Desde que foi
apresentado na última terça-feira, o texto da declaração final da Conferência
das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável – da lavra do Itamaraty – foi
alvo de críticas. A insatisfação com os seus 283 parágrafos, esparramados por
49 páginas de muita retórica e pouca decisão, é geral.
As primeiras a
estrilar foram as ONGs. Anteontem, pediram que uma expressão (“com plena participação
da sociedade civil”) fosse retirada do documento oficial, como forma de deixar
registrado que não compactuam com a solução construída pelo Brasil. Não foram atendidas.
Mas as ONGs não falaram
sozinhas. Para espanto geral, críticas ainda mais contundentes vieram da
delegação da Comunidade Europeia – decepcionada com a timidez dos negociadores
brasileiros – e até mesmo do secretário-geral da ONU: Ban Ki-Moon causou
tamanha contrariedade ao governo brasileiro que ontem teve que se desdizer.
Também contrariados se
manifestaram representantes de empresas e academia. No documento
“A Rio+20 que não queremos”, repudiaram o caminho trilhado pelos governos, guiados
pela diplomacia brasileira, na Rio+20, seja pela timidez das deliberações, seja
pela falta de ambição com compromissos objetivos.
“A Rio+20 passará
para a história como uma conferência da ONU que ofereceu à sociedade mundial um
texto marcado por graves omissões que comprometem a preservação e a capacidade
de recuperação socioambiental do planeta, bem como a garantia, às atuais e
futuras gerações, de direitos humanos adquiridos”, diz o texto.
Ex-líderes políticos
mundiais, como Fernando Henrique Cardoso, Gro Harlem Brundtland (Noruega) e
Mary Robinson (Irlanda), também externaram sua decepção com a conferência recepcionada
pelo Brasil. Reunidos no grupo denominado “The Elders”, disseram, num
comunicado, que a Rio+20 não fez o suficiente para pôr a humanidade na
trajetória de desenvolvimento sustentável.
Vale recordar que,
até o início da semana, era generalizada a expectativa de que a conferência resultasse
em pelo menos três avanços: a criação de um fundo para promover o desenvolvimento
sustentável em países pobres; a definição de metas de produção e consumo
sustentáveis; e o fortalecimento de órgãos de governança da ONU voltados ao
meio ambiente, em substituição ao Pnuma.
As discussões
preliminares, que se desenrolaram por meses a fio, não haviam conseguido lograr
êxito em atingir o consenso em torno destes objetivos. Mas, em compensação, os
negociadores também ainda não haviam jogado a toalha: apostava-se no diálogo de
alto nível dos chefes de Estado para se chegar a um entendimento no Rio.
Bastou, porém, o Brasil
assumir as negociações para, em quatro dias, as esperanças estarem sepultadas. Nenhum
dos três principais pontos em torno dos quais havia maiores expectativas foi
preservado pelo Itamaraty no documento final. Tudo em nome de um mínimo
denominador comum que compromete ao máximo o futuro do planeta.
Não apenas a busca
de avanços mais evidentes foi abandonada, como alguns compromissos que estavam quase
fechados foram dizimados do texto final pela diplomacia brasileira. É o caso,
por exemplo, de um programa de ação de mudança nos padrões de produção e
consumo que havia levado oito anos para ficar pronto e agora deixou de constar
da declaração final da Rio+20. Dada antes como certa, a proteção dos oceanos nas
áreas além das fronteiras territoriais também naufragou.
Com seu trator, o
governo brasileiro reduziu a cúpula dos chefes de Estado, iniciada na
quarta-feira, a um mero referendo das decisões insossas costuradas pelos ministros.
As contribuições da sociedade civil, elaboradas num ciclo de diálogos de alto nível
integrante da Rio+20, também foram simplesmente ignoradas – o texto final foi
fechado antes que os debates fossem finalizados.
Até a proverbial rispidez
que cerca os modos da presidente brasileira marcou presença na conferência do
Rio. Os jornais registram a maneira “pouco suave” com que Dilma Rousseff
reclamou de críticas feitas ao Brasil pela ONU. Também salientam gestos de “truculência e constrangimento” exibidos pelos negociadores brasileiros junto às delegações de
outros países na pressa por fechar o documento final da Rio+20.
Tudo considerado, as
atitudes do governo brasileiro nos últimos dias parecem indicar que a Brasília
importou muito mais salvar o país-anfitrião do vexame de não conseguir produzir
um texto de consenso, qualquer que fosse ele, do que pavimentar avanços globais
rumo a um mundo mais sustentável. Na Rio+20, prevaleceram o interesse menor e as
veleidades da diplomacia do governo Dilma Rousseff.
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