Na sexta-feira, o governo anunciou que vai pôr a Polícia
Federal para vigiar as inscrições no Mais Médicos, o programa lançado pela
presidente Dilma Rousseff para aumentar – mas só daqui a oito anos! – a presença
de médicos no SUS. O motivo seriam movimentações suspeitas engendradas nas
redes sociais.
O Ministério da Saúde afirma que quer evitar uma espécie de
boicote ao programa: médicos se inscreveriam em massa para impedir a entrada de
estrangeiros e, depois, desistiriam das vagas, frustrando os planos oficiais. Parece
até aqueles planos conspiratórios bolados em filmes de quinta categoria sobre a
CIA e a KGB. E é.
Em primeiro lugar, a ameaça de sabotagem é fantasiosa. Está
na mesma categoria da “central de boatos” que gente mal informada e mal
intencionada do governo Dilma achou para justificar os tumultos causados por um
erro da Caixa Econômica Federal no pagamento do Bolsa Família em maio – e sobre
os quais a PF não chegou a conclusão alguma após dois meses de investigações...
Mas, mais grave que isso, nada fantasiosa é a intenção
manifestada oficialmente pelo governo, por meio de ofício do Ministério da
Saúde, de usar o poder coercitivo dos policiais federais para amedrontar
médicos. É mais uma iniciativa do Estado policialesco que o PT tanto acalenta e
assaca contra os que não lhe dizem amém.
Pensando hipoteticamente, significa que um profissional de
saúde que for selecionado dentro do programa, mas decidir abrir mão das vagas
que lhe forem apresentadas por não concordar com as condições do local de
trabalho, pode ter sua vida vasculhada pela PF. É de se perguntar: também será
colocado na lista de traidores da nação?
Batizado Mais Médicos, o programa petista foi sacado da
algibeira dos governantes em Brasília como forma de dar alguma resposta aos
protestos que clamaram pela prestação de melhores serviços pelo poder público. É
uma mandracaria, um ilusionismo. Mistura remédios, mas não cura o paciente.
Também por isso, gerou intensa reação de profissionais de saúde.
Os pontos mais condenáveis são a extensão do curso de
Medicina por mais dois anos – ao longo dos quais os estudantes terão que,
obrigatoriamente, prestar serviços no SUS – e a permissão para que médicos estrangeiros
atuem no Brasil sem a necessidade de comprovarem sua aptidão, medida pelo exame
chamado de Revalida.
Trata-se, no primeiro caso, de uma arbitrariedade. Significa
aumentar em um terço a duração do curso de Medicina, com impactos diretos nos
custos de formação do aluno. Sem falar na afronta ao livre arbítrio dos
estudantes.
“Melhorar as condições de trabalho é a solução óbvia. Mas
isso exige que o governo assuma a culpa e deixe de empurrar o problema com a
barriga. Mais fácil é culpar os jovens médicos, pouco patrióticos, que só
pensam em dinheiro e se recusam a trabalhar em um sistema público de saúde bem
organizado, eficiente, sem filas e tão bem avaliado pela população”, escreveu o
médico Fernando Reinach em artigo publicado sábado n’O Estado de S.Paulo.
Quanto a receber médicos do exterior sem testar suas
qualidades, trata-se de uma temeridade sem tamanho. Basta lembrar que, nos
dois últimos anos, os exames de revalidação de diplomas estrangeiros exibiram índices
de reprovação de 90% e 91%. Em instituições como a UFMG, 56% dos candidatos vêm
da Bolívia, 9% de Cuba e 8% do Paraguai. Serão as faculdades de lá melhores que
as nossas?
As más qualidades do programa são agravadas pela falta de
discussão prévia com a sociedade e pelo uso nefasto e autoritário do instrumento
da medida provisória para sua tramitação no Congresso. Ontem venceu o prazo
para apresentação de emendas ao texto que cria o programa, cujo número superou
500, segundo o Brasil Econômico.
O que o Mais Médicos menos visa é enfrentar os graves problemas
da saúde pública brasileira. Seus reais objetivos são criar subterfúgios para
que a presidente Dilma tente fugir da cobrança das ruas e apresente-se como dirigente
laboriosa. Para tanto, o governo petista já mostrou que é capaz até de transformar
nossos médicos em monstros.
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