Um leilão que termina sem concorrência, vencido por quem não ofereceu uma
gota de óleo de ágio, não pode ser considerado um sucesso. Mas o que há de mais
lamentável na licitação do campo de petróleo de Libra realizada ontem são os
malefícios que a tardia conversão do PT às privatizações causou ao país. As
riquezas do pré-sal já poderiam estar jorrando há muito tempo.
O leilão de Libra – se é que se pode ser chamada assim uma disputa sem
concorrentes e arrematada pelo mínimo – foi vencido por um consórcio de cinco
empresas. A expectativa oficial era de que o campo gigante fosse disputado por
40 empresas. No final, sobraram nove e apenas um grupo apresentou proposta,
conquistando a área com compromisso de entregar à União 41,65% do óleo que vier
a extrair.
O resultado poderia ter sido pior. Mas a entrada de duas grandes
petroleiras privadas no consórcio vencedor nos últimos dias – a francesa Total
e a anglo-holandesa Shell – melhorou o perfil do grupo vencedor e aliviou um pouco o peso estatal que era esperado para o primeiro leilão do pré-sal.
Se o modelo adotado pela gestão petista pudesse mesmo ser considerado um
sucesso, não seria voz corrente dentro do próprio governo que as regras
adotadas no novo regime de partilha, testado ontem pela primeira vez, devem ser
modificadas nas próximas ofertas, que só devem acontecer após 2015.
Nas próximas rodadas, deve cair a exigência de a Petrobras ser operadora
única dos blocos. A estatal também não deverá mais ter participação obrigatória
de pelo menos 30% nos consórcios. Os novos blocos também deverão ser muito
menores que Libra (que representa quase metade das reservas brasileiras comprovadas),
aumentando a competição e a arrecadação. Do contrário, vai ser sempre assim:
leilões de mentirinha, sem disputa e sem ágio.
A realidade é que – até finalmente curvar-se à constatação de que o
investimento privado é imprescindível para o país dar o salto que precisa rumo
ao desenvolvimento e ao maior bem-estar da população – o governo do PT perdeu
tempo demais dedicando-se a enxovalhar um modelo que, este sim, comprovadamente
deu certo: o de concessões.
Implementado pela gestão Fernando Henrique, a partir de 1997, o regime de
concessões gerou resultados que tornaram o setor de petróleo uma das principais
alavancas da nossa economia – sua participação no PIB brasileiro saltou de 2%
para 12% em dez anos.
Neste período, as reservas de petróleo do país mais que dobraram, saindo
de 7 bilhões de barris para os atuais 15,3 bilhões. Ao mesmo tempo, a produção
nacional de petróleo passou de 800 mil barris/dia para 2 milhões – patamar em
que estagnou nos últimos anos, em função das dificuldades impostas pela gestão
petista à Petrobras.
Em mais uma rede nacional de rádio e televisão, a presidente Dilma
Rousseff disse ontem à noite que “a batida do martelo do leilão de Libra foi
também a batida à porta de um grande futuro que se abre para nós, nossos filhos
e nossos netos”. Noves fora a pobreza da retórica, é de se constatar que a
porta que ora se abre é a mesma que o PT manteve fechada por anos e anos a fio
ao se opor raivosamente às privatizações.
Até que os leilões de petróleo fossem finalmente retomados, no início
deste ano, havia transcorrido meia década sem disputas, interrompidas tão logo
foram descobertas as primeiras reservas do pré-sal, em 2007. Hoje a Petrobras
já extrai 330 mil barris de petróleo por dia do pré-sal. Imagine quanto
já estaria sendo produzido no país se o governo do PT não tivesse brecado as
licitações...
A presidente foi à TV dizer também que um certame que termina com duas
empresas privadas detendo 40% do negócio “é bem diferente de uma privatização”.
Bobagem semântica. É positivo que o leilão represente, sim, o ingresso de
investidores privados que produzirão riqueza no país, recolherão regiamente a
parte do governo e permitirão que se gere mais benefícios e bem-estar para a
população. Que mal há nisso?
Dilma também destacou que o Estado ficará com 85% de tudo o que Libra
produzir. Será muito, mas não será tanto: segundo cálculos minuciosos de Luiz
Quintans, advogado especializado em direito do petróleo ouvido pelo Valor Econômico, o ganho financeiro e em
óleo ficará em torno de 67%, já considerando a participação da Petrobras como
renda do governo advinda do campo.
Mas o fato é que a elevação das receitas do governo com o pré-sal não
dependeria em nada da adoção do sistema de partilha e poderia muito bem ser
obtida por meio do aumento da participação especial no regime de concessão. E
já há bastante tempo, com a vantagem adicional de não ter produzido toda a
celeuma que produziu no setor nestes últimos anos.
O Brasil fez ontem um megaleilão em que o dinheiro arrecadado irá todo para
engordar o caixa do governo e produzir um superávit fiscal menos feio do que se
temia, em função dos desequilíbrios em série que a gestão Dilma tem produzido nas
contas públicas. Ou seja, o curto prazo governou o aproveitamento de nossas
riquezas de longo prazo.
Em suma, o leilão não foi um sucesso, como quer fazer crer o governo – se
fosse, a presidente Dilma não teria cancelado sua ida ao local onde se realizou
a disputa no Rio, temendo que acontecesse exatamente o que aconteceu: a disputa
terminasse sem concorrência, com apenas um consórcio interessado e arrematada
pelo preço mínimo.
Dilma Rousseff preferiu o conforto de mais uma cadeia nacional de rádio e TV, em
que pôde dar sua versão dos fatos na esperança de que eles prevaleçam sem serem
contestados. Em seu pronunciamento, acenou com um futuro venturoso que, por ora,
é apenas uma aposta e uma promessa. Torçamos para que, já num tempo bem
distante da era petista, a profecia se cumpra.
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