações meramente protelatórias,
movidas por interesses derrotados. Quem sai prejudicada é a sociedade, que
demora a ter as melhorias.
Entretanto, verifica-se,
também, que a lei n° 8.666 não tem se mostrado capaz de coibir a miríade de
conchavos, malandragens e acertos entre empresas que, em tese, deveriam
competir entre si pelos contratos, oferecendo menores preços pelos serviços prestados ao Estado. Isto é, a legislação não tem sido hábil em resguardar os
cofres públicos.
O submundo conseguiu
transformar as licitações num crime que compensa. As dificuldades que a 8.666 impõe
acabaram se transformando numa forma de autoridades e funcionários públicos
venderem facilidades. Desde o mensalão, já se sabe que há muita gente disposta
a pagar caro por elas.
O que fazer diante
disso? Há duas alternativas: partir para uma digna reforma da lei, aperfeiçoando-a
à luz de suas quase duas décadas de aplicação, ou sair pela tangente buscando
chicanas que afrouxem os controles, ao invés de redefini-los em favor da
preservação do patrimônio público.
O governo petista
optou pela segunda vertente, como era de se esperar. Nos últimos dias, lançou-se
numa cruzada para emplacar o modelo do “liberou geral” previsto nas regras – ou
seria na falta delas? – do Regime Diferenciado de Contratações (RDC) em todas
as obras do PAC. É o caminho mais curto para reforçar os dutos da corrupção.
O RDC é aquele
sistema arquitetado pelo governo Dilma Rousseff para fugir do risco do fiasco
completo nos empreendimentos voltados à Copa de 2014 e à Olimpíada de 2016. Entre
outros aspectos, permite a contratação das obras sem projetos básico e executivo,
ou seja, sem que se conheçam seus detalhes, cuja definição cabe às empresas
vencedoras. Trata-se, em suma, de modalidade em que ninguém sabe ao certo o que
está sendo contratado – nem por quanto – com o dinheiro público.
O novo sistema mal
foi testado até agora. Foi empregado apenas pela Infraero em seis licitações –
do que se sabe, o melhor resultado teria sido encurtar o tempo do processo, como
informou O
Globo. Mas o governo do PT já almeja estender as facilidades a toda a
carteira do PAC e suas centenas de bilhões de reais em investimentos previstos.
É possível ver pelos
menos duas razões para o desejo petista. Uma é fugir do incômodo que a legislação
que rege os contratos de obras públicas no país oferece à maneira sempre improvisada com
que age o governo. Trata-se da reconhecida incapacidade do PT de atuar de
maneira eficiente dentro dos marcos legais. Nesta ótica, a melhor saída é
sempre rompê-los, e não reformá-los.
Outro motivo, bem
pior, é azeitar de vez os drenos de dinheiro público. Com o pouco revelado até
agora das conexões entre Carlinhos Cachoeira, Agnelo Queiroz, Construtora Delta
e afins já se vislumbra quanto pode ter sido desviado do dinheiro do
contribuinte para as teias da corrupção e quanto mais pode ter sido originado
dos polpudos contratos do PAC. Como ficaria isso com o RDC disseminado nos
contratos públicos?
Se a proposta do
governo prosperar, o boi que passou até agora tornar-se-á logo em boiada. É do
interesse do país que a contratação de obras públicas envolva total lisura. É certo
que os marcos legais que regem as licitações clamam por ser modernizados, mas escancarar
a porteira só servirá para liberar o rebanho para uma verdadeira farra com o dinheiro público.
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