quinta-feira, 3 de agosto de 2017

‘In dubio pro reo’

A decisão a ser tomada hoje pela Câmara dos Deputados define muito dos rumos que o país pode tomar. É sempre tentador punir um presidente da República impopular e poder começar uma nova história. Mas o momento atual do Brasil não comporta a opção de abrir mais um livro em branco de final imprevisível.

É possível que o pedido de investigação feito pela Procuradoria-Geral da República (PGR) não tenha os votos mínimos dos deputados para prosseguir. Há razões para tanto. A primeira delas é a ausência de uma comprovação definitiva, cabal, irrefutável de que Michel Temer cometeu o crime de corrupção passiva de que é acusado.

A segunda é a constatação de que provavelmente o país, exaurido pela instabilidade semeada pelo PT, não suporte mais uma guinada em tão curto espaço de tempo. Não há, dentro dos preceitos constitucionais, alternativa reconhecidamente melhor do que a continuidade da atual administração.

A terceira é que, por mais que as pesquisas de opinião mostrem repúdio popular ao governo, não existe no mundo real um anseio efetivo e inarredável pela saída de Temer. Há, sim, um rechaço geral à política, uma espécie de “fora todos” que a aprovação do pedido pela PGR apenas cuidaria de alimentar, sem saciar. Quem seria a próximo?

Não será cortando cabeças a esmo que a política irá se reconciliar com a sociedade. As punições devem existir, mas devem atingir sobretudo quem gerou o mal que hoje acomete o país. A possível manutenção de Temer no cargo deveria ser acompanhada de compromissos éticos mais firmes do que os assumidos pelo atual governo até aqui.

Por outro lado, manter a caçada a Temer atenta contra os interesses do país. Há quase três meses não se fala de outra coisa que não seja o suposto escândalo político, minando o ímpeto de uma agenda que, sejamos francos, vinha sendo executada a contento – ainda mais levando-se em conta as difíceis condições do país.

Nesse sentido, a oposição ao governo, numericamente minúscula, foi quem melhor se saiu. Conseguiu sabotar a incipiente recuperação da economia, levar o governo às cordas e paralisar as reformas. Pior, ainda pode levar o prêmio máximo: ver sua tese do “golpe” de 2016 ser chancelada até por aqueles que supostamente o patrocinaram.

Objetivamente, a denúncia apresentada pela PGR é inepta para justificar o afastamento do atual presidente da República. Porque não consegue provar, nem de longe, que ele tenha de fato cometido o crime que lhe é imputado. Se os procuradores conseguirem comprovar isso nas outras denúncias que dizem que farão, são outros quinhentos.

Mas o caso presente tem que ser analisado juridicamente, sob pena de qualquer pretexto poder ser usado doravante para tirar um mandatário indesejável do cargo. Não é isso o que uma nação madura e equilibrada deveria almejar. In dubio pro reo, como manda o melhor direito, sem invencionices como a que se tentou promover na CCJ da Câmara.

Este não é o governo dos sonhos de ninguém. Mas é o governo possível, é o governo que a Constituição nos reservou. Afastada a denúncia, o ideal será recompor suas bases, ousando nos seus objetivos. Michel Temer deveria assumir compromisso muito mais firme com as reformas e com o ajuste das contas públicas, limpar áreas suspeitas de corrupção e malversações e usar os 17 meses que lhe restam para fazer o que ninguém mais, em tão exíguo espaço de tempo, pode ser capaz de fazer.

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