O Senado pode votar
hoje projeto de lei que estende o chamado Regime Diferenciado de Contratação a todas
as obras públicas a serem feitas no país. Se aprovado, estará escancarada a porteira
para um festival de tramoias. Tudo pago com o dinheiro do contribuinte. O pior
é que nem o que promete o RDC entrega.
O RDC foi criado no início
de 2011 pelo governo petista para tentar evitar atrasos em obras da Copa do
Mundo e das Olimpíadas de 2016. Inicialmente, sua aplicação limitava-se a empreendimentos
relacionados aos dois eventos esportivos, àquela altura já flagrantemente
atrasados – pergunta-se: algo mudou de lá para cá?
Pouco a pouco, a possibilidade
de atropelar as rígidas exigências da Lei de Licitações (n° 8.666) foi sendo
estendida a outros tipos de intervenções públicas, na mesma medida em que as
promessas dos governos petistas teimavam em não sair do papel. O PAC foi o alvo
seguinte e a proposta ora em discussão, de autoria da senadora Gleisi Hoffmann
(PT-PR), é o “liberou geral” que faltava.
Entre outros
aspectos, o RDC permite a contratação das obras sem projetos básico e
executivo, ou seja, sem que se conheçam seus detalhes, cuja definição fica a
cargo das empresas que vencerem a concorrência. Trata-se, em suma, de
modalidade em que ninguém sabe ao certo o que está sendo contratado – muito
menos por quanto – com o dinheiro público.
Tudo no RDC é cercado
de sigilo. O governo argumenta que, desta maneira, consegue forçar as concorrentes
a baixar os preços. Balela. Vence a concorrência, em geral, quem tem acesso às
fonte$ certa$ de informação e, depois, basta ir enfiando aditivos nos contratos
– hoje a 8.666 limita-os a um máximo de 50% do valor do orçamento original, trava
que o RDC eliminou.
O desejo petista de
libertar-se das amarras da Lei de Licitações é antigo, e recorrente. Desde o
governo Lula, a gestão federal mantém atritada convivência com sistemas de fiscalização
e controle existentes no país. Seu sonho sempre foi instalar um vale-tudo nas
contratações feitas pela administração pública, de modo a facilitar os
negócio$.
Quando nasceu, o RDC
foi alvo de ação direta de inconstitucionalidade movida
pela Procuradoria-Geral da República. O órgão via “comprometimento ao
patrimônio público” se as contratações das obras fossem feitas por meio do novo
sistema. Isto ainda em setembro de 2011. Imagina o que rolou desde então.
O principal argumento
do governo federal para defender o RDC é que ele acelera obras. Está tão longe
da verdade quanto a distância que separa as promessas da gestão petista de sua
realização. O sistema de fato apressa os prazos das licitações, primeiro passo
do processo. Mas, daí até o início das obras, a delonga é hoje até maior do que
era antes.
Ocorre que, só
depois de conhecido o vencedor da concorrência, é que os projetos que embasarão
as obras serão feitos. Aí o tempo corre leeeento. Há casos de obras cujo
certame já foi concluído há 17 meses e até hoje não há obras, simplesmente
porque não há projetos. É o que acontece, por exemplo, na BR-163 no Pará.
Feitas por meio do
RDC, as obras da BR-381 que a presidente Dilma Rousseff foi ontem “iniciar” em
Minas são outro exemplo. Dos seus 11 lotes, quatro ainda não foram sequer contratados.
Não se sabe quando sairão do papel, a despeito de a duplicação da perigosa
rodovia – o governo petista manterá 40% do traçado em pista simples – ter sido
promessa de campanha da petista.
Não são apenas os
prazos que o RDC mantém elásticos. Levantamento feito com base em 188 obras que
tiveram editais publicados pelo DNIT desde o início da vigência do novo modelo
mostra que apenas 64% delas tiveram o certame finalizado. As demais
simplesmente não foram adiante.
Mas não é só isso: os
custos também alçam ao céu com o novo regime de contratação de obras públicas
que os petistas defendem com tantas unhas, dentes e cifrõe$. Alguns exemplos são
citados por Pedro da Luz Moreira, diretor do Instituto dos Arquitetos do
Brasil, em artigo publicado hoje no Valor Econômico.
A ampliação do
aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, mais que dobrou de preço, mas a
conclusão, esperada para este mês de maio, não tem sequer data para acontecer. O
custo da ampliação do aeroporto de Cuiabá já subiu 50% e a entrega, prevista
para dezembro passado, até hoje não ocorreu. São todas obras que o governo petista
louva ter acelerado por meio de contratação, pela Infraero, usando o RDC.
O Regime
Diferenciado de Contratação foi sacado da algibeira petista como solução para
os improvisos em série que marcam a gestão pública federal desde a gestão Lula.
De panaceia, passou a bom e rentável negócio, dependendo de que lado do balcão
se está. Para a população em geral, contudo, o RDC não passa de um engodo, uma
forma de o governo usufruir de dinheiro público com menos fiscalização e de o
petismo manter intacta sua sina de obras que nunca terminam.
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