Em artigo
publicado em O Globo e n’O Estado de S.Paulo, o presidente lista diversos
componentes da “herança pesada” recebida por Dilma de seu antecessor. São muitos:
a crise moral, o mensalão, a falta de reformas institucionais, o aumento da
carga tributária, as iniquidades na Previdência, a ineficiência dos investimentos
públicos, os descaminhos da política energética. Examinada a lista, é de se perguntar:
há alguma mentira nela? Nenhuma.
Fernando Henrique
lamenta a corrosão moral que marcou o primeiro ano da gestão Dilma. Fato: dos
37 ministros que assumiram com a presidente, sete foram defenestrados por
suspeitas de corrupção e irregularidades de toda natureza. Não custa lembrá-los:
Antonio Palocci (Casa Civil), Carlos Lupi (Trabalho), Alfredo Nascimento
(Transportes), Pedro Novais (Turismo), Orlando Silva (Esporte), Wagner Rossi
(Agricultura) e Mario Negromonte (Cidades).
Em seguida, o
presidente trata do mensalão. Dos 37 réus, dez
são do PT. São eles: os já condenados João Paulo Cunha e Henrique Pizzolato; José
Genoino e Delúbio Soares, os próximos da lista; o único absolvido Luiz Gushiken;
José Dirceu, Silvio Pereira, Paulo Rocha, Professor Luizinho e João Magno de
Moura. Mente Fernando Henrique ao denunciar a “busca de hegemonia a peso de
ouro alheio” por esta gente? Por tudo o que se viu ao longo das 17 sessões de
julgamento realizadas no STF até agora, nem um pouco.
Segundo alguns
jornais, Dilma teria ficado especialmente brava com a menção à desastrada
política energética que vigora no governo petista. Mas quem, senão a própria atual
presidente da Petrobras, ressaltou
noutro dia que, desde 2003, a estatal não cumpre suas metas de produção? Quem,
senão a própria empresa, deve apresentar nova queda na
produção neste ano e registrou, após 13 anos, bilionário prejuízo?
Quem vale
hoje menos do que valia dois anos atrás, antes de um processo de capitalização
embalado em clima de fanfarra eleitoral?
No artigo, Fernando Henrique
também aponta os equívocos que transformaram o Brasil de potência na geração de
etanol em importador do produto. Os fatos: neste ano-safra, a produção de álcool
no país caiu 15% e compramos dos Estados Unidos nada menos que 1,8 bilhão de
litros do biocombustível. Em consequência deste desarranjo, as importações de
gasolina deverão mais que quadruplicar
até o fim da década.
O líder tucano trata,
ainda, dos atrasos na Transnordestina e na transposição do rio São Francisco.
Quem há de negá-los? A ferrovia
só tem um terço das obras prontas, liga nada a lugar algum e já encareceu 50%,
bancada por financiamento do BNDES. A transposição tem seis dos 14 lotes com
obras suspensas,
muitas por suspeitas de irregularidades. Seu término, antes previsto para 2010,
já foi estendido para, no mínimo, 2015.
A presidente tentou
rebater as sóbrias palavras de Fernando Henrique com uma nota oficial combinada
com Lula, segundo revelou o Estadão.
Disse, por exemplo, que seu antecessor legou-lhe “uma economia sólida, com crescimento robusto, inflação sob controle,
investimentos consistentes em infraestrutura”. Em que país ela está vivendo?
Ou, pior: qual país ela pensa que está governando?
“Economia sólida” será a que cresce menos que todos os países
latino-americanos e é a quarta mais desigual e injusta do continente? “Crescimento
robusto” será aquele que, neste ano, ficará em cerca de metade do que foi o
pibinho de 2011? “Investimentos consistentes em infraestrutura” são a paralisia
que se vê em estradas, ferrovias, aeroportos, portos e conjuntos habitacionais,
e que, na última década, deixou de aplicar quase R$ 50
bilhões em recursos orçamentários? Francamente...
Dilma chama atenção para “os avanços que o país obteve nos últimos dez
anos”. Se não fosse tão sectária, mais correto seria dizer dos avanços que vêm
sendo construídos por toda a nação desde a transição democrática – da qual, aliás,
o PT recusou-se a participar no colégio eleitoral. Mais adequado ainda seria
falar da completa ausência de avanços institucionais na última década, em que o
arcabouço arduamente construído na gestão tucana foi sendo, dia após dia, dilapidado
até o osso, até não sobrar nada que permita ao país lançar-se a novos saltos
rumo ao futuro.
Para terminar, a
presidente da República diz que seu tutor é “um exemplo de estadista”. Sobre
isso, não é preciso dizer muito. Basta lembrar que, neste instante, Luiz Inácio
Lula da Silva está mergulhado até a alma em disputas eleitorais pelo Brasil “mordendo
a canela” de adversários e exalando ódio a quem não lhe diz amém. Enquanto isso,
Fernando Henrique dedica-se a apontar erros e elogiar eventuais acertos,
buscando colaborar para a melhoria do país. A verdade muitas vezes é incômoda,
mas nunca foi tão necessária quanto agora.
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