quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Comigo não, apagão!

O governo federal transformou o que poderia ser uma ação positiva para o futuro do país em disputa política. Ligou, mais uma vez, sua máquina oficial de propaganda para imputar culpas e encobrir sua incapacidade de construir consensos em torno de estratégias positivas para o Brasil. As novas regras do setor elétrico são um salto na escuridão.

Num processo em que decisões de longo prazo tiveram que ser tomadas com base em premissas que ainda sequer foram transformados em lei, terminou ontem o prazo para que as companhias de energia optassem pela renovação das concessões. No escuro, elas assinaram contratos que vigorarão por até 30 anos.

Na geração, a adesão foi apenas parcial – equivaleu a 60% do total – e só a interferência direta e truculenta do governo na Eletrobrás impediu uma recusa maciça às novas regras. Na transmissão, segmento em que o modelo proposto mostrou-se menos desequilibrado, a concordância foi integral.

Com isso, frustrou-se a expectativa, anunciada em cadeia nacional de rádio e TV pela presidente Dilma Rousseff em 6 de setembro, de que as tarifas de energia ficariam 20,2% mais baratas. Agora, segundo promete o governo, a queda média será de 16,7% a partir de março do ano que vem – para residências pode ficar perto de apenas 10%, segundo a Folha de S.Paulo. A que preço se chegará a estes cortes é que são elas.

Em menos de 90 dias, Dilma conseguiu transformar um setor da economia razoavelmente vigoroso numa aposta de alto risco e numa incógnita para o desenvolvimento sustentado do país. Investir em energia passou de bom negócio a iniciativa temerária. Quem irá se aventurar num ambiente em que o governante de turno faz o que bem entende e a qualquer hora?

Desde setembro, as 32 empresas de energia negociadas na BM&FBovespa perderam R$ 31,2 bilhões em valor de mercado, numa queda de 15,6%, segundo O Globo. O governo petista desdenha as perdas, que penalizariam “especuladores”, mas ignora que investir em ações de energia sempre foi uma alternativa de renda para a aposentadoria de pequenos poupadores.

As mudanças desestruturam o setor por completo. As empresas perderam rentabilidade e terão dificuldades para operar, manter e expandir suas instalações. O aumento da geração de energia, crucial para que o país não sufoque ainda mais, torna-se mais um fator de incerteza no ambiente econômico já bastante instável em que a gestão petista nos atolou.

O governo Dilma conduziu com improviso o processo de renovação das concessões de energia, há anos aguardado pelos agentes do setor. Juntou uma medida de longo prazo a necessidades imediatas e conjunturais, a mais premente delas segurar a inflação com artifícios e malabarismos, e produziu um tremendo curto-circuito.

“A administração federal tomou o caminho errado. Preferiu a improvisação ao planejamento, sem negociação com os agentes envolvidos. (...) Mais uma vez a presidente Dilma Rousseff confundiu o papel do Estado como articulador e indutor do crescimento com o exercício autoritário do poder”, opina O Estado de S.Paulo em editorial.

As empresas mais sólidas do setor decidiram não embarcar integralmente. Cesp, Cemig, Copel e Celesc aderiram parcialmente à renovação baseada nas novas regras. Não se recusaram, porém, a colaborar com a redução das tarifas: tanto, que, em todas elas, parte significativa dos contratos foi renovada.

Empresas que aderiram totalmente admitiram que o fizeram constrangidas. Na Eletrobrás, os minoritários ameaçam processar os administradores da companhia por irresponsabilidade. A CEEE, do Rio Grande do Sul, disse que a decisão foi “sofrida” e que, antes equilibrada, a empresa demorará até cinco anos para voltar a ter lucro. Neste ínterim, como fará os investimentos necessários?

Recusar regras que impõem prejuízos às empresas controladas pelo Estado, e são, portanto, patrimônio público, é demonstração de zelo, de respeito ao contribuinte, de responsabilidade com as demais ações que cabe ao poder público desempenhar, como prover saúde, educação e segurança. Se Cemig, Cesp e Copel tivessem assinado todos os contratos tal como queria o governo petista, estariam lesando os cidadãos de Minas, São Paulo e Paraná que elegeram administrações responsáveis para governá-los.

O governo federal poderia ter atacado as tarifas por meio da redução de tributos e encargos – um dos únicos agora cortados, a RGE, havia sido renovado há menos de dois anos. Mas investiu contra a rentabilidade e capacidade de empreender das empresas.

As perspectivas para o setor elétrico brasileiro não são boas. Os apagões se repetem, projetos de transmissão e geração demoram a desabrochar, erros de planejamento barram novas expansões. Para piorar, o uso mais intenso de usinas térmicas – cujo custo é quatro a cinco vezes maior que o das hidrelétricas – tende a esterilizar parte da redução tarifária que o governo ora comemora.

Dilma Rousseff é parte central desta trapalhada. O modelo que aí está foi integralmente gestado sob seu comando, mas só vem produzindo riscos e incertezas. Já é possível antever problemas mais graves mais adiante e o que Brasília faz, desde já, é buscar bodes expiatórios. Mas a responsabilidade de que se instale a escuridão é integralmente da presidente e de seu governo. Conosco não, apagão!

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