Hoje é o dia D para
a renovação das concessões de dezenas de usinas e milhares de quilômetros de
linhas de transmissão de empresas de energia. Os dirigentes das companhias
estão com uma espada apontada para suas cabeças a lhe cobrar decisões que
afetarão o futuro de seus negócios ao longo de décadas. É agora ou jamais.
Visto assim, parece
que as empresas foram displicentes, deixando decisões importantes para a undécima
hora. Mas o fato é que há anos elas cobravam de Brasília uma definição para a
renovação de seus contratos de concessão – que começariam a vencer em 2015 – e por
anos o governo petista protelou uma solução. As novas regras só vieram a
público há menos de 90 dias, por meio de uma medida provisória, a de número 579,
impondo prazos exíguos e condições disparatadas.
Até o fim desta fatídica
terça-feira, as empresas terão que assinar contratos cuja vigência chega a 30
anos. Detalhe relevante: a MP que impõe tal prazo ainda não foi sequer votada no
Congresso e tem mais de 400 emendas apresentadas aguardando a apreciação dos
parlamentares. Está, portanto, longe de ser um instrumento jurídico perfeito
que dê um mínimo de segurança a decisões tomadas com base nela.
Diante de tamanha
escuridão, ontem a Cesp recusou-se a aderir às novas regras para a renovação de
suas concessões, juntando-se à Copel, que só aceitou revalidar os contratos de
suas linhas de transmissão. A Cemig decidirá hoje o que fazer. Também ontem, numa
polêmica assembleia, a Eletrobrás, cujas ações amargam perda de quase 40% em três
meses, impôs a aceitação dos novos contratos goela abaixo de seus acionistas
minoritários.
Desde o malfadado 11
de setembro, as empresas de energia elétrica entraram numa espiral descendente.
Seu negócio perdeu dezenas de bilhões de reais em valor de mercado a partir do
momento em que o governo anunciou a intenção de baixar as tarifas de energia em
20%, em média, a partir do próximo ano. Para uma intenção louvável, medidas totalmente
descalibradas.
O governo petista tenta
moldar a discussão de modo a enquadrar os críticos das novas regras na condição
de opositores da energia barata. Nada disso: o que se busca evitar é um salto
no escuro que transforme o setor energético em mais um fator de insegurança para
o futuro do país. Para continuar a gerar, transmitir e distribuir eletricidade,
as empresas precisam de rentabilidade mínima compatível com seus investimentos de
longuíssimo prazo. Sem isso, não haverá energia suficiente para iluminar o
caminho.
Há exemplos de sobra
de que a gestão petista age atabalhoadamente. Um dos pomos da discórdia é o
valor das indenizações a que as companhias de energia terão direito por
investimentos já realizados. Em setembro, o governo anunciou que pagaria R$ 20
bilhões pelos ativos. Depois de grita generalizada, Brasília admitiu que errou
nos cálculos e reviu as contas. Na semana passada, concluiu que terá de pagar R$ 10 bilhões a mais,
ou seja, falhou em módicos 50%...
Tal como estão as
regras, a consequência mais previsível das medidas será impor um brutal enxugamento
ao setor elétrico, que hoje, claramente, já demonstra não estar dando conta de
prover energia em qualidade e quantidade suficientes para a expansão do
mercado. Os repetidos apagões são a prova mais evidente de que os problemas existem
e não comportam soluções simplistas, muito menos atitudes populistas e
irresponsáveis.
Até aliados do PT
criticam o novo modelo, que vem sendo gestado desde a época em que Dilma Rousseff
era ministra de Minas e Energia. “O que vai haver é que não vai ter como operar
o sistema todo, o país é imenso, como fazer a manutenção da linha, dos
transformadores, eles já estão tendo problemas. (...) Isso vai piorar, e muito”,
disse recentemente Luiz Pinguelli Rosa, presidente da Eletrobrás à época do
governo Lula, à Folha
de S.Paulo.
Outra consequência daninha
deverá ser a enorme dependência que as estatais federais de energia passarão a ter
em relação ao Tesouro. A Eletrobrás perderá R$ 9 bilhões anuais em receitas e,
para fazer frente a suas obrigações, provavelmente terá que ser socorrida pelo acionista
controlador, a União. Ou seja, o governo concede tarifas mais baixas ao
consumidor por um lado e, de outro, tira do contribuinte os subsídios – ou seja,
o meu, o seu, o nosso dinheiro – que cobrirão os rombos.
A União tem vários
outros instrumentos para realizar a tão desejada redução das tarifas. Pode
começar cortando parte dos tributos e das taxas que encarecem as contas em
quase 50% – mas não vale maquiagem, ou seja, reduzir só os encargos que o
governo acabou de subir... Também valeria impor eficiência às descontroladas
subsidiárias estaduais da Eletrobrás, um manancial de prejuízos.
Infelizmente, o setor
elétrico é apenas uma das áreas que sofre com a desenfreada interferência
estatal no país. A instabilidade que emana de Brasília pôs em xeque os
investimentos na expansão de um segmento vital para o futuro do Brasil. É esta mesma
falta de perspectivas que está jogando toda a economia para o buraco. Sem luz,
tudo fica bem pior.
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