sábado, 9 de março de 2013

A guerra dos royalties

A guerra fratricida entre as unidades da Federação em torno dos royalties é só mais um capítulo da balbúrdia em que se transformou o setor do petróleo no Brasil desde que o governo petista decidiu trocar um modelo vitorioso por um sistema que, até agora, só produziu confusão, paralisia e quase nenhum resultado.

A mudança na fórmula de repartição dos royalties decorre da substituição do modelo de concessão, vigente no país a partir de 1997, pelo de partilha, adotado no novo marco regulatório aprovado em 2010 para as novas áreas do pré-sal e as classificadas como “estratégicas”. Trocou-se um sistema estável, testado e aprovado por um salto no escuro, tudo sob o patrocínio direto da então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.

Na visão do PT, o modelo de partilha é uma forma de o Estado apropriar-se de parcelas maiores dos ganhos obtidos nas reservas supostamente superprodutoras de petróleo do pré-sal. Se os riscos são menores, menor deve ser a fatia que fica com as empresas operadoras. A tese é justa, mas o mecanismo adotado para aplicá-la não.

Bastavam mudanças tópicas no antigo modelo para que tudo se ajeitasse, mas ao petismo o que importava era sepultar o vitorioso regime de concessões, gestado no governo Fernando Henrique. O PT preferiu optar pela trilha mais ideológica, mais dogmática e menos eficiente. 

A adoção do novo arcabouço foi feita de maneira tão inopinada que seus formuladores simplesmente relegaram a segundo plano a definição das regras para os royalties. “A equipe estava focada em garantir à União uma maior fatia da riqueza do pré-sal. Ninguém queria falar de royalties”, historia Valdo Cruz hoje na Folha de S.Paulo.

Desde que as propostas do pré-sal foram enviadas ao Congresso pelo governo Lula, em meados de 2009, tudo passou a recender a improviso e apropriação política. As discussões, se é que podem ser chamadas assim, sobre as riquezas existentes nas camadas ultraprofundas desenrolaram-se a baixíssima profundidade.

Tal situação difere muito do que tínhamos até então. Nos cerca de 12 anos em que o modelo de exploração de petróleo no país esteve submetido exclusivamente ao regime de concessão, o sucesso foi avassalador. A abertura da exploração do setor a outras empresas além da Petrobras elevou a participação da atividade no PIB de cerca de 2,75% para 12%.

Outros resultados provam o êxito da legislação implantada no governo Fernando Henrique. Apenas para ficar em dois exemplos: aumento da produção de 870 mil barris/dia para cerca de 2 milhões/dia e multiplicação por mais de dez vezes das receitas geradas para União, estados e municípios até 2010.

A Petrobras também ganhou muito: tornou-se muito mais eficiente, produtiva e rentável. Aliás, o que aconteceu com as ações da estatal nos últimos dois dias mostra como a empresa e, de resto, o setor respondem positivamente quando sujeitos a regras mais equilibradas. Bastou o governo autorizar um novo aumento para o diesel, reduzindo a defasagem e as perdas da companhia, para os papéis subirem mais de 20%. É mais uma evidência de quanto o jugo político tem vergado a nossa outrora maior companhia.

Recentemente, tornou-se notório o fato de a Petrobras ter sido ultrapassada pela colombiana Ecopetrol no ranking das maiores petrolíferas do mundo. É significativo que, a partir de 2004, a Colômbia venha adotando o mesmo modelo de concessão praticado no Brasil desde 1997, incluindo a criação de uma agência reguladora forte. Fizeram lá o que o PT não quer mais fazer aqui.

O mesmo ranço ideológico que desembocou na adoção do sistema de partilha levou o país a estar há mais de quatro anos sem promover rodadas de licitação para exploração de novas reservas. Uma das consequências é que o tamanho da área de petróleo prospectada no Brasil hoje é metade do que era no passado. A retomada das rodadas está programada para maio, mas a disputa em torno dos royalties borrifou mais uma nuvem de incerteza no ambiente.

A própria exploração do pré-sal está travada pelas dificuldades que a Petrobras tem tido para levar adiante seu bilionário plano de negócios. Na partilha, a estatal entra obrigatoriamente com pelo menos 30% de participação em cada consórcio, além de ser, também obrigatoriamente, a única operadora. Segundo o Valor Econômico, hoje o governo estaria “absolutamente arrependido” de ter incluído esse dispositivo no novo marco.

A guerra dos royalties adiciona mais um elemento de tensão e incerteza num setor que só andou para trás depois que o governo do PT resolveu implodir uma experiência exitosa. Mas não chegamos a esta lamentável situação apenas pelas equivocadas decisões regulatórias da gestão petista. 

Tão grave quanto foi a omissão do governo federal, que lavou as mãos numa questão federativa e deixou de exercer o papel coordenador que, constitucionalmente, lhe cabe. A União não se furta, porém, em sujar as mãos quando trata de avançar sobre as rendas de estados e municípios.

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