terça-feira, 29 de agosto de 2017

O puxadinho da Previdência

A crise política deflagrada a partir de maio atropelou o principal item da agenda de reformas em marcha no Brasil: a mudança no sistema de aposentadorias e pensões. Pelas previsões iniciais, a esta altura a Previdência já deveria ter tido suas regras alteradas, mas isso está se tornando cada vez menos provável.

A proposta, que depende de emenda constitucional, foi aprovada em comissão especial da Câmara ainda no mês de maio. O prognóstico era de que passaria pelo plenário e seguiria para tramitação no Senado ainda no primeiro semestre. Nada disso aconteceu até hoje, nem se sabe mais quando acontecerá.

Quanto mais se aproximam as eleições gerais do próximo ano, menos os parlamentares se mostram dispostos a votar medidas sabidamente impopulares como a reforma previdenciária. Infelizmente, nessas horas exacerba-se a ética de conveniência, em detrimento da ética da responsabilidade.

A reforma é imperativa. Quem quer que a ponha em dúvida age de má-fé ou dedica-se apenas a fazer proselitismo eleitoral – e não são poucos os que assim atuam. Mudar o sistema é fundamental por razões fiscais e demográficas, mas é também mandatório sobretudo para combater privilégios e tornar o sistema mais justo – hoje ele claramente beneficia muito mais as pessoas mais ricas.

O maior problema em torno da reforma tornou-se o escopo das mudanças. A proposta aprovada na comissão especial da Câmara era profunda o suficiente para desenhar um horizonte consistente de recuperação das contas da Previdência, com efeitos diretos sobre a solvência do Estado. Era também política e socialmente aceitável.

Ocorre que o enfraquecimento político do governo federal também debilitou as condições de conduzir uma mudança mais profunda. Desde então, passou-se a trabalhar com a hipótese de uma reforma tímida, restrita apenas à imposição de idade mínima para obtenção dos benefícios. Agora começa-se a cogitar também alterar o prazo mínimo de contribuição, segundo relatou a Folha de S.Paulo no fim de semana.

É insofismável que o país tem um encontro de contas a fazer com seu sistema de aposentadorias e pensões. Quanto mais ele demorar a acontecer, piores serão as condições a remediar, mais custosas e mais radicais terão de ser as mudanças. Uma reforma tímida apenas obrigará uma nova rodada de modificações num prazo bem curto, provavelmente já no início do próximo governo.

A questão que se coloca é: vale a pena torrar capital político para aprovar uma reforma tão limitada? Ou o melhor é aguardar o governo que emergirá das urnas para implementar as mudanças realmente adequadas e consistentes que o sistema demanda?

Corre-se o risco de aprovar um puxadinho que só sirva para que os adversários da mudança o transformem em bandeira eleitoral para seu proselitismo demagógico e, dessa maneira, aumentem suas chances de vencer as eleições de 2018 e, ao fim e ao cabo, decretem a implosão da reforma da Previdência e a morte do Brasil.

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