Num processo em que
decisões de longo prazo tiveram que ser tomadas com base em premissas que ainda
sequer foram transformados em lei, terminou ontem o prazo para que as
companhias de energia optassem pela renovação das concessões. No
escuro, elas assinaram contratos que vigorarão por até 30 anos.
Na geração, a adesão
foi apenas parcial – equivaleu a 60% do total – e só a interferência direta e truculenta
do governo na Eletrobrás impediu uma recusa maciça às novas regras. Na
transmissão, segmento em que o modelo proposto mostrou-se menos desequilibrado,
a concordância foi integral.
Com isso, frustrou-se
a expectativa, anunciada em cadeia nacional de rádio e TV pela presidente Dilma
Rousseff em 6 de setembro, de que as tarifas de energia ficariam 20,2% mais
baratas. Agora, segundo promete o governo, a queda média será de 16,7% a partir de
março do ano que vem – para residências pode ficar perto de apenas 10%, segundo
a Folha
de S.Paulo. A que preço se chegará a estes cortes é que são elas.
Em menos de 90 dias,
Dilma conseguiu transformar um setor da economia razoavelmente vigoroso numa
aposta de alto risco e numa incógnita para o desenvolvimento sustentado do país.
Investir em energia passou de bom negócio a iniciativa temerária. Quem irá se
aventurar num ambiente em que o governante de turno faz o que bem entende e a
qualquer hora?
Desde setembro, as 32
empresas de energia negociadas na BM&FBovespa perderam R$ 31,2 bilhões em
valor de mercado, numa queda de 15,6%, segundo O
Globo. O governo petista desdenha as perdas, que penalizariam “especuladores”,
mas ignora que investir em ações de energia sempre foi uma alternativa de renda
para a aposentadoria de pequenos poupadores.
As mudanças
desestruturam o setor por completo. As empresas perderam rentabilidade e terão
dificuldades para operar, manter e expandir suas instalações. O aumento da geração
de energia, crucial para que o país não sufoque ainda mais, torna-se mais um
fator de incerteza no ambiente econômico já bastante instável em que a gestão petista
nos atolou.
O governo Dilma
conduziu com improviso o processo de renovação das concessões de energia, há
anos aguardado pelos agentes do setor. Juntou uma medida de longo prazo a
necessidades imediatas e conjunturais, a mais premente delas segurar a inflação
com artifícios e malabarismos, e produziu um tremendo curto-circuito.
“A administração
federal tomou o caminho errado. Preferiu a improvisação ao planejamento, sem
negociação com os agentes envolvidos. (...) Mais uma vez a presidente Dilma
Rousseff confundiu o papel do Estado como articulador e indutor do crescimento
com o exercício autoritário do poder”, opina O
Estado de S.Paulo em editorial.
As empresas mais
sólidas do setor decidiram não embarcar integralmente. Cesp, Cemig, Copel e
Celesc aderiram parcialmente à renovação baseada nas novas regras. Não
se recusaram, porém, a colaborar com a redução das tarifas: tanto, que, em
todas elas, parte significativa dos contratos foi renovada.
Empresas que
aderiram totalmente admitiram que o fizeram constrangidas. Na Eletrobrás, os
minoritários ameaçam processar os administradores da companhia por
irresponsabilidade. A CEEE, do Rio Grande do Sul, disse que a decisão foi “sofrida”
e que, antes equilibrada, a empresa demorará até cinco anos para voltar a ter
lucro. Neste ínterim, como fará os investimentos necessários?
Recusar regras que impõem
prejuízos às empresas controladas pelo Estado, e são, portanto, patrimônio
público, é demonstração de zelo, de respeito ao contribuinte, de responsabilidade
com as demais ações que cabe ao poder público desempenhar, como prover saúde,
educação e segurança. Se Cemig, Cesp e Copel tivessem assinado todos os
contratos tal como queria o governo petista, estariam lesando os cidadãos de
Minas, São Paulo e Paraná que elegeram administrações responsáveis para governá-los.
O governo federal poderia
ter atacado as tarifas por meio da redução de tributos e encargos – um dos únicos
agora cortados, a RGE, havia sido renovado há menos de dois anos. Mas investiu contra
a rentabilidade e capacidade de empreender das empresas.
As perspectivas para
o setor elétrico brasileiro não são boas. Os apagões se repetem, projetos de
transmissão e geração demoram a desabrochar, erros de planejamento barram novas
expansões. Para piorar, o uso mais intenso de usinas térmicas – cujo custo é quatro
a cinco vezes maior que o das hidrelétricas – tende a esterilizar parte da
redução tarifária que o governo ora comemora.
Dilma Rousseff é
parte central desta trapalhada. O modelo que aí está foi integralmente gestado
sob seu comando, mas só vem produzindo riscos e incertezas. Já é possível antever
problemas mais graves mais adiante e o que Brasília faz, desde já, é buscar bodes
expiatórios. Mas a responsabilidade de que se instale a escuridão é integralmente
da presidente e de seu governo. Conosco não, apagão!
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