sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Muito a explicar

O Ministério da Integração Nacional está devendo, e não é de agora. Não é apenas nas atuais tragédias de verão que a pasta tem mostrado pouca eficiência e repetido vícios nefastos da política. Também tem falhado em ações estruturantes, que deveriam servir para apoiar estados e municípios em suas fragilidades e aplacar desigualdades regionais.

O exemplo mais gritante são as obras da transposição do rio São Francisco. De responsabilidade da Integração, foram apresentadas na campanha eleitoral de 2010 como espécie de cartão de visitas da “gestora” Dilma Rousseff. Hoje, muito antes de levar uma gota d’água ao sertão nordestino, estão em escombros.

Neste início de ano, a pasta de Fernando Bezerra admitiu, depois de negar seguidas vezes no passado, que a bilionária obra vai sair bem mais caro que o previsto. O custo deve saltar de R$ 5 bilhões para, pelo menos, R$ 6,9 bilhões. Ou seja, módicos 40% mais. O cronograma também será esticado: uma parte pode ficar pronta no fim do governo Dilma, outra só depois. A previsão inicial era começar a funcionar em 2010.

A Integração Nacional tem um padrão insatisfatório de desempenho. E não é de hoje. Quando trata de desastres e tragédias originadas em causas climáticas, sua tônica tem sido remediar a prevenir. Foi assim desde o início do governo Lula, quando a pasta era um feudo do PMDB.

Nos últimos oito anos, as dotações autorizadas pelo Congresso para “prevenção e preparação para desastres” somaram R$ 2,8 bilhões, mas apenas R$ 695 milhões foram investidos. Em contrapartida, desde 2003 o país gastou sete vezes mais em “resposta a desastres e reconstrução”, ou seja, R$ 5,9 bilhões, nas contas de Gil Castello Branco, da ONG Contas Abertas.

A estrutura pública de prevenção a desastres climáticos ainda é inacreditavelmente acanhada para um país de dimensões continentais e que vive às voltas com intempéries, como o Brasil. O centro de alertas contra temporais só entrou em operação no fim de 2011 e cobre apenas 20% dos municípios considerados de maior risco – todos no Sul e Sudeste do país.

A Defesa Civil é outra das fragilidades da Integração, que é responsável por ela – ou deveria ser. Além de estar desaparelhada, o ministério não tem autoridade administrativa sobre suas congêneres estaduais e municipais. Consequentemente, não há uma estratégia para enfrentar as crises provocadas pelas inundações; a reação se dá sempre em cima de fatos e tragédias consumadas.

“Não há governança, e sem governança não há uma política de defesa civil, e sem a política não há gestão. Consequentemente não há a verba necessária para atender de forma adequada e proporcional as necessidades das populações das cidades atingidas. (...) O problema das enchentes exige gestão”, comentou o Valor Econômico em editorial na edição de ontem.

Os vícios na Integração são de longa data, mas há também os equívocos próprios de Fernando Bezerra. Como o privilégio a parentes: seja na liberação de verbas a rodo para o filho deputado e candidato a prefeito, mostrada pela Folha de S.Paulo, seja na prática de nepotismo, com acolhimento de familiares em cargos de confiança.

Há, também, o flagrante desequilíbrio na aplicação de verbas públicas relacionadas a calamidades. Tanto em 2011, quanto neste ano, Pernambuco, o estado-natal do ministro, receberá a maior parte dos recursos, a despeito de não ter nenhuma cidade classificada entre as 56 de maior risco de desastres naturais no país.

Há, ainda, o privilégio a empresas amigas na contratação de obras e na liberação de dinheiro. Assim como a baixa execução orçamentária, que fez da Integração Nacional uma das pastas de pior desempenho em 2011: aplicou 41% dos R$ 19 bilhões previstos, como mostrou o Estado de Minas na semana passada.

Das verbas para “prevenção e preparação para desastres”, menos de um terço foi aplicado no ano passado. Foram os mais baixos investimentos nesta finalidade desde 2007. Ao mesmo tempo, o gasto com respostas a desastres ocorridos foi dez vezes maior, mostra Ribamar Oliveira hoje no Valor.

Fernando Bezerra terá hoje uma tropa de choque governista a blindá-lo em depoimento que dará ao Congresso: apenas quatro dos 25 integrantes da comissão representativa são da oposição. Mas o ministro tem muito a explicar. Não pode deixar de ser creditado ao governo ao qual ele serve o saldo trágico que, só neste verão, já chega a 37 mil brasileiros desabrigados, 33 mortos, centenas de municípios sob estado de emergência e um desamparo sem fim.

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