quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Barato que sai caro

Sem nenhum alarde, o governo do PT dá prosseguimento hoje a suas privatizações. De forma quase envergonhada, levará a leilão mais um trecho da BR-101. Mas o que deveria mesmo constranger a gestão petista é a necessidade de evitar que fiascos de concessões feitas nos últimos anos voltem a se repetir agora.

No leilão desta manhã, será concedida a exploração de um trecho de 476 quilômetros da rodovia entre o Espírito Santo e a Bahia. No modelo do PT, o investidor privado nem precisa pagar para explorar o patrimônio público. Vence a disputa quem se dispuser a cobrar a menor tarifa de pedágio – com teto de R$ 0,06237 por quilômetro.

O edital exige investimento de R$ 2,1 bilhões ao longo dos 25 anos de contrato. Uma das obrigações é duplicar este trecho da estrada, uma das mais movimentadas do país. Por ela trafegam diariamente centenas de caminhões que servem, principalmente, as indústrias de papel e celulose da região. Muitos acidentes com morte acontecem ali, todos os dias.

Mas quem vencer o leilão não precisará se preocupar muito com as obrigações contratuais, nem tampouco em mudar rapidamente o estado deplorável da BR-101. Os prazos dados pelo governo do PT para o concessionário da rodovia são de pai para filho – ou, para ser mais preciso, na atual conjuntura, de mãe para filho.

O vencedor do leilão terá até 2022, ou seja, dez anos, para duplicar 207 km, isto é, menos da metade do trecho. Toda a extensão da rodovia entre o Espírito Santo e a Bahia só precisará estar em pista dupla no longínquo ano de 2035, como mostrou a Folha de S.Paulo em outubro.

A postergação de melhorias concretas nas condições da BR-101, e da obtenção de benefícios efetivos para quem trafega por ela, foi a fórmula encontrada pelo governo do PT para tentar manter baixas as tarifas de pedágio – embora, desta vez, elas correspondam ao dobro das hoje vigentes nas concessões feitas à época da gestão Lula.

Repete-se, portanto, um equívoco. O modelo petista propugna tarifas baratinhas, mas não entrega as contrapartidas necessárias. As rodovias que foram privatizadas pelo PT sob este arcabouço não têm apresentado as melhorias que resultariam em maior segurança e mais qualidade nos deslocamentos rodoviários.

No ano passado, O Estado de S.Paulo mostrou que o barato do modelo petista saiu muito caro para a sociedade. Passados quatro anos desde a privatização de um lote de 2,6 mil km de rodovias federais, quase  metade dos investimentos previstos na melhoria delas não havia sido realizada.

“As grandes obras previstas nos contratos de concessão das sete rodovias federais, leiloadas em outubro de 2007 pelo governo Lula, continuam no papel. (...) Projetos que deveriam ser entregues no ano que vem [2012], por exemplo, foram prorrogados para 2015. Outros ainda nem têm previsão de início ou término das obras”, informou o jornal na ocasião.

Logo depois, O Globo também foi verificar o que havia acontecido com as rodovias de pedágios a preço de banana concedidas pelo PT. O jornal tentou ouvir o governo, que se recusou a fornecer dados atualizados. Mas conseguiu confirmar com a própria concessionária que explora cinco dos sete lotes leiloados em 20007 que menos de um terço das obras prioritárias previstas para os primeiros anos de concessão haviam sido feitas até o fim de 2010.

Sobre a morosidade das obras prometidas, mas nunca entregues, disse um procurador do Ministério Público Federal à Folha, em outubro: “Todos os anos eu entro com ação, porque mando fazer perícia e verifico que não foram feitas obras previstas para aquele período”.

Os atrasos, porém, não rendem penalidades para as concessionárias. A única forma de impor-lhes sanções seria reduzir os reajustes tarifários. Mas não foi isso o que aconteceu nos últimos anos: desde 2007 até o ano passado, os pedágios haviam subido de 22% a 39%, para uma inflação acumulada no mesmo período de 19% a 22%.

Atualmente há 4.763 km de rodovias federais concedidas à iniciativa privada. A maior parte o foi sob a gestão do PT. No Plano Plurianual 2012-2015 enviado pelo governo Dilma Rousseff ao Congresso no ano passado, há a previsão de conceder mais 2.234 quilômetros à iniciativa privada – além do trecho leiloado hoje, a BR-116 e a BR-040. Oxalá isso aconteça.

Mas, mais importante do que enterrar um dogma petista que tanto atrapalhou e atrasou o desenvolvimento do país, a retomada das privatizações rodoviárias deve assegurar benefícios efetivos para os usuários. O que não adianta é bradar que saiu tudo baratinho para os motoristas, sem que as melhorias apareçam. Pechinchas assim são péssimo negócio.

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