O governo jura que
jamais vinculou futebol à política. Mas desmente-se todos os dias. A investida
da hora é tentar descolar-se do fracasso da seleção brasileira defendendo a
“renovação” do nosso futebol. Até instrumento para isso eles já têm: botar o
Estado para intervir no esporte, a mesma receita que fracassa na economia.
Até a fatídica
terça-feira em que a Alemanha atropelou o Brasil no Mineirão, a ordem era
surfar na onda de otimismo, na esperança de que ela desaguasse na entrega da
taça de campeão ao zagueiro Thiago Silva no domingo. Mas a maré baixou antes da
hora e, com o naufrágio, busca-se agora, desesperadamente, o que afaste a
presidente do espectro do fracasso em campo.
Anteontem, Dilma Rousseff
deu, em entrevista à CNN Internacional, sua receita para superar o infortúnio:
usar o poder de governo para impedir que jogadores deixem o país, como forma de
criar atrativos para encher estádios brasileiros. Em paralelo, seu ministro de
Esportes acrescentou que o Estado tem que participar das decisões
futebolísticas. Não será surpresa se vier por aí uma Futebolbrás.
O governo pega
carona no legítimo movimento protagonizado por alguns jogadores, o Bom Senso
F.C. Na sua agenda renovadora do futebol nacional, a presidente promete
recebê-los no Palácio do Planalto na próxima semana. E depois diz que não
mistura política com a paixão nacional...
Na falta de uma
lista robusta de benefícios duradouros para a população decorrentes da
realização da Copa no Brasil, constatação que o discurso oficial luta para
encobrir, o governo agora quer transformar uma possível reestruturação do nosso
futebol – algo desejável – num feito seu. Pelo jeito, enfim encontraram um
legado para exibir.
No entanto, o vezo
estatizante que move corações e mentes do petismo – e que cobra seu alto preço
no desempenho medíocre da nossa economia – se faz novamente presente. O
cardápio vai desde a submissão de clubes e cartolagem ao Estado até a proibição
da venda de jogadores para o exterior, ferindo, inclusive, a liberdade dos profissionais.
Do que se divulgou
ontem, parece correto apenas querer cobrar contrapartidas de clubes e entidades
de futebol a benesses concedidas pelo governo, como a renegociação de dívidas
tributárias. Mas há aberrações como, por exemplo, ameaçar rebaixar time que
atrasa salários.
Futebol se joga e se
ganha, ou se perde, dentro de campo. A relação profissional entre jogadores e
contratantes deve obedecer às mesmas regras e leis que regem qualquer categoria
no mercado de trabalho.
Dilma e seu ministro
de Esportes não querem que o Brasil “exporte matéria-prima e consuma produto
acabado”. Acham que, intervindo no mercado da bola e podando a liberdade de
ascensão dos nossos jogadores, conseguirão encher estádios Brasil afora.
A presidente poderia
ter a mesma preocupação em relação ao resto da nossa pauta de comércio exterior,
cada vez mais concentrada em produtos de baixo valor agregado. E poderia achar
outra e mais eficiente maneira de salvar da ociosidade os elefantes brancos
travestidos de “arenas” construídos para a Copa.
Futebol exige
treino, diz Dilma. Corretamente. Mas também exige perseverança, competência,
dedicação, trabalho árduo. O que a presidente diz sobre a seleção de Felipão
cabe muito bem para sua equipe de governo. Afinal, são todos atributos bastante
em falta na gestão do país...
Um ano atrás, depois
que a seleção conquistou a Copa das Confederações, a presidente tentou
tornar-se sócia do triunfo e disse que seu governo era “padrão Felipão”. Será
que ela continua achando isso ou, dentro da sua estratégia de surfar na onda da
hora, vai tentar forjar um novo bordão?
Aproveitar um
momento de infortúnio para começar a construir um caminho que, no longo prazo,
conduza ao reencontro com a trajetória de sucesso é algo bem-vindo, necessário,
salutar. É o que fez a Alemanha depois de 2006, quando fracassou na Copa
promovida em casa.
Iniciar esta
trajetória mirando as eleições, apropriando-se oportunisticamente de movimentos
e sentimentos legítimos de profissionais e torcedores e, sobretudo, enfiando o
Estado onde não deve parece ser a pior maneira de tentar renovar o futebol
brasileiro.
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