Joaquim Barbosa
avançou ontem na leitura de seu voto sobre o mensalão e mostrou que recursos do
Banco do Brasil foram usados para pagar o apoio de parlamentares que apoiavam o
governo Lula. Pelo menos R$ 76 milhões foram drenados para irrigar operações
fraudulentas e encher os bolsos de deputados da base aliada.
O ministro relator
foi cristalino em sua argumentação. O dinheiro foi repassado à DNA, uma das
agências de publicidade de Marcos Valério, pela Visanet. Os advogados dos réus
argumentam que a empresa é privada e, portanto, não haveria problema. Mas, se
32,3% das ações da Visanet são detidas pelo Banco do Brasil, os recursos não poderiam
ser outra coisa senão públicos. Simples assim.
Houve pagamentos
antecipados à DNA, no valor de R$ 73 milhões, e apropriação, pela agência, de
bonificações que deveriam ser restituídas ao Banco do Brasil, que somam R$ 2,9
milhões. O erário foi, portanto, assaltado. Tudo foi determinado a partir da diretoria de
marketing do BB, comandada à época por Henrique Pizzolato.
O dinheiro desviado
dos cofres públicos foi, então, usado pela DNA para levantar empréstimos junto
aos bancos Rural e BMG em favor do PT. Dos guichês das instituições, os
recursos foram sacados pelos mensaleiros, beneficiários do esquema que
pretendia arrecadar R$ 1 bilhão para patrocinar a perpetuação do projeto de poder
petista.
Barbosa foi direto e
didático ao propor a condenação dos envolvidos nos desvios. Por uma razão
singela: o relator já deixou claro que não admite os cínicos argumentos da
defesa dos réus, que tenta, a todo custo, transformar o mensalão num pecadilho,
um delito de segunda classe, um simples crime eleitoral “que sistematicamente é
feito no Brasil” – conforme as palavras de Lula ainda em 2005.
Depois do relator, amanhã
se manifesta o revisor, Ricardo Lewandowski, e, em seguida, os demais nove
ministros do Supremo Tribunal Federal. Aceita a constatação, feita por Barbosa,
de que houve desvio de dinheiro público, os réus acusados – o deputado João Paulo
Cunha, Pizzolato, Marcos Valério e mais dois de seus sócios – são passíveis de
serem condenados por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro.
Se a tese prosperar,
estará reforçada a acusação de lavagem de dinheiro, que recai sobre 35 dos 37
réus do processo do mensalão. Trata-se de crime caracterizado como “tentativa
de ocultar a origem ilegal de recursos”, que, mostrou ontem Joaquim Barbosa,
eram públicos. Estará aberto também o caminho para chegar a quem, de fato,
comandou o esquema corrupto.
Depois de
desmascarar a origem pública do dinheiro, nos próximos capítulos do seu voto o ministro
relator deve deitar por terra as alegações de que o mensalão não passou de
crime de caixa dois. Tampouco deverá deixar prosperar a tese de que os
mensaleiros não sabiam da origem suja do dinheiro que gostosamente embolsavam.
Joaquim Barbosa
traçou ontem o caminho a seguir, dentro do formato didático, claro e preciso que
vem imprimindo a suas manifestações no julgamento. Com o ministro, quem fala são
os fatos. Comprovada a origem pública do dinheiro que alimentou o mensalão, o
relator examinará, nesta ordem, a gestão fraudulenta dos bancos; a prática de
lavagem; a compra de apoio parlamentar; a evasão de divisas; e, finalmente, a
formação de quadrilha.
É nesta hora que o
julgamento chegará aonde a sociedade mais espera: àquele quem, “entre quatro
paredes de um palácio presidencial”, comandou todo o esquema mafioso. Seu
operador é mais que evidente: José Dirceu – se ainda havia dúvidas disso, O
Estado de S.Paulo mostrou, em sua edição de domingo, quão longos eram
os tentáculos do então ministro-chefe da Casa Civil de Lula.
Mas o verdadeiro
chefão ainda permanece oculto, ou melhor, não foi arrolado pela
Procuradoria-Geral da República na peça acusatória. É difícil crer que um
esquema tão poderoso tenha ocorrido à revelia do líder máximo, daquele que
ocupava o mais importante gabinete do Palácio do Planalto e a quem interessava,
ao fim e ao cabo, que o PT se eternizasse no poder. Não será difícil chegar lá.
O caminho está aberto, é só seguir o rastro do dinheiro.
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