A candidata à
reeleição adotou uma nova prática nas últimas semanas: abre as portas dos
palácios de governo para oferecer convescotes que invariavelmente transforma em
palanque de campanha. Nestas ocasiões, Dilma Rousseff acaba sempre por revelar
um pouco mais de sua particular visão de mundo. Em alguns casos, ela parece ter
chegado da lua.
Ontem à noite, a
presidente recebeu um grupo de jornalistas para mais um jantar de, digamos,
confraternização no Alvorada. Na semana passada, havia aberto as portas do palácio
para editores de esportes, um grupo dominado por homens. Já Lula, seu tutor, prefere
falar com os “blogueiros progressistas”, aquela gente paga pelo governo para
falar bem do governo...
No encontro de
ontem, segundo relato publicado pela Folha de S.Paulo, Dilma, entre outros assuntos, admitiu que “não está tudo
bem” em relação à inflação brasileira. Será que só agora a presidente percebeu
isso? Será porque, como mandatária, não tem que passar pelo perrengue de ir à feira
e constatar, a cada semana, que o salário compra cada vez menos comida?
Dilma chega ao
último ano de seu mandato vendo a inflação decolar sem que tenha feito movimento
à altura para conter os aumentos em série. Ela nunca cumpriu por um ano sequer
a meta fixada para a política monetária e deve entregar, pelo segundo ano
consecutivo, preços mais altos que os vigentes no ano anterior. Legará ao
sucessor inflação maior que a que recebeu, algo inédito desde a estabilidade conquistada
com o Plano Real.
A presidente parece
não ver problema algum nesta receita indigesta. Enxerga – e só ela consegue
isso – um futuro venturoso para uma política que, à inflação em alta constante,
junta crescimento econômico minúsculo por anos a fio. Para Dilma Rousseff, esta
combinação é, na verdade, um anabolizante e tanto. De que planeta ela aterrissou?
No convescote de
ontem, a presidente afirmou às jornalistas que erra quem prevê um ano de
ajustes e dificuldades em 2015. Segundo sua visão particular da realidade, no
ano que vem o Brasil estará, isto sim, “bombando”. Só se for no sentido literal
mesmo, sob uma chuva de mísseis... Existe consenso hoje – e até gente do
governo admite – que do jeito que está não dá para ficar.
Em razão da forma
como vem sendo governado pelo PT, o país tem uma série de bombas-relógio
armadas para explodir nos próximos meses. Há desde a inflação represada de
preços administrados, como energia e combustíveis, até o crônico desequilíbrio
entre receitas e despesas, agravado sobremaneira nos últimos 12 anos.
Até Dilma, ainda que
em atos falhos, admite isso. Em discurso ontem à tarde, ela disse
que está “sofrendo” com decisões tomadas pelo antecessor: “Eu tenho certeza que
o mundo brasileiro daqui a três anos será melhor que o de hoje, porque hoje eu
já estou sofrendo, ou melhor, me beneficiando das decisões tomadas no período
Lula”.
Quando resolve
tratar de problemas que o país ainda tem a vencer, Dilma insiste na odiosa transferência
de responsabilidades. Três mandatos após a chegada de seu partido ao poder,
continua culpando investimentos que “não foram feitos no passado” por atrasos como,
por exemplo, no saneamento – área em que as gestões petistas tiveram resultados
piores que as anteriores. Doze anos é pouco para mudar uma situação?
Para convencer incautos,
Dilma lança mão de uma alquimia de estatísticas, saídas das pajelanças
produzidas por Marcelo Néri no Ipea. Tenta mostrar aos brasileiros que a situação
vai bem e que o problema é que nós, pobres e ignorantes mortais, não temos
capacidade para perceber isso. Faltam feira e supermercado neste elixir – ou,
talvez, torturar um pouco mais os números...
Os momentos de
ensaiada descontração que promove nos palácios permitem aos brasileiros
conhecer mais amiúde os pontos de vista da presidente. Na conversa com os
jornalistas esportivos, por exemplo, Dilma deixou transparecer que prefere a
atenção de médicos vindos de Cuba do que a capacidade dos médicos brasileiros. É
de se sugerir que ela vá se cuidar na ilha quando, e se, suas condições de
saúde voltarem a exigir.
Mas o que tais ocasiões
trazem de melhor é permitir à população avaliar melhor no que estará incorrendo
caso opte por manter Dilma Rousseff por mais quatro anos no principal gabinete
do Palácio do Planalto. Resta evidente que a percepção da presidente sobre a
nossa realidade aproxima-se da de quem tivesse chegado ontem de uma viagem à lua.
Lá, aliás, é bom destino para ela a partir de 2015.
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