O real foi o oitavo
plano de estabilização – décimo-segundo, se considerarmos também as
experiências ortodoxas do fim do regime militar – a ser tentado no país no
intuito de pôr fim à hiperinflação, que durante anos persistia na casa de dois
dígitos mensais. Todas as tentativas anteriores só haviam resultado em mais
carestia, reaceleração dos preços e frustração. Os mais pobres eram sempre os
mais penalizados, por não contar com mecanismos de proteção financeira.
Em 1993, Itamar
Franco pôs em marcha uma estratégia inovadora, bolada por um grupo de jovens e
brilhantes economistas: seu cerne era desarmar a engrenagem da indexação, que
sempre retroalimentara a inflação. Para conduzi-la, o presidente escalou
Fernando Henrique Cardoso, que deixou o comando do Itamaraty para assumir o Ministério
da Fazenda. A uma ideia ousada juntou-se um líder capaz de emprestar
credibilidade à empreitada, como Itamar precisava.
Uma das
características do plano, e fundamental para seu sucesso, foi a transparência.
Então acostumada a pacotes baixados na calada da noite, a sociedade brasileira
foi envolvida no processo de adoção da nova moeda, de modo a preparar-se para aquele
1° de julho de 1994, dia em que o real finalmente estreou. Tratava-se de uma
postura absolutamente inovadora, franca, honesta.
Antes do real, o
Brasil experimentou o cruzeiro real como padrão monetário; foi nossa nona moeda
e só existiu por 334 dias. Para ter noção de quão dramática era a situação, neste
curto período o cruzeiro real acumulou inflação de 3.673%. Trocando em miúdos:
naquela época, os preços subiam em dois dias mais do que sobem hoje, em média,
num ano todo. O real veio enfrentar esta realidade e vencê-la.
A estabilização foi
o passo inicial de uma profunda transformação institucional do Estado
brasileiro. A ela, seguiram-se a renegociação das dívidas estaduais e
municipais; o saneamento do sistema bancário, por meio do Proer; a Lei de
Responsabilidade Fiscal; a adoção do regime de metas de inflação e de câmbio
flutuante. Concomitantemente, vieram também a liberalização comercial e as
privatizações. O PT opôs-se a todas estas iniciativas, mas, a despeito de sua
truculência oposicionista, o Brasil foi renovado.
Todo este ciclo de
mudanças transcorreu ao longo dos dois mandatos do presidente Fernando
Henrique. Lá se vão dez anos desde seu fim, e a pergunta que fica é: o que
aconteceu de novo no Brasil desde então? É certo que, no empuxo de uma expansão
sem precedentes no comércio global ao longo dos anos 2000, milhões de
brasileiros foram incorporados ao mercado de consumo nos últimos anos. Mas que avanços
institucionais ocorreram na era petista? A resposta é: nenhum.
O Brasil teve, nos
últimos anos, oportunidades preciosas de ingressar num longo ciclo de
desenvolvimento sustentado. Para tanto, eram necessárias novas mudanças, lances
de ousadia, reformas estruturais, instituições adequadas aos novos tempos. Mas,
nos governos petistas, vivemos aprisionados no curto prazo, sem preparar o país
para voltar a dar novos saltos adiante, como o Plano Real fez.
Muito do sucesso do
governo Lula e da relativa estabilidade da gestão Dilma Rousseff deve-se ao
arcabouço institucional herdado da administração tucana. Fica-se a imaginar o
que teria acontecido se a chegada do PT ao poder não tivesse sido precedida das
inovações e das transformações desencadeadas naquele longínquo 1° de julho. O Brasil
que temos hoje – melhor que o de ontem, mas ainda distante do que precisa ser amanhã
– só existe graças ao Plano Real.
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