quarta-feira, 7 de novembro de 2012

A mais cara energia

O governo federal conseguiu produzir um choque de alta voltagem no setor elétrico brasileiro. No mesmo momento em que o abastecimento de energia tem apresentado falhas, na forma de apagões cada vez mais frequentes, baixou regras draconianas para a renovação dos contratos de concessão de hidrelétricas e linhas de transmissão que podem simplesmente travar os investimentos na expansão da oferta no país.

Reduzir as tarifas de energia tornou-se uma obsessão da presidente Dilma Rousseff. Se todos concordamos com os fins, é ampla, geral e irrestrita a discordância quanto aos meios. Das duas, uma: ou o governo está muito certo ou todo o mundo está completamente enganado. Difícil fiar-se na primeira hipótese.

As regras definidas para a renovação dos contratos têm sido consideradas drásticas demais por todos os agentes do setor. Não há vivalma que aplauda o que o governo vem fazendo, embora seja unânime o reconhecimento de que o país precise ter tarifas de energia mais baixas.

Mas a questão é: da forma como o governo quer proceder, o risco é não haver quem se interesse em investir no setor elétrico no Brasil. E aí cairemos no pior dos mundos, porque a energia mais cara é aquela que não existe.

Na noite de quinta-feira, véspera de feriado, o governo publicou os valores das indenizações que pretende pagar às empresas detentoras de 15 usinas hidrelétricas e às nove de transmissão por investimentos ainda não amortizados e ativos que possuem. No total, R$ 20 bilhões, com base numa redução média de 72% nas tarifas. É muito menos do que as companhias esperavam receber.

A regra representa um corte expressivo nas receitas previstas pelas empresas de energia – há casos, como o de Chesf, em que a perda atinge 80%. Conclusão lógica: faltará dinheiro para assegurar a continuidade, a confiabilidade e a preservação dos ativos do sistema elétrico nacional, que hoje já não está lá estas coisas.

A constatação entre agentes do setor, empresários, analistas e investidores é unânime: as tarifas impostas pelo governo não cobrem os investimentos necessários para a expansão e põem em risco a manutenção e a segurança do sistema elétrico brasileiro. “As novas tarifas beiram o ridículo. As usinas vão valer um cafezinho”, comentou um ex-conselheiro de Furnas a’O Estado de S.Paulo.

É possível que muitas das companhias não adiram às novas regras e abram mão de concessões. Com isso, deve se frustrar a meta do governo de redução nas tarifas – entre 16,2% e 28%. Já há quem preveja que este percentual pode cair a 12%.

Como reação às novas regras, as companhias de energia vêm perdendo valor de mercado. Segundo O Globo, foram R$ 19,064 bilhões em pouco mais de dois meses. Ontem, os papéis voltaram a despencar, em consequência dos baixos valores que o governo se dispõe a pagar a título de indenização pelos ativos das empresas.

Quem mais perde até agora são as companhias cujos principais controladores são os governos tucanos de Minas Gerais e São Paulo. Por que será? Desde o começo de setembro, as ações da Cemig já caíram quase 32% e as da Cesp, mais de 45%. Nem a federal Eletrobrás – que, segundo análise do banco UBS, passará a ter geração de caixa negativa e dependerá da injeção de capital por parte do governo para financiar seus investimentos – sofre tanto.

As chances de as águas que movem as turbinas das usinas voltarem a um curso normal estão todas depositadas no Congresso, onde tramita a medida provisória (n° 579) que definiu as regras para a renovação das concessões. O texto, editado em 14 de setembro pelo Planalto, já recebeu 431 emendas e começará a ser discutido hoje em audiência pública.

Até 4 de dezembro, as companhias terão que decidir se aceitam ou não as regras impostas a fórceps pelo governo petista. Ou seja, terão 30 dias para definir o futuro de seus negócios pelos próximos 30 anos. Se não acatarem, simplesmente devolverão as concessões ao poder concedente. E aí ficará a incógnita: quem vai tocar adiante os investimentos em energia de que o país necessita?

A presidente Dilma Rousseff se apresenta como especialista no setor. O sistema atual foi todo desenhado quando ela era ministra de Minas e Energia, com forte viés estatal e, agora, também com condições desfavoráveis ao investimento privado. O modelo preconiza a modicidade tarifária, mas pode acabar produzindo a mais cara das energias: a que não existe. Ainda há tempo de corrigir o erro, antes que se instaure a escuridão.

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